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Política criminal no fim da história

No início dos tempos modernos, aqueles que se diziam de esquerda proclamaram que o problema do crime somente seria resolvido com o fim da desigualdade social, ou seja, com o fim da sociedade capitalista. Do outro lado, aqueles que eram chamados de direita, tratavam o problema com rigor penal, ou seja, com a prisão daqueles que chamavam de criminosos.

Passado algum tempo, com o fracasso do rigor penal, o discurso da desigualdade social ganhou a opinião pública confundindo pobreza com crime. A direita, então, incorporou na sua prática o discurso da esquerda. Continuou tratando o problema do crime como uma questão de polícia, mas justificava seu fracasso afirmando que o crime tem causas sociais complexas:  enquanto não se acabar com a desigualdade social, o crime não vai acabar.

Com mais um pouco de tempo, a esquerda abandonou o socialismo, ganhou governos e incorporou ao seu discurso a prática da direita. Continuou proclamando que o problema do crime somente seria resolvido com o fim da desigualdade social, mas o tratou como uma questão de polícia: depois que o crime ocorre, prende-se o criminoso.

Hoje, quando o assunto é política criminal, esquerda e direita se misturam e confundem a opinião pública, pois tratam o problema do crime exclusivamente como uma questão de polícia, embora paradoxalmente proclamem que se trata de uma questão social. O resultado dessa contradição, todos sabemos: leis penais mais severas, mais policiais nas ruas, cadeias superlotadas, mais crimes, mais insegurança.

Contudo, algo de novo está acontecendo. Além do fim da polarização ideológica direita-esquerda, aqueles que governam estão percebendo que não existe relação de causalidade entre crime e pobreza, sendo possível atingir níveis razoáveis de segurança pública na sociedade capitalista. Para tanto, estão realizando ações preventivas, sem aumentos de impostos e de acordo com a realidade concreta de cada situação. Estão descobrindo que é melhor prevenir do que remediar. No caso do problema do crime: é melhor desenvolver ações preventivas do que prender depois.

Exemplos dessas ações preventivas estão sendo noticiadas pela imprensa. Entre elas: fechamento de bares, campanha de desarmamento, central de polícias, programas de renda mínima, instalação de câmaras, atividades culturais e esportivas, abertura de escolas nos fins de semana, pacote social, criação de conselhos fiscais etc.

Pelo que está sendo noticiado, essas ações estão realizando aquilo que o rigor penal promete, desde o tempo em que existia direita e esquerda, mas não cumpre; isto é, redução das taxas da criminalidade comum. Por exemplo, segundo a revista ÉPOCA (nº 359 – 04/04/05), o fechamento de bares adotado em Diadema, na Grande São Paulo, reduziu em 67% os atendimentos em prontos-socorros, em 36,5% os casos de violência contra a mulher e em 23,6% o número de assassinatos.

É preciso repetir, reduziu em 35% os casos de violência contra a mulher. Resultado superior a todas as alterações na legislação penal inspiradas no discurso do rigor penal.

Tem mais. Ainda segundo a mesma fonte, com a campanha de desarmamento, desenvolvida desde julho de 2004, foram recolhidas até agora, em todo o país, mais de 218 mil armas. Em São Paulo, o índice de morte violenta por arma de fogo caiu 18%. Em Curitiba, a queda foi de 27%.

A boa nova continua, na mesma reportagem: o projeto Esporte à Meia-Noite desenvolvido em Planaltina-DF reduziu o número de estupros em 50%, o de roubos em 52,38% e o de lesão corporal em 75%; a instalação de câmeras em Praia Grande, litoral paulista, reduziu a criminalidade em 39%; em Resende-RJ, a criação de conselhos locais, onde a população é atendida por advogados e estagiários e apresenta suas queixas, reduziu a taxa de homicídios em 63%, de estupros em 91%, roubos 41% e contravenções 72%; em Belo Horizonte, no Morro das Pedras, o pacote social que inclui oficinas de prevenção ao uso de drogas e doenças sexualmente transmissíveis até cestas básicas e policiamento reforçado reduziu a taxa de homicídios em quase 50% etc.

Em 1845, Karl Marx profetizou o fim da história, pois a luta de classes chegaria ao fim com a vitória da esquerda. Em 1989, com a queda do muro de Berlim, Francis Fukuyama confirmou o fim da história, mas com a vitória da direita. Muitos não concordam com o fim da história; outros tantos, com a luta de classes como motor da história. Contudo, uma coisa é certa: com o fim da polarização ideológica entre capitalismo e socialismo está surgindo a possibilidade de uma nova abordagem ideológica para o problema do crime. A prisão não é eficiente. O discurso da igualdade social também não. Novas estratégias públicas para a diminuição da violência (política criminal) estão surgindo e com elas renasce a esperança na construção de uma sociedade livre, igualitária e fraterna.

Então é isso, no fim da história, estamos descobrindo que o problema do crime não é exclusivamente uma questão de polícia e muito menos conseqüência da desigualdade social. É possível reduzir os índices de violência urbana com ações preventivas. Tudo depende da eficiência daqueles que governam os Municípios, os Estados e a União – daqueles que são escolhidos pelo voto popular. Enfim, depende de nós, cidadãos assustados com a violência urbana.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Edison Miguel da Silva Jr

 

Procurador de Justiça em Goiás

 


 

Equipe Âmbito Jurídico

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