Resumo: O uso dos faróis acesos em rodovias, no período diurno, pode reduzir consideravelmente o número de acidentes nas estradas. O presente artigo desenvolve um estudo do tema, apontando que o simples ato de acender os faróis durante o dia pode ser um elemento fundamental para a segurança do trânsito nas estradas; com ampla pesquisa de campo, discorre sobre como outros países tratam do assunto, e as discussões no país sobre aprovação de projetos de lei sobre o tema, já aplicado em alguns estados brasileiros.
Palavras chave: acidentes nas estradas; segurança no trânsito; faróis acesos durante o dia nas rodovias; projeto de lei; Código Nacional de Trânsito.
Abstract: The use of headlights on highways in the daytime classes, can significantly reduce the number of road accidents. This article develops a study of the subject, pointing out that the simple act of turning on the headlights for the day can be a key element for traffic safety on the roads; with extensive field research, discusses how other countries deal with the issue, and the discussions in the country on approval of draft law on the subject, already applied in some brazilian states.
Keywords: road accidents; traffic safety; headlights on during the day on the roads; bill; National Traffic Code.
Sumário: Segurança no trânsito; Faróis acessos durante o dia diminuem acidentes nas estradas; Contran recomenda, mas é opcional; Faltam verbas para campanhas educativas; Números estarrecedores mobilizam OMS; Países aprovam a medida; Regulamentação no Brasil movimenta parlamentares; Discussão esquenta entre opositores; Pesquisa em campo; Considerações finais; Fontes.
Há muito se fala que o uso dos faróis acesos em rodovias, no período diurno, pode reduzir consideravelmente o número de acidentes, tão alarmante no Brasil. Mas, até o momento, poucas são as iniciativas capazes de regulamentar essa prática, o que representa um grande desafio diante da complexidade do assunto, especialmente no que se refere à legislação responsável por viabilizar a adoção dessa medida.
Na verdade, o simples ato de acender os faróis durante o dia, é considerado, por muitos especialistas, um elemento fundamental para a segurança do trânsito nas estradas. Segundo pesquisas realizadas no Canadá, os faróis acesos permitem ao motorista a visualização de um veículo a uma distância de até 3 km nas retas, alertando-o sobre as prováveis situações de risco e gerando ações preventivas para evitar acidentes. Também oferecem maior segurança aos pedestres e ciclistas que transitam pelas vias, pois permitem melhor dimensionamento da velocidade e do movimento dos veículos.
De acordo com a Polícia Rodoviária Federal, os automóveis com faróis acesos durante o dia tornam-se 60% mais visíveis, evitando principalmente acidentes de colisão frontal, já que a imprudência é ainda a principal causa. Essa informação é reforçada pelo Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) ao constatar que o maior porcentual de mortes nas rodovias concentra-se na tentativa frustrada de ultrapassagem, com consequente choque frontal.
Contran recomenda, mas é opcional
Embora não obrigatório – exceto nos estados do Paraná, cuja legalidade foi questionada na justiça, Minas Gerais e Rio Grande do Sul – a utilização de farol aceso nas rodovias durante o dia, foi proposta pelo Contran (Conselho Nacional de Trânsito), há mais de dez anos, pela Resolução 18, de 17 de fevereiro de 1998. Essa resolução considera que as cores e as formas dos veículos modernos contribuem para mascará-los no meio ambiente, dificultando a sua visualização a uma distância efetivamente segura para qualquer ação preventiva, mesmo em condições de boa luminosidade. Por esse motivo, o Contran recomenda às autoridades de trânsito, com circunscrição sobre as vias terrestres, que motivem seus usuários a manter o farol baixo aceso durante o dia nas rodovias, por meio de campanhas educativas, conferindo ao DENATRAN o acompanhamento dos resultados obtidos pelos órgãos que implementarem essa medida.
Hoje, o Código Nacional de Trânsito, instituído pela lei nº 9503, de 23 de setembro de 1997, dispõe, em seu artigo 40, que apenas os ônibus, quando trafegarem em faixas próprias, motos e ciclomotores são obrigados a circular com faróis acesos à luz do dia. Os estímulos luminosos chamam a atenção dos olhos e, portanto, o nível de conscientização e atenção no trânsito aumenta quando há identificação de faróis. Para os veículos de passeio, o uso 24 horas é opcional, mas o condutor fica obrigado a ascender luz baixa à noite e, durante o dia, somente nos túneis providos de iluminação pública ou em situações de baixa visibilidade como neblina e chuva forte na estrada.
Faltam verbas para campanhas educativas
O fato é que o Brasil ainda não despertou para o problema da segurança no trânsito da forma como deveria. Há necessidade de realização de amplas campanhas educativas, que contribuam para reduzir os índices de acidentes e os custos com o aparato de saúde pública, além de melhorar a imagem do poder público perante a população.
Hoje, o Governo Federal investe apenas uma parte pequena dos recursos previstos no orçamento para campanhas de prevenção de acidentes, segundo informações do portal G1. O Fundo Nacional de Segurança e Educação de Trânsito (Funset), em vigor há mais de 16 anos e cuja verba destina-se a campanhas de conscientização dos motoristas, conta com orçamento praticamente fictício, dizem os especialistas. Em 2013, dos R$ 860 milhões previstos, foram aplicados somente R$ 230 milhões, ou seja, menos de 30%. Neste ano, a verba é ainda menor, estão liberados apenas R$ 170 milhões de um total de R$ 930 milhões, de acordo com levantamento feito pela ONG Contas Abertas.
Enfim, gasta-se pouco em conscientização para minimizar os acidentes nas estradas. No entanto, parte do dinheiro do Funset, em torno de 5%, provém das multas arrecadadas mensalmente. Recursos que, segundo o Código de Trânsito Brasileiro, têm que ser usados exclusivamente em sinalização, engenharia de tráfego, policiamento, fiscalização e educação no trânsito.
Números estarrecedores mobilizam OMS
Enquanto isso, os números crescem e aterrorizam a população. Anualmente, o Brasil contabiliza, em média, mais de 1 milhão de acidentes e cerca de 45.000 mortes, informa o Ministério da Saúde, sendo que mundialmente o número de mortes no trânsito é de 1,3 milhão de pessoas ao ano.
O Brasil gasta mais de R$ 22 bilhões em acidentes nas estradas municipais, estaduais e federais, segundo pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A maioria dos acidentes de trânsito ocorrem durante o dia, com o tempo bom e em pista de mão única, muitas vezes com colisões frontais, constata o Ipea, lembrando que um acidente com morte custa, em média, R$ 567 mil aos cofres públicos. Esse e outros números fazem das vias brasileiras uma das mais violentas do mundo, exigindo medidas firmes no sentido de combater excessos dos motoristas, bem como melhorar a estrutura viária nacional.
Por outro lado, o progressivo agravamento global da violência no trânsito levou as Nações Unidas a proclamar a Década de Ação pela Segurança no Trânsito 2011-2020, visando estabilizar e reduzir as cifras de vítimas previstas, com a implementação de planos nacionais, regionais e internacionais.
Estudos divulgados pela Organização Mundial da Saúde, em 2010 e 2013, indicaram uma séria epidemia letal no trânsito das vias públicas do planeta. Tanto é que, hoje, os acidentes de trânsito já representam:
– A terceira causa de mortes na faixa de 30 a 44 anos;
– A segunda na faixa de 5 a14 anos e
– A primeira na faixa de 15 a 29 anos.
A OMS estima que 90% dessas mortes acontecem em países com rendimentos baixos ou médios, que, em conjunto, possuem menos da metade dos veículos do mundo. O esperado aumento nos índices de motorização, sem os investimentos necessários em segurança nas vias públicas, como acontece no Brasil, agravará ainda mais esse quadro.
Atualmente, tais acidentes já representam um custo global de US$ 518 bilhões/ano. E, se nada for feito, a OMS estima que deveremos ter 1,9 milhão de mortes no trânsito em 2020 e 2,4 milhões em 2030. Nesse ritmo, a previsão é que para o ano 2020, os acidentes de trânsito representem a terceira causa de incapacidade física em todo o mundo.
Países aprovam a medida
Enquanto se discute no Brasil o uso ou não dos faróis durante o dia, na Europa e nos EUA a medida é, comprovadamente, uma importante redutora de acidentes de trânsito. Nos Estados Unidos, o uso do farol durante o dia reduziu em 5% as colisões entre carros e em 12% os acidentes envolvendo pedestres e ciclistas, segundo números da NHTSA, associação norte-americana de segurança rodoviária.
Em alguns países da Europa, estados americanos, além do Canadá, os faróis dos carros acendem automaticamente, assim que se liga o motor, ou seja, os veículos já saem de fábrica com um circuito elétrico que realiza essa operação. Esse dispositivo – denominado de Daytime Running Lights (DRL) – é uma luz de intensidade menor que o farol baixo. Trata-se de uma luz adicional ao sistema de faróis principais, que permanece acesa durante todo o tempo em que o veículo estiver ligado. São projetadas para serem de baixa intensidade, minimizando o consumo de energia e preservando o balanceamento energético do veículo.
Mundialmente, a obrigatoriedade do uso dos faróis acesos durante o dia surgiu nos países escandinavos, onde a luminosidade natural é precária. No entanto, o facho de luz diurno tornou-se um importante dispositivo de segurança, independente das questões climáticas, espalhando-se para outros países como Estados Unidos, Canadá, e os que compõem o Mercosul. Estudos revelam que essa prática reduziu consideravelmente o número de acidentes no trânsito. Vários relatórios publicados nesses países indicam uma redução de 21% nas estradas rurais. A Suécia mostrou uma baixa de 11% nas colisões. A Dinamarca e a Hungria registraram reduções de até 8% em colisões frontais e transversais, sendo que na Dinamarca, só nos primeiros 15 meses, houve uma diminuição de 7%. No Canadá e Estados Unidos, foram constatados respectivamente 11% e 7% menos acidentes.
Regulamentação no Brasil movimenta parlamentares
Apesar dos benefícios já relatados do uso do farol baixo diurno nas estradas brasileiras, até o momento, somente os estados do Rio Grande do Sul e Minas Gerais contam com lei estadual em vigor que obriga os motoristas a adotarem essa prática. No Paraná, a lei que regulamentava essa medida de segurança foi julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal por invadir a competência privada da União em legislar sobre trânsito, com base no artigo 22, inciso XI, da Constituição Federal. O Mato Grosso do Sul conta com projeto de lei apresentado na Assembleia Legislativa do Estado, em 19 de fevereiro último, pelo deputado Paulo Corrêa, do PR. E, em São Paulo, André Soares, do DEM, também apresentou projeto de lei nº 404, de 2007, que institui Política Estadual de Conscientização e Estímulo ao uso permanente de faróis nas rodovias do estado.
No âmbito federal, foram encaminhados à Câmara vários outros projetos, visando tornar obrigatório o uso diurno do farol baixo nas estradas. O primeiro a chegar foi o projeto de lei nº 561, de 2007, do deputado Otávio Leite, do PSDB/RJ, que também recomendava o uso das luzes de condução diurna (DRL), tal como é feito nos países desenvolvidos, e estendia esse benefício para todas as vias, não só as estradas. Em 2012, esse projeto chegou ao Senado e teve sua estrutura modificada com a inclusão de outras propostas similares e a retirada da obrigatoriedade do DRL e do uso do farol baixo em todas as vias.
O novo texto sob o número 3522/12, do senador Eunício de Oliveira, PMDB/CE, foi encaminhado novamente à Câmara e teve o parecer do deputado Arolde de Oliveira aprovado, por unanimidade, pela Comissão de Viação e Transportes, em 20 de março de 2013. Nesse parecer, o deputado recomenda a aprovação do projeto do Senado, rejeitando todos os outros recebidos sobre o mesmo assunto, já que – segundo ele – as propostas estão atendidas no projeto 3522/12, que tem boa técnica legislativa. O projeto altera os artigos 40 e 250 do Código de Trânsito Brasileiro, com o objetivo de obrigar os veículos a trafegarem nas rodovias com o farol baixo aceso durante o dia.
Os projetos de lei rejeitados são: 561, de 2007, do Deputado Otávio Leite; 4.496, de 2008, do Deputado José Mentor; 4.631, de 2009, do Deputado Filipe Pereira; 5.953, de 2009, do Deputado Milton Monti; 6.695, de 2009, do Deputado Capitão Assunção; 7.268, de 2010, do Deputado Wellington Fagundes; 1.192, de 2011, do Deputado Efraim Filho; 1.234, de 2011, do Deputado Manato; 1.945, de 2011, do Deputado Eleuses Paiva; 3.923, de 2012, do Deputado Jilmar Tatto.
Também em agosto de 2013, a Comissão de Viação e Transportes da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 5070/13, do parlamentar Rubens Bueno (PPS-PR), que torna imprescindível a utilização, nas rodovias, de farol baixo aceso durante o dia, segundo notícia do Portal Transporta Brasil, assinada pelo repórter Victor José. O projeto, que tramita em caráter conclusivo, ainda será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Discussão esquenta entre os opositores
Mas nem tudo são flores. Há um grande debate em torno dos efeitos negativos dessa medida, que ainda provoca muita discussão. A deputada Selma Schons (PT-PR) apresentou o projeto de lei 6777/2006, que aguarda votação na Câmara dos Deputados e proíbe o uso dos faróis acesos durante o dia. Segundo o projeto, o uso indiscriminado do farol altera os elementos naturais de percepção e pode desencadear situações de stress no condutor. Além disso, se constitui numa grave ameaça à segurança do trânsito dos motoqueiros, que se destacam com faróis acesos entre os demais veículos.
Para os pesquisadores do Instituto de Noergologia da Unibem, de Curtiba, PR, esse projeto de lei regulamenta o uso correto dos faróis no modo fotocélula, que acende ou apaga de acordo com a luminosidade ambiente, proibindo o modo indiscriminado, que provoca poluição luminosa, afetando diretamente o cérebro, além de gerar poluição química por elevar os níveis de dióxido de carbono na atmosfera.
O uso diurno indiscriminado do farol noturno já está abolido até nos sombrios países nórdicos com nevasca, onde de dia é permitido o farol diurno de luz fraca, o DRL, e não o farol noturno. Essa proibição – segundo esses pesquisadores – diminui os riscos da perda da proteção do estímulo mutante por parte dos motoqueiros; os acidentes ocasionados por cronaxia, ou seja, cegueira momentânea gerada por estímulos luminosos de faróis artificiais sobrepostos à luz do sol quase na horizontal, bem como os provocados por aumento de distorção perceptiva; acidentes pelo estresse gerado pela agressão da luz artificial sobreposta à luz do sol inibindo o efeito “visão de águia”, cuja secreção ocular diminui a intensidade luminosa melhorando a percepção visual; e os acidentes noturnos provocados por faróis cujo teor de luminosidade foi esbanjado insensatamente à luz do sol, mas não foi trocado ao final do seu ciclo de luminância útil.
Assim, dizem os especialistas, que o farol diurno indiscriminado não deve ser encarado apenas como uma questão de trânsito. O PL 6777/2006 transcende a simples esfera do trânsito, porque também preserva a teia da vida do ecossistema. Vale ressaltar que a National Motorists Association Foundatin (EEUU) já luta, inclusive, pela proibição do próprio DRL, alertando que os prejuízos que provoca superam eventuais benefícios, pois punem toda a sociedade com o aumento do consumo de combustível, além de despejar oito bilhões de libras de dióxido de carbono na atmosfera só nos EEUU.
Pesquisa em campo
O autor deste artigo teve a oportunidade de testar sua eficácia em viagem recente realizada ao Estado do Rio Grande do Sul, quando ao trafegar pelas estradas desse estado, foi interceptado por policiais rodoviários que questionaram o fato de estar com o farol baixo do veículo apagado. “Informei às autoridades locais que desconhecia essa norma, até porque, no Estado de São Paulo e demais estados do Brasil, o uso do farol baixo aceso durante o dia não é obrigatório. Por outro lado, após dirigir quase 3.000 km nas estradas do Uruguai, Argentina e Paraguai, pude constatar que realmente o farol aceso traz maior segurança ao condutor nas estradas de mão única."
Considerações finais
Enfim, as cartas estão na mesa e os pontos positivos e negativos dessa medida já são de domínio público. Mas, apesar das correntes contrárias, a experiência tem sido bem-sucedida e comprovada até o momento, inclusive em nível internacional.
Assim, diante das recomendações feitas pelo Contran e o Denatran, da preocupação das Nações Unidas (2011/2020) em diminuir o agravamento global da violência no trânsito, da experiência dos países que implantaram e aprovaram a medida, das iniciativas de regulamentação no Brasil e da pesquisa realizada em campo pelo próprio autor deste artigo, a conclusão é que realmente o uso dos faróis acesos durante o dia nas estradas se faz necessário por questões de segurança.
Advogado professor sócio do escritório Barcellos Advogados Associados pós graduado em Processo Civil pela PUC-SP e em Direito Ambiental pelo Senai ex-delegado de Polícia e doutorando pela Universidade UMSA
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