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Racionamento de energia, constitucional ou não?

O Brasil está hoje em um compasso de
espera… De um lado está a sociedade civil, que se mantém no aguardo das
contas de energia e do impacto de eventuais sobretaxas e valores comprados no
MAE (para os empresários). Alguns seguem acreditando que não temos mesmo uma
crise de energia, mas sim um tarifaço disfarçado.
Outros, porém, embora entendam a gravidade da situação, esperam o mesmo que
nosso governo: a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o assunto. A Ação
Declaratória de Constitucionalidade nº 9, impetrada
pela Advocacia Geral da União, deverá ser julgada na próxima semana e será um
divisor de águas. Para alguns é iminente a declaração da constitucionalidade
pelo STF da Medida Provisória 2.152-2, principalmente, em virtude de já
existirem liminares derrubadas por alguns TRF em nosso país. Esquecem-se,
porém, que a grande maioria das liminares tem sido confirmadas e uma ao menos,
concedida pelo juiz Salem Jorge Cury, da 2ª Vara
Federal de Marília em
São Paulo, mantida na íntegra pela desembargadora
Cecília Marcondes, do Tribunal Regional Federal de São Paulo, vale para todo o
Brasil e suspende os cortes de luz e a cobrança de
sobretaxa de energia, medidas previstas no plano de racionamento do governo
federal.

Logo, até a decisão do Supremo, dois
dos instrumentos abusivos das medidas governamentais estão afastados de serem
aplicados até o momento. No entanto, o cenário muda muito rapidamente. Em um
seminário realizado pelo Instituto Qualitas em São Paulo nesta
quinta-feira, 21 de junho, estes temas foram discutidos por diversos advogados,
promotores e juízes e, de todas as discussões, chegou-se a um consenso que
entendo ser uma visão mais correta: a queda de algumas liminares no país
deve-se não ao fato não serem manifestamente inconstitucionais parte das
medidas pretendidas pela Câmara de Gerenciamento da Crise Energética, mas ao
simples fato destas liminares basearem-se em MP’s já
revogadas pelo governo. As regras e ameaças aos direitos mudam o tempo todo.
Estamos na terceira medida provisória (2.152-2), temos quinze resoluções da
CGCE (algumas alteradas mais de uma vez), nove decretos (entre os numerados,
não numerados e pessoais) e quatro circulares. Boa parte das
liminares em vigor vieram das primeiras medidas provisórias e, assim, é
natural que algumas sejam derrubadas em virtude da mudança da norma ou da
ameaça que atacavam.

Ainda nesta linha de raciocínio,
entendo como factível que o Supremo Tribunal Federal declare constitucional
parte das medidas governamentais previstas na MP 2.152-2, até mesmo em virtude
da necessidade concreta de racionarmos a energia, dada a
situação de nossos reservatórios e a falta de chuvas, num sistema energético
como o brasileiro, que depende 90% de usinas hidrelétricas. Porém, penso ser
pouco provável que se admita estas sobretaxas e os
cortes punitivos pretendidos, entre outras coisas. Os argumentos para isso são
bem simples: esquecendo que teremos um confisco na cobrança de valores
adicionais a tarifa de energia (que deve guardar estrita
ligação com custo do serviço público oferecido e mais uma parcela pela sua
distribuição), a MP 2.152-2 deixa claro que esta sobretaxa tem caráter de
sanção, uma vez que o parágrafo 4º de seu artigo 15 diz que os percentuais de
aumento de tarifa não se aplicarão aos consumidores que observarem as
respectivas metas de consumo. Isto significa dizer que há uma multa e isto, em
se tratando de consumo de energia elétrica (que não é ato ilícito) é
inconstitucional. Já o corte punitivo é outro flagrante ataque à Constituição
Federal: distribuição de energia elétrica é considerada serviço público
essencial (previsto como tal pela Lei 7.783/89, a Lei de Greve, em seu artigo
10, I) e não pode ser suspenso desta maneira. Nossos tribunais têm entendido,
inclusive, que mesmo os inadimplentes não podem ter sua energia cortada, o que
torna ainda mais inimaginável o abuso de se cortar a energia de pessoas que
estão pagando pelo serviço.

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Resta então que, se é necessário
racionar energia, se faça isto sem penalizar ainda mais a população, com
medidas de exceção em total desacordo com a nossa Carta Magna. E, ainda que se
admita possíveis tais situações, nada poderá afastar a
reparação dos danos por estas medidas de contenção de consumo, uma vez que o
Estado falhou com seu dever máximo de prover seu povo com a energia necessária,
venha ela de que modo for. Esta não é uma crise imprevista, ao contrário e isto
é público e notório. Só se surpreende quem quer…

 


 

Informações Sobre os Autores

 

Sérgio Ricardo M. Gonçalves

 

Advogado da Correia Lopes e Gonçalves
Advogados Associados

 

Renato M. S. Opice Blum

 

Advogado e economista; Professor da FGV, PUC, IBTA/IBMEC, ITA/CTA (convidado) e outras; Árbitro da FGV, da Câmara de Mediação e Arbitragem de São Paulo (FIESP) e do Tribunal Arbitral do Comércio; Presidente do Conselho de Comércio Eletrônico da Federação do Comércio/SP; Fundador e ex-Presidente do Comitê de Direito da Tecnologia da Câmara Americana de Comércio (AMCHAM); Autor / Colaborador das Obras: “Direito Eletrônico – a internet e os tribunais”, “Novo Código Civil – questões controvertidas”, “Internet Legal”, “Conflitos sobre Nomes de Domínios”, “Comércio Eletrônico”, “Direito & Internet – aspectos jurídicos relevantes”, “Direito da Informática – temas polêmicos”, “Responsabilidade Civil do Fabricante e Intermediários por Defeitos de Equipamentos e Programas de Informática”, “O Bug do Ano 2000 – aspectos jurídicos e econômicos” e outras.

 


 

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Equipe Âmbito Jurídico

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