Resumo: Abordagem objetiva acerca da possibilidade de o juiz participar ativamente ou não da inquirição de testemunhas em plenário de Tribunal do Júri.
Sumário: 1. Introdução. 2. Correntes sobre o tema. 3. Conclusão crítica
1. Introdução
Desde seus primórdios, na Lei de 18 de Junho de 1822, quando se prestava apenas ao julgamento dos crimes de imprensa, até o atual estágio de evolução, consagrado como direito fundamental na Constituição da República, o Tribunal do Júri se revelou instituição suscitadora dos mais acalorados debates, especialmente tangentes à legitimidade da decisão por julgadores leigos bem como à falibilidade e obscuridade do sistema de julgamento por íntima convicção.
Com semelhante aptidão para a beligerância doutrinária, a atuação do juiz na instrução processual penal, participando de forma mais ativa da colheita de provas, também deflagra anosa contenda doutrinária, com importantes desdobramentos teóricos e práticos.
É na sísmica zona de convergência entre tais temas que se situa o foco do presente artigo, no qual se pretende realizar abordagem objetiva acerca da (i)lidimidade da realização de perguntas pelo juiz às testemunhas arroladas pelas partes durante a oitiva em plenário de Júri.
2. Revisão legislativa e doutrinária sobre o tema
De lege lata, tem-se que "prestado o compromisso pelos jurados, será iniciada a instrução em plenário quando o juiz presidente […]"[1] tomará as declarações do ofendido e inquirirá as testemunhas arroladas pela acusação.
Este cenário é sensivelmente diverso do encontrado na norma geral insculpida no artigo 212, parágrafo único, do diploma processual, que, após a reforma legislativa ocorrida em 2008, assentou, segundo parte relevante da doutrina, atuação exclusivamente complementar/supletiva do magistrado na ouvida das testemunhas, in verbis[2]:
“a medida encontra-se alinhada a um modelo acusatório de processo penal, no qual o juiz deve assumir posição de maior neutralidade na produção da prova, evitando-se o risco, aqui já apontado, de tornar-se magistrado um substituto do órgão de acusação”.
A condução da produção da prova oral pelo juiz, ainda que com contorno subsidiário, se justifica pelo raciocínio de que aquele, destinatário da prova que é, deve poder auxiliar na reconstrução da verdade no bojo do processo, contribuindo diretamente para que essa venha à tona.
Pois bem, diante do confronto apresentado, duas questões exsurgem, a saber, se o modelo geral suplanta a previsão especial contida na disciplina da instrução em plenário e se, em caso positivo, esta operação se alinha ao espírito do Tribunal do Júri.
Tangenciando essas problemáticas, AURY LOPES JÚNIOR assim discorre[3]:
“O papel do juiz, mais do que nunca, é subsidiário. Sua principal missão é evitar a indução e eventuais constrangimentos que promotor e advogado de defesa venham a praticar em relação à testemunha. Já os jurados, verdadeiros juízes do caso penal, poderão formular perguntas, através do juiz presidente, que exercerá o papel de mediador.”
Na direção oposta, RENATO BRASILEIRO assevera que o regramento geral não pode ser aplicado à instrução em plenário de Júri, porque os jurados, julgadores leigos, devem ser protegidos de abusos ou induções de que, eventualmente, acusação e defesa poderiam se valer se inaugurassem as perguntas à testemunha.
Nesta perspectiva, incumbiria ao juiz a realização das perguntas de forma inicial e principal, de tal modo que “às partes restarão[iam] apenas as reperguntas”[4].
Em linha alternativa, há, ainda, a posição de HERMÍNIO ALBERTO MARQUES[5], que parece sustentar tocar a inauguração da ouvida das testemunhas em plenário não ao magistrado togado, que deveria restar silente, mas sim aos verdadeiros juízes da causa, inclusive por meio de inquirição direta, a qual é repugnada tanto por LOPES JÚNIOR quanto por BRASILEIRO.
Finalmente, a titulo de curiosidade, releva registrar que, das três soluções, o Anteprojeto de Código de Processo Penal adotou, visivelmente, a apresentada por LOPES JR., concebendo a possibilidade de participação do juiz nas oitivas testemunhais em plenário, desde que com atuação coadjuvante e subsidiária.
3. Conclusão
A despeito do renome e elevação acadêmica dos estudiosos aludidos no tópico antecedente, entendemos que em nenhum vértice da tríade apresentada há completa virtude.
Com efeito, não há como conceber participação do magistrado na realização de perguntas em plenário, pois, partindo da inquestionável premissa de que os jurados são os reais juízes da causa, a dúvida daquele sobre certo ponto do depoimento pode não afligir estes.
É dizer, se destinatários da prova, no júri, são os juízes leigos, fenece de razão permitir intervenção do togado, verdadeiro terceiro, alheio à apreciação da prova.
Demais disto, eventual manifestação do magistrado poderia acabar turbando o exercício de formação de convicção pelos jurados, seja em prol da defesa, seja da acusação, mas sempre contra a realização da justiça.
Sob outro ângulo, também os jurados não devem ostentar a possibilidade de realizar perguntas, pois, conforme leciona LOPES JR. [6], "a ambição da verdade acaba por matar o contraditório e, portanto, o ponto nevrálgico do processo penal democrático e constitucional.".
Assim, concluímos que o Código de Processo Penal não foi perfeito ao tratar do papel do juiz na inquirição de testemunhas no plenário do Júri, o que deu azo à vacilação doutrinária, parecendo-nos que o caminho mais convergente a um modelo garantista de processo penal é o da limitação do juiz ao acompanhamento da oitiva testemunhal, assegurando a sua regularidade, mas sem nela interferir quanto à apuração de elementos.
Advogado. Professor de Direito Penal e Processual Penal no Centro Universitário Fluminense – UNIFLU. Professor adjunto na Universidade Cândido Mendes – UCAM. Advogado Orientado no Fórum da Universidade Cândido Mendes – FUCAM. Pós-graduação Lato Sensu em Direito Penal e Processual Penal com ênfase em prática forense do Centro Universitário Fluminense – UNIFLU
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