O prazo prescricional na ação de reparação de danos decorrentes de atos de improbidade administrativa

Resumo: Breve exame sobre o prazo prescricional na ação de improbidade administrativa, notadamente no dever de reparar o dano decorrente dessa modalidade de ilícito.


Palavras-chave: Improbidade Administrativa. Reparação. Dano. Prescrição.


Sumário: 1. Introdução; 2. Desenvolvimento; 3. Conclusão; Referências bibliográficas.


1. INTRODUÇÃO


O presente estudo tem como objetivo investigar se o dever de reparar os danos decorrentes da aplicação da lei de improbidade de administrativa está submetido a prazo prescricional ou se esse dever é imprescritível.


2. DESENVOLVIMENTO


A Constituição Federal prevê em seu art. 37, §4°, em capítulo destinado à Administração Pública, a hipótese de responsabilização por atos de improbidade administrativa, referindo que poderão gerar a aplicação das penas de suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário.


Apesar da Carta Magna não indicar o conceito de ato de improbidade administrativa, o referido dispositivo deixa transparecer que se trata de ato grave, dada as penalidades previstas, e de natureza não penal, já que ressalva a aplicação das penas decorrentes da legislação criminal.


A matéria foi disciplinada, então, pela Lei n.° 8.429/92, que, após prever as várias formas e atos que configurariam ato de improbidade administrativa, fixou as penalidades a serem aplicadas em caso de sua efetiva ocorrência.


Assim prevê seu art. 12:


“Art. 12.  Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: (Redação dada pela Lei nº 12.120, de 2009).


I – na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;


II – na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;


III – na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.


Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente”.


Observa-se, pois, que, à luz do texto constitucional, foram fixadas várias penalidades em caso de comprovação de prática de ato de improbidade administrativa, que poderão ser aplicadas em conjunto ou isoladamente, sendo algumas de natureza eminentemente patrimonial (multa e dever de ressarcimento) e outras de natureza estritamente pessoal (suspensão dos direitos políticos, perda do cargo).


Outrossim, em capítulo próprio da Lei de Improbidade Administrativa, é tratado do prazo prescricional a incidir em caso de aplicação da referida norma.


Nesse contexto, o art. 23 refere que será de cinco anos, após o término do exercício de mandato, cargo de comissão ou de função de confiança, ou, para casos de exercício de cargo efetivo ou emprego, dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público.


Ocorre que a Constituição Federal prevê em seu art. 37, §5° verdadeira regra de imprescritibilidade para o caso de ressarcimento de danos ao erário.


Cumpre colacionar:


“§ 5º – A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento”.


Em que pese entendimento minoritário em sentido contrário, firmou-se posicionamento, inclusive no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, de que a Constituição Federal, ao ressalvar as respectivas ações de ressarcimento, previu que elas não estariam submetidas a prazo prescricional, sendo, portanto, o dever de ressarcir os prejuízos causados ao erário, imprescritível.


Aparentemente, há conflito entre as normas, o que afastaria a aplicação do disposto no art. 23 da Lei n° 8.249/92, por inconstitucionalidade material.


Entretanto, em face da própria incidência do disposto no art. 37, §5°, da Constituição Federal, a norma do art. 23 da Lei de Improbidade aplica-se apenas as sanções de natureza diversa daqueles com a finalidade de ressarcir o erário.


Com efeito, na forma do art. 37, §5°, da CF, a sanção que obriga o agente a ressarcir o dano causado em razão do ato de improbidade não se submete a nenhum prazo prescricional.


Entretanto, as demais sanções estão submetidas à regra do art. 23 da Lei de Improbidade.


Conforme ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro:


“A prescrição da ação de improbidade está disciplinada no artigo 23, que distingue duas hipóteses: pelo inciso I, a prescrição ocorre em cinco anos após o término do exercício de mandato, cargo em comissão ou de função de confiança; para os que exercem cargo efetivo ou emprego, o inciso II estabelece que a prescrição ocorre no mesmo prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público. São, contudo, imprescritíveis, as ações de ressarcimento por danos causados por agente público, seja ele servidor público ou não, conforme estabelece o artigo 37, §5°, da Constituição. Assim, ainda que para outros fins a ação de improbidade esteja prescrita, o mesmo não ocorrerá quanto ao ressarcimento do dano. (DI PIETRO, 2006. Página 791)”.


Entende-se, pois, que a ação civil de improbidade está submetida ao prazo prescricional do art. 23 da Lei 8.429/92, circunstância que, contudo, não impede o ajuizamento de ação civil para que o dano decorrente desse ato ilícito seja reparado.


Nessa linha, inclusive, é impositivo que se ressalte o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Resp1.089.492 – RO, de relatoria do Ministro Luiz Fux.


Na referida decisão, a Corte aduziu que a pretensão de reparação de danos é imprescritível, na forma do art. 37, §5°, da Constituição Federal, enquanto as demais sanções se submetem ao prazo do art. 23 da Lei de Improbidade Administrativa. Inclusive, a Corte determinou o prosseguimento do processo, apenas quanto ao pedido de reparação, em razão da decretação da prescrição do direito de imposição das demais sanções.


Ou seja, não julgou extinto o feito, mas permitiu o prosseguimento da ação civil de improbidade para reparação dos danos, apenas.


Portanto, o dever de reparar o dano ao erário é imprescritível, estando, entretanto, as demais penalidades incidentes por força da Lei de Improbidade submetidas ao prazo do art. 23 da Lei n.° 8.429/92.


3. CONCLUSÃO


Em razão do estudo realizado, notadamente do disposto no art. 37, §5°, da Constituição Federal e do art. 23 da Lei n.° 8.429/92, se conclui que, efetivamente, o dever de reparar os danos ao erário casos por ato de improbidade é imprescritível.


 


Referências bibliográficas:

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 19° ed. São Paulo: Atlas, 2006.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

Informações Sobre o Autor

Angela Roberta Kruger

Procuradora da Fazenda Nacional. Pós-graduanda em Direito Público pela UNIDERP.


Equipe Âmbito Jurídico

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