Iniciaremos a partir deste artigo um trabalho de breves comentários sobre a Proposta de Reforma Tributária, PEC 233/08, em discussão no Congresso Nacional.
Ao contrário do anunciado na exposição de motivos, o novo Sistema Tributário irá tornar mais complexa a legislação e elevará a carga tributária. Sacramenta o regime de ocultação da real carga tributária e, a pretexto de combater a “guerra tributária” (a mensagem refere-se, equivocadamente, à “guerra fiscal”), institui como regra a tributação no destino, mas com exceções que, por sua vez, comportam novas exceções casuísticas a demandar incríveis providências burocráticas.
Abordaremos, neste primeiro artigo, o perfil do IVA-F, que de IVA só ostenta o nome. Não se trata de imposto sobre o valor agregado como sugere a sua denominação. A não-cumulatividade continua sendo obtida por meio de mecanismo contábil de crédito do imposto (decorrente da entrada de mercadorias e serviços) e o débito do imposto (decorrente da saída de mercadorias e serviços), como no atual ICMS.
Sobre esse novo imposto, que irá substituir o PIS, a COFINS e a CIDE, a PEC pouco adianta.
Limita-se a outorgar à União competência para instituir o imposto sobre “operações com bens e prestações de serviços, ainda que as operações e prestações se iniciem no exterior” (inciso VIII do art. 153 da CF). Não repete a mesma expressão utilizada pela similar estadual, IVA-E, que continua consagrando a nomenclatura atual “operações relativas à circulação de mercadorias”. Será que o IVA-F pretende desprezar o caráter mercantil do imposto, fazendo-o incidir sobre simples movimentação física do bem? Como se sabe, mercadoria é o bem objeto de comércio. Não há entre este e aquela distinção de natureza substancial, mas, apenas a de destinação. Este aspecto deverá ser debatido no âmbito da Comissão de Reforma para bem aclarar a questão.
Outrossim, o novo imposto federal será não-cumulativo na forma dos incisos I e IV do § 6º. E, para evitar qualquer questionamento, o inciso V do § 6º consagra expressamente a tributação por dentro, que tem o condão de transformar uma alíquota nominal de 25%, por exemplo, em uma alíquota real de 33,35%, ou, de 18% em 21,38%, tudo na contramão do princípio da transparência tributária, que está previsto no § 5º do art. 150 da CF. O § 7º, por sua vez, prescreve que “considera-se serviço toda e qualquer operação que não constitua circulação ou transmissão de bens”. Cometeu-se um equívoco elementar confundindo o gênero (bens) com a espécie (bens imateriais), a menos que a dubiedade redacional tenha sido proposital.
O certo é que o novo texto constitucional permitirá a bi-tributação jurídica em relação aos bens corpóreos (IVA-E e IVA-F) e tri-tributação jurídica em relação aos serviços (IVA-E, IVA-F e ISS). Os serviços tributados pelos estados estão descriminados na Constituição, ao passo que, os tributados pelos municípios estão catalogados em Lei Complementar. Não se sabe como serão os serviços onerados pela União (IVA-F). O princípio constitucional da discriminação de impostos, que não configura cláusula pétrea, sofrerá exceções, vale dizer, as limitações ao poder de tributar serão mais flexibilizadas. No passado, já tivemos a bi-tributação de combustíveis líquidos e gasosos, exceto óleo diesel (ICMS e IVV).
Essa situação confusa foi gerada, porque a idéia inicial era a de incorporar o IPI no IVA-F e de incluir o ISS no IVA-E. Não aconteceu uma coisa, nem outra, por conta de pressões políticas. Porém, na formatação desses novos impostos, federal e estadual, não foi levada em conta a nova realidade.
Tudo indica que o IVA-F vem à luz para constitucionalizar as contribuições sociais substituendas, totalmente desvirtuadas, desde a origem, com o desvio sistemático do produto de suas arrecadações.
Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.
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