Os reflexos do inquérito policial na persecução penal

Resumo: Este trabalho visa compreender o Inquérito Policial como forma investigativa dentro do ordenamento jurídico brasileiro e a maneira como ele se comporta dentro do processo penal, a luz dos princípios constitucionais, tais como: o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal; tentando compreender a relação existente entre esses direitos fundamentais do cidadão vivente em um Estado Democrático de Direito, com características específicas da investigação, como a sigilosidade, sob pena de falhar no intento de remontar, de forma verídica, os fatos em ordem cronológica para apreciação do Ministério Público, que então decidirá a favor, ou não, de uma denúncia do fato delituoso ao juiz de direito, instaurando-se assim, o processo penal.

Palavras-chave: Inquérito policial; Princípios constitucionais; Processo penal.

Abstract: This work seeks to understand the police investigation as form investigative in the Brazilian Legal system and the way like it behaves inside the penal process,  in the light of the such constitutional beginnings as: the contradictory, the legal defense and the due process legal; trying to understand the existent  relationship among those fundamental rights of the living citizen in the Democratic State of Right, with specific characteristics of the investigation as the secrecy, under penalty of failing in the project of remounting, in a truthful way, the facts in chronological order for appreciation of the Public Persecution Service, that then, will decide in favor or not of an accusation of the criminal fact to the Magistrate, being established like this, the penal process.

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Key-Word: Police Investigation; Constitutional Beginnings; Penal Process.

Sumário: 1. Introdução. 2. Inquérito Policial: Panorama Geral. 2.1 Histórico.  2.2 Conceito. 2.3. Encerramento. 3. Características do Inquérito Policial. 3.1. Oficialidade. 3.2. Autoriedade. 3.3. Dispensabilidade/Discricionariedade. 3.4. Indisponibilidade. 3.5. Oficiosidade. 3.6. Forma Escrita. 3.7. Inquisitoriedade. 3.8 Sigilosidade. 3.8.1. Direito de Defesa no Inquérito Policial. 4. Os reflexos do Inquérito Policial na Persecução Penal. Conclusão. Referências.   

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo tentará compreender a funcionalidade do Inquérito Policial dentro da cadeia processual penal brasileira e também como é regido internamente.

Tal estudo se faz necessário devida a complexidade da sociedade pós ditadura militar brasileira, ainda mais dentro do contexto de uma Constituição Federal que fosse pautada pelo direito às liberdades individuais dos cidadãos.

Justamente, por isso se faz importante o conhecimento aprofundado dos princípios regentes das investigações policiais, visto que é a partir delas, que o indivíduo pode se ver a beira da perda desses direitos constituintes fundamentais.

O Inquérito Policial configura-se, portanto, no símbolo da força estatal, e como ela age em nosso cotidiano. Isto porque o Estado não pode, legalmente, manter para si um aparato que o determine mais poderoso que a própria massa popular. Mesmo porque, o poder que ora pertence ao Estado, não é, verdadeiramente, pertencente, mas meramente contratado.

O povo, a sociedade civil, compreende para a harmonia e bem viver geral e assim, não seria possível que cada cidadão aplicasse sua própria lei, por isso, através do que filósofos chama de Contrato Social, outorgaram ao Estado a prerrogativa de aplicação das leis.

Mas essa procuração dada não pode, de maneira alguma, voltar-se contra a própria população, seja por que meio for, através de que procedimento for. É nesse sentido que este estudo sobre o Inquérito Policial está enquadrado: é tentando entender o jogo de relações entre a sociedade civil, as instituições jurídicas, os procedimentos legais e os princípios e direitos fundamentais do cidadão brasileiro.

Assim, no primeiro capítulo haverá um estudo sistemático sobre o Inquérito Policial, qual sua origem histórica, sua conceituação, natureza jurídica, finalidade e os devidos prazos legais a que a Polícia Judiciária deva cumprir em suas investigações.

O segundo capítulo, versa sobre um aprofundamento das características do Inquérito Policial, quais são elas e como se comportam segundo os parâmetros do Código de Processo Penal e a Constituição Federal.

Já no terceiro e ultimo capítulo, será feita uma análise acerca dos reflexos da instrução do Inquérito Policial no ordenamento jurídico penal, uma vez que é o procedimento, por excelência, dessa fase persecutória, e, de regra, o primeiro e a forma mais comum para coleta dos primeiros elementos informativos de um crime, que irão embasar a ação penal.

Por fim, na conclusão do trabalho, uma tentativa de entender o papel do Inquérito, bem como a discussão sobre o entendimento que algumas correntes jurídicas possuem de que os princípios constitucionais do Contraditório e Ampla Defesa devem ser seguidos desde a investigação policial

Não é, e nem poderia ser, o objetivo desse trabalho, ser capaz de suprir toda a discussão sobre o Inquérito Policial dentro do ordenamento jurídico brasileiro, mas a longo prazo, espera-se contribuir de maneira significativa ao aprofundamento das questões discutidas, permitindo que a sociedade civil seja beneficiada com um sistema penal que seja justo e que não permita a exclusão de nenhum de seus cidadãos.

A pesquisa a ser apresentada será uma pesquisa qualitativa do tipo bibliográfica, atentando a Doutrinas e legislações vigentes.

As fontes de pesquisa a serem utilizadas serão a Constituição federal de 1988 e o Código de Processo Penal, além de outras legislações e também obras doutrinárias de autores significativos, revistas, artigos e materiais disponíveis na Internet.

A coleta da bibliografia pertinente será feita na biblioteca da faculdade, além da aquisição de obras e materiais de relevante importância para o tema e também provenientes da indicação e disposição de materiais oferecidos pelo professor/orientador.

2. INQUERITO POLICIAL: PANORAMA GERAL

2.1. HISTÓRICO

Embora aplicado atualmente no Estado brasileiro, o Inquérito Policial data de muito antes da criação da Constituição Federal do Brasil de 1988. A primeira vez que se tem notícia de uma investigação, com fins de apuração da culpa de determinada pessoa, é ainda na Roma antiga.

O Estado romano, então, auferia aos parentes da vítima ou a ela própria, a “inquisitio” – uma espécie de procedimento investigativo – que deveria identificar o criminoso e também o localizar. Com o tempo, foi dado, ao acusado a sua própria “inquisitio", que o habilitaria a provar sua inocência.

Com a evolução da sociedade romana e dos processos envolvidos, “o Estado quis para si o direito de investigação, passando a função para agentes públicos1” (PICOLIN, 2007) e excluindo os comuns do processo investigativo.

À medida que a investigação de crimes avança através da história, temos que o direito à investigação, pertence ora ao Estado, ora à Igreja ou mesmo aos monarcas, que teriam seus interesses resguardados acima de qualquer outro cidadão.

Na era Moderna, juntamente com o pensamento Iluminista, temos a virada do pensamento humano acerca desse poder absoluto e sua legitimação. Assim, filósofos iluministas como Jacques Rousseau, John Locke e Thomas Hobbes dedicaram a entender como funcionava a sociedade e os meios que a regem.

Com a premissa de que o Estado era o depositário das liberdades individuais, eles investigaram o estado natural do homem, aquele momento, em que o individuo ainda não vive dentro de regras sociais estabelecidas. Thomas Hobbes descreve o estado de natureza:

“O direito natural (…) é a liberdade que cada um possui de usar seu próprio poder, da maneira que quiser, para a preservação de sua própria natureza, ou seja, de sua vida. Consequentemente, de fazer tudo aquilo que seu próprio julgamento e razão lhe indiquem como meios adequados a esse fim. (…) Em tal condição, todo homem tem direito a todas as coisas” (HOBBES, cap. V).

Entendida dessa forma, temos que a liberdade pertencia por natureza ao individuo, para que dela fizesse o que melhor lhe conviesse. E é claro que um convívio social – em que o único meio regulatório fosse a força individual de cada um, para defender seus próprios interesses – não seria possível; de maneira que os homens, para viverem juntos, e assim garantirem sua sobrevivência, estipularam o Contrato Social.

E é a partir do momento que o homem natural passa a ser o homem civil, aquele que delega ao Estado, parte de sua liberdade, em prol do bem comum, que visível fica o jus puniendi. O direito de punir, pertencente ao Estado, não nasce com ele, não é gerado através de seu aparato, mas lhe é confiado através do contrato social, e, portanto, não deverá servir ao próprio Estado, nem aos interesses de alguns, mas sim, ao bom funcionamento da coletividade.

Entender o jus puniendi como um “direito-poder” (FERNANDES, 2006), torna-se fundamental para as bases de um Direito Penal mais justo e igualitário, uma vez que esse poder só poderá ser visto como instrumento, que age em função de proteger aqueles que outorgaram o direito ao Estado.

Por isso, temos que o mesmo Estado que acusa o individuo de determinado delito, não poderá ser aquele que julgará, pois haveria intenso conflito de interesse. E como uma forma de solucionar esta questão, temos que no âmbito do processo penal, o Estado subdivide-se em duas partes:

O Estado-Administrativo enquadra-se durante a fase investigativo-apurativa da ação criminal, e que para fazer valer o seu direito constitucional de acusação, deverá noticiar o crime ocorrido àquele, que de direito, o poderá julgar: ao Estado-Juiz.

Dentro do Estado-Administrativo, há ainda uma subdivisão, de ordem prática, em dois organismos, que tem como missão a operacionalização das ações pertencentes à “persecutio criminis”: sendo que ao Ministério Público cabe a denúncia, ou seja, levar ao conhecimento do Estado-Juiz “o fato que se reveste de aparência delituosa, apontando seu autor, a fim de que o juiz possa verificar se deve ou não puni-lo”. (TOURINHO, 2009, p. 107).

À polícia, então, cabe à responsabilidade da investigação do crime cometido, em processo que envolve, desde oitiva de testemunhas até buscas e apreensões (de pessoas e posses), e que receberá a denominação de Inquérito Policial.

O Inquérito Policial, portanto, configura-se como procedimento preparatório à ação penal, como será visto a seguir.

2.2. CONCEITO

O Inquérito Policial é um “procedimento preparatório da ação penal, de caráter administrativo, conduzido pela policia judiciária e voltado à colheita preliminar de provas para apurar a prática de uma infração penal e sua autoria”. (NUCCI, 2012, p. 140)

O que isso traduz na prática, é que cabe à Polícia Judiciária a colheita inicial de provas e depoimentos, que juntos, poderão convencer ao representante do Ministério Público da veracidade dos delitos cometidos, levando-o a apresentar a denúncia perante o magistrado, quando iniciará o processo penal.

No Brasil, tem-se a inclusão do Inquérito Policial na legislação desde a edição da lei 2.033 de 20 de novembro de 1871 (regulamentada pelo Decreto-Lei 4.824, de 22 de novembro de 1871), em que se encontra a seguinte definição: “O Inquérito Policial consiste em todas as diligências necessárias para o descobrimento dos fatos criminosos, de suas circunstâncias e dos seus autores e cúmplices; e deve ser reduzido a instrumento escrito”. Sendo que desde essa época, já constava como atribuição da Polícia Judiciária a investigação e encaminhamento ao promotor público, conforme consta no §6º do referido decreto:

“Terminadas as diligências e autuadas todas as peças, serão conclusas à autoridade que proferirá o seu despacho, no qual, recapitulando o que for averiguado, ordenará que o inquérito seja remetido, por intermédio do Juiz Municipal, ao Promotor Público ou a quem suas vezes fizer.” (BRASIL, 1871)

Assim, temos que o Inquérito Policial sempre configurou o espaço de colher provas e evidências de que determinado fato criminoso ocorreu, bem como tentar verificar a culpabilidade dos envolvidos.

Embora seja de natureza administrativa, que tenha como principal órgão a Polícia Judiciária, figurada pelo Delegado de Polícia, não pode ter seu valor de imparcialidade (dentro do processo penal) desvalorizado, ou mesmo subjugado.

É nesse sentido que o jurista Paulo Rangel escreve:

“Desta forma, surge a chamada persecutio criminis, que é exercida pela Polícia Judiciária (através do Inquérito Policial  ) e pelo Ministério Público (através da competente ação penal). A função jurisdicional fica inerte, aguardando o resultado da autoexecutoriedade dos atos da administração e a devida provocação. […] O Inquérito Policial   é o instrumento de que se vale o Estado, através da polícia, órgão integrante da função executiva, para iniciar a persecução penal com o controle das investigações realizadas do Ministério Público”. (RANGEL, 2007, p. 97)

De forma a corroborar esse pensamento, temos que na Carta Magna brasileira, em seu artigo 144, atribui especificamente às atribuições das polícias, tanto federal como civil, determinando-lhes que sejam auxiliares ao Poder Judiciário – vem desta, até, seu nome de Polícia Judiciária.

Portanto, de forma inequívoca, quis o legislador constituinte que ficassem separadas as instituições capazes da persecutio criminis, impedindo, assim, o aparecimento de Instituição “Superpoderosa” (NUCCI, 2012), que controlasse todo o processo investigatório e também a notitia criminis; assim, desequilibrando o sistema harmônico em que se funda a base do direito democrático.

É mais salutar ao processo penal, a divisão de trabalhos entre a Polícia Judiciária e o Ministério Público, principalmente porque a primeira tem seus procedimentos e processos revisados e fiscalizados, tanto pelo MP quanto pelo juiz de direito, não realizando sozinha a condução da investigação criminal.

Garante-se a imparcialidade necessária à investigação do ato delituoso, pois se a Polícia Judiciária não tomar a parte no processo penal – e assim, não precisará escolher um lado a filiar-se – ela poderá, exclusivamente, seguir o caminho das evidências, levando a verdade dos fatos aos, que de direito, julgarão os cidadãos.

Definir qual a natureza jurídica do Inquérito Policial é extremamente importante para delimitação do poder delegado pelo Estado aos seus braços administrativos penais, impedindo a superposição entre eles.

A investigação policial, que pode ser levada ao conhecimento tanto do Ministério Público, como de pessoa particular interessada, tem sua representação escrita no Inquérito Policial, que é o encadeamento lógico dos fatos apurados.

Razão, pela qual, a natureza deste é muito mais inquisitiva, pois a Polícia Judiciária visa esclarecer os fatos, a culpa ou inocência dos indiciados, ou seja,

“É um procedimento administrativo informativo destinado a subsidiar a propositura da ação penal, constituindo-se em dos poucos poderes de autodefesa do Estado na esfera da repressão ao crime, com caráter nitidamente inquisitorial, em que o indicado não é sujeito processual e sim simples objeto de procedimento investigatório”. (BUGARIM; et al, 2011, p. 77)

Sendo o Inquérito Policial constituído de uma sequência de atos ou ações que se sucedem, entende-se que sua natureza pertence muito mais a categoria de procedimento que a de processo. Faz-se necessário esmiuçar como funcionam essas duas categorias dentro do processo penal:

“Processo é relação jurídica formada entre as partes interessadas no litígio e o Juiz de Direito, representante do Estado. […] E procedimento é a série dos atos que impulsionam o processo. O procedimento é o aspecto formal, o modus faciendi do processo, cujo elemento material seria a lide (mérito)”. (SOIBELMAN, 1996, pág. 21)

Ao ser feita esta distinção, entende-se, que o inquérito é o procedimento administrativo que preparará a ação penal, sendo uma simples peça informativa-descritiva, conforme decisão já publicada pelo Egrégio Superior Tribunal Federal.

E sendo meramente informativo, não cabe no Inquérito Policial o princípio do contraditório – em que a parte acusada pode se defender. Isto porque não há acusado ou mesmo parte, durante um inquérito, mas somente indiciado – que é aquele que está sendo investigado.

Outra importante conceituação acerca do procedimento do Inquérito Policial, é que este “não visa ao exercício do poder jurisdicional” (MATOS, 2009), já que não pertence ao processo penal; e por isso não tem necessidade dos agentes deste, tal como o ofertante da denúncia (Ministério Público ou pessoa particular), o defensor (réu, representado por seu advogado) e, finalmente, aquele que julgará e proferirá a sentença: o juiz de direito.

Entende-se, portanto, é que a Polícia Judiciária e a Justiça, ambas devem ter seus papéis bem definidos e trabalhados, impedindo que uma tome a alçada que, juridicamente, pertence à outra.

Sendo que à primeira cabe a competência de investigar, informar e relatar a sequência dos fatos acontecidos, e à segunda, a verdadeira competência de julgar, sentenciando, de acordo com o que determina a lei, aquele que for, comprovadamente, considerado culpado do fato delituoso.

Com a finalidade, por tanto, de identificar o autor de ato delituoso e ainda reconstruir a verdade histórica acerca deste ato, o Inquérito Policial ainda deverá ter uma terceira finalidade.

Tem a função de levar os dados coletados em suas diligências ao conhecimento do Ministério Público, que a partir do relatório produzido pela Polícia Judiciária, irá analisar se o fato reveste-se de caráter delituoso e deve ser denunciado ao juiz de direito competente para julgar a questão.

“O Inquérito Policial é peça meramente informativa. Nele se apuram a infração penal com todas as suas circunstâncias e a respectiva autoria. Tais informações tem por finalidade permitir que o titular da ação penal, seja o Ministério Público, seja o ofendido, possa exercer o jus puniendi in judicio, isto é, possa iniciar a ação penal”. (TOURINHO, 2001, p. 106)

Nota-se, porém, que dessas três finalidades, a mais é importante é o objetivo de investigação, em que se aponta o autor do fato delituoso ao titular capaz de promover a ação penal em juízo – seja o MP ou o interessado particular; uma vez que através desse procedimento administrativo, evita-se o ajuizamento arbitrário contra as pessoas de bem.

Tem-se, assim, que o inquérito pode ser crucial para o entendimento e recolhimento de provas “perecíveis” (como cadáveres ou provas matérias de fácil deturpação), e que sem essa valiosa contribuição inicial, pudesse ser impossível a imputação da sentença a quem ela pertence de fato.

Porém, na contramão do procedimento, tem-se que a coleta de provas, sem que haja a participação do acusado ou seu defensor, que depois poderão ser usadas durante o processo penal, não possuem valor legal, pois ferem dois direitos constitucionais importantes para os cidadãos: a ampla defesa e o contraditório.

Verifica-se, porém, algumas soluções que podem ser tomadas, no sentido de evitar a violação dos direitos fundamentais:

“O ideal é que o juiz tenha discernimento para tomar as seguintes medidas, assegurando todos os enfoques necessários (segurança pública e garantia individual de ampla defesa) ao devido processo legal: a) deve desprezar toda e qualquer prova que possa ser renovada em juízo sob o crivo do contraditório; b) deve permitir à defesa que contrarie, em juízo, os laudos e outras provas realizadas durante o inquérito, produzindo contraprova; c) deve tratar como mero indicio e jamais como prova direta eventual confissão do indiciado; […] f) pode aceitar toda prova colhida na fase policial, desde que seja incontroversa, ou seja, não seja impugnada pelas partes, em momento algum.” (NUCCI, 2012, p. 145)

Desta forma, o Inquérito Policial cumpriria com o seu dever informativo, e não extrapolaria sua alçada jurídica ao tentar dar valor de prova, às evidências colhidas durante as diligências efetuadas. E nem mesmo a justiça perderia importantes e valiosas informações, que coletadas a tempo e a hora, poderiam ser cruciais para que o verdadeiro culpado do crime seja julgado pelo ato cometido.

2.3. ENCERRAMENTO

De acordo com o ART. 10, §1º do CPP, ao final do inquérito policial, será elaborado um relatório não opinativo, isto é, não será emitido nenhum juízo de valor, salvo se a autoridade policial representar pela preventiva; a opinio delicti cabe ao titular da ação penal e não a quem apenas investiga o fato infringente da norma penal.

Após a feitura do relatório, os autos do inquérito serão remetidos ao juiz que ao recebê-lo analisará a natureza do crime, assim, sendo o crime de ação penal pública, o juiz dará vista dos autos do inquérito ao Ministério Público que poderá tomar uma de três atitudes, quais sejam: oferecer a denuncia; requerer novas diligências, devendo o inquérito policial retornar para autoridade policial para novas diligências, conforme autoriza o Art. 16 do CPP, ou requerer o arquivamento do inquérito ao juiz. Ao passo que, se tratando de crime de ação penal privada, o inquérito policial fica em juízo aguardando a manifestação do ofendido, para que ofereça a queixa-crime no prazo decadencial de 6 (seis) meses contados do conhecimento da autoria.

Não obstante existem alguns prazos que devem ser respeitados para encerramento do inquérito policial.

Conforme disposto no Art. 10, caput, do CPP, estando o réu preso a autoridade policial terá 10 (dez) dias para encerrar o inquérito policial, não sendo possível nenhuma prorrogação, mantendo o réu preso por mais de 10 dias essa prisão será ilegal, motivo pelo qual deverá ser relaxada. Entretanto, estando o réu solto, o prazo será de 30 (trinta) dias, sendo possível a estipulação de novo prazo.

A legislação extravagante, no entanto, comporta algumas exceções consoantes à conclusão do inquérito policial.

Nos crimes de competência da Justiça Comum Federal estando o réu preso o prazo de conclusão será de 15 dias. Podendo ser prorrogado por igual período; estando o réu solto, o prazo será de 30 (trinta) dias – regra do Art.10, caput, do CPP.

Já nos crimes previstos na Lei 11343/2006 será de 30 dias para o caso de réu preso e de 90 dias para réu solto; ademais esses prazos podem ser prorrogados uma única vez, conforme dispõe o Art. 51, caput e Parágrafo único da referida lei.

“Art.51 O inquérito policial será concluído no prazo de 30 (trinta) dias, se o indiciado estiver preso, e de 90 (noventa) dias, quando solto.

Parágrafo único: Os prazos a que se refere este artigo podem ser duplicados pelo juiz, ouvido o Ministério Público, mediante pedido justificado da autoridade de policia judiciária”.

3. CARACTERÍSTICAS DO INQUÉRITO POLICIAL

3.1. OFICIALIDADE

A oficialidade determina que os procedimentos investigatórios só podem ser realizados através dos órgãos oficiais do Estado, quais sejam a Polícia Judiciária (art. 144 da CF) e o Ministério Público, o legítimo representante da ação penal (art. 129 §1ª da CF) nos casos da coisa pública.

Nas situações em que a titularidade da ação penal for atribuída à cidadão comum (ação penal privada) a investidura da investigação criminal ainda pertencerá ao Estado, através da Polícia Judiciária.

3.2. AUTORIEDADE

A presidência do inquérito policial caberá sempre à autoridade pública; nos casos de persecução criminal investigada pela Polícia Judiciária será, então, nomeado como presidente, o Delegado de Polícia.

3.3. DISPENSABILIDADE/ DISCRICIONARIEDADE

A abertura de um processo penal não dependerá exclusivamente de um Inquérito Policial, podendo concorrer como outras fontes de investigação, como base para um processo penal.

Assim, quando o titular da ação penal dispuser de outro tipo de investigação preliminar – Termo Circunstanciado ou outras fontes de informação- o inquérito será plenamente dispensável para o início da ação penal.  Entretanto, será indispensável quando servir de base para o oferecimento da denúncia ou da queixa.

Essas fontes, também chamadas inquéritos extrapoliciais podem ser: as CPI’s – Comissões Parlamentares de Inquérito, em que só serão utilizadas para investigar crimes de políticos e dentro da esfera política a que se relacionem; IPM’s – Inquérito Policiais Militares, usados exclusivamente quando um dos objetos da investigação – seja o inquerido, seja a vítima – for membro de um dos braços militares do Brasil, quais sejam: Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros Militar; Inquérito Civil – de exclusiva competência do Ministério Público, visa o levante de evidências, para configurar como provas em Ação Civil Pública.

Dado que o Inquérito Policial não é realizado observando os princípios constitucionais do acusado, quais sejam o contraditório e a ampla defesa, e que, facilmente, pode ser preterido por outros procedimentos investigativos, tem-se que seu valor probatório deve ser considerado relativo.

“Existe preocupação no sentido de não se permitir que a sentença condenatória tenha por base apenas elementos do inquérito policial, justamente porque tais elementos foram obtidos em fase meramente inquisitiva, afastado o principio do contraditório. […] O inquérito policial é peça meramente informativa, destinada tão-somente a autorizar o exercício da ação penal. Não pode, por si só servir de lastro à sentença condenatória”. (SALLES JÚNIOR, 1998.p. 130)

Assim, é do entendimento do ordenamento jurídico brasileiro que as provas colhidas ainda em fase inquisitorial não podem ser consideradas suficientes, em si mesmas, para embasar sentença judicial condenatória, visto que essas provas não podem ser equiparadas, em matéria de observância aos princípios constitucionais, àquelas colhidas dentro do devido processo legal.

3.4. INDISPONIBILIDADE

  A indisponibilidade do Inquérito Policial nos diz que uma vez instaurado o procedimento administrativo, não estará mais dentro das competências policiais o arquivamento da investigação, devendo o Inquérito chegar à sua conclusão final (art. 17 do CPP).

Nem mesmo o Ministério Público poderá pedir, arbitrariamente, o arquivamento da investigação, sendo que nos casos em que o pedido for feito, deverá primeiro, remeter os autos ao Juiz de Direito, que como fiscal de indisponibilidade, deverá anuir com os argumentos propostos para o arquivamento.

3.5. OFICIOSIDADE

Uma vez instaurado o Inquérito Policial poderá a autoridade pública agir sem a necessidade de provocação da parte ofendida; ou seja, na prática, esse princípio implica que a partir do momento que as investigações forem iniciadas, não mais dependerá do interessado para que ela se desenvolva, bastando, para isso, a Polícia Judiciária, de ofício, levar a investigação à sua conclusão final.

A exceção à oficiosidade se faz quando da instauração do procedimento investigatório, que neste momento, só poderá ser realizado através de pedido expresso do interessado, seja ele o Ministério Público, na esfera pública, seja o cidadão comum, na esfera particular.

3.6 FORMA ESCRITA

Acerca da forma como deve ser registrado um Inquérito Policial discorre a lei que todas as peças constantes nos autos deverão estar escritas, à mão ou digitadas. Nos casos em que forem as páginas digitadas, estas deverão estar rubricadas ao final pela autoridade policial, o Delegado.

3.7. INQUISITORIEDADE

Durante toda a fase investigatória, quando ainda realizada pela Polícia Judicial, aplicam-se as características do Sistema Inquisitório, significando, com isso, que haverá somente a apuração dos fatos envolvidos, sem que os indiciados, tenham, neste momento específico, acesso aos seus direitos constitucionais, como a Ampla Defesa e o Contraditório.

Assim, o Inquérito preocupa-se apenas com a montagem, em uma cadeia de sequencia lógica, dos fatos constitutivos do ato delituoso, deixando os juízos de valores e as oportunidades de defesa para o devido processo legal.

3.8. SIGILOSIDADE

Justamente devido ao seu caráter inquisitorial, ou seja, investigativo, é que o Inquérito Policial deverá ocorrer sob a égide do sigilo, principalmente, no que diz respeito ao conhecimento prévio dos indiciados, ao que lhes propiciaria a oportunidade de interferir no curso das investigações criminais, principalmente quando as evidências não estivessem em seu favor.

3.8.1. Direito de Defesa no Inquérito Policial

Direitos fundamentais a manutenção da liberdade estão garantidos na Constituição Federal de 1988, principalmente no que diz respeito ao Contraditório, a Ampla Defesa e o Devido Processo Legal.

Mister, porém, faz-se o entendimento de que o Inquérito Policial não se configura como parte do processos legal, sendo, em verdade, um procedimento administrativo realizado com o intento de remontar a cadeia de eventos que levaram à execução do ato delituoso, além de apurar os responsáveis por tais atos.

Por isso, é que nesse momento, abrir espaço ao indiciado para dialogar por sua inocência não faria qualquer sentido. Em primeiro, porque não sendo um processo devidamente constituído, o Inquérito não possui características que permitam o diálogo e em segundo, e, hipoteticamente falando, se houvesse esse diálogo, com quem ele se daria?

Tentaria o acusado, por meio de seu representante legal dialogar sua inocência com o Delegado de Polícia? Tal situação configura-se inconstitucional, pois estaria além do escopo de obrigações e deveres da autoridade policial, o juízo de valor ou mesmo o julgamento da causa: tais prerrogativas legais pertencem ao Juiz de Direito.

Outra questão que se coloca é relativa ao papel que a participação da defesa desempenharia na regulamentação dos procedimentos policiais em uma investigação criminal:

“[…] uma garantia – garantia do acusado, de um lado, e garantia do justo processo, do outro. É certo que pode, numa ótica subjetiva, ser vista como direito do acusado, mas no processo moderno adquire relevância o perfil objetivo da defesa, como ofício essencialmente social: defesa, portanto, como condição de regularidade do procedimento, na ótica do interesse público à atuação do contraditório, defesa, em última análise, legitimador da própria jurisdição.” (GRINOVER; et al. 2005, p. 22)

Usar do argumento de que com a participação do acusado no processo de investigação sobre si iria aumentar a regularidade dos trabalhos policiais, parece, além de despropositada, um verdadeiro contrassenso.

Quem haveria de possuir maior interesse no resultado de uma investigação policial se não aquele que fosse o objeto dessa mesma investigação? Ainda mais que, a depender do resultado apurado pela Polícia Judiciária, o indiciado se verá prestes a enfrentar acusação criminal e a passar por processo judicial.

E a função de fiscalizar os atos policiais, constitucionalmente falando, pertence ao Juiz de Direito, bem como ao Ministério Público, não havendo necessidade de uma terceira fiscalização, que só teria a ganhar com a desmoralização dos trabalhos investigatórios.

Assim, entende-se que a participação da defesa no Inquérito Policial além de não acrescentar qualquer vantagem à lide investigatória, poderia, sim, e com razão, impedir os trabalhos policiais, dificultando a busca pela verdade dos fatos que levaram ao ato delituoso.

Não é, portanto, por não ter os direitos do Contraditório e Ampla Defesa atendidos ainda em fase inquisitorial que o indiciado deverá sentir desprotegido de seus direitos constitucionais, até por que, a Carta Magna brasileira só os preconiza quando em devido processo legal, e até o momento, o Inquérito Policial consta  em seu texto como mero procedimento administrativo.

4. OS REFLEXOS DO INQUÉRITO POLICIAL NA PERSECUÇÃO PENAL

O inquérito policial não constitui fase obrigatória da persecução penal. Dessa forma, doutrina e jurisprudência entendem não ser obrigatória a observância do contraditório, uma vez que os dados colhidos na investigação apresentam-se como elementos de informação destinados diretamente ao titular da ação penal. Assim, o juiz ao proferir uma decisão condenatória em processo penal não poderá “fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas”, segundo o art. 155 do Código de Processo Penal.

Assim sendo, instrui Aury Lopes Jr., apud Távora e Alencar:

“[…] podemos afirmar que o inquérito gera atos de investigação, com uma função endoprocedimental, no sentido de que sua eficácia probatória é limitada, interna a fase. Servem para fundamentar as decisões interlocutórias tomadas no seu curso (como fundamentar o pedido de prisão temporária ou preventiva) e para fundamentar a probabilidade do fumus comissi delicti que justificará o processo ou o não processo”.

Importante salientar que a jurisprudência tem orientação no sentido de que “os elementos do inquérito podem influir na formação do livre convencimento do juiz para a decisão da causa quando complementam outros indícios e provas que passam pelo crivo do contraditório em juízo”.

“E M E N T A: RECURSO ORDINÁRIO EM “HABEAS CORPUS” – PRETENDIDO RECONHECIMENTO DE NULIDADE DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA, QUE ESTARIA FUNDAMENTADA, UNICAMENTE, EM ELEMENTOS COLIGIDOS NA FASE POLICIAL – INOCORRÊNCIA – DECRETO CONDENATÓRIO QUE TAMBÉM ENCONTRA APOIO EM PROVA PRODUZIDA EM JUÍZO, SOB A ÉGIDE DA GARANTIA CONSTITUCIONAL DO CONTRADITÓRIO – PLEITO RECURSAL QUE, ENVOLVENDO DISCUSSÃO EM TORNO DA EXISTÊNCIA MATERIAL DO FATO DELITUOSO E DE SUA AUTORIA, IMPÕE EXAME APROFUNDADO DE FATOS E IMPLICA CONFRONTO ANALÍTICO DE MATÉRIA ESSENCIALMENTE PROBATÓRIA – INVIABILIDADE NA VIA SUMARÍSSIMA DO “HABEAS CORPUS” – IMPETRAÇÃO, ADEMAIS, QUE TEM APOIO NA PRETENDIDA APLICAÇÃO, À ESPÉCIE, DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA, FUNDAMENTO ESSE NÃO EXAMINADO PELO ÓRGÃO JUDICIÁRIO ENTÃO APONTADO COMO COATOR: HIPÓTESE DE INCOGNOSCIBILIDADE DO “WRIT” CONSTITUCIONAL – ALEGADA INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO ENTRE IMPUTAÇÃO E SENTENÇA (“QUOD NON EST IN LIBELLO, NON EST IN MUNDO”) – INOCORRÊNCIA – FATOS QUE FORAM DESCRITOS, EM SEUS ELEMENTOS ESSENCIAIS, NA PRÓPRIA PEÇA ACUSATÓRIA – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.
(RHC 99785 AgR, Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 03/06/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-158 DIVULG 15-08-2014 PUBLIC 18-08-2014) Acesso em 10 de outubro de 2014.”

Ainda nesse sentido, segundo entendimento da primeira turma do STF:

“HABEAS CORPUS. PENAL. ALEGAÇÃO DE NULIDADE. CONDENAÇÃO BASEADA EXCLUSIVAMENTE EM PROVAS COLHIDAS NO INQUÉRITO POLICIAL. INOCORRÊNCIA. DECISÃO FUNDADA EM OUTROS ELEMENTOS OBTIDOS NA FASE JUDICIAL. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA A CONDENAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE REVOLVER-SE O CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO NA VIA ELEITA. O WRIT NÃO PODE SER UTILIZADO COMO SUCEDÂNEO DE REVISÃO CRIMINAL. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA. I – Os elementos colhidos no inquérito policial podem influir na formação do livre convencimento do juiz para a decisão da causa quando complementados por outros indícios e provas obtidos na instrução judicial. Precedentes. II – A análise da suficiência ou não dos elementos de prova para a condenação é questão que exige revolvimento do conjunto fático-probatório da causa, providência incabível na via do habeas corpus. III – O habeas corpus, em que pese configurar remédio constitucional de largo espectro, não pode ser empregado como sucedâneo de revisão criminal. Precedentes. IV – Ordem denegada.” (STF – HC: 104669 SP, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 26/10/2010, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-221 DIVULG 17-11-2010 PUBLIC 18-11-2010 EMENT VOL-02433-01 PP-00079) Acesso em 08 de outubro de 2014.

A doutrina garantista abaliza a impossibilidade total dessa orientação expressada pelos tribunais, em razão da atual sistemática processual penal constitucional, baseando-se desta feita precipuamente no princípio do devido processo legal, sob o argumento de que um Estado que se pretende constitucional democrático, tem como finalidade principal a valorização do homem frente ao Estado, não podendo impor seu direito de punir ao indivíduo sem a dinâmica dialética, discussão entre as parte e valoração pelo juiz, inerente à prova, tudo isso inexistente no sistema inquisitorial do inquérito policial.

Em contrapartida, Castro emprega uma interpretação à luz da Constituição para o art. 155 do CPP, com a nova redação dada pela Lei 11.690/90, assinalando que “o legislador deixou claro e evidente que a inquisitoriedade do inquérito  restou  temperada” ao passo  que  é  possível  em  determinadas  situações  trazer  o  contraditório  para  o  inquérito policial.

O respaldo para tal entendimento está nos exames periciais, pois estes quando realizados na fase investigatória não precisam ser repetidos em juízo, desde que processados conforme a lei determina.

Nesse sentido, Bismael Moraes leciona:

“Peça de competência da Policia Judiciária – diz ele- tem o inquérito policial elementos de inegável efeito judiciário, destacando-se – como bem o demonstrava o Prof. Cândido Mendes – os autos de prisão em flagrante delito, os exames de corpo de delito, as prestações de fiança, etc”.

Pode-se concluir com isso que o procedimento atual, que consiste na corroboração em juízo das provas colhidas na fase investigatória, proporciona uma lentidão na solução dos litígios, sendo que, em muitos casos o acusado, sendo inocente, se sente privado de sua liberdade e com a moral abalada pelo transtorno de responder a um processo demorado.

Sobre a importância das provas colhidas no inquérito policial, corrobora Bismael Moraes:

“Mittlermaler, mostrando que a sentença sobre a verdade dos fatos da acusação tem por base a provas, conclui-se que é sobre estas que versam as prescrições legais mais importantes em matéria criminal. E perguntamos, entre nós, onde são colhidas as provas materiais, em geral perene e imutável, senão no inquérito policial?”

CONCLUSÃO

Em uma sociedade democrática com o Estado brasileiro, mais e mais importante se faz o conhecimento a acerca das tutelas jurídicas de que os Estado dispõe no sentindo de manter a “Ordem e o Progresso”.

Embora seja um lema positivista o que rege a bandeira brasileira, que em nada se coaduna com um Estado Democrático de Direito, tal como vivido atualmente, ele nunca esteve tão presente e verdadeiro, como agora.

Pois, em tempos de desenfreada violência urbana, é comum que o cidadão comum sinta-se desamparado das instituições jurídicas, sentindo que sendo falhas em seu trabalho de proteção.

Essa sensação de abandono muitas vezes advém da falta de conhecimento dos tramites legais, levando muitas vezes, o senso comum a ter a incorreta percepção de que a impunidade impera respaldada principalmente pelas garantias constitucionais de defesa do acusado.

Por isso, entender como funciona os tramites judiciais faz-se mister na tentativa de evitar que falsas impressões sobre os direitos e garantias fundamentais dos seres humanos, sejam considerados fatores preponderantes de impunidade.

Porém, o que não se pode perder de vista é que a justiça é feita para todos que nela adentram; tanto aqueles que são culpados de seus delitos, como aqueles que injustamente, acabam sendo indiciados e levados a processo.

Importante, então, se faz a contribuição desse trabalho sobre o Inquérito Policial, visto que, a Polícia Judiciária, por se a porta de entrada de muitos cidadãos na via penal sofre de intensa rejeição social.

Ao longo de todo esse trabalho tentou-se entender os fundamentos do Inquérito Policial a luz de uma abordagem que levasse em consideração os direitos constitucionais do inquirido, durante toda a investigação policial.

Através do exposto, verifica-se que tal “sensação” da sociedade civil não procede, pois o maior interesse da lei, está em, justamente, impedir que inocentes paguem um preço alto, com sua própria liberdade, por erros do sistema judiciário.

E dentro desse sistema judiciário, compreende-se especial importância ao Inquérito Policial, visto que é a partir dele, que toda a ação penal se inicia. O trabalho, então, bem feito da Polícia Judiciária, que observe os parâmetros legais, pautado pela ética e pela busca da verdade, poderá ensejar em um processo legal, em que o acusado seja realmente a pessoa que cometeu o fato delituoso.

Assim, é na base do sistema processual que o cumprimento à lei deverá acontecer, ou seja, é ainda dentro da investigação policial que já deve se tomar os devidos cuidados para que a cadeia de fatos remontada seja o mais fiel possível da realidade.

O que a lei exige que seja seguido dentro do Inquérito Policial são alguns princípios norteadores, já que não há qualquer protocolo rigoroso da ação policial. O Delegado de Polícia, como chefe da investigação, tem campo aberto para tomar as decisões que julgar mais acertadas para que a apuração dos fatos ocorra.

Mas isso não quer dizer que esse mesmo Delegado pode agir arbitrariamente, ou mesmo, por sua conta própria. O Poder Judiciário, a qual a Polícia pertence, tem seus próprios meios regulatórios da Polícia Judiciária, quer seja, o Ministério Público ou mesmo o Juiz de Direito que esteja julgando o caso alvo da investigação.

Assim, se a conduta policial não foi condizente com os parâmetros legais atribuídos aos agentes de polícia, todas as provas assim obtidas serão, em juízo, sumariamente rejeitas e então, não mais terão qualquer valor probatório da culpa do réu.

Por isso, não faz-se necessária que a defesa, usando dos princípios do Contraditório e da Ampla Defesa tenha acesso às investigações policiais quando essas ainda estão em curso. Atualmente, há o entendimento, entre alguns juristas de que a melhor forma de regular o trabalho da Polícia Judiciária seria se fosse fiscalizada pela parte ofendida do processo, o que só poderia ocorrer se os supra citados princípios já fossem observados desde a fase inquisitorial.

Ora, será que aquele com maior interesse no resultado de uma investigação – no caso, o indiciado – é aquele que possui a imparcialidade necessária para avaliar os trabalho realizados pela Polícia Judiciária? Não haverá nesse caso um conflito primordial de interesses, impossíveis de serem resolvidos?

É assim o entendimento deste trabalho, que depois que pesquisar e conhecer todas as características que rodeiam um Inquérito Policial, entende que a melhor forma de investigação da verdade é manter as partes mais envolvidas no caso à par dos acontecimentos, até que, em momento propício (devido processo legal) elas tenham acesso a todas as provas arregimentadas durante os trabalhos da Polícia Judiciária.

Não há como, em vista de seu próprio interesse no processo investigatório, que a defesa seja capaz de fiscalizar de forma objetiva a Polícia, e por isso mesmo, deverá a forma Inquisitorial permanecer durantes todo o procedimento investigativo.

Acontecesse de ser permitida a influência do acusado dentro do procedimento investigatório, ai sim, seria impossível colher as provas necessárias para reconstituir a cadeia de fatos que levaram ao ato delituoso, e sem que haja provas contundentes da culpa, o acusado não poderia tê-la determinada de maneira que não restassem quaisquer dúvidas ao Juiz de Direito.

Desse modo, se acusatório fosse o sistema que rege o Inquérito Policial, a única certeza de que o cidadão brasileiro teria é da impunidade criminal.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

Bárbara Fuzário

Bacharel em Direito, Pós Graduação em Ciências Criminais, Especialista em Perícia e Peritos, Pesquisadora na área de Segurança Pública, Instrutora na área de Segurança Pública e Privada


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Equipe Âmbito Jurídico

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