Processo administrativo ambiental: Fase apuratória e executiva


Resumo: A abordagem refere-se a breves linhas acerca do procedimento para apuração da prática da infração administrativa ambiental, em conformidade com a Lei nº 9.605/1998, o Decreto nº 6514/2008 e a IN nº 14/2009. Inicialmente esclarece-se acerca das fases do processo de apuração da responsabilidade ambiental, abordando-se ainda a incidência da prescrição. Após, com a formação da coisa julgada administrativa, inicia-se a fase executiva extrajudicial. Aborda-se neste momento a ocorrência da prescrição da pretensão executória.
A Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Já o Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente e estabelece o regramento para que sejam apuradas tais infrações. Tal Decreto é regulamentado pela Instrução Normativa nº 14, de 15 de maio de 2009.


No procedimento administrativo sancionador observam-se duas fases: a fase apuratória e a fase executiva. No primeiro momento, verifica-se a ocorrência da infração ambiental, com a lavratura do auto de infração e termos correlatos, consistentes em Termo de Embargo e Interdição, Termo de Apreensão e Depósito, Termo de Destruição, Termo de Demolição, Termo de Doação e Termo de Soltura de Animais, conforme a natureza da infração. O processo será instaurado na unidade federativa do local da infração.


Posteriormente, é conferido ao autuado a possibilidade de apresentar suas razões de defesa, no prazo de 20 dias, contados da data em que tomou ciência da autuação.


Tal ciência poderá se dar pessoalmente, caso o autuado esteja presente no momento da ação fiscalizatória, por representante, por carta registrada com aviso de recebimento ou ainda por publicação de edital, caso o autuado encontre-se em local incerto ou não for localizado em seu endereço.


A área de fiscalização, percebendo que a conduta praticada pelo autuado constitui também prática de crime ambiental, deverá promover a comunicação ao Ministério Público, acompanhado de toda documentação pertinente, bem como histórico de infrações do autuado. Paralelamente à apuração da ocorrência da infração administrativa ambiental, ocorrerá a persecução penal pelo Ministério Público pelo cometimento pelo infrator de crime ambiental.


Voltando ao âmbito administrativo, após a apresentação da defesa, de acordo com a IN 14/2009, haverá  tramitação atinente à confecção de pareceres técnicos, análises jurídicas pertinentes e saneamentos correlatos, que culminarão com o julgamento do auto de infração pela autoridade julgadora. Trata-se de autoridade de nível superior, servidor público, designado pelo Superintendente do IBAMA, com atribuições previstas no art. 2º da IN 14, consistentes em:


“I – homologar providências decorrentes de Notificações das quais não decorram a lavratura de autos de infração.


II – decidir motivadamente sobre produção de provas requeridas pelo autuado ou determinadas de oficio no âmbito dos processos de sua competência para o julgamento;


III – decidir sobre o agravamento de penalidades de que trata o art. 11 do Decreto nº 6.514, de 2008 no âmbito dos processos cujo julgamento seja de sua competência;


IV – julgar as infrações em primeira instância cujo valor da multa atribuído no auto de infração seja de até R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais); (com redação dada pela IN 27/2009)


V – apreciar pedidos de conversão de multa, cujo valor da multa atribuído no Auto de Infração seja de até R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), decidindo motivadamente sobre seu deferimento ou não; e


VI – apreciar pedidos de parcelamento de multas no valor de até R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), decidindo sobre seu deferimento ou não.”


A Instrução Normativa nº 14/2009, que revogou a IN nº 08/2003, incluiu duas autoridades técnicas até então inexistentes na estrutura do IBAMA: a equipe técnica e a autoridade julgadora. A Equipe técnica consiste em equipe criada para atendimento processual das fases do procedimento administrativo apuratório, atinente à intimações, notificações, elaboração de pareceres técnicos e saneadores, juntada de documentações e publicações pertinentes.


Uma vez julgado o auto de infração, poderá o infrator apresentar recurso, no prazo de 20 dias. Não recorrendo, ocorre o trânsito em julgado administrativo,  no 21º dia após a intimação.


Na fase apuratória, a administração submete-se ao prazo prescricional de cinco anos para averiguar a prática da infração, a contar da data da lavratura do auto de infração. Submete-se também à observância do lapso prazal trienal, que ocasiona a ocorrência da prescrição intercorrente, consistente na paralisação do processo por mais de três anos, sem que tenha havido qualquer movimentação processual imputável à administração. 


Há 04 hipóteses de interrupção da prescrição, três delas previstas no Decreto nº 6514/2008 e a última consignada na Lei nº 9873/1999, após alteração impressa pela Lei nº 11.941/2009, consistentes no recebimento do auto de infração ou pela cientificação do infrator por qualquer outro meio, inclusive por edital; pela prática de qualquer ato inequívoco da administração que importe apuração do fato; pela decisão condenatória recorrível ou ainda pela prática de qualquer ato inequívoco que importe em manifestação expressa de tentativa de solução conciliatória no âmbito interno da administração pública federal.


Respeitado o lapso prazal garantido para a apuração da prática da infração ambiental pela administração e homologado o auto de infração, com a formação da coisa julgada administrativa,  inicia-se a fase executória extrajudicial, para que seja possibilitada a persecução do valor da multa atribuído ao auto de infração.


Em tal fase, não mais se questiona, administrativamente, a motivação da aplicação da penalidade, pois a discussão jurídica acerca da legalidade da autuação, bem como dos paramêtros para aplicabilidade e seus limites foram já abordados na fase apuratória, em que se conferiu ao autuado a oportunidade de oferecer defesa, produzir provas e ainda recorrer, caso descontente com o julgamento proferido pela autoridade julgadora. Tendo o administrado uitlizado-se de tais garantias, com a formação da coisa julgada admistrativa, não resta mais local para discussão acerca da formação do crédito a ser perseguido pela administração.


Esgotando-se a possibilidade de interposição de recurso, o autuado será intimado para o pagamento do débito em 05 dias, momento em que lhe será concedido desconto de 30% sobre o valor da multa. Não efetuando o pagamento, o débito será inscrito no CADIN. De acordo com o art.  160 da IN 14, para que se faça a inclusão no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal, o processo deverá ser remetido à unidade administrativa de jurisdição do domicílio do autuado.


Tal remessa dos autos à unidade jurisdicional do domiciliado tem o condão de facilitar os procedimentos de cobrança, bem como para possibilitar a propositura de ação de execução fiscal.


Neste momento, o pronunciamento jurídico, bem como as decisões administrativas referentes ao auto de infração já foram tomadas pela Superintendência de origem, não cabendo à Superintendência que recebe os autos com o fito de inscrição no Cadin exercer qualquer juízo meritório sobre os autos do processo. Percebendo algum setor, ou a própria Procuradoria, que pode ter ocorrido razão para nulidade do processo em sua fase apuratória, deverá levantar a questão e remeter os autos para a Superintendência de origem, para que seja analisada por seu corpo jurídico ou técnico, a depender do aspecto suscitado. Razões de mérito, discricionárias ou entendimento jurídico divergente não devem ser levantados pela Superintendência receptora dos autos, sob pena de se revestir tal conduta de feições correicionais, atribuição não conferida a nenhuma Superintendência do IBAMA. 


Nesta fase, poderá ser levantada a ocorrência de prescrição da pretensão executória, a ser analisada pela Procuradoria receptora dos autos para inscrição no Cadin, consistente na observância do prazo de 05 anos, a contar do julgamento definitivo da infração, para persecução do crédito. A Lei nº 9.873/1999, em seu artigo 1º, preleciona que com a constituição definitiva do crédito não tributário, após o término regular do processo administrativo, restará submetida a administração ao prazo de 05 anos para a interposição de ação de execução fiscal, relativa a crédito decorrente da aplicação de multa por infração à legislação em vigor.


A Orientação Jurídica Normativa n.º 06/2009/PFE/IBAMA, que possui aplicabilidade vinculante no âmbito das procuradorias junto ao IBAMA, relata que:


“após o julgamento definitivo da infração, caso o interessado não pague a multa administrativa no prazo previsto na Lei n.º 8.005/1990, inicia-se a contagem do prazo prescricional de cinco anos da pretensão executória, em razão do princípio da simetria e consoante previsão do Decreto n.º 20.910/1932.”


Assim, escoado o prazo de cinco anos, contados a partir da data em que houve a consolidação da multa aplicada, sem que tenha havido qualquer causa suspensiva ou interrruptiva do prazo prescricional, opera-se a prescrição da pretensão executória.


Neste caso, deverá a Procuradoria Federal junto ao IBAMA receptora dos autos opinar pela ocorrência da prescrição da pretensão executória, sugerindo a baixa nos registros pertinentes, bem como a apuração de responsabilidade funcional daquele que deu causa, submetendo os autos ao Superintendente, que declarará a prescrição e determinará as dilligências pertinentes. Após, devem os autos ser remetidos para a unidade de origem, para ciência e verificação de existência de outras medidas a serem adotadas.


Quanto à apuração da responsabillidade funcional daquele que deu causa à prescrição, deverá ser afastada tal averiguação quando a ação de execução fiscal deixou de ser interposta por não atingir o valor mínimo estabelecido para seu ajuizamento. No caso de créditos originados de multas aplicadas em decorrência do poder de polícia, em que se inserem as multas administrativas aplicadas pelo IBAMA, tal valor é de R$ 500,00 (quinhentos reais). Leia-se a Portaria n.º 915, de 16 de setembro de 2009, cujo artigo 3º traz a seguinte disposição:


“Art. 3º Na cobrança de créditos das autarquias e das fundações públicas federais, ficam os Procuradores Federais dispensados de efetuar a inscrição em dívida ativa, do ajuizamento de ações e da interposição de recursos, bem como da solicitação de autorização para requerimento de extinção da ação ou de desistência dos respectivos recursos judiciais, quando o valor atualizado do crédito for inferior ou igual a R$ 1.000,00 (mil reais), ressalvados os casos relativos a créditos originados de multas aplicadas em decorrência do exercício do poder de polícia, hipótese na qual o limite referido fica reduzido para R$ 500,00 (quinhentos reais).” (G.N.)


Sendo assim, se o valor da multa aplicada era baixo e nos 05 anos seguintes não atingiu o patamar de R$500,00, tal fato não poderá ser imputado a servidor.


Por fim, resta lembrar que, caso haja necessidade de reparação de dano ambiental pelo autuado, esta obrigação deve ser tutelada pela administração, que poderá ajuizar ação civil para sua reparação, independente da ocorrência da prescrição, tendo em vista ser a reparação do dano ambiental obrigação imprescritível.



Informações Sobre o Autor

Gabriela Pereira Franco

Procuradora Federal, Coordenadora Estadual da PFE/IBAMA-DF, Especialista em Direito Público pela Universidade de Brasília. Brasília/DF


Equipe Âmbito Jurídico

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