A persistente existência de contratos com a Administração Pública com períodos de vigências que ultrapassam, até mesmo, uma década, resultantes, não raro, do desequilíbrio fiscal do Estado, a provocar seguidas paralisações nas execuções de obras, tem lançado sobre a doutrina e a jurisprudência necessárias e acirradas discussões sobre os limites à vigência dos contratos administativos.
A primeira questão que se põe a quem se proponha a enfrentar o assunto atine à existência ou não de limites temporais para a vigência de um contrato administrativo. A resposta pressupõe atenta análise das normas que disciplinam o prazo de vigência dos contratos administrativos e as interpretações doutrinárias e jurisprudenciais a elas correlatas.
Introdutoriamente, imprescindível é a distinção entre os contratos de obras públicas e os demais, cuja natureza seja diversa.
Caracteriza os primeiros o fim perseguido pela Administração ao celebrá-los: a execução de um objeto pré-determinado cujo entrega coroa a conclusão dos objetivos contratuais.
Desta forma, o contrato de obra pública é condicionado pela entrega do objeto determinado, quando, então, poder-se-á tê-lo por finalizado. Ao revés, o contrato, por exemplo, de prestação de serviços, consubstancia-se no oferecimento de serviços, tal qual pactuado, durante o transcorrer de um prazo contratualmente estabelecido, integrando este período – o prazo – em que são prestados os serviços a própria dimensão do objeto.
Ponderadas estas características, nota-se que o trespasse do prazo provoca efeitos bem diferentes para cada espécime contratual acima mencionada.
Partindo desta premissa de que o prazo provoca diferentes efeitos sobre subespécies de contratos administrativos, pode-se afirmar, portanto, que os contratos administrativos subdividem-se em contratos por objeto e contratos por prazo. Exemplo dos primeiros é a empreitada de obra; dos segundos, o contrato de prestação de serviços de vigilância ou asseio e conservação.
Os efeitos do término do prazo em cada espécime são obviamente diferentes porque, nessas duas modalidades contratuais, o lapso temporal desempenha função bastante distinta. No contrato de empreitada, o prazo contratualmente estabelecido não serve à definição do objeto, mas apenas à demarcação do tempo concedido ao contratado para a sua entrega. No contrato de vigilância, o prazo contratual define a própria extensão e valor do objeto (ex.: prestação do serviço de vigilância por seis meses).
Isto posto, nos contratos que se extinguem pela conclusão de seu objeto (contratos por objeto), o vencimento do prazo não provoca, per si, a conclusão automática do contrato, tal como ocorre nos contratos por prazo, nos quais, ao término do prazo, está entregue o objeto – “oferecimento dos serviços pelo período determinado” – e finalizado o contrato.
Nos contratos por objeto, alcançado o prazo, há de se averiguar se foi efetivamente entregue o objeto pactuado, suscitando-se, então, o exame da ocorrência ou não de mora da contratada no cumprimento de suas obrigações, com a conseqüente aplicação das sanções contratuais, por, eventualmente, não ter entregue as obras concluídas dentro do lapso de tempo estipulado – obviamente, apenas se responsabiliza a contratada se tiver dado causa ao fato que impediu o cumprimento do prazo.
Assim, os prazos previstos nos contratos por objeto são prazos moratórios, o que significa dizer que a expiração dos mesmos não extingue o ajuste. É que nos contratos que se extinguem pela conclusão do seu objeto, a prorrogação independe de aditivo ou de nova licitação, porque, embora ultrapassado o prazo, o contrato continua em execução até que seja entregue o objeto ou rescindida a avença, por uma das hipóteses legais.
De se concluir, então, que no contrato de obras, ao revés de ser limite inexorável a pôr fim à relação contratual, o prazo opera como obrigação temporal para a entrega da obra, ou seja: é o período em que, findo, deverá o contratado entregar o objeto, sob pena de operar-se sua mora (por óbvio, se culpa sua houver). Não é, pois, prazo extintivo, mas obrigação temporal para a entrega da obra, sob pena de se aplicar sanção ao contratado inadimplente – sanção que pode subsumir-se, inclusive, na rescisão do contrato, embora, evidentemente, a inadimplência do contratado no cumprimento dos prazos pode ser causa para rescisão, nos termos do art. 78 da Lei Federal n. 8.666/93.
Esta orientação encontra sua mais formosa elaboração nos ensinamentos de Hely Lopes Meirelles, cujo entendimento seria acolhido, posteriormente, por outros administrativistas do país. Estas as palavras do Professor:
“A extinção do contrato pelo término de seu prazo é a regra dos ajustes por tempo determinado. Necessário é, portanto, distinguir os contratos que se extinguem pela conclusão de seu objeto e os que terminam pela expiração do prazo de sua vigência: nos primeiros, o que se tem em vista é a obtenção de seu objeto concluído, operando o prazo como limite de tempo para a entrega da obra, do serviço ou da compra sem sanções contratuais; nos segundos o prazo é de eficácia do negócio jurídico contratado, e assim sendo, expirado o prazo, extingue-se o contrato, qualquer que seja a fase de execução de seu objeto, como ocorre na concessão de serviço público, ou na simples locação de coisa por tempo determinado. Há, portanto, prazo de execução e prazo extintivo do contrato.” (Licitação e Contrato Administrativo, ed. RT, 10ª ed., pág. 230)
Sob estas premissas, conclui (grifo nosso):
“Nos demais contratos, como no de empreitada de obra pública, não se exige, nem se justifica cláusula de prorrogação, porque o contrato não se extingue pela fluência do prazo fixado, mas sim pela conclusão da obra. Nestes contratos o prazo é apenas limitativo do cronograma físico, e será prorrogado (com ou sem mora das partes) tantas vezes quantas sejam necessárias para a conclusão da obra independentemente de previsão contratual.” (op. cit., idem, ibidem)
Luciano Ferraz, em esclarecedor parecer sobre o tema, desta forma asseverou (grifos nossos):
“Os contratos de obra pública são contratos de resultado – o que interessa é o resultado final, servindo a cláusula que fixa o prazo de execução como limite para a entrega do objeto, sem que o contratado sofra sanções contratuais. O dies a quo do prazo contratual, geralmente é contemporâneo à formalização do ajuste, mas é possível que o negócio esteja submetida a condição futura (suspensiva), que impeça seja ele imediatamente iniciado. (…) A inércia da Administração em dar ordem de serviço para o começo da obra, motivada pela escassez de recursos financeiros, inviabilizou o início da vigência do contrato. Se o prazo de vigência está paralisado por ato omissivo da Administração, é de se entender que o contrato continua em vigor e pode ser executado.” (Contrato Administrativo – Possibilidade de retomado, prorrogação ou renovação do ajuste – Manutenção do Equilíbrio econômico-financeiro inicial – Atenção às exigências da lei de responsabilidade fiscal. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ – Centro de Atualizações Jurídica, n. 14, junho-agosto, 2002. Pág. 7)
Notadamente, a própria Lei de Licitações prevê hipóteses em que, não havendo culpa do executor nos atrasos provocados no cronograma das obras, este será prorrogado com a garantia a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. Assim será com os casos em que houver enquadramento numa das previsões normativas do art. 57, §1º, da Lei de Licitações. Verbis:
“Art. 57. (…)
§ 1o Os prazos de início de etapas de execução, de conclusão e de entrega admitem prorrogação, mantidas as demais cláusulas do contrato e assegurada a manutenção de seu equilíbrio econômico-financeiro, desde que ocorra algum dos seguintes motivos, devidamente autuados em processo:
I – alteração do projeto ou especificações, pela Administração;
II – superveniência de fato excepcional ou imprevisível, estranho à vontade das partes, que altere fundamentalmente as condições de execução do contrato;
III – interrupção da execução do contrato ou diminuição do ritmo de trabalho por ordem e no interesse da Administração;
IV – aumento das quantidades inicialmente previstas no contrato, nos limites permitidos por esta Lei;
V – impedimento de execução do contrato por fato ou ato de terceiro reconhecido pela Administração em documento contemporâneo à sua ocorrência;
VI – omissão ou atraso de providências a cargo da Administração, inclusive quanto aos pagamentos previstos de que resulte, diretamente, impedimento ou retardamento na execução do contrato, sem prejuízo das sanções legais aplicáveis aos responsáveis.
Não é tormentoso constatar que o preceito acima transcrito prevê hipóteses causadoras de prolongamento na entrega do objeto do contrato, no caso da avença de resultado, estabelecendo que, diante do enquadramento dos pressupostos fáticos numa dessas previsões normativas, admitir-se-á que os prazos de início de etapas de execução, de conclusão e de entrega das obras serão prorrogados, mantidas as demais cláusulas do contrato e assegurada a manutenção de seu equilíbrio econômico-financeiro.
Em análise introdutória, pois, parece não haver óbice legal a concluirmos que a conseqüência da paralisação, por fato atribuível à Administração Pública, seria a prorrogação automática do cronograma de execução, devolvendo-se o prazo à contratada que, afinal, não está inadimplente e conserva íntegro seu direito, adquirido após regular processo licitatório, de contratar com a Administração Pública.
Esta orientação não discrepa, antes, é inerente a ela, da natureza do contrato de obra pública, como enunciou, na lição acima transcrita, Hely Lopes Meirelles, sobremodo porque, nestes, o contrato não se finda pela extinção do prazo contratual, mas, isto sim, pela conclusão da obra, que poderá se prolongar se o fato que lhe dê causa não seja atribuível ao particular contratada.
Aliás, esta hipótese de ajustamento do cronograma executório aos fatos supervenientes alheios ao contratado era expressamente acolhida pelo art. 47, §1o, “3”, do Decreto-Lei n.º 2.300/86, admitindo a prorrogação dos prazos de início, de etapas de execução, de conclusão e de entrega inclusive na hipótese de interrupção dos trabalhos por ordem da Administração.
A Lei Federal n.º 8.666/93, revogando o precedente estatuto das contratações administrativas, veio a contemplar esta hipótese, desta feita expressamente se referindo à prorrogação automática, por igual tempo (ou seja, devolução do prazo) do cronograma de execução, quando superveniente paralisação do contrato por ordem do Poder Público. (grifo nosso)
“Art 79.
…
§ 5o – Ocorrendo impedimento, paralisação ou sustação do contrato, o cronograma de execução será prorrogado automaticamente por igual tempo.”
Segundo os ditames destas normas, sendo provisória a paralisação, as partes, se mantiverem interesse em seguir o que fora contratualmente acertado, podem prossegui-lo, assim que ultrapassados os fatos que impediram o normal desenrolar da execução contratual. Observe-se que tal dispositivo coaduna-as sobremaneira com as características de um contrato de objeto.
Acaso dispusesse diferentemente a Lei, a qualquer momento em que suspendesse a Administração a execução de obras, por falta de recursos, estaria extinto o contrato e muito maiores poderiam ser os prejuízos ao erário (vide os danosos exemplos das obras inacabadas) e, também, ao particular que exerce seu direito de contratação após sagrar-se vencedor em processo licitatório.
A norma simplesmente oferece a alternativa de prorrogação do cronograma de execução, já que, afinal, foi esta suspensa exclusivamente por razões de interesse público, não sendo atribuída qualquer falha ao Consórcio contratado.
Esta devolução do prazo se coaduna com fatos corriqueiros que, não raramente, afligem a Administração Pública (falta de recursos, principalmente). O Tribunal de Contas da União, na Decisão n.º 606 do Plenário (adiante mais detalhadamente examinada), reconheceu expressamente de que forma sempre se operou a devolução de prazo nestas hipótese:
“A bem da verdade, impende frisar que a questão do prazo máximo de duração dos contratos previstos nas normas atinentes às licitações e contratos sempre se operou, no que diz respeito à construção de obras e serviços de engenharia, computando-se, para efeito de contagem de tempo, as devoluções das interrupções de responsabilidade da Administração, que via de regra patrocina as tão conhecidas e combatidas “obras paralisadas ou inacabadas” muitas vezes fruto da insuficiência de dotação orçamentária gerado pelos constantes contingenciamentos de recursos feitos pelo Governo Federal…” (Processo n. TC 008.151/94-6. TCU. Plenário. DOU de 15.10.1996. Pág. 20931)
Desta forma, o período de paralisação temporária prorroga automaticamente o cronograma executório devolvendo ao Construtor o prazo correspondente ao período de suspensão, para que se ajuste o prazo às paralisações ordenadas pelo ente Público, em respeito ao princípio da continuidade do serviço público.
Emérito comentador da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Jessé Torres Pereira Júnior fornece concludente lição concernente à matéria (grifo nosso):
“Em verdade, o §5o destina-se à preservação do contrato em casos de impedimento, paralisação ou sustação temporária de sua execução, fato que não leva, necessariamente, à rescisão, nem pode ser considerado, a rigor, hipótese de inexecução porque contratante e contratado mantêm a disposição de dar cumprimento ao avençado, temporariamente obstaculizado. Tais impedimentos, paralisação e sustação correspondem às situações descritas nos incisos XIV, XV e XVI do art. 78, em que a execução do contrato enfrenta vicissitudes decorrentes de fatos da Administração que podem ser transitórios, daí a lei prover solução que representa alternativa à rescisão, com a cautela de impor-lhe limite temporal; prorroga-se o cronograma por tempo igual àquele previsto; esgotado tal prazo, que duplica o tempo originariamente estabelecido para a execução, estará o contratado liberado do esforço de salvação do contrato e promoverá as medidas tendentes à sua rescisão. Note-se que a prorrogação aqui versada dispensa previsão editalícia ou contratual, ocorrendo “automaticamente”, em face do impedimento, de paralisação ou da sustação, isto é, sem depender de ato da Administração ou de requerimento do contratado“. (Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública, 4a Edição, Renovar, 1997. Pág. 530)
Carlos Pinto Coelho Motta, também especialista na Lei de Licitações, segue similar caminho:
“O contrato não prorrogado se extingue automaticamente. Entretanto, no direito público, nem sempre a extinção do contrato decorre do término do seu prazo. Pode-se ter um contrato, com prazo de vigência expirado e sem término de execução do objeto; o que permite, em determinadas circunstâncias, a devolução do prazo, como previsto no art. 79, §5o, da Lei n. 8.666/93. Nesse particular, o intérprete deve estar atento aos “fatos da administração”, à legislação de vigência e à análise objetiva.” (Eficácia nas licitaçõese Contratos. 7a Ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1998. P. 294)
Prossegue o autor, para concluir:
“Quanto ao tema da devolução do prazo contratual, conforme prevê a súmula 191 do TCU, entendo que a prorrogação, nas hipóteses do §1o, art. 57, não é como dantes, um ato discricionário da Administração. Ao contrário: o §5o do art. 79 da Lei expressa o direito subjetivo público do contratado à continuidade da avença. A prorrogação do cronograma de execução prevista no §5o do art. 79, combinado com o § 1o do art. 57, impõe o restabelecimento da diretriz fixada pela Súmula 191 do TCU, que havia sido considerada alterada pela redação do inciso XV, do art. 68, do Decreto-Lei 2.300/86…” (Eficácia nas Licitações e Contratos. 4a Ed., Del Rey, P. 213)
Este valoroso ensinamento do Professor Carlos Pinto Coelho Motta recebeu acolhimento deste próprio Tribunal de Contas da União. Em precisa decisão (Decisão n.º 606/1996), o Exmo. Ministro Relator, transcrevendo as lições acima, concordou integralmente com o emérito professor. E foi além (grifo nosso):
“Em harmonia com o entendimento acima creio que a exegese correta dos dispositivos do já revogado DL 2.300/86 não pode deixar de considerar a hipótese de que dando causa às interrupções dos contratos a Administração concorreu para a não execução a bom termo das avenças, impondo, desse modo, em regra, vultosos prejuízos ao contratado, decorrente do não cumprimento integral do objeto pactuado, sendo pois, bastante razoável que a suspensão do contrato por conveniência administrativa autorize a devolução do prazo correspondente a essa suspensão, conceito este que se coaduna tanto com a Súmula 191 do TCU, bem assim com os dispositivos da atual Lei nº 8.666/93, como visto anteriormente. 63. Por pertinente ao assunto acima abordado, cabe registrar que a moderna linha doutrinária e jurisprudencial do direito administrativo admite cabalmente que a rescisão unilateral por parte da Administração, sem que os motivos ensejadores do referido distrato tenham origem no contratado, impõe ao contratante a reparação dos prejuízos causados pelo rompimento. (Processo n. TC 008.151/94-6. TCU. Plenário. DOU de 15.10.1996. Pág. 20931)
Enfim, concluiu o Ministro Relator que a não devolução dos prazos, quando interrompidas as obras por ordem da Administração, não apenas feriria o princípio da economicidade, como também contrariaria o arcabouço legal que permite, inclusive, a contratação das obras remanescentes (não concluídas), por dispensa de licitação, obedecendo-se a classificação do certame realizado (grifo nosso):
“É de fácil verificação, portanto, que no mundo dos fatos a sistemática de contagem em dias corridos para a apuração do prazo máximo dos contratos firmados sob o pálio do DL 2.300/86 (5 anos), no caso de ser a Administração responsável pelo retardamento, agravamento ou pelo impedimento da execução contratual, afora não estar cristalinamente expressa no r. diploma legal, só resultaria em dano ao princípio da economicidade consagrado na Constituição Federal. 64. Assim, admitindo-se a devolução dos prazos por culpa da Administração aos contratos originais de remanescentes de obras em questão, é de se notar que tais contratos permaneciam vigentes, visto que não teriam atingido o limite máximo de duração e sobretudo não se teria concluído o objeto contratado, sendo, desse modo, inteiramente passíveis de renovação, inclusive na permissão cabível de dispensa de licitação (inciso V do art. 22 do DL 2.300/86), uma vez que, não estando sob a égide da legislação em vigor (Lei nº 8.666/93), a Administração, ante a comprovada necessidade e conveniência administrativa, poderia a seu talante contratar diretamente, com dispensa de licitação, a complementação de obra, serviço ou fornecimento anterior que se fizesse necessária.”
Como bem percebeu o Ministro Relator, se a Lei admite a dispensa de licitação para conclusão do remanescente de obras (observando-se a classificação do certame realizado), seria, de fato, incongruente se considerasse caduco um contrato, firmado após lídimo procedimento licitatório, cuja execução apenas fora suspensa por ordem da Administração.
Cumpre, por fim, aclarar que a prorrogação do cronograma nos moldes citados pela Decisão n.º 606 deste TCU (com devolução do prazo, portanto) encontrou inteligente acolhida do nosso Egrégio Tribunal Regional Federal da 5a Região, no seguinte Acórdão (grifo nosso):
“MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. EXECUÇÃO DO CONTRATO. O PECULIAR REGIME DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS PREVÊ, COMO DESDOBRAMENTO DO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO, SUA PRORROGAÇÃO AUTOMÁTICA NOS CASOS DE “IMPEDIMENTO, PARALISAÇÃO E SUSTAÇÃO” (ART. 79, PARÁGRAFO 5º, DA LEI Nº 8.666/93), NÃO ADMITINDO, POR OUTRO LADO, A RESCISÃO UNILATERAL POR INICIATIVA DO PARTICULAR. (Pleno, 2001, MS 69491, PE, Proc. n° 9905588345, Rel. Des. Ridalvo Costa)”
Concludente, assim, que a Lei autoriza a devolução dos prazos correspondentes aos períodos de suspensão da execução do contrato, prorrogando-se o cronograma de execução de obras.
Ultrapassado este primeiro ponto, há que se indagar se o limite qüinqüenal previsto no revogado Decreto n.º 2.300/86 mantém-se vigente ante a Lei Federal n. 8.666/93.
Esta a inteligência do Estatuto das Licitações antecedente:
“Art. 47. A duração dos contratos regidos por este Decreto-lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos, exceto quanto aos relativos:
I – a projetos ou investimentos incluídos em orçamento plurianual, podendo ser prorrogado se houver interesse da Administração, desde que isso tenha sido previsto na licitação e sem exceder de 5 anos ou do prazo máximo para tanto fixado em lei;
(…)
§ 1º Os prazos de início, de etapas de execução, de conclusão e de entrega, admitem prorrogação a critério da Administração, mantidas as demais cláusulas do contrato, desde que ocorra algum dos seguintes motivos:
(…)
3. interrupção, da execução do contrato ou diminuição do ritmo de trabalho, por ordem e no interesse da Administração;” (g.n.)
A bem da verdade, o art. 47, § 1º, 3, do DL 2.300/86 já admitia a prorrogação dos Contratos Administrativos, dentre outras hipóteses, no caso de interrupção da execução das avenças por ordem e no interesse da Administração, isto é, diante do fato da administração.
Contudo, sujeitava-se a Administração, à época da vigência da normação acima mencionada, submetida à limitação de que tratava o caput do transcrito art. 47, ou seja, o prazo máximo de cinco anos.
Esse limite, contudo, foi superado após a edição da Lei n.º 8.666/93 e sua alteração pela Lei n.º 8.884/94, que, contemplando norma especial de direito intertemporal, fez aplicar aos contratos vigentes o disposto em seu art. 57, que não impunha nenhum limite aos contratos com recursos previstos no Plano Plurianual (PPA). Eis a prescrição do art. 121 (grifo nosso):
“Art. 121. O disposto nesta Lei não se aplica às licitações instauradas e aos contratos assinados anteriormente à sua vigência, ressalvado o disposto no art. 57, nos parágrafos 1o, 2o e 8o do art. 65, no inciso XV do art. 78, bem assim o disposto no “caput” do art. 5o, com relação ao pagamento das obrigações na ordem cronológica, podendo esta ser observada, no prazo de noventa dias contados da vigência desta Lei, separadamente para as obrigações relativas aos contratos regidos por legislação anterior à Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 8.6.94)”
O próprio TCU, através da Decisão 766/94, adotou entendimento segundo o qual se permite a duração de contratos por prazo superior a 5 anos. Nos fundamentos desta, anotou o Ministro Relator que, a partir da Lei n.º 8.666/93 deixara de existir o limite qüinqüenal para projeta contemplado pelos Planos Plurianuais:
Isto posto, rege-se, quanto a sua duração, o contrato em pauta, pelas disposições do art. 57, I, que, efetivamente, eliminou o limite qüinqüenal da legislação antecedente:
“Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:
I – aos projetos cujos produtos estejam contemplados nas metas estabelecidas no Plano Plurianual, os quais poderão ser prorrogados se houver interesse da Administração e desde que isso tenha sido previsto no ato convocatório;”
Vê-se, portanto, que não contraria a Lei n.º 8.666/93 o alongamento da execução contratual por mais de 5 (cinco) anos, se incluídas nos Planos Plurianuais, até porque, efetivamente, o prazo para a execução de obras é, deveras, distinto daquele fixado para a prestação de serviços, como acima anotado – o que, a princípio, já traria evidentes dúvidas sobre a possibilidade de limitação de prazo. Por dever de cautela, evidentemente, há de se condicionar a vigência de cada Contrato a sua inclusão nos Planos Plurianuais de todo o período correspondente a sua vigência.
Embora, como procuramos demonstrar, a vigência dos contratos administrativos para execução de obras não tenha um limite temporal pré-fixado, sendo possível seu alongamento para além de 5 anos se incluído seu objeto nos PPA’s, a conclusão acerca de sua vigência comporta limites e ressalvas que precisam ser considerados.
A primeira e principal ressalva é a vedação de descaracterização do objeto contratado, sob pena de imputação de “burla à licitação” aos responsáveis, como já apontado pelo Tribunal de Contas da União em inúmeros casos.
Longos períodos de paralisação de execução de obras e mudanças no objeto contratado durante longa vigência, com efeito, não podem deixar frestas a que se considere impreciso o objeto licitado, ilicitude que o TCU tem apontado nas hipóteses de aproveitamento de contratos antigos, com objeto demasiado amplo, de que é exemplo o seguinte trecho do Acórdão n. 1683/2004 do Plenário:
“Ainda sobre o contrato utilizado, impende observar que a caracterização extremamente ampla de seu objeto, que consistia na ?execução das obras de infra-estrutura urbana em diversos bairros de João Pessoa?, não encontrava amparo nem mesmo na legislação aplicável à época, conforme se depreende da leitura do art. 32, inciso I, do Decreto-lei 2.300/86. Não seria nem mesmo razoável que, com a descrição do objeto na forma prevista no referido contrato, a prefeitura pudesse dele se utilizar para realizar todas as obras de infra-estrutura urbana em João Pessoa, pelos dez anos seguintes, tal como foi feito.”
Neste mesmo Acórdão, determinou o TCU que:
“9.5.3. evite inserir nos editais de licitação definições de objeto imprecisas ou demasiadamente amplas, cuja interpretação possa levar à possibilidade de contratação de mais de uma obra, serviço ou fornecimento em decorrência de uma única licitação;”
A segunda ressalva refere-se ao grau de precisão dos Planos Plurianuais, cujo conteúdo genérico, como sói acontecer, pode enfraquecer o enquadramento dos fatos examinados à hipótese normativa do art. 57, inciso I.
Enfim, é preciso destacar que, ainda que, como acima exposto, não haja óbice ao trespasse do prazo de mais de 5 anos nos contratos administrativos cujos objetos estejam insertos nos PPA’s do período de vigência, há natural resistência do TCU no aproveitamento de contratos antigos, que possam, a seu ver, representar indiretamente uma “contratação por prazo indeterminado”.
Esta ressalva pode ser exemplificada pelo posicionamento expresso no Acórdão 1683/2004, do Plenário, em cujo Relatório o Ministro Relator anotou:
“Entendemos que a utilização do contrato mais de uma década após a sua assinatura contraria o art. 57, inciso I, da Lei 8.666/93, alterada pela Lei 8.883/94, conforme entendimento firmado na Decisão 766/1994 do Plenário deste Tribunal no sentido de que em qualquer hipótese é vedada a contratação por prazo indeterminado ou com vigência injustificavelmente longa, e de que aos contratos celebrados, quer anteriormente, quer após a edição do Decreto-lei 2.300/86, cujo atingimento do limite legal de duração (previsto no Regulamento Geral de Contabilidade Pública ou no Decreto-lei 2.300/86) tenha ocorrido ou venha a ocorrer após 8/6/1994, aplica-se o disciplinamento constante do referido artigo da Lei 8.666/93.”
Essas são, em síntese, as considerações que se pretendia fazer a respeito da duração dos contratos administrativos de obras.
Advogado, Coordenador da Unidade de Direito Administrativo do Lima & Falcão/Demarest Almeida Advogados e Graduando em Administração pela Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco.
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