Resumo: O regime de contratação de pessoal dos Conselhos Profissionais é polêmico em razão da ausência de previsões constitucionais e legislativas expressas. São também extremamente escassas as obras doutrinárias sobre o assunto, geralmente resumidas a pequenas referências em manuais. A construção do regime jurídico dos Conselhos e, consequentemente, do regime de pessoal destes é, principalmente, jurisprudencial por julgados dos tribunais superiores e decisões do TCU, motivo pelo qual basearão esta análise. O presente trabalho pretende, então, lançar um rápido exame sobre as principais alterações legislativas e decisões dos Tribunais Superiores relativas ao regime de pessoal dos Conselhos Profissionais: I) o regime jurídico de direito público dos conselhos profissionais; II) a obrigatoriedade de contratação exclusivamente por concurso público; III) a questão dos “empregados em comissão”; III) o regime jurídico aplicável: celetista ou estatutário. Ao final, espera-se demonstrar a necessidade de adequação do pessoal dessas autarquias ao Regime Estatutário, em consonância com a Constituição Federal e Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
Palavras Chave: direito administrativo – conselhos de fiscalização profissional – regime estatutário – regime celetista – jurisprudência.
Abstract: The professional councils’ hiring regime is controversial due to the lack of constitutional and legislative provisions on the topic. In addition, the legal literature on this subject is very scarce, usually limited to very few references in manuals. The councils’ legal regime and likewise their personnel regime is mainly resultant from superior courts’ case law and Federal Court of Auditors’ judgments. As a result, this research will be based on the analysis of these decisions. This article intends to undergo a brief examination of the main legislative changes and high courts’ decisions concerning the professional councils’ personnel regime, that is: I) the professional councils’ public law legal framework; II) the obligation to exclusively hire personnel through public contests; III) the matter of "employees on commission"; III) the applicable legal regime: private (“celetista”) or public (statutory). In conclusion, the necessity of conforming these institutions’ personnel legal regime to the Statutory Regime will be hopefully demonstrated in accordance with the Federal Constitution and the the Federal Supreme Court’s jurisprudence.
Key words: administrative law – professional supervisory boards – statutory organization – celetista organization – jurisprudence
Sumário: I. Introdução. II. Do regime jurídico de direito público dos conselhos profissionais e da obrigatoriedade de contratação exclusivamente por concurso público. III. A questão dos “empregados em comissão”. IV. Do regime jurídico aplicável: celetista ou estatutário. V. Conclusões. Referências.
I. INTRODUÇÃO
Os Conselhos de Fiscalização Profissional foram, em sua maioria, criados há cerca de 5 (cinco) décadas. Inicialmente, as normas que os instituíram previam que eles teriam natureza pública, mas seriam hierárquica e funcionalmente desvinculados do Poder Executivo. Assim, foram agrupados como “autarquias” pela doutrina e jurisprudência, embora tivessem organização mais semelhante à de entidades privadas que recebem contribuições para fiscais e prestam serviços de interesse público ou social, previstas no Art. 183 do Decreto-lei 200/67 (QUINTINO, 2008, p. 152-153).
A conceituação das entidades e organizações de interesse público está no Art. 183 do Decreto-lei 200/67:
“Art . 183. As entidades e organizações em geral, dotadas de personalidade jurídica de direito privado, que recebem contribuições para fiscais e prestam serviços de interêsse público ou social, estão sujeitas à fiscalização do Estado nos têrmos e condições estabelecidas na legislação pertinente a cada uma”.
A das autarquias, no Art. 5º, I do DL 200/67:
“Art. 5º Para os fins desta lei, considera-se:
I – Autarquia – o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada”.
A Constituição Federal de 1988, por sua vez, não estabeleceu de modo expresso a natureza jurídica dos Conselhos de Fiscalização Profissional. Da mesma forma, não há referência específica constitucional sobre o regime de pessoal dos Conselhos. É encontrada, apenas, de forma genérica, a previsão de um Regime Jurídico Único no Art. 39 do texto original da Carta “para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas” (BRASIL, 1988).
O regime de contratação de pessoal dos Conselhos Profissionais, pela ausência de previsões constitucionais e legislativas expressas, é polêmico. São, também, extremamente escassas as obras doutrinárias sobre o assunto, geralmente resumidas a pequenas referências em manuais. A construção do regime jurídico dos Conselhos e, consequentemente, do regime de pessoal destes é, principalmente, jurisprudencial por julgados dos tribunais superiores e decisões do TCU, motivo pelo qual basearão esta análise.
O presente trabalho pretende, então, lançar um rápido exame sobre as principais alterações legislativas e decisões dos Tribunais Superiores relativas ao regime de pessoal dos Conselhos Profissionais. Ao final, espera-se demonstrar a necessidade de adequação do pessoal dessas autarquias ao Regime Estatutário, em consonância com a Constituição Federal e Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
II. DO REGIME JURÍDICO DE DIREITO PÚBLICO DOS CONSELHOS PROFISSIONAIS E DA OBRIGATORIEDADE DE CONTRATAÇÃO EXCLUSIVAMENTE POR CONCURSO PÚBLICO
Alguns autores discordam da classificação dos Conselhos como autarquias porque o fato de as entidades serem criadas por lei, apesar do disposto no Art. 37, XIX da CF/88, não induz que, necessariamente, todas as pessoas jurídicas criadas por lei serão autarquias (QUINTINO, 2008, p.52-53). A própria fiscalização profissional, para parte da doutrina, não seria atividade típica da Administração Pública (QUINTINO, 2008, p. 53). O regime de adesão obrigatória ao Conselho Profissional também não implicaria, por si só, na caracterização da entidade como pública (QUINTINO, 2008, pp. 147-148). Aprofundando a observação deste autor, poder-se-ia apontar outras entidades, como as do “Sistema S”, em que haveria contribuições obrigatórias por particulares, mas isso não as tornaria públicas ou mesmo autarquias.
Apesar de a Constituição apenas ter tipificado as figuras das autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista como entidades da Administração Indireta, isso não impossibilitaria, em tese, a criação de outras entidades (QUINTINO, 2008, p. 53).
Seguindo o entendimento apontado, o Art. 58 da Lei 9.649/98 transformou os Conselhos Profissionais em entidades de direito privado por delegação do Poder público, mediante autorização legislativa, com exceção da OAB:
“Art. 58. Os serviços de fiscalização de profissões regulamentadas serão exercidos em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legislativa. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 1º A organização, a estrutura e o funcionamento dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas serão disciplinados mediante decisão do plenário do conselho federal da respectiva profissão, garantindo-se que na composição deste estejam representados todos seus conselhos regionais. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 2º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, dotados de personalidade jurídica de direito privado, não manterão com os órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 3º Os empregados dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são regidos pela legislação trabalhista, sendo vedada qualquer forma de transposição, transferência ou deslocamento para o quadro da Administração Pública direta ou indireta.
§ 4º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são autorizados a fixar, cobrar e executar as contribuições anuais devidas por pessoas físicas e jurídicas, bem como preços de serviços e multas, que constituirão receitas próprias, considerando-se título executivo extrajudicial a certidão relativa aos créditos decorrentes. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 5º O controle das atividades financeiras e administrativas dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas será realizado pelos seus órgãos internos, devendo os conselhos regionais prestar contas, anualmente, ao conselho federal da respectiva profissão, e estes aos conselhos regionais. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 6º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, por constituírem serviço público, gozam de imunidade tributária total em relação aos seus bens, rendas e serviços. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 7º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas promoverão, até 30 de junho de 1998, a adaptação de seus estatutos e regimentos ao estabelecido neste artigo. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 8º Compete à Justiça Federal a apreciação das controvérsias que envolvam os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, quando no exercício dos serviços a eles delegados, conforme disposto no caput. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 9º O disposto neste artigo não se aplica à entidade de que trata a Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994”.
Entretanto, após discussão doutrinária, o STF resolveu sobre a natureza pública da autarquia dos Conselhos profissionais na ADI 1717. Neste julgado, foi declarada a inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, que atribuíam personalidade jurídica de direito privado às entidades:
“EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS. 1. Estando prejudicada a Ação, quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, a Ação Direta é julgada procedente, quanto ao mais, declarando-se a inconstitucionalidade do "caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo art. 58. 2. Isso porque a interpretação conjugada dos artigos 5°, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre com os dispositivos impugnados. 3. Decisão unânime”. (BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADI 1717, Relator(a): Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 07/11/2002, DJ 28-03-2003 PP-00061 EMENT VOL-02104-01 PP-00149).
O julgado afirmou a natureza autárquica dos Conselhos, principalmente, pela indelegabilidade do Poder de Polícia estatal, exercido por meio dos Conselhos Profissionais, à iniciativa privada. A jurisprudência citada tem sido reafirmada desde então pelo STF, como se vê em recente acórdão:
“Ementa: 1) MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. NATUREZA JURÍDICA. AUTARQUIA FEDERAL. ENTIDADES CRIADAS POR LEI. FISCALIZAÇÃO DE EXERCÍCIO PROFISSIONAL. ATIVIDADE TIPICAMENTE PÚBLICA. DEVER DE PRESTAR CONTAS. 2) EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. ART. 37, II, DA CRFB. 3) DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO PROFERIDA MESES DEPOIS DA REALIZAÇÃO DA SELEÇÃO SIMPLIFICADA PELO IMPETRANTE. 4) SEGURANÇA DENEGADA. 5) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PREJUDICADOS. 1. As autarquias, forma sob a qual atuam os conselhos de fiscalização profissional, que são criados por lei e possuem personalidade jurídica de direito público, exercendo uma atividade tipicamente pública, qual seja, a fiscalização do exercício profissional, é de rigor a obrigatoriedade da aplicação a eles da regra prevista no artigo 37, II, da CF/1988, quando da contratação de servidores. Precedentes (RE 539.224, Rel. Min. Luiz Fux, DJe18/6/2012). 2. In casu, o Acórdão nº 2.690/2009 do TCU determinou ao Conselho Federal de Medicina Veterinária que: “9.4.1. não admita pessoal sem a realização de prévio concurso público, ante o disposto no art. 37, inciso II, da Constituição Federal, e adote as medidas necessárias, no prazo de sessenta dias, a contar da ciência deste Acórdão, para a rescisão dos contratos ilegalmente firmados a partir de 18/5/2001;” 3. Segurança denegada”. (BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MS 28469, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 09/06/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-151 DIVULG 31-07-2015 PUBLIC 03-08-2015).
Quanto à contratação por concurso público, há previsão legislativa expressa de sua necessidade para admissão de empregados públicos para além do Art. 37, II da Constituição da República de 1988. A Lei 9.962/2000, que disciplina o regime de emprego público do pessoal da Administração federal direta, autárquica e fundacional, prevê, expressamente, que a contratação de pessoal na Administração federal direta, autárquica e fundacional deve ser precedida de concurso público:
“Art. 2º A contratação de pessoal para emprego público deverá ser precedida de concurso público de provas ou de provas e títulos, conforme a natureza e a complexidade do emprego”.
O STJ, em julgado de 03/02/2016 e acompanhando a jurisprudência do STF, reafirma a natureza autárquica dos Conselhos de Fiscalização Profissional. Portanto, a estes se aplica o regime jurídico de direito público e a necessidade de contratação exclusivamente por concurso público:
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. ALTERAÇÃO DO ART. 114 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EC 45/2004. PREVALÊNCIA DA SÚMULA 66 DO STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. NATUREZA JURÍDICA. AUTARQUIA FEDERAL. REGIME ESTATUTÁRIO. DEMISSÃO. AUSÊNCIA DO REGULAR PROCESSO ADMINISTRATIVO. NULIDADE. PRECEDENTE DO STF E DO STJ. 1. Permanece incólume a Súmula 66/STJ, embora a Emenda Constitucional 45/2004, ao dar nova redação ao art. 114 da Constituição Federal, tenha ampliado a competência da Justiça do Trabalho de maneira expressiva, passando a estabelecer, nos incisos I e VII do citado dispositivo, que compete à Justiça do Trabalho processar e julgar "as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios" e "as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho". 2. Com efeito, segundo a orientação da Primeira Seção desta Corte de Justiça, a atividade fiscalizatória exercida pelos conselhos profissionais, decorrente da delegação do poder de polícia, está inserida no âmbito do direito administrativo, não podendo ser considerada relação de trabalho e, consequentemente, não está incluída na esfera de competência da Justiça Trabalhista. 3. Os conselhos de fiscalização profissional possuem natureza jurídica de autarquia, sujeitando-se, portanto, ao regime jurídico de direito público. Precedentes do STF e do STJ. 4. Até a promulgação da Constituição Federal de 1988, era possível, nos termos do Decreto-Lei 968/1969, a contratação de servidores, pelos conselhos de fiscalização profissional, tanto pelo regime estatutário quanto pelo celetista, situação alterada pelo art. 39, caput, em sua redação original. 4. Para regulamentar o disposto na Constituição, o legislador inseriu na Lei 8.112/1990 o art. 253, § 1º, pelo qual os funcionários celetistas das autarquias federais passaram a ser servidores estatutários, não mais sendo admitida a contratação em regime privado, situação que perdurou até a edição da Emenda Constitucional 19/1998 e da Lei 9.649/1998. 5. No julgamento da ADI 1.717/DF, o Supremo Tribunal Federal reafirmou a natureza jurídica de direito público dos conselhos fiscalizadores, ao declarar a inconstitucionalidade do art. 53 da Lei 9.649/98, com exceção do § 3º, cujo exame ficou prejudicado pela superveniente Emenda Constitucional 19, de 4 de junho de 1998, que extinguiu a obrigatoriedade do Regime Jurídico Único. 6. Em 2 de agosto de 2007, porém, o Supremo Tribunal Federal deferiu parcialmente medida liminar na ADI 2.135/DF, com efeitos ex nunc, para suspender a vigência do art. 39, caput, da Constituição Federal, com a redação atribuída pela referida emenda constitucional. Com essa decisão, subsiste, para a administração pública direta, autárquica e fundacional, a obrigatoriedade de adoção do regime jurídico único, ressalvadas as situações consolidadas na vigência da legislação editada nos termos da emenda declarada suspensa. 7. In casu, o agravado foi contratado pelo Conselho Regional de Contabilidade do Estado do Rio Grande do Sul em 5 de junho de 2006, tendo sido demitido em 14 de janeiro de 2013, ou seja, após o mencionado julgamento da Suprema Corte, sem a observância das regras estatutárias então em vigor. Assim, existe ilegalidade na demissão por ausência de prévio processo administrativo, uma vez que, à época do ato, o ora agravado estava submetido ao regime estatutário. 8. Agravo Regimental não provido”. (BRASIL SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AgRg no AgRg no AREsp 639.899/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/11/2015, DJe 03/02/2016).
O TCU, como não poderia deixar de ser, também entende que a contratação de pessoal pelos Conselhos Profissionais deve ser realizada exclusivamente por concurso público:
“TC-016.441/2005-7 (c/ 03 anexos). Natureza: Representação.
Entidades: Conselho Regional de Técnicos em Radiologia/PR, Conselho Regional de Biblioteconomia/PR, Conselho Regional de Psicologia/PR, Ordem dos Músicos do Brasil – Conselho Regional do Estado do Paraná, Conselho Regional de Fonoaudiologia/PR, Conselho Regional de Serviço Social/PR, Conselho Regional de Química/PR, Conselho Regional de Museologia/PR, Conselho Regional de Administração/PR, Conselho Regional de Contabilidade/PR, Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia/PR, Conselho Regional de Odontologia/PR, Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional/PR, Conselho Regional de Representantes Comerciais/PR, Conselho Regional de Medicina Veterinária/PR, Conselho Regional de Corretores de Imóveis/PR, Conselho Regional de Economia/PR, Conselho Regional de Farmácia/PR, Conselho Regional de Enfermagem/PR, Conselho Regional de Educação Física/PR, Conselho Regional de Medicina/PR.
SUMÁRIO: REPRESENTAÇÃO. CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. ADMISSÃO DE PESSOAL SEM CONCURSO PÚBLICO. PROCEDÊNCIA.
1. Os conselhos de fiscalização profissional sujeitam-se aos princípios constitucionais aplicáveis à Administração Pública e devem, portanto, observar a regra do concurso público para a admissão de pessoal.
2. São irregulares as contratações de pessoal sem concurso público a partir de 18/05/2001, data da publicação no Diário da Justiça da deliberação do Supremo Tribunal Federal acerca do julgamento do mérito do Mandado de Segurança n. 21.797-9.
BRASIL. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. ACÓRDÃO 578/2006. PLENÁRIO. Relator MARCOS BEMQUERER. Processo 016.441/2005-7. Tipo de processo REPRESENTAÇÃO (REPR). Data da sessão 19/04/2006. Número da ata 15/2006. Unidade Técnica SECEX-PR – Secretaria de Controle Externo – PR”.
No inteiro teor do TC-016.441/2005-7, já citado, o TCU explicita a tese da inconstitucionalidade da contratação de pessoal pelos Conselhos de Fiscalização Profissional sem concurso público:
“o entendimento do Supremo Tribunal Federal – STF por ocasião do julgamento do Mandado de Segurança n. 21.797-9 e da ADIN n. 1.717/DF, cuja eficácia deu-se com a publicação no Diário da Justiça em 18/05/2001 e 28/03/2003, respectivamente; nesta assentada o STF se pronunciou, em definitivo, pela natureza autárquica dos referidos conselhos e pela procedência da Ação, declarando a inconstitucionalidade do art. 58, caput, e seus parágrafos, da Lei Federal n. 9.649/1998, ficando assim obrigatória a realização de concurso público para a admissão de pessoal, ainda que de modo simplificado (Acórdãos TCU ns. 1.720/2003 e 341/2004, ambos do Plenário), informando a este Tribunal no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, as medidas adotadas pelo Conselho Federal e Regionais para a rescisão dos contratos ilegalmente firmados a partir de 18/05/2001, data da publicação no Diário da Justiça do julgamento do mérito do Mandado de Segurança n. 21.797-9 (TC 015.344/2002-4);”.
BRASIL. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. ACÓRDÃO 578/2006. PLENÁRIO. Relator MARCOS BEMQUERER. Processo 016.441/2005-7. Tipo de processo REPRESENTAÇÃO (REPR). Data da sessão 19/04/2006. Número da ata 15/2006. Unidade Técnica SECEX-PR – Secretaria de Controle Externo – PR.
Assim, não restam dúvidas de que a contratação de pessoal em Conselhos Profissionais deve ser realizada exclusivamente por concurso público após o Mandado de Segurança n. 21.797-9 e da ADIN n. 1.717/DF, cuja eficácia deu-se com a publicação no Diário da Justiça em 18/05/2001 e 28/03/2003. A obrigatoriedade de realização de concurso público se deve à natureza autárquica dessas entidades, bem como pelo desempenho de atividades que exigem poder de polícia e são indelegáveis à iniciativa privada, ressalvadas as vozes doutrinárias em sentido contrário (QUINTINO, 2008).
Entretanto, há divergência sobre se o regime jurídico de pessoal seria de Direito Administrativo e os empregados, obrigatoriamente, submetidos ao Regime Jurídico Único da União ou se o regime cabível seria o Celetista. A jurisprudência diverge sobre o tema e, atualmente, nem mesmo entre os Conselhos há consenso. Alguns contratam pelo Regime Celetista, enquanto há decisões judiciais obrigando outros a aderir ao RJU (FREITAS, 2013, 86-114), como se passa a expor.
III. A QUESTÃO DOS “EMPREGADOS EM COMISSÃO”.
Conforme exposto, os empregados públicos efetivos dos Conselhos Profissionais devem ser contratados, obrigatoriamente, por concurso público. Todavia, são levantadas dúvidas sobre a possibilidade de contratação para “empregos em comissão” para as funções de direção, chefia e assessoramento. Isso porque, conforme exposto, a maioria dos Conselhos ainda contrata pessoal pelo regime celetista.
A literalidade do Art. 37, II da CR/88 apenas faz menção à figura do “cargo em comissão”:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;”.
Como se percebe, a Constituição apenas prevê “cargo em comissão”, cargo este regido pelo regime jurídico estatutário e declarado em lei de livre nomeação e exoneração. Não seria possível, segundo a literalidade da CR/88, a criação de “empregos públicos” sob regime de livre nomeação e exoneração, apenas cargos públicos.
A Lei 9.962/2000, que disciplina o regime de emprego público do pessoal da Administração federal direta, autárquica e fundacional, já citada, proíbe expressamente que pessoal contratado por Cargo em Comissão seja submetido ao Regime Celetista na Administração Pública:
“Art. 1º O pessoal admitido para emprego público na Administração federal direta, autárquica e fundacional terá sua relação de trabalho regida pela Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, e legislação trabalhista correlata, naquilo que a lei não dispuser em contrário.
§ 1º Leis específicas disporão sobre a criação dos empregos de que trata esta Lei no âmbito da Administração direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo, bem como sobre a transformação dos atuais cargos em empregos.
§ 2º É vedado:
I – submeter ao regime de que trata esta Lei:
a) (VETADO)
b) cargos públicos de provimento em comissão;
II – alcançar, nas leis a que se refere o § 1o, servidores regidos pela Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990, às datas das respectivas publicações.
§ 3o Estende-se o disposto no § 2o à criação de empregos ou à transformação de cargos em empregos não abrangidas pelo § 1º”.
O MPT e o MPF vêm atuando de forma enérgica contra o “emprego em comissão”. Como consequência, o emprego em comissão será extinto na ECT[1] e a Justiça Trabalhista anulou empregos em comissão na Eletrobrás[2]. Nesse sentido, jurisprudência do TST:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. CONTRATO NULO. A Corte Regional reconheceu que a contratação do autor se deu sem a aprovação em concurso público, à margem do disposto no artigo 37, II, da Constituição Federal. A indicação de afronta ao artigo 7º, I, da Constituição Federal não tem o condão de impulsionar o apelo, pois não se trata de dispensa arbitrária ou sem justa causa, mas sim da nulidade da relação. Agravo de instrumento a que se nega provimento”.
(AIRR – 1863-95.2011.5.10.0003, Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de Julgamento: 21/10/2015, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 29/10/2015)
No inteiro teor do acórdão citado há trecho elucidativo sobre a questão:
“Com a promulgação da Carta da República de 1988, ficou definitivamente obstada a contratação de empregado pela Administração Pública direta e indireta sem a prévia aprovação em concurso público, conforme dicção expressa do artigo 37, inciso II, nos seguintes termos:
‘a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.’
A norma em comento foi expressa em exigir a submissão a concurso público para a investidura em cargos ou empregos públicos, sendo os ocupantes desses últimos regidos pela legislação trabalhista.
A exceção da contratação por tempo determinado, para atender necessidade temporária de excepcional interesse público (CRFB, art. 37, inciso IX), a possibilidade de investidura nos quadros da administração pública sem a realização do concurso público ocorre em relação aos cargos declarados em lei de livre nomeação e exoneração. Estes são os chamados cargos em comissão destinados apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento (CRFB, artigo 37, V), submetendo-se os seus ocupantes ao regime estatutário.
A Constituição da República não faz alusão à figura do ‘emprego em comissão’, que seria uma situação sui generis do dito ‘cargo em comissão’, pois, apesar de destinados à função de direção, chefia e assessoramento, de livre nomeação e exoneração, estariam os seus ocupantes sujeitos às normas trabalhistas”.
Ainda, nos raros casos em que julgados do TST[3] admitem empregados em comissão, a Corte exige lei para sua criação. No entanto, como destacado, os empregos públicos do Conselhos Profissionais são criados por atos administrativos, na contramão da jurisprudência:
“NECESSIDADE DE PREVISÃO LEGAL. O Tribunal Regional assentou que os empregos em comissão no âmbito da Administração Indireta se sujeitam à previsão em lei, sendo claro no sentido de que inexiste "instrumento legal instituindo empregos em comissão no âmbito da empresa ré", ora Agravante, logo não está caracterizada a violação dos arts. 37, II, e 173, § 1º, II, da CF/88. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento”.
(BRASIL. TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. AIRR – 89-16.2010.5.10.0019. Relatora Desembargadora Convocada: Cilene Ferreira Amaro Santos, Data de Julgamento: 21/10/2015, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 23/10/2015)
Nos Conselhos profissionais, a conduta fica ainda mais delicada. Os Planos de Cargos, Carreiras e Salários, em regra, não são criados por lei, mas por Resoluções Administrativas das entidades (FREITAS, 2013, 86-114). Assim, caso seja autorizado que criem, livremente, cargos comissionados, a autarquia poderia, facilmente, burlar a obrigatoriedade da contratação de empregados por via do concurso público. Bastaria continuar a “inventar” empregos como “gerentes” e “assessores” diversos para empregar apadrinhados políticos ou quem fosse do interesse da diretoria da entidade. Destaca-se que a própria diretoria de um Conselho Profissional é eleita pelos pares da profissão, possuindo interesses políticos.
Assim, nesse trabalho, entendemos pela inconstitucionalidade do uso de emprego em comissão para direção, chefia e assessoramento em Conselhos Profissionais, devendo as funções serem preenchidas por empregados aprovados previamente em concurso público. Dessa forma, com a contratação isonômica, imparcial e após a aferição da capacidade técnica do profissional por concurso público, esperamos que haverá maior controle sobre as normas de Direito Público dos Conselhos (licitações e contratos), bem como profissionalização e autonomia da fiscalização.
Apesar de todo impasse, o TCU tem admitido empregos em Comissão nos Conselhos Profissionais. Segundo Orientações do próprio órgão às entidades, cabendo citar:
“7.2.3 Cargos Comissionados
Ao analisar o TC 016.756/2003 – 0, relativo ao percentual de cargos comissionados junto aos Conselhos de Fiscalização Profissional, o TCU concluiu da seguinte forma (Acórdão TCU 0341 – Plenário):
• Necessidade de os conselhos de fiscalização profissional adequarem suas instruções normativas internas ao art. 37, inciso V, da Constituição Federal, estabelecendo, ainda, o percentual mínimo de 50% dos cargos em comissão a serem preenchidos por empregados de carreira, a exemplo da orientação fixada pelo art. 14 da Lei 8.460/92.
• Nos termos das disposições constantes do art. 37, inciso V, da Constituição Federal, ‘as funções de confiança devem ser exercidas, exclusivamente, por servidores ocupantes de cargos ou empregos efetivos, enquanto que os comissionamentos, jungidos ao aspecto de confiança, devem ser preenchidos, preferencialmente, por servidores efetivos do quadro de carreira da entidade, em percentuais pré-fixados, destinando-se estes, apenas, às atribuições próprias de direção, chefia e assessoramento’.
• Inexistindo lei que estabeleça para os conselhos os percentuais mínimos, seria plausível fixar o percentual de 50% dos comissionamentos para o pessoal com vínculo efetivo com as entidades, ficando a outra metade para livre escolha dos
administradores.
• Para que seja evitada a ocorrência de fraude à exigência de concurso público, os casos de terceirizações devem limitar-se às modalidades de mão de obra que não constituem ‘invasão ou substituição das atribuições próprias e inerentes ao pessoal do quadro de carreira’ (TCU, 2014, p. 110)”.
Dessa forma, o TCU tem aceitado a existência de “empregados em comissão” nos Conselhos Profissionais, desde que respeitado o parâmetro mínimo de 50% dos empregos preenchidos pelo pessoal de carreira. Esses empregos em comissão deverão, também, ser exclusivos para funções de “direção, chefia e assessoramento” e não implicarem em “invasão ou substituição das atribuições próprias e inerentes ao pessoal do quadro de carreira”. Respeitados esses requisitos, seriam legais as contratações. Todavia, entendemos que este entendimento viola o Art. 37, II da Constituição da República caso o Conselho Profissional contrate pessoal pelo regime do “emprego público”, pois não tem previsão constitucional a figura do “empregado em comissão”, além de violar a literalidade do Art. 1º, § 2º, I, b da Lei 9.962/2000.
IV. DO REGIME JURÍDICO APLICÁVEL: CELETISTA OU ESTATUTÁRIO.
O ponto mais polêmico sobre o regime jurídico de pessoal dos Conselhos Profissionais é a questão se o pessoal deveria ser contratado pelo regime celetista ou estatutário. Para não fazer referência à origem remota da controvérsia, será analisada apenas a questão pós Constituição de 1988, que estabeleceu, em seu Art. 39, o Regime Jurídico Único (estatutário) para os servidores das autarquias da Administração Indireta.
Conforme exposto no tópico II, a Lei 9.649/1998, em seu Art. 58, estabeleceu a natureza privada dos Conselhos de Fiscalização das Profissões. Como consequência, seus empregados seriam contratados por meio do regime celetista e dispensado o concurso público.
Na ADI 1.717, já citada, o STF julgou diversos dispositivos da Lei nº 9.649/1998 inconstitucionais, em especial o que estabeleciam a natureza privada das entidades. Entretanto, na data deste julgamento, 07/11/2002, o Art. 39 da Constituição da República estava alterado pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998, de 04 de junho de 1998, que extinguia o Regime Jurídico Único na Administração Pública Brasileira. Por isso, o Supremo julgou prejudicado o pedido de declaração de inconstitucionalidade do Art. 58, §3° da Lei 9.649/1998[4], que determina a contratação dos servidores dos Conselhos Profissional sob o regime celetista.
Como se sabe, na ADI nº 2.135, julgada em 02/08/2007, o STF entendeu pela inconstitucionalidade da Emenda Constitucional nº 19, de 1998, retornando a redação original do Art. 39 da Constituição e a vigência do Regime Jurídico Único. O Supremo, todavia, ressalvou, “em decorrência dos efeitos ex nunc da decisão, a subsistência, até o julgamento definitivo da ação, da validade dos atos anteriormente praticados com base em legislações eventualmente editadas durante a vigência do dispositivo ora suspenso” (BRASIL, STF, ADI 2135). Acontece que o julgamento do mérito da ADI 2.135 não ocorreu até o presente momento e parte dos Conselhos continua contratando pelo regime celetista, enquanto decisões judiciais pontuais obrigam outra parte a aderir ao regime estatutário, como a já citada do STJ[5].
Além disso, decisões de Tribunais Regionais Federais também têm passado a reconhecer a necessidade de implementação do regime estatutário nos Conselhos Profissionais independente do julgamento final da ADI 2.135. Como exemplo, julgado do TRF1:
“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONSELHOS PROFISSIONAIS. NATUREZA JURÍDICA. AUTARQUIAS FEDERAIS CORPORATIVAS. REGIME JURÍDICO DE SEUS SERVIDORES. ESTATUTÁRIO. INVESTIDURA. PRÉVIA APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. ILEGALIDADE DE RECRUTAMENTO POR SIMPLES TESTE DE SELEÇÃO E DE CONTRATAÇÃO SOB O REGIME CELETISTA. INEXISTÊNCIA DE ESTABILIDADE ÀQUELE ASSIM ADMITIDO. – Os conselhos de fiscalização profissional são autarquias federais corporativas. O art. 58 da Lei n. 9.469/98, que lhes atribuía personalidade de direito privado, foi considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (ADIN n. 1.847-7). – Por conseguinte, o recrutamento de seus servidores sujeita-se à prévia aprovação em concurso público, conceito este que não alberga simples teste de seleção, devendo a relação de trabalho materializar-se ainda sob o regime estatutário. Art. 37, I e II, da CF; e Lei n. 8.112/90. – O funcionário admitido após a realização de teste de seleção e sob a forma preconizada pela CLT não pode ser considerado servidor público federal, não gozando, portanto, da estabilidade deferida pela Constituição, ainda que seja dirigente sindical. Há nulidade de pleno direito na investidura não sanável sob qualquer ótica. Lícita a sua demissão, já que não enquadrável nas disposições do art. 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. – Apelação improvida. (BRASIL. TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO. AC 0011679-03.1998.4.01.0000 / MT, Rel. JUIZ JULIER SEBASTIÃO DA SILVA (CONV.), TERCEIRA TURMA SUPLEMENTAR (INATIVA), DJ p.291 de 08/10/2001)”.
Decisões mais recentes reconhecem, inclusive, o direito à estabilidade excepcional prevista no Art. 19 do ADCT aos “empregados públicos” dos Conselhos Profissionais, visto que deveriam estar enquadrados no regime estatutário. Nesse sentido, o julgado do TRF4:
“DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. ADI'S 1717 E 2.135/STF. CONSELHOS PROFISSIONAIS. DECRETO-LEI Nº 968/69. LEI 9.649/98. AUTARQUIA FEDERAL. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. ART. 19 DO ADCT C/C LEI 8.112/90. ESTABILIDADE FUNCIONAL DE SERVIDOR. RECONHECIMENTO. REINTEGRAÇÃO. DIREITO ÀS VERBAS SALARIAIS DESDE A DEMISSÃO IMOTIVADA. CONSECTÁRIOS LEGAIS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. FORMA DE CÁLCULO E ATUALIZAÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE DE EXECUÇÃO. HONORÁRIOS. OBSERVÂNCIA DA PREVISÃO CONTIDA NO ART. 20 §§ 3º E 4º DO CPC. APELO PROVIDO. 1. De acordo com a interpretação dada pelo Superior Tribunal de Justiça no AgRg no REsp 1164129/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, tem-se que por força no disposto no Decreto-Lei nº 968/69, o regime dos funcionários dos Conselhos de Fiscalização de Profissões era o celetista. Após a Constituição Federal de 1988 e com o advento da Lei nº 8.112/90, foi instituído o regime jurídico único, sendo os funcionários dessas autarquias alçados à condição de estatutários, situação que perdurou até a Emenda Constitucional nº 19/98 e a entrada em vigor da Lei nº 9.649/98, a qual instituiu novamente o regime celetista. 2. No julgamento da ADI nº 1.717/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 58 e seus §§ 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º, da Lei nº 9.649/98, afirmando que os conselhos de fiscalização profissional possuem natureza de autarquia de regime especial, permanecendo incólume o art. 58, § 3º, que submetia os empregados desses conselhos à legislação trabalhista. 3. No entanto, o próprio Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 2.135/DF suspendeu, por força de liminar, a redação emprestada pela EC n.º 19/98 ao caput do artigo 39 da CF, restabelecendo, assim, a redação original dispositivo legal, apenas ressalvando as contratações ocorridas com suporte na Emenda Constitucional 19/98. Tem-se, portanto, que os Conselhos de Fiscalização Profissional são considerados Autarquias Federais e a eles também se aplica o Regime Jurídico Único previsto no art. 39 da Constituição Federal de 1988. Igualmente a eles incide o disposto no art. 243 da Lei nº 8.112/1990, de sorte que os funcionários por eles contratados e cujo vínculo era regido pela CLT passaram a ser submetidos à referida Lei. 4. Na sucessão das normas no tempo, constata-se que a Constituição da República de 1988 instituiu o Regime Jurídico Único, do qual se beneficiaram, nos termos do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, somente os empregados que, em 05-10-1988, haviam já completado pelo menos 5 (cinco) anos de exercício continuado nos respectivos empregos, os quais restaram transformados em cargos pelo § 1º do art. 243 da Lei n. 8.112/90. 5. Na hipótese em tela, a parte autora faz jus à estabilidade nos termos do art. 19 do ADCT, haja vista que na data de promulgação da atual Constituição Federal (05-10-1988) contava com mais de 05 (cinco) anos continuados de exercício no emprego público. 6. Desse modo, a sua demissão ocorrida no ano de 1992, mostrou-se ilegal, já que só poderia ser afastada do serviço público mediante regular processo administrativo. 7. Portanto, é de rigor o reconhecimento da nulidade do ato de demissão, e imperativa a condenação da autarquia à reintegração da autora e ao pagamento dos valores devidos, pertinentes à remuneração vencida, com juros e correção monetária no percentual e índice, respectivamente, constantes da legislação em vigor em cada período em que ocorreu a mora da fazenda pública, ficando o montante para ser apurado por cálculos no processo de execução, compensando-se, ainda as verbas rescisórias eventualmente pagas. 8. Firmado em sentença e/ou em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária legais por eventual condenação imposta à Fazenda Pública e em razão da falta de pacificação dos temas pelos Tribunais Superiores, a forma como será apurada a atualização do débito deve ser diferida (postergada) para a fase de execução, observada a norma legal em vigor. Precedentes. 9. Com a modificação na solução da lide, é automática inversão dos ônus sucumbenciais, devendo, contudo, ser levada em conta nova apreciação equitativa do julgador do recurso de apelação, quanto à previsão contida nos parágrafos 3º e 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil. No caso em tela, fica condenada a parte ré a pagar custas processuais e verba honorária no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). 10. Apelo provido”. (BRASIL. TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA QUARTA REGIÃO. AC 50684541820124047100. Relatora: SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, TRF4 – TERCEIRA TURMA, D.E. 26/10/2015.)
Recentemente, em 03 de junho de 2015, o Ministro Luiz Fux decidiu na RCL 19537 do Sindicato dos Servidores dos Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional no Estado do Rio Grande do Sul e a Central Única dos Trabalhadores (CUT-RS) impor aos Conselhos Regionais de fiscalização profissional daquele estado a adoção do Regime Jurídico Único aos servidores aprovados em concursos públicos[6].
O Ministro Luiz Fux assim se pronuncia na primeira decisão monocrática da Rcl 19537:
“Nesta primeira análise dos autos, própria das tutelas de urgência, verifico a plausibilidade das alegações, haja vista que os atos reclamados parecem dissentir da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade, revestida, portanto, de caráter vinculante.
Isso porque os Conselhos reclamados possuem natureza autárquica e, portanto, o ingresso nos seus quadros depende de aprovação em concurso público, e a contratação deve observar o regime estatutário”.
Seguindo a nova jurisprudência do STF, o PGR propôs em 20/08/2015 a ADI 5367, em que questiona:
“(…) dispositivos de leis que autorizam os conselhos de fiscalização profissional a contratarem pessoal sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Ele pede a declaração de inconstitucionalidade dos artigos atacados, sem declaração de nulidade por 24 meses, para que a presidente da República tenha tempo para instaurar processo legislativo para edição de norma que trate do regime jurídico para contratação de servidores por essas entidades[7]”.
Como se percebe, decisões recentes de Tribunais Regionais Federais, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal apontam a necessidade de adoção do Regime Jurídico Estatutário nos Conselhos Profissionais. A decisão final sobre a controvérsia, que poderá unificar o regime de pessoal dos Conselhos Profissionais como estatutário, poderá vir da ADI 5367, proposta pelo PGR, ou por meio da RCL 19537, proposta pela CUT-RS e o Sindicato dos Servidores dos Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional no Estado do Rio Grande do Sul. Defende-se que este entendimento está em consonância com a Constituição Federal, visto a natureza autárquica dos Conselhos Profissionais, bem como pelo desempenho do poder de polícia nas atividades de fiscalização.
V. CONCLUSÕES
Desse modo, o STF consolidou sua jurisprudência no sentido da natureza autárquica dos Conselhos Profissionais e da aplicação a eles do regime de direito público em ADI, com efeitos erga omnes e vinculante (ADI 1717). Da mesma forma, o STF solidificou jurisprudência sobre a obrigatoriedade de contratação de pessoal nos Conselhos Profissionais exclusivamente por concurso público (MS 22.6432 e MS 28469), no que é seguido pelo TCU (TC-016.441/2005-7) e pelo STJ (AgRg no AgRg no AREsp 639.899/RS).
Por os Conselhos Profissionais desempenharem atividades que exigem o poder de polícia, bem como pela natureza autárquica e a existência do Regime Jurídico Único (Art. 39 da CR/88), entendemos que o regime mais adequado para o pessoal dos Conselhos Profissionais é o estatutário. A jurisprudência dos Tribunais superiores, conforme exposto ao longo do trabalho, parece convergir nesse sentido e a solução do impasse pode ocorrer com o julgamento da ADI 5367, proposta pelo PGR, no STF ou por meio da RCL 19537, proposta pela CUT-RS e o Sindicato dos Servidores dos Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional no Estado do Rio Grande do Sul.
Conforme exposto no tópico III, entendemos também pela inconstitucionalidade do uso de emprego em comissão de livre provimento para direção, chefia e assessoramento em Conselhos Profissionais, devendo as funções serem preenchidas por empregados aprovados previamente em concurso público, em consonância com o Art. 37, II da Constituição da República e a literalidade do Art. 1º, § 2º, I, b da Lei 9.962/2000. Caso haja a conversão do regime de pessoal para o estatutário, esperamos que a utilização de cargos comissionados de livre provimento fique restrita a casos muito pontuais e mediante previsão legal.
A jurisprudência do TST já parece apontar no sentido da inconstitucionalidade da figura do empregado em comissão nos Conselhos Profissionais (BRASIL, TST, AIRR – 89-16.2010.5.10.0019), ressalvado entendimento do TCU (TCU, 2014, p. 110). Por estes possuírem quadros de pessoal reduzidos, a utilização de cargos comissionados de livre provimento para, por exemplo, chefiar as atividades de fiscalização ou para assessoria jurídica pode influenciar na atividade fim do órgão, bem como diminuir o necessário controle jurídico sobre as licitações e demais normas de Direito Público a serem aplicadas pela autarquia.
No entanto, ainda que o STF decida pela natureza estatutária do regime de pessoal dos Conselhos, acreditamos que será feito um regime de transição. Será necessário tempo para que sejam editadas leis criando os planos de carreira, cargos e salários (que, atualmente, são criados por resoluções dos Conselhos) (FREITAS, 2013, 86-114), bem como regulamentando a adaptação dos cargos ao regime da Lei nº 8.112/1990. Ainda será necessário muito debate entre Governo Federal, Tribunais Superiores e os empregados públicos dos Conselhos Profissionais, que não podem ser excluídos da discussão, para definição das controvérsias.
Acreditamos que, com a aplicação do regime jurídico único aos Conselhos Profissionais, haverá maior profissionalização na fiscalização realizada pelas entidades. Não se pode esquecer que os Conselheiros exercem importante de papel de orientação das atividades administrativas e de fiscalização nessas autarquias. Estes são eleitos pelos pares, e não escolhidos pelo chefe do executivo, como no restante da Administração Indireta da União. Assim, possuirão interesses políticos na gestão dos Conselhos, o que, em alguns casos, pode conflitar com a imparcialidade da fiscalização exercida pelos fiscais concursados. Com a garantia do regime jurídico único e, por consequência, da estabilidade, a fiscalização ficará mais independente e com maior condição de resistir a pressões externas, o que atenderá ao interesse público.
Analista Judiciário – Área Judiciária no Tribunal Regional do Trabalho da 4 Região. Bacharel em Direito pela UFMG. Pós-graduado em Direito público pela UCAM
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