Royalties: competência dos estados, do distrito federal e dos municípios para fiscalizar estas receitas

Resumo: Estuda a competência prevista no Ordenamento Jurídico pátrio para o exercício da fiscalização pelos Estados, Distrito Federal e Municípios sobre as receitas oriundas da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais em seus territórios. Aborda os aspectos jurídicos trazidos pela ADI 4606 sobre a Lei do Estado da Bahia e do Decreto que a regulamenta, que versam sobre o controle, fiscalização e arrecadação dos Royalties devidos a aquele Estado. Sobrepuja princípios, dispositivos constitucionais e infraconstitucionais como fundamento ao exercício da fiscalização dos Royalties pelos Entes Federativos. Imprime ligeira análise sobre a receita pública e enquadra os Royalties como receita patrimonial-originária. Conclui pelo total acolhimento da competência dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios em editarem Leis para a fiscalização e gestão dos Royalties, tendo em vista a natureza jurídica desta receita.[1]


Palavras-chave: Royalties. Participações e Compensações Financeiras. Competências Constitucionais. Receitas Originárias.


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Resumen: Estudia la competencia prevista en el Sistema Jurídico Patrio para el ejercicio de la fiscalización por los Estados, Distrito Federal y Municipios en respecto de los ingresos provenientes de la exploración del petróleo o gas natural, los recursos hídricos para fines de generación de energía eléctrica y otros recursos minerales en sus territorios.  Aborda los aspectos legales traídos por la  ADI 4606 acerca de la ley del Estado de Bahía y el Decreto que la regula, que discurre sobre el control, fiscalización y recaudación de los Royalties  debidos  a ese Estado. Sobrepuja principios, dispositivos constitucionales y infra constitucional como fundamento al ejercicio de la fiscalización plena por los Entes Federativos sobre las participaciones y compensación financiera que les son debidas. Imprime análisis rápido acerca de la hacienda pública y encuadra las participaciones y compensación financiera – Royalties – en la hacienda patrimonial-originaria. Concluye para el abrigo total de la competencia de los Estados, del Distrito Federal y Municipio en editaren Leyes para la fiscalización  y gestión de los Royalties, debido a la naturaleza legal de esta hacienda. 


Palabras clave: Royalties. Participaciones y Compensaciones Financieras. Competencias Constitucionales. Ingresos Originales.


Sumário 1. Introdução. 2. Royalties. 2.1. Conceito 2.2. Previsão Atual no Direito Brasileiro 2.3 Natureza Jurídica da Receita de Royalties. 3. A repartição de competências na Constituição de 1988. 4. Fiscalização dos royalties 4.1. O Exercício da Fiscalização à Luz da Natureza Jurídica da Receita 4.2. A ADI 4606. 5. Considerações finais. Referências.


1. INTRODUÇÃO:


O tema abordado neste artigo trata da competência dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios para fiscalizar as receitas de Royalties – compensação e participação financeira – oriundas da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais em seus territórios, nos termos do §1º, do art. 20, da Constituição Federal.


 Objetiva-se debater os principais questionamentos aduzidos na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4606), ajuizada pela Presidência da República, por intermédio da Advocacia Geral da União, em face da Lei 10.850 de 06 de dezembro de 2007, e do Decreto que a regulamenta, editados pelo Estado da Bahia, os quais o instrumentalizam para o exercício da fiscalização sobre os Royalties; encargo atribuído à Secretaria da Fazenda daquele Estado, em virtude da ocorrência de atividade exploratória de minérios ou de aproveitamento dos recursos hídricos para efeito de geração de energia elétrica no seu território.


Acoimam os subscreventes da indigitada Ação que os diplomas legais editados usurpam a competência da União em legislar privativamente sobre águas, minerais e energia por disciplinarem o uso e aproveitamento dos potenciais de energia elétrica e dos recursos minerais existentes no território nacional, além versar sobre a propriedade dos bens e do regime de exploração.  


As questões jurídicas suscitadas na ADI 4606 sobrepujaram analises do ponto de vista de alguns institutos do Direito Constitucional, Tributário e Financeiro, além de impingirem breve abordagem ao Direito Administrativo, ante a relação inerente que o tema se esboça junto à Administração Pública. O caráter interdisciplinar que este breve estudo acolheu, suscitou pesquisas na produção doutrinária consentânea assim como impulsionou vasta consulta na jurisprudência pátria, haja vista a escassez literária acerca do tema.  


2. ROYALTIES:


2.1 Conceito:


Etimologicamente a expressão Royalties é de origem anglo-saxônica, a qual significa aquilo relativo ao rei ou realeza. Em base histórica, compreendia uma compensação, ou, do que se podia deduzir, uma contraprestação paga pelo terceiro ao “El-Rei pelo uso ou exploração de bens sob seu domínio. Neste aspecto, os bens objetos desta relação eram de diversas naturezas, tais como: recursos minerais, uso da água, de madeira, outros recursos naturais, além de materiais utilizáveis para produção agrícola.


Esta palavra já se encontra dicionarizada na língua portuguesa. Em Houaiss[2] (Dicionário da Língua Portuguesa) o termo Royalty é classificado como substantivo masculino, concebendo plural: Royalties. Nele Royalty significa: “parte do lucro ou comissão paga ao detentor de um direito qualquer”. Já o Aurélio[3] (Dicionário da Língua Portuguesa) lhe destina o seguinte significado: “Importância cobrada pelo proprietário de uma patente para permitir seu uso ou comercialização”.


Em relação à abordagem conceitual da expressão Royalties aqui delineada, iremos nos deter aos aspectos gerais enquanto receita pública, pelo que exclui a pretensão de sua completude. Concorre para isto, o fato de que o sentido da expressão Royalties, objeto deste trabalho, estende-se em sua tradicional referência que lhe é imputado no mundo social, político e cultural cotidianos. Entretanto, jamais abduzindo-a do contexto dogmático jurídico a qual está inserida esta receita, como elemento fundamental nos esclarecimentos aqui trazidos.  


No âmbito das relações jurídicas exclusivamente de direito privado, o termo Royalties também é designado para se referir a uma compensação devida ao detentor de riqueza econômica disponível ao uso por outrem. Naturalmente, advêm de contrato firmado entre as partes, cujo objeto pode ser de variadas naturezas, no qual o “quantum” devido é fixado em comum acordo pelas partes envolvidas.


Entretanto, o alcance do conceito de Royalties, a servir a este breve estudo, restringe-se à valores devidos pelos agentes econômicos – concessionários – pela atividade exploratória e de aproveitamento de bens e recursos naturais públicos, nos termos da legislação que o regulamenta.


Não obstante as vicissitudes historicamente havidas quanto à concepção de sua natureza, os Royalties foram, e ainda são, concebidos na legislação nacional como compensação financeira ou como participação em resultado. Conquanto estas e outras designações, são utilizadas para se referirem ao pagamento devido por terceiros, na condição de concessionários, à entidade pública beneficiária, em virtude do aproveitamento econômico de recursos naturais públicos.


2.2. Previsão Atual no Direito Brasileiro


A legislação nacional vigente, que versa sobre Royalties, é amparada por dispositivo consignado na Lei Fundamental. Este status foi alçando na Carta Política de 1988. Nas Ordens Constitucionais anteriores, esta matéria era reservada apenas à legislação infraconstitucional.    


O direito a percepção dos Royalties está previsto na Constituição Federal. É desta previsão que decorre a legislação infraconstitucional que regulamenta sua cobrança e ampara as entidades beneficiárias para o exercício da cobrança da compensação e a participação financeira pela lavra mineral e pelo uso de recurso hídrico para fins de geração de energia elétrica, realizados em seus respectivos territórios. Vejamos:


Art. 20. São bens da União:  […]


§ 1º – É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.”


A elevação dos Royalties ao ápice do Ordenamento Jurídico Nacional deu-se por uma composição política, na constituinte de 1988, oriunda de discussão empreendida sobre a estrutura do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e prestação de Serviços de transporte interestadual e intermunicipal e comunicação – ICMS.


O constituinte ao fazer a opção por um sistema misto de distribuição da carga tributária decorrente da incidência do ICMS nas operações interestaduais, a qual prevê a partição entre os Estados de origem e os Estados destinatários, esbraseou a insurgente discussão sobre as operações que envolviam petróleo e energia, dada a relevância destes produtos na matriz energética nacional e, naturalmente a notória dependência que assentam no processo de desenvolvimento nacional.


Faz-se oportuno lembrar o voto[4] exarado pelo Ministro Nelson Jobim, no qual se valendo da experiência de constituinte no julgamento do Mandado de Segurança nº. 24.312-1/Distrito Federal, no plenário do Supremo Tribunal Federal, discorreu sobre a plataforma de negociação em que se chegou à imunização do ICMS sobre as operações interestaduais com energia elétrica, petróleo e seus derivados, e da contrapartida compensatória traduzida pelos Royalties.


Abstraindo-se da motivação política fomentadora do dispositivo constitucional em comento, como viés de compensação à perda de ICMS a ser experimentada pelos Estados produtores, percebeu-se que o constituinte cuidou em garantir uma compensação ou participação financeira, em virtude da exploração dos bens da União eleitos ao aproveitamento econômico em seus territórios, quais sejam: petróleo e gás natural, recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e outros recursos minerais.


Observa-se, entretanto, no próprio dispositivo constitucional que a matéria deverá ser regulamentada nos “termos da lei”.  Desta previsão, foram editadas as Leis Federais[5] 7.990/89, a 8.001/90 e a 9.478/97. Esta última, denominada de Lei do Petróleo.     


Já a terminologia “compensação financeira”, prevista no dispositivo constitucional, se impõe por constituir pagamento dos concessionários aos Estados, Distrito Federal, Municípios e aos órgãos da administração direta da União pela lavra e utilização econômica dos recursos hídricos e minerais no seu respectivo território.


Outro importante aspecto do §1º, do art. 20 da Constituição Federal, o qual merece comentários, é a natureza diferenciada existente entre “participação sobre o resultado” e “compensação financeira”.


A Lei Federal 7.990/89 em seu art. 6º[6], ao regulamentar o disposto no §1º do art. 20 da Constituição Federal, quando do estabelecimento de percentuais a serem aplicados sobre a receita líquida decorrente do faturamento da venda do resultado da lavra, imputa-lhe natureza de participação financeira, e não de compensação.


Em seu voto, consignado no Recurso Extraordinário: 228.800-5/DF[7], o Ministro Sepúlveda Pertence (Relator) alude a matéria com a propriedade que lhe é peculiar:


“Na verdade – na alternativa que lhe confiara a Lei fundamental o que a Lei 7.990 – 1989 instituiu, ao estabelecer no art. 6º que “a compensação financeira pela exploração de recursos minerais, para fins de aproveitamento econômico, será de 3% sobre o valor do faturamento líquido resultante da venda do produto mineral” não foi verdadeira compensação financeira: foi sim, genuína “participação sobre o resultado da exploração”, entendido o resultado não como o lucro do operador, mas como aquilo que resulta da exploração, interpretação que revela o paralelo existente entre a norma do art. 20, §1º, e do art. 176, §2º, da Constituição.”


E segue:


Ora, tendo a obrigação prevista no art. 6º da Lei 7.990-89 a natureza de participação no resultado da exploração, nada mais coerente do que consistir o seu montante numa fração do faturamento.


Nada importa que – tendo-a instituído como verdadeira “participação nos resultados” da exploração mineral, a lei lhe haja emprestado a denominação de “compensação financeira” pela mesma exploração – outro termo da alternativa exposta pelo art. 20, §1º, da Constituição […]”


É pujante acatar o generoso alcance que constituinte imputou aos institutos da compensação e da participação consignadas no §1º, do art. 20 da Constituição Federal. Muito embora o texto constitucional designe como financeira apenas a compensação, não se pode conceber à participação outro entendimento, senão o de possuir, também, natureza financeira, pois, a legislação infraconstitucional vigente, ao tratar da matéria, regulamenta-a de forma que o valor a ser pago é também de expressão monetária.            


Nesta esteira, convêm ressaltar o dizer de Manoel Gonçalves Ferreira Filho[8] sobre o tema:


Participação ou Compensação. O direito constitucional anterior não se preocupava com a questão.


A norma distingue entre participação e compensação. Esta ultima pressupõe um prejuízo decorrente da exploração. Já a participação constitui uma associação nos benefícios.


Compreende-se que o ente federativo que no seu território sofra a exploração, seja por ela compensado ou, até, nela tenha participação. Menos aceitável é que faça jus a participação quando a exploração se der na plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, que não lhe integra o território. Quanto à compensação, esta seria ainda admissível, sob a condição de prejuízo.”


Neste apanhado, um tanto mais aguçado, o eminente doutrinador arremata a questão, diferenciando a participação da compensação por entender que aquela enseja mais do que uma contraprestação à prejuízo; sinaliza que a participação traduz em benefícios.


Amparando-se em mesma base de fundamentos, poder-se-ia também projetar esta asserção para acolher o disposto na Lei 9.478/97 (Lei do Petróleo), especificamente, em seu art. 45[9], o qual institui as chamadas Participações Governamentais sobre a exploração de petróleo e gás natural sem qualquer prejuízo na essência dos conceitos até então já consignados.


Entretanto, não nos é autorizado prescindir do devido cuidado que devemos nos cercar quando da identificação da natureza jurídica de cada Participação Governamental instituída pelo legislador ordinário. Por outro lado, cabe-nos resguardar o foco proposto neste estudo, limitando-se as consignadas no inc. II e III do art. 45 da Lei 9.478/97, que trata dos Royalties e da Participação Especial, respectivamente, por serem participações sobre as quais os Estados, Distrito Federal e Municípios possuem percentuais.


Os Royalties e a Participação Especial, embora tenham núcleos de incidência diferenciados, na verdade possuem a mesma natureza, qual seja, de compensação e participação financeira. Os Royalties, conforme previstos na Lei do Petróleo, possuem alíquota de 10%, sendo os primeiros 5% calculado sob a égide da Lei 7.990/89, e o restante, na forma como está especificado na Lei do Petróleo.


Já a Participação Especial retrata a obrigatoriedade de pagamento para os casos de grande volume de produção ou grande rentabilidade; é por natureza uma compensação financeira de caráter extraordinário. A Lei do Petróleo foi regulamentada pelo Decreto 2.705/98[10], pelo que assim definiu a Participação Governamental em comento: “[…] constitui compensação financeira extraordinária devida pelos concessionários de exploração e produção de petróleo ou gás natural, nos casos de grande volume de produção ou de grande rentabilidade […]”. De efeito, a Participação Especial incidente sobre a lavra do petróleo e gás natural sub-roga-se ao conceito genérico de Royalties aqui apresentado, pelo qual sempre será mencionada.


Resta-nos abordar a concretude do caráter indenizatório que a própria legislação chegou a empregar aos Royalties. A Lei 2.004/53[11] previa no seu art. 27 que a Petrobrás e suas subsidiárias ficavam obrigadas a pagar aos Estados e Territórios, onde ocorresse a lavra de petróleo e gás, o percentual de 5% sobre o valor do produto da extração a título de indenização. Nesta esteira, o art. 1º da Lei 7.454/85[12] revogou o art. 27 da Lei 2.004/53 e manteve em sua redação o caráter indenizatório.


Revela-se imperioso frisar a razoabilidade aplicada pelo constituinte quando da redação dada ao tema dos Royalties na Constituição de 1988. Acreditamos que o texto redigido teve como escopo não repetir a incorreção que a legislação anterior persistia em manter. Assim, não cremos ter os Royalties caráter indenizatório.


Embora convictos que a compensação financeira e a participação sobre o resultado do aproveitamento econômico de minérios e de recursos hídricos possuam caráter contraprestacional – resguardadas as diferenças já aludidas alhures – não nos parece, repise-se, que estes institutos tratem de indenização.  


Trazendo a análise sob à ótica dada pelo Código Civil Brasileiro – Lei 10.406-02, art. 944[13] – quando expressamente dispõe sobre a matéria, vê-se, de pronto, que os Royalties não têm a natureza indenizatória. Ora, se assim o fosse, não haveria viabilidade econômica para o aproveitamento dos bens da União disponíveis ao aproveitamento econômico quando exercido na forma indireta por terceiros concessionários, admitindo que este teria que recompor aquele pela apropriação do produto da exploração. De efeito, destoaria, inclusive, do preceito consignado no art. 176 da Constituição Federal, que garante ao concessionário a propriedade do produto da lavra.  


Ressalte-se, por oportuno, que a legislação ordinária que institui os elementos constitutivos da base de cálculo para efeito de pagamento dos Royalties, não propõe nenhum vínculo objetivo, além de não apregoar proporcionalidade com qualquer medida que mensure a extensão do dano ocasionado pela atividade exploratória.


Por fim, vê-se seguramente afastada a caracterização de que os Royalties devidos são pagos como propósito de restabelecer o status quo ante. Da exegese aplicada as leis que estabelecem os percentuais devidos aos entes públicos beneficiários, ultima-se por concluir que, pelas ordens de grandezas ali exaradas, não se trata de indenização.


2.3 Natureza Jurídica da Receita de Royalties


O texto constitucional assegura aos Estados, Distrito Federal e Municípios, além de órgãos da administração direta da União – §1º, do art. 20 da Constituição Federal – compensação e participação financeira sobre a lavra e sobre o aproveitamento econômico dos recursos naturais que especifica. Ressalva, entretanto, o mesmo dispositivo, que deverá ser observada a Lei.


De efeito, a Lei 7.990/89 foi editada com o fito de regular o dispositivo constitucional. Em seu texto foram estabelecidos os percentuais de participação das entidades públicas beneficiárias. Além do mais, regra que o pagamento devido pelos concessionários seja efetivado diretamente[14] ao beneficiário dos Royalties.


Mas, para tanto, impera como pressuposto prático da aplicabilidade da norma, a decisão política para que se dê o aproveitamento econômico dos bens públicos, que deverá ser submetido ao rigoroso e regrado processo. Os bens públicos eleitos são expressamente mencionados no próprio dispositivo constitucional – Art. 20, §1º, da Constituição Federal: “§ 1º -[…].da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais[…]”(grifo nosso).


Seguramente, a decisão política sobre a exploração econômica dos bens em destaque não poderá advir dos Estados, Distrito Federal e Municípios, tendo em vista tratar-se de bens da União, consoante o art. 20, V, VIII e IX, da Constituição Federal[15].


Sob a ótica da Ordem Econômica Constitucional, nossa Carta Magna, em seu art. 176[16], assegura à União a propriedade sobre as jazidas minerais e dos potenciais de energia hidráulica e destaca a dicotomia: solo e subsolo, além de garantir ao concessionário o produto da lavra.


A norma constitucional destacada no parágrafo anterior, irrefreavelmente certifica a tutela da União sobre os potenciais de energia hidráulica e recursos minerais. Depreende-se, também, pelo amparo do §2º[17] do mesmo artigo, que o proprietário do solo também terá participação no resultado da lavra, consoante a Lei.


Adverte-se, então, que o legislador ordinário, ao discorrer sobre os elementos constitutivos da receita apregoada no artigo 20, §1º da Constituição Federal, abalizou toda a regulamentação em consonância aos princípios informadores da autonomia federativa, pois de outro modo, comprometeria a coluna vital de todo Sistema Federativo.  


Neste pórtico, ao estabelecer os percentuais destinados aos Entes Federativos beneficiários; forma de pagamento e o próprio fato gerador da receita, conforme os dispositivos consignados nos diplomas já anteriormente apontados, o legislador ordinário imprimiu harmonia e coerência aos princípios constitucionais consentâneos. Consagrou não haver qualquer vínculo de subordinação ou dependência entre os Entes Federativos, ainda que os Royalties decorram de um processo de exploração ou aproveitamento econômico de bens da União.


Incontestavelmente, a União detém o domínio sobre os minérios e recursos hídricos, assim como também não se contesta que os valores assegurados pelo §1º, do art. 20 da Constituição Federal são receitas dos Entes Federados beneficiários.


A compensação e a participação financeira prevista no §1º, do art. 20 da Constituição Federal é a tradução, a termo, da negociação havida na constituinte de 1988, conforme consignado no voto relativo ao Mandado de Segurança nº. 24.312-1, do Ministro Nelson Jobim, que pela sua pertinência, nos cabe repisar aquilo que importa:


“[…] Então, Ministra Ellen, estou tentando recompor a questão histórica, com isto, estou entendendo que não é uma receita da União que liberalmente está dando, por convênio, ao Estado; é uma receita originária dos Estados, face à compensação financeira da exploração em seu território de um bem, de um produto sobre o qual não incide o ICMS. Essa a origem do problema […]”. (grifo nosso)


Sob esta ótica, se os Estados e o Distrito Federal se abstinham de cobrar o ICMS nas operações interestaduais com o petróleo e seus derivados e sobre a energia elétrica produzida em seu território, equitativo seria assegurar uma contrapartida à perda de receita do ICMS, e que, de preferência, fosse recomposta por outra receita sobre a qual os Estados e o Distrito Federal exercitariam sua autonomia financeira conferida pela Constituição Federal, resguardadas a regulamentação trazida pelas as Leis Federais que instituíram seus elementos constitutivos.


Neste diapasão, a compensação e a participação financeira – Royalties – são receitas originárias dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios. Assim, derroca-se, inclusive, a ideia de que os Royalties sejam transferências constitucionais ou legais da União aos Estados, Distrito Federal e Municípios, mesmo porque, o art. 8º, da lei 7.990/89, impõe, taxativamente, que o pagamento seja feito diretamente ao Ente beneficiário.


Neste contexto, cabe trazer à baila a definição dada por João Angélico[18]:


“Receita patrimonial e receita industrial são as que resultam de ação direta do Estado na exploração de atividades comerciais, industriais, agropecuárias, bem como das rendas obtidas na aplicação de fundos de inversões financeiras, ou de produto da venda de bens da propriedade do Estado são receitas originárias”.


Deste conceito, logo se abebera que para auferir tais receitas, o Estado não se impõe revestido de poder estatal que lhe é inerente. Ou seja, não se projetou sobre o patrimônio do particular, imbuído com seu poder de império, para angariá-las, como é próprio do exercício arrecadatório das receitas de natureza tributária. Vemos que, no caso das receitas patrimoniais, o Estado, facultativamente, buscou nas atividades contratuais e de cunho privado receitas de caráter originário. Portanto, pode-se deduzir que as receitas originárias são receitas de natureza facultativa e contratual.


 Nesta esteira, não há como contrapor aos fundamentos já apresentados até então, de que os Royalties – compensações e participações financeiras – são receitas originárias.


3 A REPARTIÇÃO DAS COMPETÊNCIAS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988


É assertiva necessária que a repartição de competência pressupõe autonomia. Esta repartição é elemento essencial de toda a estrutura do Federalismo e exterioriza a descentralização política, a qual é o objetivo central do Sistema Federativo. Parafraseando José Afonso da Silva[19]: “Esta distribuição constitucional de poderes é o ponto nuclear da noção de Estado Federal.”


A repartição de competências é considerada como um dos elementos essenciais, por que não dizer, base fundamental para existência do Federalismo. Caracteriza-se por não haver, na sua concepção, hierarquia entre os Entes Federativos, com o escopo de garantir-lhes autonomia. Indiscutível que, dada sua importância, tal direito deverá está previsto e assegurado na Lei Fundamental de qualquer Estado Federal. Porém, é de se esperar que existam variações na estrutura de atribuição de competências, como de fato tem, entre os diversos modelos de federações constituídas.


O modelo de repartição de competências acolhido na Constituição de 1988 é perceptivelmente complexo, dada sua configuração que prevê interseção de atribuições entre os Entes Federativos.  Neste diapasão, Fernanda Dias de Menezes[20], expressa categoricamente que:


“Estruturou-se, com efeito, um sistema complexo em que convivem competências privativas, repartidas horizontalmente, com competências concorrentes, repartidas verticalmente, abrindo-se espaço também para a participação das ordens parciais na esfera de competências próprias da ordem central, mediante delegação.”


É nesta estrutura que se conforma a repartição de competência previstas na Carta política de 1988, na qual se encontram, taxativamente as competências da União, Estados, Distrito Federal e dos Municípios, além da criação de uma área comum pela qual tanto pode atuar a União como os demais Estados-membros.


A repartição de competências teve como mola mestra o “Princípio da Predominância do Interesse” que se extrai a orientação geral para se estruturar a repartição de competências, segundo a qual União é dada a competência sobre as matérias de interesse geral; aos Estados cabem tratar sobre matérias de interesse regional; e, aos Municípios cabem tratar de matérias de interesse local.


Kildare Gonçalves Carvalho[21], sobre o tema, assim comenta:


“Inicialmente, lembre-se de que o critério próprio para a repartição de competências é o da amplitude do interesse em jogo. À União dirá respeito a tudo quanto concernir ao país em sua totalidade, abrangendo-se, sob este prisma genérico, o âmbito de suas relações internas, e o domínio de suas relações externas. Aos Estados-Membros dirá respeito tudo quanto se vincular a seu próprio território e aos interesses preponderantemente regionais”.


Entretanto, não há como afastar a premissa de que os interesses envolvidos têm repercussão em todas as esferas. Há quem justifique inclusive a propriedade do termo “predominância” com o propósito de não afastar a ideia intrínseca de interesses comuns.


Não obstante a dificuldade, ou a impossibilidade de delinear os contornos palpáveis das atribuições, admite-se que a pretensão da descentralização político-administrativa trazida no modelo em estudo é satisfatoriamente adequada.


No dizer de Fernanda Dias de Menezes[22],


“Parece-nos, efetivamente, que a utilização das competências concorrente, como idealizada, atende aos desígnios de se chegar a maior descentralização, sem prejuízo da direção uniforme que se deva imprimir a certas matérias. Numa palavra, o caminho que se preferiu é potencialmente hábil a ensejar um federalismo de equilíbrio, que depende, embora, como não se desconhece, também de outras providências. Abrir aos Estados uma esfera de competências legislativas concorrente, em que lhes é facultado, por direito próprio, e dentro dos limites traçados pela Constituição, disciplinar uma série de matérias que antes escapavam de sua órbita de atuação legiferante, significa, por certo, ampliar-lhes os horizontes e incentivar-lhes a criatividade. O mesmo se diga em relação à descentralização de encargos mediante o estabelecimento de uma área de competências comuns, em que da cooperação de todos os integrantes da Federação é que deverá resultar o atendimento das metas objetivadas”.


Acrescente-se a observação de que as matérias enquadradas constitucionalmente na atividade legislativa concorrente também se caracterizam pela sua irrefutável imprescindibilidade do exercício das atribuições imputadas aos Organismos Federativos.


Da breve análise dos dispositivos que regram as competências dos Entes Federativos, deparamo-nos com o art. 21 da Constituição Federal no qual são explicitados os encargos atribuídos à União que, muito embora, não constem expressamente que lhes são reservados, não decorre outro entendimento, senão, que são atribuições privativas desta esfera. Manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais, por exemplo, não se poderia conceber como atribuição dos Municípios.


Entretanto, algumas, nos parece, ficariam mais bem amparadas como encargos dos Estados-membros e dos Municípios, tendo em vista à proximidade que os Entes Subnacionais possuem com os destinatários dos serviços estatais: os administrados.


Já o art. 22 da Constituição Federal enumera as competências legislativas privativas da União, conquanto não as esgotem, pois, outras previsões se destacam no art. 48.


No art. 23 encontram-se elencadas as competências materiais comuns das entidades federativas. São competências que o constituinte consignou como encargos comuns dos Organismos Federativos. São realizáveis num esforço paralelo e cooperado de forma a garantir o equilíbrio do desenvolvimento econômico como o bem-estar social, conforme previsão do parágrafo único do dispositivo em comento.


Na grade de encargos materiais comuns às três esferas federativas, percebe-se elevado conteúdo de interesse social, tendo o constituinte chamado todos os Organismos Federativos a sua responsabilidade.


Já o art. 24 da Constituição Federal trata da competência legislativa concorrente entre a União, os Estados e Distrito Federal. Este artigo confere tópico diferenciado da Carta Política de 1988 pelo elevado grau de interação legislativa entre os Entes Federativos, observando-se, por questão de ordem, as regras emanadas pelos parágrafos que se seguem.   


Com propriedade, Fernanda Dias de Menezes esclarece:[23]


“Caberá aos Estados, observadas as normas gerais federais, desenvolver toda uma legislação específica sobre temas da maior importância, podendo talvez melhor equacionar problemas sociais graves, mas que não se projetam com a mesma intensidade em todos os lugares e que, por isso mesmo, comportam tratamento diferenciado em atenção às peculiaridades com que se apresentam em cada Estado.”


Da leitura do art. 24 (caput) observa-se que os Municípios não integram o rol dos Entes Federativos detentores da atividade legislativa concorrente. Entretanto, ao observamos as espécies consignadas nos incisos I e II, do art. 30[24] da Constituição Federal, constata-se que cabem aos Municípios produzir as normas específicas para o atendimento ao seu interesse local como também suplementar a legislação federal e estadual, quando necessário.


O art. 25 da Constituição Federal, especificamente no seu §1º[25], expressamente estabelece que são reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas pela Constituição Federal.


Sobre o tema, assim lecionou Kildare Gonçalves Carvalho[26]:


“Os Estados federados detêm poderes reservados, ou seja, são-lhes reservadas as competências não vedadas pela Constituição. As competências, portanto, que sobrarem ou remanescerem dos poderes da União e dos Municípios serão de atribuição dos Estados.” 


Por fim, merece ressaltar que a Constituição de 1988 optou por uma estrutura rígida e atribuição especificada da competência tributária a cada esfera federativa, que teve como contra partida a adoção do modelo federalista cooperativo com a instituição das chamadas “cotas de participação”, as quais estão enumeradas no próprio capítulo relativo ao Sistema Tributário Nacional, sob o subtítulo: Da Repartição das Receitas Tributárias.  


4 FISCALIZAÇÃO DOS ROYALTIES


4.1 O Exercício da Fiscalização à Luz da Natureza Jurídica da Receita


Abordaremos, agora, os aspectos jurídicos das receitas de Royalties que, oriundas dos bens objetos susceptíveis de exploração econômica, revelam fundamentos para o efetivo exercício da fiscalização pelos Estados-membros, Distrito Federal e Municípios sobre as parcelas lhes asseguradas na Lei Fundamental.


De efeito, é forçoso deduzir que, apesar de oriundas da atividade de natureza privada da União sobre seu próprio patrimônio, aos Estados-membros, ao Distrito Federal e dos Municípios são asseguradas a participação e a compensação financeira sobre a exploração que ocorrerem em seus territórios, pelo que não descaracteriza a natureza de receita originária (patrimonial) pertencentes aos beneficiários que hospedam o exercício da atividade econômica, as quais se submetem às normas gerais estabelecidas na Lei 4.320/64[27].


 Quando discorremos acerca das competências legislativas concorrentes demarcadas no art. 24, da Constituição Federal, concluímos que, nesta espécie, à União cabe apenas editar normas gerais, e aos Estados e ao Distrito Federal, suplementá-las. Dentre o rol das matérias enumeradas naquele artigo, participa o Direito Financeiro, o qual tem, sob sua tutela, a Lei 4.320/64, que dispõe sobre normas gerais de elaboração e controle dos orçamentos e balanços dos Entes Federativos.    


Tomando como base a premissa de que os Royalties são receitas de natureza patrimonial-originária, podemos afirmar que, por assim ser, estão submetidas ao regramento estabelecido pela Lei 4.320/64, a qual introduziu no Ordenamento Jurídico Pátrio as normas gerais de Direito Financeiro. Desta forma, em observância a previsão Constitucional, infere-se que aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios cabem produzir sua legislação específica com o fito de regulamentar, sob a égide das normas gerais editadas pela União, os procedimentos de controle interno e externo (assembléia ou câmara municipal) destas receitas, sem prejuízo da fiscalização exercida pelo Tribunal de Contas do Estado-membro ou órgão equivalente. 


Neste pórtico, importa ressaltar que as Leis Federais 7.990/89, 8.001/90 e a 9.478/97, que inauguraram a previsão expressa no §1º do art. 20 da Constituição Federal, fixaram os elementos essenciais específicos referentes às quotas-partes destinadas aos Entes beneficiários. Nela também foram previstos fórmula para cálculo, os percentuais da distribuição para cada ente destinatário, prazo de pagamento, entre outras providências.


Portanto, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, na produção legislativa específica para fiscalização e controle de suas receitas financeiras, oriundas das atividades exploratórias de recursos naturais em seu território, cabe fiel observância às normas gerais consignadas na Lei 4.320/64 e aos elementos constitutivos instituídos pelas Leis Federais citadas, não podendo, a seu talante, abstraírem-se do regramento imposto pelas citadas normas, tendo em vista o caráter geral que elas possuem.


Por decorrência de expressa previsão Constitucional[28], podemos inferir que, inexistindo qualquer aspecto específico destas receitas nas normas de caráter geral produzidas pela União, ficam os Estados autorizados para suplementar ou exercer a competência legislativa plena para atender suas peculiaridades.


Destarte, aos Estados, Distrito Federal e Municípios cabem a fiscalização de sua quota-parte dos Royalties sem que se submeta a qualquer supressão ou ingerência, seja por parte da União ou de qualquer outro Ente Federativo, sobre a autonomia atinente aos seus Royalties.


 O entendimento jurisprudencial acerca do tema segue a mesma esteira. O Mandado de Segurança n º 24.312/DF[29], impetrado pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, em face de ato do Presidente do Tribunal de Contas da União, redundou em reconhecimento, por unanimidade, pelo pleno do Supremo Tribunal Federal, da titularidade dos Royalties àquele Estado, sujeitando-se à fiscalização do Tribunal de Contas do próprio Estado fluminense.


Em seu voto, o Ministro Carlos Veloso ressalta: “Presente a norma do §1º, do art. 20, o Estado arrecada o que é seu. Desse modo, a competência, no caso, não é do Tribunal de Contas da União.  Neste sentido, no mesmo Mandado de Segurança, assevera o Ministro Marco Aurélio:


“Portanto, o numerário pertence ao Estado, que participa, tem aporte de recursos, considerando o §1º do artigo 20 da Constituição Federal. A óptica, sem dúvida, homenageia a autonomia governamental, tão pertinente quando se vive numa federação”.


Deste precedente nativo da mais alta Corte Judiciária do país, torna-se perfeitamente defensável que as receitas dos Royalties, nas partes que lhes são conferidas, são receitas financeiras próprias dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios, cabendo-lhes exclusivamente os atos de arrecadação, controle e fiscalização.


Convergindo neste sentido, a própria Lei 7.990/89 prevê expressamente que o pagamento dos Royalties sejam realizados diretamente aos Estados, Distrito Federal e aos Municípios, conforme se segue:


“Art. 8º O pagamento das compensações financeiras previstas nesta Lei, inclusive o da indenização pela exploração do petróleo, do xisto betuminoso e do gás natural será efetuado, mensalmente, diretamente aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e aos órgãos da Administração Direta da União, até o último dia útil do segundo mês subseqüente ao do fato gerador,[…]” (Grifo nosso).


A compulsoriedade atribuída ao pagamento dos Royalties diretamente aos seus beneficiários imprime o sentido lógico de que a receita é dos Organismos Federativos e que cabem a eles, somente a eles, o exercício de sua fiscalização.  


Portanto, no exercício de sua autonomia, assegurada pela Constituição Federal, os Estados, Distrito Federal e dos Municípios organizar-se-ão fundados na atividade legislativa própria, provendo as necessidades do seu governo e de sua administração. No dizer de Fernanda Dias de Menezes[30]: “[…]..só haverá autonomia onde houver a faculdade legislativa desvinculada da ingerência de outro ente autônomo.” Esta autonomia se revela pelo efetivo exercício administrativo de arrecadação, controle e fiscalização, os quais devem se desenvolver sobre o concessionário devedor para asseverar-lhe que a sua parcela compõe-se com retidão.


Assim, é do preceito invocado no art. 176 e do §1º do art. 177 da Constituição Federal[31] que deriva o condão o qual assevera a condição do concessionário (empresas privadas ou estatais) – titular do contrato de concessão que lhe outorga o direito da exploração da atividade econômica – de sujeito passivo da relação obrigacional de recolhimento dos Royalties aos Entes Federativos beneficiários.   


Neste contexto, a produção legislativa acerca da atividade administrativa de arrecadação, fiscalização e controle das quotas-partes dos Royalties – receitas originárias – devidas aos entes beneficiários, é de competência das Assembléias Legislativas e das Câmaras Municipais. Ressalte-se, também, que os questionamentos deduzidos aos exercícios das atividades administrativas acima enumeradas submetem a apreciação do Órgão Judiciário dos respectivos Estados.


Por outro lado, não se pode preterir do regramento dado por lei para qualquer exercício da atividade administrativa no âmbito da competência de cada Entidade Federativa. A produção legislativa pelos Estados, Distrito Federal e pelos Municípios é imprescindível para o exercício de sua fiscalização sobre suas receitas. É sob a supremacia de um dos Princípios Constitucionais basilares e informadores das atividades administrativas da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, e demais órgãos da administração direta e indireta, que toda administração pública se vincula: o Princípio da Legalidade.


No dizer de Celso Antônio Bandeira de Melo[32]:


“Assim, o princípio da legalidade é o da completa submissão da Administração às leis. Esta deve tão-somente obedecê-las, cumpri-las, pô-las em prática. Daí que a atividade de todos os seus agentes, desde o que lhe ocupa a cúspide, isto é, o Presidente da República, até o mais modesto dos servidores, só pode ser a de dóceis, reverentes, obsequiosos cumpridores das disposições gerais fixadas pelo Poder legislativo, pois esta é a posição que lhes compete no Direito Brasileiro.”


De efeito, é certo que a expedição de atos regulamentares de execução da lei devam ser editados pelo poder executivo, porém, adstritos ao conteúdo disposto na respectiva lei. Neste pórtico, Celso Antônio Bandeira de Melo[33] prossegue: “Logo, a Administração não poderá proibir ou impor comportamento algum a terceiro, salvo se estiver previamente embasada em determinada lei que lhe faculte proibir ou impor algo a quem quer que seja”.


Portanto, a produção legislativa e, se for o caso, sua regulamentação, são invocadas como pressupostos necessários ao exercício da atividade de fiscalização e controle a ser dirigida aos concessionários das atividades exploradoras geradoras das receitas dos Royalties – receitas originárias – dos Entes Federativos beneficiários. Ou seja, a previsão legal da atividade administrativa de todo Ente Público é condição prévia para o seu efetivo exercício, sob pena de invalidade dos seus atos.


Urge, por fim, indagar sobre a fiscalização e controle da parcela de Royalties prevista no Fundo Especial instituído pela lei 7.990/89, em seu art. 27, §4º[34], distribuído entre todos os Estados e Municípios, inclusive, entre os entes não detentores em seus territórios de atividades exploratórias.


As receitas oriundas do Fundo Especial, destinadas a todos os Estados e Municípios, não se subsumem ao disposto no §1º, do art. 20 da Constituição Federal. A compensação e a participação financeira ali previstas são asseguradas aos Entes Federativos que suportam, em seus territórios, os efeitos da atividade exploratória.  


Este Fundo é formado de parcela específica prevista em lei, paga pelo concessionário, para compor o rol das transferências legais que a União realiza. Ou seja, para todos os beneficiários da receita oriunda deste fundo, trata-se de receita de transferências que advêm de Fundo, por imposição legal.  Sendo assim, o controle e a fiscalização destas receitas estão sob a tutela do Tribunal de Contas da União, conforme previsto no inciso IV, art. 253, do seu Regimento Interno[35].   


4.2 A ADI 4606


Em maio de 2011, a Presidente da República, representada pela Advocacia Geral da União, ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, em face da lei nº 10.850, de 06 de dezembro de 2007, do Estado da Bahia, a qual disciplina a fiscalização, a arrecadação e o controle das receitas decorrentes da exploração de recursos hídricos e minerais em seu território, e do Decreto nº 11.736 de 30 de setembro de 2009 que a regulamentou.


Argúi, em princípio, intromissão legislativa daquele Estado em matéria de competência privativa da União. Argumenta que a normatização sobre águas, energia, jazidas, minas e outros recursos minerais lhes são matérias reservadas pela Constituição Federal[36]. Além do mais, destaca a titularidade da União aos recursos minerais, inclusive do subsolo e dos potenciais de energia hidráulica, preceituados também na Carta Política de 1988.  


Entretanto, ao examinarmos o diploma baiano guerreado, não nos convencemos de que o legislador estadual usurpou as prerrogativas estabelecidas pela Constituição Federal à União, na matéria que tratou. Não implicou querer regulamentar ou regular a atividade econômica exploratória de petróleo, gás natural e outros minérios, além dos recursos hídricos em seu território.


Cumpre mencionar que as atividades econômicas acima apontadas já se deleitam em vasta regulamentação produzida pelo legislador federal. Sua regulação também se conforma em diversos atos produzidos (portarias, resoluções, etc), editados pelas Agências Reguladoras da atividade, como a ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) e a ANA (Agência Nacional de Águas).


Neste particular, o que se vê é que a Lei estabeleceu obrigações prestacionais aos sujeitos passivos – concessionários – que importam em informar ao Fisco daquele Estado sobre quantidade de produção; demonstrativos de cálculos; comprovantes de recolhimento, entre outros, de sorte que diz respeito à dados para a efetiva fiscalização e controle de suas receitas, tendo em vista que são informações em que se funda o cálculo e, conseqüentemente, o recolhimento dos valores de sua quota-parte.


Importa dizer que se trata do exercício de fiscalização, controle e arrecadação de uma receita que lhe é devida constitucionalmente. O fato da regulamentação e a regulação da atividade econômica desenvolvida pelo concessionário ser de competência da União, não tolhe ou afastar a autonomia financeira do Ente beneficiário sobre seus Royalties. Esta autonomia, decorre o exercício de fiscalização e controle sobre sua receita, os quais serão exercidos observando os contornos legais prescritos.  


Ressalte-se que os concessionários das atividades exploratórias de petróleo, gás natural e outros minérios, além dos produtores de energia elétrica, são sujeitos passivos na relação jurídico tributária dos tributos incidentes sobre as atividades que desenvolvem, ainda que todas estas atividades sejam matérias de competência legislativa privativa da União, a quem cabe, como já dissemos, a regulamentação e a regulação.


Entretanto, estão os concessionários sujeitos ao cumprimento das obrigações tributárias previstas na legislação específica, sem que caracterize imiscuição de qualquer ente titular de competência tributária na atividade legislativa privativa do Poder Central.


Vejamos, por exemplo, o caso do ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicações. Os concessionários das atividades de exploração e produção de petróleo, gás natural, outros minérios e energia elétrica, ao desenvolverem suas atividades, promovem a circulação dos produtos que exploram e sujeitam-se a incidência do ICMS. Logo, são considerados sujeitos passivos do tributo estadual, ainda que oriundo de uma atividade econômica regulada e regulamentada privativamente pela União.


Mesmo assim, estes concessionários, mediante Lei Estadual, estão obrigados a fornecer aos Fiscos estaduais informações acerca de sua produção; movimento econômico relativo às vendas da produção; compras de insumos e materiais diversos; estoques de produção, dentre tantas outras, com o escopo de fomentar a Fazenda Pública Estadual dos dados necessários ao devido controle, fiscalização e arrecadação de seu tributo, pelo que não incorrem os Estados em inconstitucionalidade quando da edição de suas leis e respectivos decretos.  


Mister lembrar que tanto a receita dos Royalties – receita originária – quanto a receita do ICMS se inserem no campo do Direito Financeiro e Tributário, respectivamente, cabendo a União discorrer apenas sobre normas gerais e os Estados e Distrito Federal elaborar suas leis específicas.


O que não se poderia conceber é que o legislativo estadual discorresse, por exemplo, sobre qualquer elemento constitutivo instituído pela Lei Federal que regulamenta a matéria, por se tratar de reserva legal dado ao legislador federal ordinário, conforme consignada no próprio texto do §1º, do art. 20, da Constituição Federal, ou que elaborasse normas de caráter regulatório sobre as atividades econômicas aludidas, cuja competência é legalmente atribuída às Agências Reguladoras.


Voltando ao caso em tese, o legislador baiano se ateve a apontar os Diplomas Legais Federais que instituíram os elementos constitutivos das receitas dos Royalties, sem ousar adentrar na matéria ali regulamentada e, sequer, transcrever seu conteúdo. A Lei foi editada em harmonia ao preceito estabelecido pelo Princípio da Legalidade a quem a Administração Pública deve observância.


Ademais, não se restringindo em análise perfunctória, e se projetando aos possíveis efeitos práticos que a Lei e o Decreto do Estado da Bahia podem produzir, não se vislumbra qualquer ameaça à uniformidade de incidência no território nacional que as Leis Federais que regulamentam a matéria possuem. Repise-se, a Lei baiana não inovou ou produziu normas que importassem em conflito aos dispositivos das Leis Federais.      


Não nos convencemos também da tese exarada na Ação Direta de Inconstitucionalidade de que o disposto no inciso XI, do art. 23, da Constituição Federal[37], decorre do direito da participação ou compensação financeira sobre o resultado da exploração assegurada aos entes beneficiários no §1º, do art. 20 da Constituição Federal. Trata-se, ao nosso sentir, dispositivo com propósito diverso do que pretendido na argumentação trazida à baila.


O §1º, do art. 20 da Constituição Federal, esgota-se no seu propósito quando assegura aos entes hospedeiros da atividade exploratória nele especificadas a participação ou compensação financeira nos termos da Lei Federal. Este parágrafo encontra-se consignado no capítulo concernente aos Bens da União.


Já no inciso XI, do art. 23, o constituinte atribui encargo comum às três esferas federativas com pretensão que não se justifica em mero exercício de fiscalização das receitas apontadas no §1º, do art. 20 da Constituição Federal. Trata-se de demandas que expressam significativa relevância ao interesse social, pelo que sobrepuja, das três esferas federativas, o esforço conjunto, conquanto, de forma cooperada.


Perfilhando este mesmo entendimento, Fernanda Dias Menezes[38] assim assevera:


“Pelas matérias especificadas percebe-se que o concurso de todos os Poderes é reclamado em função do interesse público existente na preservação de certos bens (alguns particularmente ameaçados) e no cumprimento de certas metas de alcance social, a demandar uma soma de esforços.”


Também, Kildare Gonçalves Carvalho[39], ressalta o caráter imperioso que a espécie justifica:


“A Constituição, neste ponto, segundo Raul Machado Rocha, ampliou consideravelmente os objetivos da competência comum, transformando-as em competência nacional, com descaracterização da competência local e estadual.”


Estratifica-se do acima exposto que em virtude da relevância que os encargos dispostos nos incisos do art. 23 representam para o país, o constituinte imbuiu às três esferas federativas o dever de exercê-las conjuntamente.


Conforme versa o inciso em debate: “XI – registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios”, vê-se apontadas as atividades de pujante interesse nacional, pelo que o constituinte também elegeu para que se designem com cuidado, zelo e atenção. Então, depreendendo-nos de qualquer possibilidade de coincidência, as atividades arroladas neste inciso estão inseridas no contexto da política energética nacional, projetando-se pelo especial interesse, tendo em vista o aproveitamento racional das fontes de energia disponíveis – art. 1º, lei do petróleo[40].


No âmbito dos objetivos elencados na lei 9.478 de 1997 – Lei do Petróleo, Maria D’Assunção Costa[41], bem definiu interesse nacional:


“Convém ressaltar que o interesse nacional não é representado pelo atendimento ao interesse dos governantes dos cargos eletivos mas, também – e principalmente – compreende o conjunto de interesses de todos os usuários dos serviços energéticos, dos agentes econômicos públicos ou privados que se dediquem a essas atividades e aos órgãos governamentais afetos ao setor de energia, ou seja, à sociedade em geral”.


À propósito, para realização das tarefas comuns consignadas no art. 23, o seu parágrafo único[42] prevê a edição de Leis Complementares com o escopo de fixar normas de cooperação entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios. De sorte, pressupõe que é sob a égide das bases políticas e operacionais delineadas por estas normas que as atividades ali arroladas seriam mais bem atendidas, tendo em vista objetivar o equilíbrio no desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.


Urge, então, indagar se a ausência destas normas obsta a efetivação dos objetivos almejados no rol dos encargos, tendo em vista tarefas revestidas de elevado interesse nacional e social. Em breve cotejo, conclui-se que o objetivo destinado a estas normas não afasta e não condiciona a realização das tarefas atribuídas às três esferas federativas, pois imputaria nada mais que a interface de cooperação administrativa e operacional.  


O registro, o acompanhamento e a fiscalização das concessões dos direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, previstos no inciso XI, do art. 23 da Constituição Federal, devem ser exercidos à luz da legislação que regulamenta e regula a atividade econômica. Esta competência é irrefutavelmente privativa da União e a ela cabe o exercício pleno de sua competência, ressalvada a realização em concurso da competência material da fiscalização, controle e registro, atribuída pelo inciso XI, do art. 23, concorrentemente com os demais Entes Federativos. Porém, repise-se, sob a égide da legislação produzida pela União.


5 CONSIDERAÇÕES FINAIS


A competência para a fiscalização dos Royalties pelos Estados, Distrito Federal e Municípios tem pressupostos fundamentais de natureza Constitucional e Legal. Há, no entanto, que imputar-lhes a devida interpretação sistêmica para que não se cometa o equívoco de produzir entendimento à margem da harmonia presumida que se tem do Ordenamento Jurídico Pátrio.


Os Royalties são receitas originárias dos Entes Subnacionais que, de alguma forma, suportam o ônus público específico das atividades econômicas em seu território, as quais advêm das lavras dos bens públicos que a própria Constituição Federal elegeu como susceptíveis a exploração. É este o condão que literalmente se imprime no §1º do art. 20 da Constituição Federal, como pressuposto necessário e suficiente para o Ente Federativo se polarize na relação jurídica como beneficiário da receita de Royalties.


Estas receitas, como vimos, têm natureza de contra-prestação e abrangem os danos causados ao meio ambiente, conseqüentes da atividade exploratória em vastas áreas nas quais se situam os campos de exploração. Agrega-se a isso, por exemplo, a indisponibilidade sofrida pela área ocupada imputada ao seu proprietário. Além do mais, soma-se também o fato da decorrente mobilização em infra-estrutura para o atendimento da demanda social que os empreendimentos destas indústrias provocam, principalmente aos governos locais, que se empreendem em demasia em busca de recursos para amenização do impacto causado.


Assim, é de se concluir que há convergência principiológica e normativa vigente que ampara e reforça o entendimento de que os Estados, Distrito Federal, inclusive, os Municípios detém a competência para editarem leis que possibilitem a fiscalização do cálculo e do pagamento dos Royalties, além de autorizar a cobrança extrajudicial e judicial de suas receitas originárias, em virtude da inadimplência do concessionário.


 Sobre as questões aduzidas e das postulações consignadas na ADI 4606, até a data de encerramento deste trabalho, o Supremo Tribunal Federal ainda não havia se pronunciado, todavia, estamos convictos que os diplomas editados pelo Estado da Bahia, objetos desta ação, não usurpam a competência da União, haja vista que se restringe ao exercício de fiscalização e controle sobre sua receita originária. Trata-se da autonomia federativa concebida pela Ordem Constitucional em vigor, além da consonância estabelecida pela exigência de preceitos legais impositivos, fulcro da preconização inafastável do Princípio da Legalidade imputado à Administração Pública.


Já a fiscalização, registro e acompanhamento preceituado no inciso XI, do art. 23 da Constituição Federal, não há como acreditar, por todas as razões anteriormente exaradas – além da eminente importância que as atividades possuem ao interesse nacional – que o constituinte tenha arrogado imperioso encargo como mera atividade auxiliadora da prescrição do §1º, do art. 20 da Carta Política, conforme consignada na ADI 4606.


Por fim, merece aqui destacar a lacuna da Lei Complementar que visa disciplinar a cooperação para o esforço conjunto referente ao encargo estabelecido pelo inciso XI, do art. 23 da Constituição Federal. Esta omissão jamais poderia ser acolhida como condição à realização das tarefas imputadas às três esferas federativas, conforme impostas no inciso acima mencionado. Mas, também, é certo que, tendo em vista os preceitos constitucionais, a realização deste encargo, por qualquer das esferas federativas, deva ser exercida estritamente sob a prescrição da legislação regulamentadora e reguladora da União. 


 


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VELLOSO, Carlos Mário da Silva; ROSAS, Roberto; AMARAL, Antônio Carlos Rodrigues do. Princípios Constitucionais Fundamentais. São Paulo. Editora Lex. 2005.


Notas:

[1] Artigo apresentado à Universidade Potiguar – UNP, como parte dos requisitos obrigatórios para a obtenção do título de Especialista em Direito do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Orientador: Prof. Deyvidson Giulliano Xavier de Paula.

[2] HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Sales. Mini Houaiss – Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro. Objetiva, 2003, p .462.

[3] FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini Aurélio – Dicionário da Língua Portuguesa. 8ª ed. Curitiba. Positivo, 2010, p. 676.

[4] “Em 1988, quando se discutiu a questão do ICMS, o que tínhamos? Houve uma grande discussão na Constituinte sobre se o ICMS tinha que ser na origem ou no destino. A decisão foi que o ICMS tinha que ser na origem, ou seja, os Estados do Sul continuavam gratuitamente tributado as poupanças consumidas nos Estados do Norte e do Nordeste.Aí surgiu um problema envolvendo dois grandes assuntos: energia elétrica – recursos hídricos – e petróleo. Ocorreu o seguinte: os Estados onde ficasse sediada a produção de petróleo e a produção de energia elétrica acabaria recebendo ICMS incidente sobre o petróleo e a energia elétrica. O que se fez? Participei disso diretamente, lembro-me que era, na época, o Senador Richard quem defendia os interesses do Estado do Paraná e o Senador Almir Gabriel quem defendia os interesses do Estado do Pará, além do Rio de Janeiro e Sergipe, em relação às plataformas de petróleo.Então, qual foi o entendimento político naquela época que deu origem a dois dispositivos na Constituição? Daí por que preciso ler o § 1º do art. 20, em combinação com o inciso X do art. 155, ambos da Constituição.O que se fez? Estabeleceu-se que o ICMS não incidiria sobre operações que se destinassem a outros Estados – petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos, gasosos e derivados e energia elétrica -, ou seja, tirou-se da origem a incidência do ICMS.Vejam bem, toda a produção de petróleo realizada no Estado do Rio de Janeiro, ou toda a produção de energia elétrica, no Paraná e no Pará, eram decorrentes de investimento da União, porque o monopólio era da União. Toda a arrecadação do País contribuiu para aquela produção. Assim, decidiu-se da seguinte forma: tira-se o ICMS da origem e se dá aos Estados uma compensação financeira pela perda dessa receita. Aí, criou-se o § 1º do art. 20, dizendo:‘Art. 20.§ 1º. É assegurado, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União,’ – já se falava na possibilidade de criação das agências que poderiam ser financiadas em face da autonomia financeira – ‘participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica’ – leia-se ITAIPU, que estava na base da discussão no Paraná – ‘e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva,’ – que eram as plataformas de petróleo de Sergipe – ‘ou compensação financeira para essa exploração’.Então, Ministra Ellen, estou tentando recompor a questão histórica, com isto, estou entendendo que não é uma receita da União que liberalmente está dando, por convênio, ao Estado; é uma receita originária dos Estados, face à compensação financeira da exploração em seu território de um bem, de um produto sobre o qual não incide o ICMS. Essa a origem do problema.” MS 24.312/DF.STF.Disponívelem:http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=86118. Acesso em 12 de outubro de 2011;

[5] Lei 7.990/89: Institui, para os Estados, Distrito Federal e Municípios, compensação financeira pelo resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica, de recursos minerais em seus respectivos territórios, plataformas continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva […]. Lei 8.001/90: Define os percentuais da distribuição da compensação financeira de que trata a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989 […] Lei 9.478/97: Dispõe sobre a política energética nacional, as atividades relativas ao monopólio do petróleo, institui o Conselho Nacional de Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo e dá outras providências.

[6] Lei 7.990/89. Art. 6º A compensação financeira pela exploração de recursos minerais, para fins de aproveitamento econômico, será de até 3% (três por cento) sobre o valor do faturamento líquido resultante da venda do produto mineral, obtido após a última etapa do processo de beneficiamento adotado e antes de sua transformação industrial. (grifo nosso).

[7]RE:228.800/DF.STF.Disponível:http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=51182. Acesso em 12 de outubro de 2011.

[8] FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários a Constituição Brasileira de 1988. São Paulo. Editora Saraiva. 1990, p. 154.

[9] Lei 9.478/97. Art. 45. O contrato de concessão disporá sobre as seguintes participações governamentais, previstas no edital de licitação: I – bônus de assinatura;II – royalties;III – participação especial; IV – pagamento pela ocupação ou retenção de área.

[10] Decreto 2.705/98: Define critérios para cálculo e cobrança das participações governamentais de que trata a Lei nº 9.478, de 06 de agosto de 1997, aplicáveis às atividades de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural, e dá outras providências

[11] Lei 2.004/53. Art. 27. Art. 27. A sociedade e suas subsidiárias ficam obrigadas a pagar a compensação financeira aos Estados, Distrito Federal e Municípios, correspondente a 5% (cinco por cento) sobre o valor do óleo bruto, do xisto betuminoso e do gás extraído de seus respectivos territórios, onde se fixar a lavra do petróleo ou se localizarem instalações marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque de óleo bruto ou de gás natural, operados pela Petróleo Brasileiro S.A. – PETROBRÁS, obedecidos os seguintes critérios:

[12] Art. 1º. O artigo 27 e seus parágrafos da Lei nº 2.004, de 03 de outubro de 1953, alterada pela Lei nº 3.257, de 02 de setembro de 1957, passam a vigorar com a seguinte redação: “Art. 27. A Sociedade e suas subsidiárias ficam obrigadas a pagar indenização correspondente a 4% (quatro por cento) aos Estados ou Territórios e 1% (um por cento) aos Municípios, sobre o valor do óleo, do xisto betuminoso e do gás extraídos de suas respectivas áreas, onde se fizer a lavra do petróleo.

[13] Lei 10.406/02. Código Civil Brasileiro. Art. 944 A indenização mede-se pela extensão do dano.

[14] Lei 7.990/89. Art. 8º O pagamento das compensações financeiras previstas nesta Lei, inclusive o da indenização pela exploração do petróleo, do xisto betuminoso e do gás natural será efetuado, mensalmente, diretamente aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e aos órgãos da Administração Direta da União, até o último dia útil do segundo mês subseqüente ao do fato gerador, devidamente corrigido pela variação do Bônus do Tesouro Nacional (BTN), ou outro parâmetro de correção monetária que venha a substituí-lo, vedada a aplicação dos recursos em pagamento de dívida e no quadro permanente de pessoal. (grifo nosso)

[15] Constituição Federal. Art. 20. São bens da União:…V – os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva;…IX – os recursos minerais, inclusive os do subsolo;

[16] Constituição Federal. Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra.

[17] Constituição Federal. Art. 176…§ 2º – É assegurada participação ao proprietário do solo nos resultados da lavra, na forma e no valor que dispuser a lei.

[18] ANGÉLICO, João. Contabilidade Pública. 8 ed. 1994, p 45.

[19] SILVA, op. cit., p.477.

[20] ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competências na Constituição de 1988. 5ª Ed. São Paulo. Editora Atlas, 2010, p.58.

[21] CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional – Teoria do Estado e da Constituição, Direito Constitucional Positivo.  15ª Ed. Belo Horizonte. Del Rey Editora, 2009, p. 1002.

[22] ALMEIDA, op.cit., p.61.

[23] ALMEIDA, op.cit., p.127.

[24] Art. 30. Compete aos Municípios: I – legislar sobre assuntos de interesse local; II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;[…]

[25] Constituição Federal. Art. 25…§ 1º – São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.

[26] CARVALHO, op. cit., p.1026.

[27] Lei 4.320/64. Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e contrôle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

[28] Constituição Federal. .Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:[…]

§ 1º – No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

§ 2º – A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

§ 3º – Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

[29]MS:24.312/DF.STF.Disponívelem:http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=86118. Acesso em 12 de outubro de 2011;

[30] ALMEIDA, op.cit., p.81.

[31] Constituição Federal. Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra. Art. 177. Constituem monopólio da União: […] § 1º A União poderá contratar com empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a IV deste artigo observadas as condições estabelecidas em lei.

[32] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17ª ed. São Paulo. Malheiros Editores. 2004, 92.

[33] Ibidem. p. 93.

[34] Lei 7.990/89. Art. 27…§ 4º É também devida a compensação financeira aos Estados, Distrito Federal e Municípios confrontantes, quando o óleo, o xisto betuminoso e o gás forem extraídos da plataforma continental nos mesmos 5% (cinco por cento) fixados no caput deste artigo, sendo 1,5% (um e meio por cento) aos Estados e Distrito Federal e 0,5% (meio por cento) aos Municípios onde se localizarem instalações marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque; 1,5% (um e meio por cento) aos Municípios produtores e suas respectivas áreas geoeconômicas; 1% (um por cento) ao Ministério da Marinha, para atender aos encargos de fiscalização e proteção das atividades econômicas das referidas áreas de 0,5% (meio por cento) para constituir um fundo especial a ser distribuído entre os Estados, Territórios e Municípios.(grifo nosso)

[35] Tribunal de Contas da União. Regimento Interno. Art. 253. O Tribunal fiscalizará, na forma estabelecida em ato normativo:[…] IV – o cálculo, a entrega e a aplicação, conforme o caso, de quaisquer recursos repassados pela União por determinação legal a estado, ao Distrito Federal ou a município, consoante dispuser a legislação específica.

[36] Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:[…] IV – águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão; XII – jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia;

[37] Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:[…] XI – registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios.

[38] ALMEIDA, op.cit., p.113.

[39] CARVALHO, op. cit., p.1012.

[40] Lei 9.478/97. Art. 1º As políticas nacionais para o aproveitamento racional das fontes de energia visarão aos seguintes objetivos:[…](griso nosso).

[41] COSTA, D’Assunção. Comentários à Lei do Petróleo. São Paulo. Editora Atlas, 2009, p. 91.

[42] Constituição Federal. Art. 23.[…] Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.

Informações Sobre o Autor

Derance Amaral Rolim

Bacharel em Direito; Especialista em Direito do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis; Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais; Auditor Fiscal do Estado do Rio Grande do Norte


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Equipe Âmbito Jurídico

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