Cumpre distinguir, antes de mais nada, o procedimento administrativo do lançamento, do sistema de responsabilização de terceiros pelo pagamento de crédito tributário constituído contra o sujeito passivo natural (contribuinte) ou o responsável tributário (sujeito passivo por força de lei nos termos do art. 128 do CTN).
O procedimento administrativo do lançamento, referido no art. 142 do CNT, é unilateral não comportando o contraditório e ampla defesa apregoado por alguns processualistas. Trata-se de atividade administrativa vinculada tendente à verificação da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, determinação da matéria tributável, cálculo do montante devido, identificação do sujeito passivo e, sendo o caso, propositura de aplicação da penalidade cabível.
Esse procedimento termina com a prática do ato final pelo agente público competente exteriorizado pelo lançamento que, uma vez notificado o sujeito passivo, constitui definitivamente o crédito tributário.
O contribuinte notificado do ato de lançamento tem duas opções: a) promover o pagamento do montante exigido, extinguindo o crédito tributário; b) oferecer resistência à pretensão do fisco, apresentando impugnação ao crédito tributário, dando nascimento ao processo administrativo tributário. Aqui sim, cabe falar na aplicação dos princípios do devido processo legal e do contraditório e ampla defesa.
Enquanto não transitada em julgado a decisão administrativa, a exigibilidade do crédito tributário fica suspensa. Acolhido o recurso do contribuinte em última instância administrativa opera-se a extinção do crédito tributário. Se a decisão transitada em julgado for contrária ao contribuinte, este será notificado a efetuar o pagamento do crédito tributário, no prazo de 30 dias, sob pena de inscrição na dívida ativa, para o fim de execução fiscal.
Na prática, é comum o fisco inscrever na certidão de dívida ativa, como responsáveis solidários, os sócios das empresas devedoras. Na área do INSS, a própria NFLD já consigna os nomes dos sócios como devedores solidários, com base no art. 124, II do CTN c.c o art. 13 da Lei nº 8.620/93. Esse dispositivo legal dispõe que “os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada respondem solidariamente, com seus bens pessoais pelos débitos junto à Seguridade Social”. Por sua vez, prescreve o art. 124, inciso II do CTN que são solidariamente obrigadas “as pessoas expressamente designadas por lei”.
Ora, os sócios são terceiros em relação à sociedade de que participam. A pessoa jurídica não se confunde com as pessoas dos sócios, ressalvados os casos de abusos de personalidade jurídica reconhecidos por decisão judicial (art. 50 do C.C).
Outrossim, não cabe, no caso, a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva só aplicável em relação ao Poder Público e às concessionárias de serviços públicos (art. 37, § 6º da CF).
A solidariedade decorrente de pessoas designadas por lei (art 124, II do CTN) não se presume. Ela só pode ser imputada mediante observância dos requisitos previstos no art 134 do CTN:
“Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:
I- os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores; (…)
VII- os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.”
Vários são os requisitos cumulativos a serem observados: a) a impossibilidade de exigência do crédito tributário da pessoa jurídica; b) a prática de atos ou omissões do sócio que ensejaram o nascimento da obrigação tributária; c) a liquidação da sociedade de pessoas.
Ora, o preenchimento de todos esses requisitos não pode ser verificado unilateralmente pelo fisco. Impõe-se a observância do contraditório e ampla defesa, dentro do principio do devido processo legal.
Não se pode acrescentar na certidão de inscrição na dívida ativa quem não é parte da relação tributária material, ou consignar na NFLD os nomes de sócios como devedores solidários, com base no art. 13 retro citado, sem assegurar ao terceiro da relação tributária o contraditório e ampla defesa.
Como conseqüência da inobservância desse princípio constitucional do contraditório e ampla defesa por parte do fisco, aplicável, também, na esfera administrativa, a execução fiscal é tumultuada com discussão de matérias estranhas ao processo executivo específico, quer por meio de exceção de pré-executividade, quer por meio de preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, quer, ainda, por meio de embargos de terceiros quando a constrição alcançar os bens dos sócios.
Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.
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