INTRODUÇÃO
O objeto do presente estudo são os elementos caracterizadores da responsabilidade civil do advogado e, conseqüentemente, algumas situações nas quais se poderá atribuir o dever de reparar os danos por este causados no exercício da profissão.
A responsabilidade profissional, hodiernamente, tem sido cada vez mais exigida. É cada vez mais corrente a idéia de que o advogado deve adotar uma postura ética, em consonância com as prescrições do Estatuto do Advogado e as demais leis esparsas. Dessa forma, os advogados que malferirem essas normas devem ser responsabilizados por eventuais danos que venham a causar a seus clientes.
No primeiro capítulo da monografia foi feita uma breve análise acerca da evolução da responsabilidade civil, seguida de um panorama sobre os principais caracteres do instituto, seus pressupostos e elementos básicos.
No segundo capítulo procurou-se demonstrar como se sustenta a responsabilidade específica dos advogados, iniciando-se com uma abordagem acerca dos deveres impostos a estes profissionais pela legislação pátria.
Em um terceiro momento abordou-se diretamente a responsabilidade do advogado segundo o código de Defesa do Consumidor, com base na doutrina civilista e consumerista.
No último capítulo foi elaborada uma pesquisa jurisprudencial com vistas a demonstrar a posição dos Tribunais em relação à temática enfocada neste trabalho monográfico, dando azo às considerações finais em seguida empreendidas.
2. BREVE ESCORÇO HISTÓRICO DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Visando obter uma melhor análise dos aspectos que regem a responsabilidade civil, mais precisamente a responsabilidade civil do advogado, é necessário expor, em uma rápida análise, a evolução histórica da responsabilidade civil e, conseqüentemente, da reparação do dano, para conhecer suas fontes, origem e principalmente sua situação atualmente.
A história da responsabilidade civil confunde-se, até certo ponto, com a ‘história da pena’, o que só começa a se alterar, mesmo moderadamente, no direito Romano.[1]
É notório que o Direito Romano influiu de forma a contribuir com várias modalidades do direito, inclusive na responsabilidade civil, entretanto, não chegou a elaborar nenhuma teoria sobre o assunto, como destaca Caio Mario da Silva Pereira:
Não chegou o direito romano a construir uma teoria da responsabilidade civil, como aliás, nunca se deteve na elaboração teórica de nenhum instituto. Foi todo ele construído no desenrolar de casos de espécie, decisões dos juizes e dos protetores, respostas dos jurisconsultos, constituições imperiais que os romanistas de todas as épocas, remontando às fontes e pesquisando os fragmentos, tiveram o cuidado de utilizar, extraindo-lhe os princípios e desta sorte sistematizando os conceitos. Nem por isto, todavia, é de se desprezar a evolução histórica da responsabilidade civil no direito romano. Em verdade muito do que o direito moderno apresenta vai-se enraizar na elaboração romana. Até mesmo ao evidenciar os contrastes, as fontes prestam não despicienda contribuição.[2]
Na antiguidade a pena tinha função de reparar o fato cometido pelo infrator, pois quando o mesmo era punido, considerava-se retratado seu erro perante toda a sociedade. Seguindo esse raciocínio percebe-se que a pena tinha como fito uma espécie de “purificação” do infrator, como assevera Hélio Apoliano: “Assim a pena funcionava como um purificador do infrator. Dado importante é que a pena, na sua fase embrionária, era coletiva, podendo atingir até mesmo a família do condenado.”[3]
Apesar da posição majoritária de que através do direito romano não se construiu nenhuma teoria específica e direta a respeito de responsabilidade civil, foi através daquele obteve-se um grande mérito na diferenciação entre “pena” e “reparação”.
Em se tratando da história da responsabilidade civil, pode-se destacar que a mesma passou a evoluir a partir do momento em que difundiu-se a sua aplicação. Desde o princípio “The King does not Wrong”, segundo o qual as decisões do Estado eram soberanas e este não era responsabilizado por seus atos, até a responsabilidade do Estado, por todos os seus agentes.
2.1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Antes de adentrar no mérito da presente monografia, cumpre ainda conceituar o que vem a ser responsabilidade civil. Adota-se, para tal, os escólios de Savatier, mesma teoria adotada por Silvio Rodrigues em sua obra. Assim, Responsabilidade Civil vem a ser obrigação que pode forçar uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou fato de pessoas ou coisas que dela dependam[4].
Esta definição não é aplicável, por óbvio, a todos os casos, mas é a que melhor representa, em nosso sentir, o que vem a ser a Responsabilidade civil. Ademais, o que não se deve perder de vista é que em qualquer relação jurídica, existindo violação a algum bem jurídico, tal ato é considerado lesão a outrem e o autor ou dependente seu tem o dever de reparar o dano sofrido, seja ele moral ou material.
É importante sempre diferenciar o dano sofrido de um mero aborrecimento, pois este segundo não enseja indenização. A grande diferença entre os dois é que no mero aborrecimento não há violação a um bem jurídico, nesta linha de pensamento surge um questionamento: o que vem a ser mero aborrecimento? Já que os dois conceitos estão tão próximos. O mero aborrecimento seria os transtornos diários inerentes ao cotidiano de uma sociedade complexa como esta que vivemos. Dentre estes, é importante lembrar que o principal fator que leva ao aborrecimento é a falta de comunicação, que muitas das vezes é confundida com lesão a um direito.
No atual Código Civil, a responsabilidade civil é tratada com mais profundidade do que na legislação de que vigorou desde 1916, apesar do atual manter a mesma estrutura do anterior. Pelo Código de 2002, tem-se normatização acerca da responsabilidade civil nos arts. 927 e seguintes.
Além dessa maior profundidade com que é tratada a responsabilidade civil, no atual Código Civil foi acrescentada a possibilidade de que se obtenha uma indenização por um certo dano exclusivamente moral, como podemos notar na definição de ato ilícito dada pelo art. 186, que em seu texto prevê: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
Em se tratando da responsabilidade civil é importante saber qual a conduta que se reflete em obrigação de indenizar e o agente causador da mesma, como retrata Venosa:
Na realidade, o que se avalia geralmente em matéria de responsabilidade é uma conduta do agente, qual seja, um encadeamento ou série de atos ou fatos, o que não impede que um único ato gere por si o dever de indenizar.[5]
Há, todavia, a possibilidade de que terceiros venham a ser chamados a reparar o dano causado por pessoas que tenham para com eles uma relação de dependência, conforme delineia Venosa: “No direito civil, terceiros somente podem ser chamados a indenizar quando a lei expressamente o permitir e assim aponta.”[6]
Em um conceito mais amplo a responsabilidade civil pode ser caracterizada como a obrigação de reparar algum dano feito a uma certa pessoa ou bem (patrimônio). Também são passíveis de reparação os atos danosos cometidos em face de interesses coletivos e até transindividuais, sejam estes difusos ou coletivos (stricto sensu).
Nesse sentido, as palavras de Rui Stoco:
A responsabilidade não é fenômeno exclusivo da vida jurídica, antes se liga a todos os domínios da vida social. […] A responsabilidade é, portanto, resultado da ação pela qual o homem expressa o seu comportamento, em face desse dever ou obrigação. [7]
Portanto, não só os atos derivados de relação contratual que ensejam reparação, havendo ainda todas as hipóteses de indenização por danos causados em decorrência de uma situação jurídica que não se mostre ligada por algum vínculo, ou seja, a responsabilidade extracontratual.
2.1.1 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Para que seja configurada a responsabilidade civil, antes de tudo necessita-se que exista uma ação, comissiva ou omissiva, e esta seja qualificada juridicamente, somada a ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado a vítima em face dessa ação ou omissão e que, por fim, exista um nexo de causalidade entre o dano e a ação, visto que, não existe a responsabilidade civil entre ação e dano.
Alguns doutrinadores ainda vislumbram a culpa como elemento essencial da responsabilidade civil. Todavia, não é esse o posicionamento do presente estudo, haja vista que o ordenamento pátrio adotou a responsabilidade subjetiva como regra, mas também admite a responsabilidade objetiva, que prescinde de culpa, em determinadas hipóteses.
Da mesma forma ocorre com a antijuridicidade, pois a despeito de a essência da reparação civil estar centrada no ato ilícito, há casos em que mesmo os atos lícitos ensejam indenização, como nos casos dos arts. 1313, §3º e 1285, ambos do CC/02.
3. A RESPONSABILIDADE DO ADVOGADO
3.1 FUNÇÃO SOCIAL DO ADVOGADO
O papel que o advogado desempenha vai muito além de defender inocentes que estão sendo acusados ou representá-los em juízo. Há que se rechaçar a tese de que o advogado é um simples defensor daquele que está sofrendo uma injustiça. O papel do profissional, legalmente habilitado, vai muito alem desta visão, pois tal profissão é baseada em fundamentos maiores que passam despercebidos aos olhos do homem comum, que não tem a visão que o advogado ao defender um direito particular, está defendendo também a própria ordem jurídica e a coletividade.
A função do advogado é tida como essencial à justiça. E é tão imprescindível que própria Constituição Federal prevê, em seu Art. 133, que: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”
Assim, incumbe aos advogados a prestação de um serviço essencial à administração da justiça, zelando pela boa aplicação das leis e pugnando pela imparcialidade nos julgamentos proferido pelo Judiciário, sempre na defesa do interesse dos seus constituintes.
3.2 OS DEVERES DO ADVOGADO
Os deveres do advogado estão previstos no Estado da Advocacia e da Ordem dos Advogados (Lei 8.906/94) do Brasil complementado com o código de Ética e Disciplina da OAB. São deveres pessoais: a probidade; a lealdade; a delicadeza no trato; a moderação na obtenção de ganhos; e a dignidade de conduta.
A probidade quer significar que o advogado deve ser moderado na obtenção de ganhos, pois advogar não é comerciar, não é negociar coisas materiais, apesar de elas serem discutidas.
Já a lealdade é proveniente das prerrogativas do exercício da profissão. O advogado, no exercício do seu mister, deve ser sempre pautado pela boa–fé, buscando comprovar a verdade dos fatos sem o intuito de fraudar o convencimento dos demais operadores do direito, evitando assim fazer acusações ou defesas sem fundamentos.
O advogado deve sempre prezar em atender seu cliente da melhor forma possível. Impõe-se que trate seus clientes com cordialidade, fineza e é extremamente importante que seja compreensivo. O advogado deve buscar sempre ser um exemplo a ser seguido por seus clientes, colegas de profissão, magistrados ou serventuários da justiça. O advogado não pode jamais comprometer a sua dignidade e seu prestígio profissional.
A dignidade da conduta do advogado esta presente no Código de Ética da OAB, Estatuto da OAB bem como na legislação processual, inclusive com sanções em caso de infração.
O advogado deve ser discreto em seus atos, sem ter o receio de ser considerado impopular na defesa dos interesses legítimos do seu cliente; este deve ser ponderado ao fazer propaganda do seu trabalho, porém a publicidade na advocacia é muito delicada uma vez que é vedada a propagando espalhafatosa e chamativa, com oferta de prestação de serviço. Na advocacia a propaganda é muito restrita, pois só é permitida que se coloque o Nome, área de atuação, registro na OAB, o telefone e o endereço.
Após a breve explanação de esses deveres inerentes ao exercício profissional da advocacia, cumpre adentrar na temática central do trabalho em tela, que se adstringe exatamente à eventual quebra destes pelo advogado, ensejando o dever de reparação civil.
3.3 RESPONSABILIDADE CIVIL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
Após a rápida contextualização acerca da responsabilidade civil e das características do exercício da advocacia, sua função social e uma breve explanação sobre a matéria que rege a responsabilidade civil, resta analisar a responsabilidade civil do advogado.
A base do exercício profissional do advogado é o mandato. É por meio dele que o cliente “contrata” o causídico e que se estabelece entre ambos uma relação de confiança e representação. No dizer de Carlos Roberto Gonçalves:
O mandato é uma das formas de contrato previstas no Código Civil. O mandato judicial impõe responsabilidade de natureza contratual do advogado perante seus clientes.[8]
A responsabilidade do advogado se assemelha à do médico, pois não assume a obrigação de sair vitorioso na causa. As obrigações decorrentes do exercício da advocacia são de meio e não de resultado. Suas obrigações contratuais, de modo geral, consistem em defender as partes em juízo e dar-lhes conselhos profissionais. O que cabe ao advogado é representar o cliente em juízo, defendendo da melhor forma possível os interesses que este lhe confiou. Se tais obrigações são de meio, conforme salientado, basta que sejam executadas com a diligência requerida, para que não se lhe possa imputar nenhuma responsabilidade pelo insucesso da causa.
Segundo Venosa:
As obrigações do advogado consistem em defender a parte em juízo e dar-lhe conselhos profissionais. A responsabilidade do advogado, na área litigiosa, é uma obrigação de meio. Nesse diapasão, assemelha-se à responsabilidade do médico […] O advogado está obrigado a usar de sua diligência e capacidade profissional na defesa da causa, mas não se obriga pelo resultado, que sempre é falível e sujeita às vicissitudes intrínsecas ao processo. Sua negligência ou imperícia pode traduzir-se em várias de várias formas. A ineficiência de sua atuação deve ser apurada no caso concreto. O que se repreende é o erro grosseiro, inescusável no profissional. Isto se aplica a qualquer ramo profissional.[9]
Assim, tem-se que o advogado só responderá pelos danos efetivamente causados ao cliente em decorrência de negligência na sua atuação. Não é o mero fato de não ganhar uma causa que dará azo à reparação pelos supostos danos suportados pelo constituinte. Assim apregoa Venosa:
O advogado que por comprovada negligência não cumpre as obrigações assumidas em contrato de mandato judicial deixam de prescrever o direito de seu constituinte a perceber prestações devidas com o dever de indenizar o dano causado em face de sua conduta culposa.[10]
Neste sentido, ressalte-se que o art. 32 do Estatuto da Advocacia dispõe que o advogado é responsável por dolo ou culpa no exercício profissional. Assim, conclui-se que o advogado não se vincula a uma obrigação de resultado, ressalvados os casos onde o mesmo é contratado para elaborar contratos ou minuta de uma escritura pública, ou ainda quando assume uma responsabilidade de ofício de uma “atividade administrativa típica de despachante burocrático”[11].
Só responde o advogado nos atos cometidos por ele no exercício da sua função por erros de fato e de direito. Em se tratando de erros de direito necessita-se que estes tenham um cunho de gravidade elevada para que seja atribuída a responsabilidade civil indenizatória ao advogado. Dentre os erros graves pode-se destacar: a desatenção à jurisprudência corrente; o desconhecimento do texto expresso de lei de aplicação freqüente ou cabível no caso; além da interpretação abertamente absurda.
Acerca das obrigações do advogado, Venosa leciona:
As obrigações do advogado consistem em defender a parte em juízo e dar-lhe conselhos profissionais. A responsabilidade do advogado, na área litigiosa, é uma obrigação de meio. Nesse diapasão, assemelha-se à responsabilidade do médico […] O advogado está obrigado a usar de sua diligência e capacidade profissional na defesa da causa, mas não se obriga pelo resultado, que sempre é falível e sujeita às vicissitudes intrínsecas ao processo. Sua negligência ou imperícia pode traduzir-se em várias de várias formas. A ineficiência de sua atuação deve ser apurada no caso concreto. O que se repreende é o erro grosseiro, inescusável no profissional. Isto se aplica a qualquer ramos profissional.[12]
Conforme acima salientado, o art. 32 do Estatuto da Advocacia prevê que o advogado é responsável por dolo ou culpa no exercício profissional. Assim, tem-se que o advogado é o “primeiro juiz” da causa. Ao propor uma ação, deverá em primeiro lugar considerar as possibilidades de êxito da demanda e, conseqüentemente, escolher o procedimento adequado para o caso. Hodiernamente, todavia, percebe-se que o ajuizamento de ações inviáveis ou pelo procedimento indevido não é de todo uma exceção. As causas devem ser perquiridas, pois tais ações levam prejuízo aos clientes, afogam o Judiciário e depõem contra a própria classe profissional.
Como resultado dessa má escolha de procedimento ou desatenção do advogado no ajuizamento da ação, pode o outorgante tornar-se sucumbente mesmo que esteja ele com o “melhor direito”. Como conseqüência desse caso é justo que o profissional incompetente seja responsabilizado pelos prejuízos oriundos da demanda para com o seu cliente.
Outro erro considerado de cunho grave é a perda de prazos, seja para resposta ou para contestação, visto que há previsão legal para que o advogado não os ignore. Mesmo que haja alguma indefinição acerca de qual o prazo, o advogado deverá sempre optar pela que traga menor prejuízo ao cliente, conforme assevera Carlos Roberto Gonçalves: ”Na dúvida entre o prazo maior e o prazo menor, deve a medida judicial ser tomada no prazo menor, para não deixar nenhuma possibilidade de prejuízo ao cliente.”[13]
Já destacou-se que as obrigações do advogado são de meio e não de resultado. A doutrina é uníssona nesse sentido, como regra. Há, contudo, uma parcela da atuação advocatícia que, em princípio são caracterizadas como obrigações de resultado. Isto se dá, repise-se, quando um advogado aceita patrocinar uma causa, e através desta é elaborado um contrato ou uma escritura, ele assume o compromisso, em tese, de chegar a um determinado resultado.
Deve-se atribuir responsabilidade de indenização do advogado nos casos em que ele comete erros graves que provocam prejuízos ao seu cliente. Tal gravidade é analisada de acordo com o caso em questão. Pode-se citar alguns erros específicos, como: perda de prazos de contestação e de resposta; uso de um remédio processual de forma inadequada na demanda; se o advogado vai contra a letra da lei; entre outros.
Em suma, o advogado deve responder pelos erros de fato e de direito cometidos durante a sua atuação no caso. Todavia, nos casos onde o advogado atua com cautela e prudência mas mesmo assim não se sagra vitorioso na ação, mesmo assim lhe são devidos os honorários, visto que ele cumpriu com sua Também neste caso não há que se falar em reparação ao cliente, devido à aplicação empreendida pelo advogado , que sempre atua na obrigação de zelar pela resolução da demanda. Há diversas decisões no sentido de que sejam pagos os honorários advocatícios caso o advogado atue com prudência e diligência no processo, mesmo que não seja vencedor da lide.
Registre-se, à guisa de complementação, que havendo vários advogados, a responsabilidade é considerada conjunta ou solidária, salvo quando for claro que um dos advogados atuou sozinho. Em se tratando de segredo profissional, por seu turno, assim como em outras profissões, responde perante o cliente o advogado que divulgar fatos que soube relativos ao cliente e, dessa forma, acarretar prejuízos a parte.
Em outros casos, onde o advogado age com culpa lato sensu, deve o mesmo reparar o dano. No direito brasileiro, são as seguintes as normas gerais de regência da responsabilidade civil do advogado: 1) Art. 133 da Constituição Federal, que estabelece a inviolabilidade do advogado por seus atos e manifestações no exercício da profissão. É norma de exoneração de responsabilidade, não podendo os danos daí decorrentes serem indenizados, salvo no caso de calúnia ou desacato. Essa peculiar imunidade é imprescindível ao exercício da profissão, que lida com a contradição e os conflitos humanos; 2) Art. 159 do Código Civil, regra básica da responsabilidade civil subjetiva, que permanece aplicável aos profissionais liberais; 3) Art. 32 da Lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia), que responsabiliza o advogado pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa; 4) “Art. 14, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor, que abre importante exceção ao sistema de responsabilidade objetiva, na relação de consumo dos fornecedores de serviço, ao determinar a verificação da culpa, no caso dos profissionais liberais.
Apesar de todos esses casos, ainda assim a desídia pode ser considerada como a falta mais grave a ensejar a responsabilidade do advogado, seja na prescrição de direitos, perda de prazos para contestar o para recorrer, seja na propositura da ação.
3.3.1 PERDA DE CHANCE
A teoria da perda de uma chance surgiu no direito francês. Segundo seus ditames, não se deve atribuir responsabilidade ao advogado que deixou de interpor um recurso que não caracteriza “perda de chance” de vitória. No dizer de Venosa:
Embora o aspecto da perda de chance não seja ainda muito esmiuçado na doutrina brasileira, nota-se que os tribunais têm dado pronta resposta à tese, quando ela faz-se necessária no caso concreto. Importa examinar no caso concreto quais as chances que poderiam beneficiar a vítima. Quando há perda de chance, o que se indeniza é a potencialidade da perda e não se leva em conta a perda efetiva. De qualquer modo, é imperativo que o cliente comprove que tenha sofrido um prejuízo certo e não meramente hipotético, ainda que dentro dos pressupostos da perda da chance.[14]
Assim, só cabe reparação de eventual dano nos casos em que o prejuízo seja demonstrado pelo cliente, ou seja, nas hipóteses em que este demonstra que a não-atuação do advogado o levou a deixar de lograr êxito na causa em questão.
3.4 RESPONSABILIDADE DO ADVOGADO NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR –
Em sede de defesa do consumidor, conforme já salientado anteriormente, a responsabilidade do fornecedor de produtos ou serviços é objetiva. Todavia a situação dos profissionais liberais, dentre os quais os advogados, possui algumas nuances distintivas.
É de fundamental relevância para a conclusão do presente estudo a análise acerca da questão do ônus da prova, quando se trata de responsabilidade do advogado.
O código de Defesa do Consumidor adota como premissa a inversão do ônus da prova, em favor da parte hipossuficiente, que é o consumidor. Tal prescrição normativa encontra-se plasmada no art. 6º, VII, tendo como norte conferir a possibilidade de os consumidores terem acesso às provas necessárias ao bom andamento do processo, que só estão disponíveis para os fornecedores.
Saliente-se, ainda, que o CDC também preconiza como regra geral a responsabilidade objetiva do fornecedor de produtos e serviços. A exceção é o art. 14, §4º, que trata especificamente dos profissionais liberais, adotando a responsabilidade subjetiva como parâmetro.
Cotejando-se esses disciplinamentos, tem-se que a responsabilidade civil do advogado será apurada mediante a prova de que agiu com culpa –subjetiva, mas este poderá ter em face de si a inversão do ônus da prova, posto que os demais comandos normativos da lei de consumo a ele são aplicados.
Nesse sentido, os ensinamentos de Fernando Vasconcelos:
Todas as regras estabelecidas no sistema protetivo do consumidor e direcionadas para o fornecedor de serviços podem e devem ser aplicadas ao profissional liberal, que está inserido também nessa área de prestação de serviços.[15]
Portanto, apesar de alguns defenderem a aplicação isolada do art. 32 do Estatuto da Advocacia e da OAB, no sentido de que as normas consumeristas não seriam aplicáveis à atuação dos advogados, não é esta a melhor exegese a se empreender, conforme se demonstrou alhures.
3.5 JULGADOS SOBRE O TEMA
À guisa de complementação, traz-se à baila os seguintes excertos jurisprudenciais, exemplificativos de tudo o que restou demonstrado na presente pesquisa:
Mandato – Ação de indenização. Relação de consumo inexistente. Não incidência do inciso I do art. 101 do Código de Defesa do Consumidor. Ajuizamento da ação no foro do domicílio do réu. Necessidade. Recurso improvido. Por não se tratar de relação de consumo a que decorre do contrato de prestação de serviços advocatícios, não incide, no caso, a regra do inciso I do art. 101 do Código de Defesa do Consumidor. Destarte, o foro competente para o ajuizamento de ação de indenização pelo cliente contra o advogado é o do domicílio deste, seguindo a regra geral do art. 94 do Código de Processo Civil. (Segundo Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, 5ª Câmara, Agravo de Instrumento 771.946-00/4-SP, Rel. Juiz Luís Carmargo Pinto de Carvalho; j. 21/05/2003; v.u. – Boletim AASP nº 2368, p. 3.078.)
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS À IMAGEM – OBRIGAÇÃO DE MEIO – A obrigação do advogado é de meio e não de resultado e a sua responsabilidade depende da perquirição de culpa, a teor do art. 159 do Código Civil e do art. 14, par. 4º, do CDC. Não havendo a prova da culpa, não há que se falar em responsabilidade do profissional do direito, mormente quando sequer houve a demonstração da existência dos alegados danos e do nexo de causalidade. Sentença parcialmente procedente em primeiro grau. Apelo provido para julga-la totalmente improcedente. (Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, 6ª Câmara Cível, Apelação 598140010, Rel. Des. Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura; j. 28/02/2001; v.u – Júris Síntese.)
PROCESSO CIVIL – Ação de conhecimento proposta por detentor de título executivo. Admissibilidade. Prestação de serviços advocatícios. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. O detentor de título executivo extrajudicial tem interesse para cobrá-lo pela via ordinária, o que enseja até situação menos gravosa para o devedor, pois dispensada a penhora, além de sua defesa poder ser exercida com maior amplitude. Não há relação de consumo nos serviços prestados por advogados, seja por incidência de norma específica, no caso a Lei nº 8.906/94, seja por não ser atividade fornecida no mercado de consumo. As prerrogativas e obrigações impostas aos advogados – como, v.g., a necessidade de manter sua independência em qualquer circunstância e a vedação à captação de causas ou à utilização de agenciador (arts. 31, § 1º, e 34, III e IV, da Lei nº 8.906/94) – evidenciam natureza incompatível com a atividade de consumo. Recurso não conhecido. (Superior Tribunal de Justiça, 4ª Turma, Recurso Especial 532.377-RJ; Rel. Min. Cesar Asfor Rocha; j. 21/8/2003; v.u. – http://www.stj.gov.br/jurisprudencia)
Advogado – Desídia – o advogado que, por comprovada negligência, Não cumpre as obrigações assumidas em contrato de mandato judicial, deixando prescrever o direito de seu constituinte a perceber prestações devidas, tem o dever de indenizar o dano causado em face de sua conduta culposa. [RT 749:267] [20]
Advogado – Prescrição de Ação – erro inescusável – Indenizatória ajuizada contra escritório de advocacia por cliente que perdeu a demanda – pretensão ao ressarcimento do prejuízo sofrido com a sucumbência sob alegação de que houve erro inescusável do causídico ao não argüir a prescrição da ação – Acolhimento – Indenizatória procedente. [RT 123:45] [21]
Advogado – Dano Moral – Negligência na atuação profissional – caracterização – Ação Trabalhista proposta só após o decurso do prazo de prescrição – Impossibilidade, entretanto, de avaliar o direito do reclamante – Indenização pela perda da chance de ver o pleito examinado pelo Judiciário – Modalidade de Dano Moral – Recurso provido para julgar procedente a ação. [1ª TACSP, Ap. 680.655-1 – Martinópolis, Boletim da AASP n. 1.986, p. 23] [22]
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A responsabilidade civil é instituto de grande importância para a manutenção da segurança jurídica, sendo considerada pedra de toque no equilíbrio entre os indivíduos.
O Código de Defesa do Consumidor trouxe importantes inovações em sede de responsabilidade civil dos fornecedores de produtos e serviços, sendo as mais importantes a previsão da responsabilidade objetiva e a possibilidade de inversão do ônus da prova.
Sob o prisma da atuação dos profissionais liberais, há que se estabelecer algumas distinções entre os fornecedores usuais, no que toca à imperativa reparação pelos danos causados em decorrência da prestação de serviço.
Desta forma, aos advogados, como categoria inserida dentre os profissionais liberais, só é imputado o dever de reparar os danos que causarem com culpa. Assim, os atos praticados pelos causídicos devem ser apurados sob o manto da responsabilidade subjetiva, perquirindo-se, pois, a culpa do profissional para que o mesmo seja responsabilizado.
Os principais atos que dão ensejo à responsabilização civil do advogado são relacionados à má técnica empregada na defesa de causas por ele patrocinadas. A perda de prazo, o desconhecimento de lei em vigor, bem como o patrocínio de causa impossível são alguns exemplos de negligência do advogado.
As decisões sobre o tema vêm a corroborar com o entendimento esposado nesta pesquisa, qual seja, o de que as normas consumeristas são aplicáveis à atividade do advogado, mormente no que tange às questões processuais, como a inversão do ônus da prova
É imprescindível portanto, que o advogado tenha o conhecimento técnico das responsabilidades e obrigações que lhe são atribuídas, além de empreender um constante estudo das questões nas quais irá atuar. Deve, ainda, tal profissional, aplicar toda a diligência necessária, para atender satisfatoriamente aos seus constituintes, de modo a não deixar margem a possíveis reclamações de danos causados no exercício do seu mister.
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