O prequestionamento

Resumo: O tratamento do tema terá um caráter teórico-conceitual, analisando bibliograficamente cada tópico e comparando as posições defendidas, tendo em vista o caráter particular que assumiu o prequestionamento em referência ao cumprimento do preceito legal que confere acesso à justiça, bem como a garantia da supremacia do interesse público.


Palavras-chave: prequestionamento, Recurso Extraordinário, Recurso Especial.


Sumário: 1. Origem histórica. 2. Conceito de prequestionamento. 3. Formas de prequestionamento. 4. Embargos de Declaração com fins prequestionadores. 5. O prequestionamento na prestação jurisdicional. 6. Conclusão. 7. Referências bibliográficas.


1. Origem histórica


A Constituição Republicana de 1891


O prequestionamento baseado nos ideais do liberalismo da Lei norte-americana serve de instrumento irrecusável ao deslinde dos recursos especial e extraordinário no Brasil, que mesmo em Constituições anteriores à época de grandes opressões políticas e sociais pretendia seguir os princípios democráticos. Assim a evolução do ordenamento jurídico brasileiro, desde o início, demonstra a dificuldade em definir os parâmetros e a real necessidade do prequestionamento diante de um Estado de Direito Democrático.


Os Constituintes da Carta Magna vigente, nessa esfera, optaram por omitir tal instituto, causando insegurança jurídica e dando margem as mais diversas interpretações dos Tribunais, sem um compromisso teórico-científico. O grau de incertezas e a quantidade de opiniões fazem com que o prequestionamento adote outras direções, senão por muitas vezes inadequadas.


O prequestionamento para muitos se parece com o “bicho-papão”, ninguém sabe o que é ao certo, mas todo mundo tem medo. Advogados se preocupam em levantar a questão federal ou constitucional desde a petição inicial ou da contestação, enquanto juízes se detêm ao mérito da causa uma vez que a discussão na esfera inferior deste tipo de matéria é delicada e deve ser observada com cautela. Os Tribunais ora entendem suficiente o simples relato da matéria ou menção de dispositivo, ora exigem o enfrentar da questão por completo como indispensável. O ônus processual de prequestionar pode ser exclusivo da parte interessada ou do julgador, e até mesmo por meio híbrido, onde um completa o outro, afastando a preclusão. Este prequestionamento como o próprio nome já diz, deve ser feito antes do julgamento do recurso, pois se este fosse realizado apenas após o julgamento seria um pós-questionamento e não um prequestionamento.


Outrossim, consoante a provável contribuição do prequestionamento como requisito específico à admissibilidade dos recursos excepcionais, juristas controvertem-se entre si para definir o seu valor no alcance da tutela jurisdicional, como também, para esgotar as afirmações e ou negações a respeito da constitucionalidade de sua exigência. Na doutrina posições há que defendem inexistir sob a proteção da Constituição Federal o instituto do prequestionamento, haja vista que este não se encontra em expressa disposição da Carta. Diversamente buscando aliviar a austeridade do requisito, outros juristas, admitem até mesmo o prequestionamento implícito ao reconhecer o inevitável cumprimento aos princípios do duplo grau de jurisdição e do acesso a tutela jurisdicional. Enfim, essa precariedade de consenso sem sombras de dúvidas aflige demasiadamente os operadores do direito que se vêem a mercê da sorte, como numa verdadeira loteria.


Isto posto, a diversidade simultânea de entendimentos pode causar seria perturbação a funcionalidade do Direito, havendo necessidade de uniformização da jurisprudência com o intuito de desenvolver mecanismos que impeçam os jurisdicionados de ficarem desprotegidos de uma situação que atente a Constituição Federal ou uma lei federal. Portanto, almejando obter esclarecimentos decisivos a respeito do tema, e não com o propósito descabido de exaurí-lo, avaliar-se-á a localização do instituto dentro do espírito da excepcionalidade dos recursos extraordinários lato sensu, ressaltando ininterruptamente as ponderações e restrições dos Tribunais Superiores no tangente a admissibilidade desses recursos. Ainda será importante frisar a possibilidade da utilização residual dos Embargos Declaratórios com fins prequestionadores, além de destacar obviamente o entender dos doutrinadores que o repugnam nesta forma.


Em meados de 1789 brotava nos ideais dos brasileiros a necessidade de uma revolução. Era a população se organizando contra a monarquia. A necessidade era a Independência do Brasil, que por conseqüência poderia trazer o fim da autoridade monarca. E como exemplo de líder pró-republicano temos Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha “Tiradentes”, o primeiro a sofrer os maus-tratos da Independência.


Proclamada a Independência havia necessidade de elaborar um sistema jurídico próprio do Brasil, haja vista que não mais podia se submeter às normas de Portugal. E a Constituição de 1824 outorgada pelo Príncipe Regente é organizada conforme a nova conjuntura política. Foi a solução para o inicio do processo de emancipação jurídica.


Reprimidos os movimentos republicanos em 1870, o País parou no tempo, contudo, a sede de revolução já se enraizava. Mas foi tão somente a partir de 1888 com a abolição da escravatura que a Proclamação da República tornou-se tangível.


Mais tarde em 1889, apenas três fatores ainda ajudavam a manter o sistema monárquico: o prestigio pessoal de D.Pedro II junto à classe política, a dedicação ao Imperador por parte dos chefes militares mais antigos e a divisão dos republicanos em “revolucionários”, que desejavam a derrubada imediata da monarquia, e “evolucionistas”, que imaginavam que com a morte do Príncipe Regente o Império cairia por si só.


E somente no dia 11 de novembro o marechal Deodoro da Fonseca aceitou chefiar um movimento que derrubaria o governo. Ao amanhecer do dia 15 de novembro, o ministério foi deposto. Na tarde desse mesmo dia, oficialmente se proclamou a Republica e dias depois a família imperial deixava o Brasil.


O Brasil passou a ser uma Republica Federativa composta por vinte Estados. Como todo sistema federativo, cada Estado possuía autonomia: podia eleger seu governador e sua Assembléia Legislativa, tinha sua própria Constituição e organizava sua administração, sistema judiciário, serviços públicos, sistema escolar, forças policiais entre outros. Podiam ainda contrair empréstimos no exterior, cobrar impostos e ter seus próprios corpos militares. Alem disso, cada Estado tinha seu Código Eleitoral e seu Código Processual Civil.


Logo se reunia a primeira constituinte republicana que apresentou a primeira Constituição Republicana dos Estados Unidos do Brasil de 1891, e que seguindo a orientação do Professor Rui Barbosa adotou como modelo a Lei judiciária norte-americana e seus princípios basilares.


A nova Constituição instituía três poderes: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.


A Constituição norte-americana admitia o duplo grau de jurisdição e o reexame necessário das decisões prolatadas pela Justiça Estadual, além de já à época, restringir a possibilidade de interposição de recursos. A previsão era de que as questões repassadas ao cunho valorativo do órgão superior deveriam ter sido objeto de discussão anterior, ou seja, exigia-se o Prequestionamento. E em virtude desses basilares, a constituinte brasileira entendeu razoável a adoção do chamado writ of error – cabimento de recurso excepcional -, porém restringido pela exigência do prequestionamento. Nasce, pois, como condição sine qua non, o conhecimento anterior da questão diante da instância inferior para a admissibilidade do recurso no Supremo Tribunal Federal.


A Constituição Republicana de 1934


Sempre ansioso por Revolução o Brasil na década de 30 fez desencadear uma série de ocorrências históricas: a deposição do então Presidente da República Washington Luís Pereira de Souza, a transmissão do Governo a Getúlio Vargas que presidiu num governo de transição, e a preparação para o Estado Novo, exclusivo da Ditadura militar e de seus interessados.


 


O governo provisório de Vargas era de interesse direto da burguesia industrial e financeira, das classes médias urbanas e da aristocracia exportadora gaúcha. E tais grupos também representavam os interesses do capitalismo americano.


Vargas adotou uma política de populismo assumindo a defesa das reivindicações sociais do momento. E paralelamente às ditaduras estrangeiras o populismo dos anos 30 fundamentava-se na concessão de direitos trabalhistas e previdenciários das massas urbanas e a cultuação a Getúlio.


Em 1933 elegeu-se uma Assembléia Constituinte para elaborar uma nova Constituição, que era formada por 214 deputados eleitos por sufrágio universal e por 40 sindicalistas, sendo 18 de sindicatos de trabalhadores, 17 de associações de empregadores, 3 de profissionais liberais e 2 que representavam o funcionalismo publico.


Por tais motivos que a terceira Constituição do Brasil foi sem dúvida a mais democrática, e como bem leciona Cretella (2000, p. 43):


“Achavam-se enumerados os preceitos e princípios que os Estados deveriam observar nas suas organizações judiciárias e provimento dos respectivos cargos, assim como os direitos e garantias individuais.


Em títulos especiais, estavam agrupados as diferentes normas atinentes a ordem econômica e social, a família, a educação e a cultura, aos funcionários públicos e a segurança nacional.”


A nova Constituição apesar de ser reflexo dos preceitos militares estava repleta de interesse pelo social, e ainda como a anterior, ao citar a expressão “questionar” manteve o prequestionamento como requisito elementar a interposição do recurso extraordinário.


A Constituição de 1946


Getúlio assumiu a presidência constitucional em 1934 para permanecer no governo até 1938. Entretanto, em 1937 Vargas através de um golpe de Estado estabeleceu a ditadura e permaneceu no poder por mais oito anos.


O golpe de 1937 alegando necessidade de paz e segurança provoca a implantação do Estado Novo na ditadura de Vargas. Decreta-se a Constituição de 1937 de imediato efecha-se o Parlamento Nacional. O poder absoluto é unicamente do Governo.


Entre os muitos crimes que ocorrerão na época da ditadura, inclui-se a prisão da mulher de Prestes, Olga Benario Prestes. Grávida, foi presa, torturada e depois entregue a Gestapo alemã, acusada de “judia e comunista”. Fuzilaram-na em 1942 no campo de concentração nazista de Revensbruck.


Vargas que se inclinou para os regimes nazi-fascistas, quinze anos passados foi perdendo suas forças para os regimes democráticos de Direito pós Segunda Guerra Mundial. Getúlio estava se aproximando dos setores políticos nacionalistas. Atemorizados com essa aproximação os grupos conservadores retiram seu apoio a Vargas e o depuseram do poder.


Entre os grupos que subiram ao poder após a queda de Vargas, incluíam-se alguns dos elementos mais reacionários que haviam apoiado a ditadura. Tal presença representava um risco permanente ao regime democrático.


Foi com a intenção de Redemocratizar o Estado Novo que Marechal Dutra acelerou a reunião da Terceira Constituinte, e a Constituição social-democrata de 1946 coerentemente ofereceu maior preocupação com o espírito democrático do momento, onde havia a sobreposição do social ao individual.


No geral, a Constituição era bastante liberal e apesar de algumas falhas adaptou-se bem a realidade brasileira.


Nesta Constituição um detalhe importante foi a inclusão do sistema de controle constitucional de toda e qualquer lesão de direito, proporcionando a todos o alcance a Carta Política. Todavia, em decorrência de algumas modificações, exclui-se o termo “questionar” em uma das hipóteses de cabimento do recurso extraordinário, e perante a dispensa do prequestionamento a jurisprudência passou a entender que em razão da natureza de recurso excepcional, não seria necessária a expressa requisição do prequestionamento.


A partir de 1964 a Constituição fora mutilada pelos Atos Institucionais acabando extinta em 1967.


 A Constituição de 1967


Vargas suicida-se. O quadro social transforma-se, refletindo nas eleições diretas.


Jânio Quadros renuncia e se institui o parlamentarismo.


Tancredo Neves passa a ser o primeiro-ministro e dias depois restabelece o Presidencialismo.


João Goulart na intenção de construir um regime marxista orientava-se pelos comunistas e põe em prática o regime militar no Brasil.


Os Atos Institucionais aterrorizam a população e o sucessor de Castello Branco, o General Costa e Silva, tratou de mandar elaborar a Constituição de 1967. No Congresso Nacional e nas ruas iniciava a oposição, pois a Carta Política teria nascido por imposição do governo.


Implantava-se um evidente regime militar, sem qualquer garantia ao cidadão brasileiro.


O texto ao tratar de recursos extraordinários, reflete-se no descontentamento com a cláusula de 1946 que mencionava tão apenas a “contrariedade”, e referia-se dando maior amplitude a “negativa de vigência”.


Ainda, o prequestionamento não era exigido e os doutrinares se dividiam entre: inconstitucionalidade em função da ausência do termo, e aplicabilidade, pois o prequestionamento já estaria embutido na tradição jurídica do País.


A Constituição de 1988


Médici tomava posse do governo em 1969 acreditando no “milagre brasileiro” e as disputas eleitorais eram travadas pela ARENA e o MDB.


O último ano do governo Médici assistiu ao colapso do “milagre brasileiro”, pois a inflação voltara a crescer e os pobres estavam ficando mais pobres do que já eram.


Em 1979 Geisel sucedia Médici, e seus atos e sua equipe transpareciam que o novo governo era mais flexível, menos radical, e se não chegava a ter tendências claramente democráticas pelo menos estaria disposto a uma moderada abertura política.


A economia deteriorava-se, sendo impossível repetir o “milagre”. A sociedade estava cansada do longo regime militar e da falta de liberdade política.


No Mundo, a crise do petróleo majorava a inflação e os preços aumentavam. No Brasil, os tecnocratas resolveram encontrar fontes alternativas de energia a fim de substituir o petróleo importado.


Em janeiro de 1979 o AI-5 foi revogado, em março ainda sob eleição indireta o general João Baptista Figueiredo tomou posse na presidência, entretanto, os movimentos das Diretas-Já tomavam fôlego e o pluripartidarismo se fortificava, momento em que os partidos ARENA e MDB se extinguiam através da reforma partidária aprovada em 1979.


Nos bastidores, os poderosos convenceram Geisel a impor Figueiredo como seu sucessor no intuito de manobrá-lo atrás das cortinas. Detalhe importante é o fato de que Figueiredo, sob os olhos de todos, era totalmente despreparado para assumir o controle do poder.


Nos dois anos seguintes o processo de abertura política atravessou uma fase turbulenta com avanços, recuos e ameaças de retorno a ditadura pura e simples.


Por fim em 1982 realizaram-se eleições diretas para governador pela primeira vez desde 1965. E em todos os Estados mais importantes o governo passava para o controle da oposição.


A Campanha das “Diretas Já” liderada por grandes expoentes do cenário político como: Franco Montoro, Mário Covas, Dante de Oliveira, Luis Inácio da Silva, Tancredo Neves, Ulisses Guimarães, Leonel Brizola entre outros, desejando eleições presidenciais diretas se intensificava.


Nas urnas em 1985 disputavam Paulo Maluf da direita pedessista ligado aos grupos mais conservadores do país e que contava com a simpatia de Figueiredo, e Tancredo Neves da direita peemedebista, um dos elementos mais moderados e que acenava com reformas que agradavam ao povo, sem no entanto, por em risco os interesses das classes dominantes.


Assim, o Colégio Eleitoral elegeu Tancredo Neves e Jose Sarney para a Presidência e vice-presidência da Republica.


A vitória do candidato acendeu enormes esperanças, mantendo contudo, o publico em vigilância, pois temiam um novo golpe militar.


Subitamente, acometido de grave doença Tancredo falece. Nas ruas a população ainda chocada com os acontecimentos assistia a posse de Sarney na Presidência da Republica.


Ressalta-se que Tancredo Neves morreu sem ter tomado posse e com base em uma interpretação discutível da Constituição o vice-presidente Sarney foi empossado na Presidência.


Diante de todos os acontecimentos a sociedade ansiava por mudanças políticas. Era necessária a eliminação de toda a legislação arbitraria e ditatorial do regime militar.


No interesse de construir um sistema político democrático e legitimo, a Assembléia Nacional Constituinte delineou as normas da Carta Magna de 1988 consolidando a redemocratização e tendo por base o princípio do Estado de Direito Democrático.


Vemos finalmente que a Constituição Federal de 1988, atualmente em vigor, em suas disposições trata tão apenas, do “contrariar” e do “contestar” quanto as hipóteses de cabimento do recurso extraordinário e do especial – que emergiu da finalidade de desafogar o Supremo Tribunal Federal e reestruturar as funções do mesmo.


Hoje o prequestionamento é invenção dos Tribunais, pois majoritariamente entenderam que mesmo suprimido o vocábulo “questionar” da Carta Magna sempre se conservou como requisito indispensável à admissibilidade e conhecimento dos recursos.


2. Conceito de prequestionamento


O prequestionamento é um pressuposto processual que deve ser entendido como pormenor anterior e externo ao ato processual, ou seja, um pressuposto extrínseco especifico – que como já foi dito, é característica da razão de ser os recursos extraordinários excepcionais – e deve estar contido no ato de interposição dos remédios extraordinários dirigidos aos Tribunais de Cúpula.


De origem doutrinária e considerado como condição sine qua non para a admissibilidade dos recursos extraordinários.


Aponta-se que desde as Constituições anteriores o prequestionamento é instituto de tamanha importância para a admissibilidade dos recursos excepcionais. Sua finalidade primária, de acordo com a jurisprudência predominante, seria impedir a supressão do principio do duplo grau de jurisdição que oferece a via recursal aos interessados e remete quando necessário, a questão a ex officio.


Prequestionar em termos meramente didáticos é abordar questão federal ou constitucional, configurando-se que a matéria veiculada nos recursos extraordinários lato sensu foi objeto de debate e decisão prévios.


Morfologicamente falando podemos subdividir o termo “prequestionamento” em: PRE – QUESTIONAMENTO, assim temos que “pre” no seu sentido etimológico é prefixo de origem latina significando anterioridade. Por outro lado, “questionamento” derivado de “questionar” exprime debater, discutir, contestar em juízo e levantar questão. Portanto, seguindo esta linha, “prequestionamento” é a discussão anterior de determinada questão em juízo.


A Constituição de 1988, diferentemente da Constituição anterior, vedou que os Tribunais Superiores “legislassem” sobre a admissibilidade e o processamento de recurso. Sobretudo, quando da previsão do recurso extraordinário e do recurso especial não se referiu ao termo “questão” usado por Constituições anteriores, contentou-se para o cabimento deste, que a decisão recorrida tivesse violado a Carta Magna ou violado e contrariado a lei federal.


A priori diz-se que o prequestionamento presta-se a exaltação dos órgãos a quo e ao princípio do acesso a prestação jurisdicional, bem como dirimir pontos controvertidos referentes a questão federal ou constitucional no âmago das relações jurídicas


Ademais, o sistema dos recursos extraordinário e especial respeita os interesses de ordem publica – qual seja, a garantia do respeito às normas constitucionais e infraconstitucionais federais. Assim, é razoável que sua interposição obedeça a critérios mais rigorosos de admissibilidade, pertinentes ao caráter de excepcionalidade que possuem, diferentemente dos recursos ordinários.


Isto posto, a diversidade simultânea de entendimentos pode causar séria perturbação a funcionalidade do Direito.


Por fim, o prequestionamento atua como um divisor indicando os limites subjetivos para a interposição dos recursos excepcionais.


E num primeiro momento, diante do exposto, teremos que somente a matéria concretamente conhecida pelo órgão a quo será objeto de apreciação do órgão ad quem, pois o debate fora realmente exaurido pela decisão recorrida.


Cumpre ressaltar que, como já aludido, “causa decidida” equipara-se a “prequestionamento”, porque “questão” é termo sinônimo de “causa”. Aliás, prequestionar nada mais é do que a existência de uma questão decidida, ou seja, a princípio a apreciação de uma determinada matéria na decisão do juízo a quo.


A diversidade dos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais nos levam a conhecer o conceito do instituto do prequestionamento além do seu sentido morfológico. De tal modo a posição do professor Nelson Nery Junior (2000, p.252) é de que o prequestionamento é exatamente a expressa manifestação do juízo a quo a respeito de uma questão federal ou constitucional. Então, afasta-se aqui, a provocação da parte, pois será a decisão proferida pelo órgão julgador que marcará o momento do prequestionamento, independentemente daquela.


Assim, de acordo com essa primeira posição, prequestionamento e a efetiva apreciação de uma questão por parte do juiz a quo. A manifestação do julgador e relevantemente mais importante do que a simples alegação da parte. E igualmente, se o órgão julgador apreciou uma dada questão há prequestionamento e considerar-se-á um ato exclusivo do juiz.


Observe-se, contudo, que se a questão só tenha surgido na decisão recorrida, dispensado estará o prequestionamento, porque desta forma compreende que o tema já foi abordado pelo órgão a quo, trazendo uma situação alienígena ao que se prevê inicialmente, tal seja, a discussão anterior enfrentada pelas partes.


Não se permite confundir os pontos tratados pela decisão recorrida e a atuação da parte recorrente, assim o que de fato importa é a mera deliberação a respeito de dado tema seja federal ou constitucional.


Há, entretanto quem entenda como Theotônio Negrão apud Medina (1999, p. 196) que o prequestionamento é decorrente de um ato da parte, ou seja, matéria prequestionada é aquela ventilada pela parte antes da apreciação do julgador.


Competirá à parte interessada provocar o juízo a quo a respeito da matéria federal ou constitucional que entende imprescindível para solucionar o conflito de interesses, por conseguinte, considerar-se-á ônus da parte recorrente.


Sobre esse vértice, o recorrente não pode propor a discussão de questão nova que não fora examinada até o momento pretendendo prequestionar a matéria. Sendo assim, o prequestionamento deve ser anterior a decisão, não admitindo inovação da parte.


Com a devida vênia, o prequestionamento é anterior, mas devemos tê-lo como o questionar de uma matéria em momento adequado, atendendo obviamente os limites da preclusão, tanto temporal, quanto consumativa. Mas ressalta-se, nesta posição a iniciativa da parte é fundamental para o deslinde e a caracterização do prequestionamento, contudo, por ser um fato pretérito não é próprio dizer que a parte deve “prequestionar”, porque uma vezqueo tempo não retrocede é perceptível que prequestionar é algo impraticável no tempo atual.


Os doutrinadores majoritariamente entendem que o prequestionamento é um ato de provocação da parte. Esta provocação pode surgir desde a inicial ou da contestação, pois desde então, há a oportunidade da parte suscitar a matéria federal ou constitucional com o intuito de resguardar seu direito.


Reconhecendo a regra da disponibilidade dos direitos o mestre CONRADO (2000, p.76):


 “Preordena o art.2º do Código de Processo Civil que “Nenhum juiz prestara a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e forma legais”. Eis a idéia de inércia, verdadeiro principio processual que impõe aos interessados a tarefa de suscitar o aparelhamento da maquina jurisdicional, pena de a atividade compositiva dos conflitos verificados ao curso das relações jurídicos de direito material quedar inviabilizada.


E e dessa idéia inicial que tiramos, doutra parte, o principio dispositivo, irmão da inércia, segundo o qual `as partes assiste um poder de disposição das faculdades jurídicas que se lhes põem: se disporem de tais ou quais faculdades, deixando, por exemplo, de postular sobre um direito (material) que lhes assiste, deixarão de obter do Poder Judiciário (que e inerte) a correlata providencia.”


O juiz somente poderá julgar nos limites do pedido e desta conclusão vemos a desvantagem do prequestionamento como um ato da parte, pois na sua inércia o juiz nada poderá fazer, sob o risco de caso se manifeste julgar extra petita.


O Estado-juiz não atua senão quando provocado nos ditames do princípio da inércia combinado com o princípio do dispositivo.


O prequestionamento ocorre em momento prévio a decisão recorrida porque apesar do dever de ofício do juiz é a parte quem deve colocar em pauta determinada discussão. Todavia, podemos perceber que se o prequestionamento tido como ato jurisdicional consoante alguns juristas é admitido, teremos o prequestionamento da parte como o momento original do mesmo, ou seja, como já exposto acima, na incidência da preclusão, ainda restará uma saída para a ocasião do prequestionamento consistente na hipótese do juízo a quo levantar a matéria como base de fundamento em sua decisão.


Temos ainda uma terceira posição que mescla as duas anteriores onde não basta que a matéria seja objeto de argüição da parte, pois na medida em que há um questionamento prévio sobre questão de direito federal ou constitucional, necessariamente deve existir em seguida a manifestação expressa na decisão recorrida acerca desse tema. Portanto, matéria ventilada e não apreciada, não será considerada como matéria prequestionada.


A matéria deve ser analisada pelo juízo a quo, daí porque a existência de um prequestionamento híbrido, onde entende que o debate tem que ser exaurido tanto quando da provocação da parte, quanto na apreciação do mérito pelo julgador.


3. Formas de apresentação do prequestionamento


Distanciando-se do conteúdo do prequestionamento e sua definição, existe uma outra problemática, tal seja a forma de manifestação desse instituto, logo se trata de mera consolidação do prequestionamento.


Pois bem, se de fato necessitamos de prequestionamento para adentrar na instância superior por meio de recursos extraordinários, indispensável será a definição de sua existência materializada de certa forma. Conseqüentemente classificamos o prequestionamento em “explícito” e “implícito”.


O prequestionamento explícito é aquele que não deixa dúvidas, a parte suscita a matéria expressamente ou o juízo emite valor acerca da matéria federal ou constitucional, decisão esta devidamente motivada e indicando os dispositivos legais sob apreciação. E a ausência desse prequestionamento inviabilizaria o conhecimento do recurso.


Explícito é termo que representa expressão, manifestação por palavra ou demonstrar de forma escrita determinado entendimento. O prequestionamento tratado aqui então, é pressuposto natural dos recursos extraordinários e para configurá-lo é imperioso que a instância inferior emita expresso juízo de valor acerca da matéria e ainda mais, exige-se o destaque do dispositivo objeto da discussão.


Nesse passo, apresentamos decisões com o fito de evidenciar a fundamental importância do prequestionamento explícito:


“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. CONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Prequestionamento implícito. Inadmissibilidade. Diz-se prequestionada a matéria quando a decisão impugnada haja emitido juízo explícito a respeito do tema, inclusive mencionando o dispositivo constitucional previamente suscitado nas razões do recurso submetido à sua apreciação. 2. Se a questão constitucional não foi suscitada oportunamente no recurso interposto perante o Tribunal de origem, são ineficazes e tardios os embargos de declaração opostos para fins de prequestionamento. Incidência das Súmulas 282 e 356 desta Corte. Agravo regimental não provido.RE 412633 AgR / SP – SÃO PAULO


AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO RELATOR: Ministro. EROS GRAU – Julgamento:  21/09/2004 – Órgão Julgador:  Primeira Turma – Publicação:  DJ DATA-15-10-2004 (grifo nosso)”


Não existe outro modo de demonstrar o prequestionamento explicito, senão de forma clara, evidente e precisa.


A contrario sensu:


“EMENTA: ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. JUROS COMPENSATÓRIOS. TAXA. CUMULAÇÃO DE JUROS COMPENSATÓRIOS E MORATÓRIOS. POSSIBILIDADE. SÚMULA 102/STJ. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. MP 1.997/00. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MP 2.109-53/00. 1. A despeito da exigüidade de sua fundamentação, o acórdão recorrido decidiu a totalidade das questões objeto do recurso especial, razão pela qual é viável o conhecimento do apelo, pelo prequestionamento implícito da matéria nele suscitada, afastando-se, com isso, a alegação de violação ao art. 535 do CPC. 2. A Medida Provisória 1.577, de 11.06.1997, introduziu no DL 3.365/41 o art. 15-A, reduzindo a taxa dos juros compensatórios de 12% (Súmula 618/STF) para 6% ao ano. Porém, a expressão “de até seis por cento ao ano”, constante do citado dispositivo, teve sua eficácia suspensa pelo STF, em 13.09.2001, em medida liminar na ADIn 2.332/DF, com o que ficou restabelecida a legislação anterior, sendo os juros compensatórios devidos no percentual previsto na Súmula 618/STF. 3. “A incidência dos juros moratórios sobre os compensatórios, nas ações expropriatórias, não constitui anatocismo vedado em lei” (Súmula 102/STJ). 4. A determinação trazida pela Medida Provisória 1.997-34, de 13.01.2000, ao introduzir no Decreto-lei 3.365/41 o art. 15-B, para que o termo inicial dos juros moratórios seja “1º de janeiro do exercício àquele em que o pagamento deveria ser feito”, é regra que se coaduna com orientação mais ampla do Supremo, segundo a qual não há caracterização de mora do ente público, a justificar a incidência dos correspondentes juros, sempre que o pagamento se faça na forma e no prazo constitucionalmente estabelecidos (arts. 33 do ADCT e 100 da CF). 5. Os critérios para a fixação de honorários advocatícios em ações de desapropriação, previstos no § 1º do art. no art. 27 do DL 3.365/41, são também aplicáveis às hipóteses de desapropriação indireta, conforme determina o § 3º do mesmo artigo, introduzido ela MP 2.109-53, de 27.12.2000 (reeditada sob o nº 2.183-56, em 4.08.2001). . “A sucumbência rege-se pela lei vigente à data da sentença que a impõe” (RESP 542.056/SP, 1ª Turma, Min. Luiz Fux, DJ de 22.03.2004; RESP 487.570/SP, 1ª Turma, Min. Francisco Falcão, DJ de 31.05.2004; RESP 439.014/RJ, 2ª Turma, Min. Franciulli Netto, DJ de 08.09.2003). 7. Recurso especial parcialmente provido. RELATOR Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI – Julgamento: 03/03/2005 – Órgão Julgador: Primeira Turma – Publicação: DJ 21.03.2005 (grifo nosso).”


Implícito, porém, é vocábulo que se define em não mostrar, que não esta expresso claramente ou que se subentende.


O prequestionamento implícito estará caracterizado quando o juízo não tenha expressamente mencionado o dispositivo da lei ou da Constituição Federal que fora ferido, bastando por si só que na decisão perceba-se o debate da questão. Isto é, supõe o prequestionamento diante da solução apresentada pelo juízo.


Posições existem no sentido de que não é suficiente que a matéria seja mencionada, porque é forçoso que haja discussão da matéria objeto dos recursos extraordinários.


Assim como a matéria deve ser enfrentada, o prequestionamento será explicito, exigindo clareza inequívoca. Se existem dúvidas a respeito da aplicabilidade de algum ato ou norma que esta discussão seja amplamente tratada inclusive indicando o próprio dispositivo em referência.


A avaliação do caso em concreto realizada pelo juízo a quo deverá ser cautelosa e precisamente motivada, oferecendo condições para a concretização do prequestionamento. Igualmente neste posicionamento encontramos fundamento na Súmula nº 282 de 1963 do Supremo Tribunal Federal: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada”.


Todavia os Tribunais na interposição do recurso excepcional tem admitido como requisito o prequestionamento implícito ao entender que além de verificar a possível discussão da questão na decisão que desconsiderou a norma, esta não necessariamente precisará mencionar os seus dispositivos que serviram de base à tese.


Eis a recente posição dos Tribunais:


“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. I – A inexistência, no e. Tribunal de origem, do prequestionamento explícito dos artigos elencados como violados no recurso especial não prejudica o exame deste, sendo suficiente para o seu conhecimento que a matéria objeto de irresignação tenha sido discutida. Precedentes. II – O segurado que presta serviço em condições especiais, nos termos da legislação então vigente, e que teria direito por isso à aposentadoria especial, faz jus ao cômputo do tempo nos moldes previstos à época em que realizada a atividade. Isso se verifica na medida em que se trabalha. Assim, eventual alteração no regime corrida posteriormente, mesmo que não mais reconheça aquela atividade como especial, não retira do trabalhador o direito à contagem do tempo de serviço na forma anterior, porque já inserida em seu patrimônio jurídico. III – O Decreto n° 72.771/73 estabelecia como atividade especial a exposição do trabalhador, em caráter permanente, a ambientes com ruídos superiores a 90dB. IV – In casu, considerando-se a legislação vigente à época em que o serviço foi prestado, incabível o enquadramento do labor como atividade especial. Agravo regimental desprovido.AgRg nos EDcl no RESP 637839 / PR ; AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL 2004/0003664-0 – RELATOR Ministro FELIX FISCHERÓrgão Julgador: Quinta Turma – Julgamento 08/03/2005 -Publicação DJ 04.04.2005 (grifo nosso).


Enfim é indubitável que diante de tais posições o prequestionamento implícito individualiza-se toda vez que a decisão recorrida, não obstante adote determinada tese, não esclareça qual a norma desrespeitada. É exatamente a incidência da hipótese de cabimento do recurso especial ou extraordinário acrescentada com a ocorrência do prequestionamento que dará origem ao direito de interpor tais recursos.


4. Embargos de Declaração com fins prequestionadores


No cumprimento do due process of law as decisões devem ser devidamente motivadas. E deste modo a parte interessada só pode recorrer de uma decisão se ela estiver fundamentada nas razões do juízo, demonstrando pois, o efetivo controle da atividade jurisdicional.


Os Embargos Declaratórios previstos no artigo 535 da Lei Adjetiva Processual têm a finalidade de sanar quaisquer contradições, obscuridades ou omissões constantes na decisão do juiz.


De fato toda decisão deve ser precisa sob pena de obstaculizar seu efeito.


A doutrina prevê a possibilidade da oposição de Embargos declaratórios quando diante da inércia das partes o juiz também não profere qualquer valor a respeito da matéria federal ou constitucional que ensejaria a interposição dos recursos excepcionais.


Há decisões no Superior Tribunal de Justiça que reconhecem que não tendo o recorrente oposto Embargos de Declaração a fim de sanar qualquer contrariedade ou provável falha, inviabilizado estará o cabimento dos recursos extraordinários, pois desta forma não existirá prequestionamento, ainda que precário, pois ocorrido somente através dos Embargos Declaratórios. Vejamos:


“RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PREQUESTIONAMENTO EXPLÍCITO. DESNECESSIDADE. JUROS DE MORA. PRECATÓRIO COMPLEMENTAR. INCIDÊNCIA. PRECEDENTES DO STF E STJ. 1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é firme no entendimento de que deve a parte vincular a interposição do recurso especial à violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, quando, mesmo após a oposição de embargos declaratórios, o tribunal a quo persiste em não decidir questões que lhe foram submetidas a julgamento, por força do princípio tantum devolutum quantum appellatum ou, ainda, quando persista desconhecendo obscuridade ou contradição argüidas como existentes no decisum. 2. Decidida a questão suscitada, qual seja, a da possibilidade do agravo de instrumento ser julgado monocraticamente pelo Relator, não há falar em violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, à ausência de omissão, contradição ou obscuridade a ser suprida ou dirimida, eis que os embargos de declaração não se destinam ao prequestionamento explícito. 3. “1. O Pleno do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que não são devidos juros moratórios no período compreendido entre a data de expedição do precatório judicial e a do seu efetivo pagamento no prazo estabelecido na Constituição Federal, por não se caracterizar inadimplemento por parte do Poder Público (cf. RE nº 298.616/SP, Relator Ministro Gilmar Mendes, in DJ 3/10/2003).2. A contrario sensu, se não houver o pagamento do valor consignado no precatório até o mês de dezembro do ano seguinte ao da sua apresentação, é de se reconhecer a incidência dos juros de mora a partir de 1º de janeiro subseqüente até a data do efetivo pagamento da obrigação (cf. EREsp nº 449.848/MG, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, in DJ 19/12/2003). (…)” (REsp 544.167/SP, da minha Relatoria, in DJ 21/6/2004). 4. Recurso provido. RESP 669707 / SP; RECURSO ESPECIAL 2004/0099047-6 – RELATOR Ministro HAMILTON CARVALHIDO – Órgão Julgador: SEXTA TURMA – Julgamento 07/10/2004 – Publicação DJ 17.12.2004.”


Assim é a Sumula nº 98 do STJ que diz: “Embargos de Declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não tem caráter protelatório.”


Os Embargos Declaratórios, então, teriam a finalidade principal de viabilizar a interposição dos recursos excepcionais.


Outras decisões do Superior Tribunal de Justiça entendem que os embargos declaratórios não prestam para prequestionar matéria não tratada:


“EMENTA: RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. OMISSÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. EFEITOS MODIFICATIVOS AO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO EXPLÍCITO DOS ARTS. 5°,XXXV, LIV E LV, E 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE ANTE AUSÊNCIA DE OMISSÃO. 1. Os embargos declaratórios se prestam a sanar omissão, obscuridade ou contradição na decisão judicial, constituindo a modificação do julgado conseqüência lógica da correção de eventuais vícios. 2. É sedimentada a impossibilidade de se emprestarem efeitos infringentes aos embargos de declaração sem que ocorra omissão, obscuridade ou contradição no acórdão objurgado. 3. As hipóteses de cabimento do recurso aclaratório estão previstas nos incisos I e II do art. 535 do CPC, e, dentre aquelas, não se encontra a possibilidade de promoção do prequestionamento explícito de dispositivo com o propósito do embargante vir a manejar recursos de natureza extrema; abre-se ensejo a tal desiderato quando houver omissão, obscuridade ou contradição no corpo da decisão judicial embargada. 4. Embargos de declaração rejeitados. EDcl no RESP 480589 / RS; EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL 2002/0166187-5 – RELATOR Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA – Órgão Julgador: Sexta Turma – Julgamento 04/11/2004 – Publicação DJ 22.11.2004.”


Os Embargos Declaratórios não seriam instrumentos próprios ao ensejo do prequestionamento, já que afrontariam os princípios constitucionais basilares e somente exteriorizariam o “jus esperniandi” do Recorrente.


Já no Supremo Tribunal Federal é pacifico que não serão admitidos os Embargos Declaratórios com fins prequestionadores porque não existem vícios. Os Embargos somente podem ser opostos quando a parte tiver ventilado determinada matéria e o juiz na apreciação for omisso a respeito.


Consoante a interpretação supra a oposição dos Embargos Declaratórios é ônus processual da parte interessada, porém não tem o condão de alcançar o prequestionamento.


Os Embargos de Declaração não são instrumentos de retrocesso na discussão de determinada questão eis que servem para suprir omissão, contradição ou obscuridade em decisão jurisdicional.


A necessidade do prequestionamento, portanto, é ínsita ao desenvolvimento da apreciação da lide, assim mesmo quando estamos diante de uma decisão viciada, isso não nos bastará para a efetiva interposição dos recursos extraordinários, pois os Embargos Declaratórios não terão utilidade de prequestionar a matéria não debatida em momento oportuno.


Os Embargos Declaratórios tidos como prequestionadores não tem o poder de fortalecer a rediscussão da matéria federal ou constitucional ou de provocar a apreciação expressa do julgador.


Contudo, a Sumula nº 356 do Supremo Tribunal Federal de 1963 formaliza que: “O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento.” Nesse sentido, entendia-se naquele tempo que se não existisse o prequestionamento nos autos do processo, bem como na decisão, haveria ainda a oportunidade da parte opor Embargos Declaratórios com o fito de abrir portas a admissibilidade dos recursos extraordinários.


Ressalta-se, entretanto, que apesar da importância da oposição dos Embargos de Declaração, para que se viabilize a interposição dos recursos excepcionais é necessária a manifestação do julgador a cerca da matéria a ser invocada em tais instrumentos, haja vista a existência da Sumula nº 211 de 1998 do Superior Tribunal de Justiça: “Inadmissível recurso especial quanto a questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo”.


Compreende-se, pois, que quando a parte opõe Embargos de Declaração este não essencialmente garantirá a apreciação do julgador quanto a questão constitucional ou federal, porque sua utilidade primária se refere tão somente a afastar vícios da decisão proferida, e não prequestionar essas matérias.


5. O prequestionamento na prestação jurisdicional


O princípio da inafastabilidade jurisdicional envolve o direito à ação, a defesa e ao contraditório, a isonomia das partes na medida de suas desigualdades, e enfim, o devido processo legal consubstanciando no direito subjetivo publico da parte que vê a relação jurídica material doente e almeja uma solução do conflito de interesses.


O direito de agir, e ainda mais, o direito de ação são resguardados pela Constituição Federal, que assegura não só o direito de petição, mas sim o direito de se defender e expor suas argumentações diante do que lhe fora rogado.


A Constituição, o ponto mais alto da pirâmide, conforme Teoria de Kelsen, é a norma fundamental que rege os princípios que iluminam as relações jurídicas, bem como a estrutura que da sustentação ao ordenamento jurídico.


Estudiosos entendem que o prequestionamento não é uma exigência legal tendo em vista que a Carta Magna não o mencionou em seu texto, e que em razão disso, seria inconstitucional. Porém não temos decisões que acolhem esse sentido.


O prequestionamento como vimos, é instituto de construção jurisprudencial, pois não previsto no ordenamento jurídico brasileiro, e a jurisprudência não pode em razão de expressa vedação constitucional, impor condição à interposição de instrumento recursal.


Evidentemente isso seria um modo de denegar o acesso à justiça, ferindo diretamente o princípio da inafastabilidade da jurisdição.


A Constituição de 1787 dos Estados Unidos da América, elaborada por deputados dos 13 Estados, combinou duas tendências: organizou-se uma república federativa presidencialista, em que se manteve para cada Estado da federação o direito de possuir a sua própria Constituição, ao mesmo tempo em que o presidente representaria o poder central, sendo eleito com um mandato de seis anos e acompanhado por duas câmaras (o Senado e deputados representantes) e pela Suprema Corte de Justiça.


Em 1891 a Primeira Constituinte do Brasil entendeu por bem acolher os princípios da Lei norte-americana, contudo, surge com alicerce nos parâmetros do Estado Liberal de Direito.


As bases do liberalismo tinham surgido com o Iluminismo, que contestavam o mercantilismo, defendendo princípios burgueses.Seus princípios gerais eram: a defesa da propriedade privada, individualismo econômico, liberdade de comércio e produção, respeito às leis naturais da economia e liberdade de contrato de trabalho sem controle do Estado ou pressão dos sindicalistas. O liberalismo transformou-se na força ideológica mundial definida a partir das Revoluções de 1830.


No liberalismo a intervenção do Estado é valida para apoiar as atividades como forma de estímulo à produção, controle flexível de preços e assistência a desempregados. A desigualdade econômica é normal e desejável, proporcionando vitalidade ao sistema. A ação do Estado não pode privar os indivíduos de seus direitos fundamentais. O consentimento é a fonte da autoridade.


O trabalho é a fonte da riqueza. E uma vez que o interesse individual coincide com o interesse da coletividade, deve-se na prática, deixar plena liberdade de ação aos interesses privados. Mas, o acesso à justiça seria privilégio somente de alguns.


No Brasil, desde a primeira Constituição, a intenção primordial, porém não tão contundente como agora, foi consolidar o Estado de Direito Democrático.


Bem, na Democracia temos o princípio da liberdade concedendo autonomia aos indivíduos, ainda há a preferência pelos regimes de Direito, o controle da Sociedade Civil sobre o Estado, como características peculiares: a iniciativa, a criatividade, a solidariedade e a cooperação; a decisão da maioria legitimando as ações políticas e jurídicas, a limitação da autoridade e o poder descentralizado através de organizações formais e informais.


O Estado de Direito Democrático é ideologia que prima pela democratização do capitalismo, justiça social através de distribuição eqüitativa da renda, mudanças sociais mediante reformas graduais, economia mista, mercado regulado, propriedade individual e pública beneficiando a todos, incentivo a organizações profissionais, partidos políticos, entidades de defesa de direitos e valorização de sindicatos.


O Estado é concebido como instrumento para a conquista da liberdade e direitos sociais, centro de poder essencial para redistribuir ao povo, os excedentes sociais.


A norma pura e simples não é expressão legitima para proteger as garantias individuais e sociais, com isso não se exaltam unicamente os direitos, mas sim a garantia a esses direitos, pois a vontade soberana do povo é essencial ao desenvolvimento do Estado.


É notório que não se coadunam os princípios do Estado Liberal com os do Estado Democrático.


O princípio da instrumentalidade das formas, embora tenha como regra o alcance da função cognitiva do Estado-juiz, compondo o conflito de interesses viciado, admite que em nome da economia processual só se preocupe com os fins, abandonando os meios.


Nesse passo, a exigência do prequestionamento impediria o acesso à prestação da tutela jurisdicional. Além disso, o processo não atingiria seu fim maior: a efetividade das normas e das decisões dos órgãos competentes.


Categoricamente, o prequestionamento é instituto de natureza genuinamente formal que impõe restrições de acesso ao judiciário, atendendo a exclusão social e apontando a deficiência da oportunidade de Justiça tão esperada pelos brasileiros. O prequestionamento há de ser considerado espécie de denegação de justiça.


Cumpre destacar finalmente que formalidades excessivas dificultam a prestação jurisdicional como prevista, e ainda, é incontestável que na existência de um vício a exemplo de quaisquer hipóteses de cabimento dos recursos, este estaria prejudicado, pois se dá maior importância ao formalismo do que à ofensa da Constituição ou da lei federal que deveria em razão de sua própria natureza ser um elemento de relevância. Ademais, neste entender, a função dos Tribunais Superiores restaria frustrada.


Sob outro enfoque, a doutrina também tem como razoável que se limite o acesso aos órgãos de cúpula haja vista que a razão de ser dos Tribunais Superiores é intrinsecamente ligada à guarda e à garantia do direito constitucional, bem como do direito federal, ademais, há de se evitar os recursos protelatórios desafogando a atividade cognitiva dos órgãos jurisdicionais.


Os recursos extraordinários lato sensu são portadores de natureza excepcional, e assim, de acordo com alguns juristas, o prequestionamento pode ser considerado como a expressão de um formalismo legítimo, não positivo, mas revelado como um instrumento bastante eficaz ao controle jurisdicional.


Nesse contexto, ao observar o artigo 102, III, e o artigo 105 III, da Carta Magna, vemos que os recursos excepcionais só teriam cabimento na existência de “causa decididas”, e consoante já analisado, podemos considerar tal expressão como “questões decididas” – e é exatamente esta interpretação que nos leva a perceber a exigência do prequestionamento, desde que este ocorra na apreciação do julgador, independentemente da atuação da parte, consoante argumentações já escandidas.


A não admissibilidade seja do recurso especial ou do extraordinário, em pretexto a ausência do prequestionamento, não revelaria impedimento à tutela jurisdicional, mas comprovaria o não cumprimento às exigências normativas.


Logo, apesar do rigor com que se admite o cabimento dos recursos excepcionais, é de extrema importância que se imponha um diferencial à admissibilidade, uma vez que abordamos matérias da guarida federal e constitucional, questões que precisam de tratamento cauteloso, com seriedade, pois normas merecedoras de destaque distinto e de competência dos Tribunais Superiores.


6. Conclusão


Caracterizando o prequestionamento como requisito inquestionavelmente necessário à admissibilidade dos recursos excepcionais, consoante argumentações doutrinárias e jurisprudenciais já escandidas, temos que sob essa análise, alguns comentários finais podem ser manifestados.


Em atenção à verificação da origem do prequestionamento sob o manto do direito brasileiro percebeu-se que este foi importado da Lei norte-americana, que teria o desígnio de respeitar o due process of law.


Diante dos acontecimentos históricos econômico-sociais, inicialmente as Constituições anteriores mencionavam em “questionar” sem esclarecer o momento processual deste questionar, depois na vigência da Carta de 1988, vemos que esta não faz qualquer referência ao instituto do prequestionamento.


A doutrina defende que mesmo não mencionando a exigência imprescindível do prequestionamento, a Constituição confirma a sua importância através da expressão “causa decidida”, haja vista que o prequestionamento se dá, em outros termos, na apreciação de uma matéria pelo julgador.


Ora existem três posições quanto ao momento em que se deve prequestionar. Primeiramente, o prequestionamento deve ser decorrente do ato da parte de ventilar a questão ao debate do juízo a quo; contudo, permitem-se alguns juristas que o prequestionamento seja ato indubitavelmente jurisdicional, e então seria a manifestação irrefutável do juízo a quo na decisão guerreada; por outro lado, há o entendimento híbrido ao reconhecer que o prequestionamento se dá na fusão desses dois momentos: na matéria suscitada pela parte acrescentada da apreciação exaurente do julgador.


A posição que prevalece é que o prequestionamento é ato da parte, pois esta possui a disponibilidade de buscar a tutela de seus direitos. Todavia, considerando que mesmo que haja a possibilidade de prequestionar desde a exordial e da contestação, fatalmente poderá ocorrer a preclusão.


Averigua-se que nesta desvantagem a terceira posição seria a que mais deve merecer destaque. Assim, o prequestionamento é a questão federal ou constitucional levada ao conhecimento da instancia inferior e conseqüentemente devidamente apreciada.


Frisa-se que o prequestionamento pode ser explícito ou implícito, porém diante das vastas colocações constatamos que no Supremo Tribunal Federal, como órgão de cúpula da guarida constitucional que é, tradicionalmente exige o prequestionamento explícito no intento de obter decisões adequadamente fundamentadas e de esgotar todas as matérias escandidas nos autos do processo em discussão.


Não obstante essas considerações, o Superior Tribunal de Justiça tem admitido o prequestionamento implícito, desde que na contemplação da decisão se note a presença dedutível do tratamento da questão, bem como, necessariamente, a menção expressa do dispositivo legal sob fundamento.


Como visto, os Embargos Declaratórios não possuem originariamente fins prequestionadores.


A oposição dos Embargos Declaratórios está vinculada a presença de vícios na decisão guerreada, e não a apresentação de argumentações novas no deslinde do processo. Perante esta compreensão, depreende-se que remotamente, somente se admitiria os seus fins prequestionadores caso a parte tenha invocado a manifestação do juízo a quo e este não tenha enfrentado a questão.


Ressalta-se, oportunamente, que conforme esta consideração é indiscutível a existência do momento de prequestionar híbrido, pois além do ato da parte é necessária a manifestação do juízo.


Por fim, notando o valor do prequestionamento, e diante da opção do legislador constituinte em não mencionar o prequestionamento, consagra-se na jurisprudência a sua constitucionalidade.


Cumpre, nesse sentido, fazer referência ao entendimento de que os obstáculos que se colocam diante da interposição dos Recursos Extraordinários lato sensu se devem ao seu caráter excepcional, tendo em vista que apesar das visíveis dificuldades, estas restrições são necessárias a segurança da ordem jurídica.


Portanto, embora muitos operadores de direito custam a acreditar a significativa importância do instituto do prequestionamento, este é constitucional, porque traz à baila o respeito aos princípios basilares do Estado Democrático de Direito, consoante fatos e fundamentos escandidos no presente trabalho.


 


Referências bibliográficas

BUENO, Cassio Scarpinella. Quem tem medo do prequestionamento?. Jus Navigandi, Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3024>. Acesso em 16 de novembro de 2005.

CRETELLA JÚNIOR, José. Elementos de Direito Constitucional. 3 ed. rev. atual. ampl. São Paulo: 1998.

GIL, Rafaela Magalhães. O prequestionamento nos recursos extraordinário e especial. São Leopoldo: UNISINOS, 2002. Monografia de graduação.

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2004.

MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso Extraordinário e Recurso Especial. 6 ed. rev. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

MEDINA, José Miguel Garcia. O prequestionamento nos recursos extraordinário e especial. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios fundamentais: teoria geral dos recursos. 5 ed. rev. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

PINTO, Nelson Luiz. Manual dos Recursos Cíveis. 3. ed. ampl. atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2003.

Informações Sobre o Autor

Vanessa Roda Pavani

Advogada


Equipe Âmbito Jurídico

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