Autonomous social service: reflections about the “s systems” and its peculiarities
Theresa Christine de Albuquerque Nóbrega[1]
Universidade Federal de Pernambuco (Brasil) – (theresa.nobrega@hotmail.com)
Ana Clara Carvalho Trindade de Sá Barreto[2]
Universidade Federal de Pernambuco (Brasil) – (anaclara.ctsb@gmail.com)
Resumo: Os serviços sociais autônomos ganharam espaço na sociedade por auxiliar no bem-estar dos indivíduos, visto que têm como objetivo ministrar assistência ou ensino a certas categorias sociais ou grupos profissionais. São pessoas jurídicas de direito privado instituídas por lei, mas organizadas por Confederações Nacionais. Não possuem fins lucrativos, sendo mantidos por dotações orçamentárias ou por contribuições parafiscais. São entes que cooperam com o Estado na execução de serviços de utilidade pública, com administração e patrimônio próprios. Os serviços que desempenham não são essenciais e, por isso, não precisam seguir às mesmas exigências do serviço público propriamente dito, como respeitar o princípio da continuidade. Exemplos desses entes são as entidades do “Sistema S” – categoria tradicional – e, recentemente, a Apex-Brasil e ABDI. A respeito de sua autonomia administrativa, já foram dispensadas várias exigências que antes se destinavam às entidades do “Sistema S”, como o dever de realizar licitações para adquirir produtos e serviços, bem como promover concursos públicos para contratação de pessoal. Não restam dúvidas que elas apenas agem em colaboração com a Administração Pública, sem compô-la. Por isso, não precisam seguir os mesmos procedimentos adotados pelo Poder Público, devendo apenas agir com observância aos princípios administrativos.
Palavras-chave: “Sistema S”. Licitações ou concursos públicos. Dispensáveis. Princípios administrativos. Respeitados.
Abstract: Autonomous social services have gained space in society to assist in the well-being of individuals, since they aim to provide assistance or education to certain social categories or professional groups. They are legal entities of private law established by law, but organized by National Confederations. They are not for profit, being maintained by budgetary appropriations or by parafiscal contributions. They are entities that cooperate with the State in the execution of public utilities, with administration and equity. The services they perform are not essential and therefore do not need to follow the same requirements of the public service itself as to respect the principle of continuity. Examples of these entities are entities of the “Sistema S” – traditional category – and, recently, Apex-Brasil and ABDI. Regarding its administrative autonomy, several requirements that previously were reserved for “Sistema S” entities have already been dispensed, such as the obligation to carry out bids to purchase products and services, as well as to promote public tenders for hiring personnel. There is no doubt that they only act in collaboration with the Public Administration, without compiling it. Therefore, they do not have to follow the same procedures adopted by the Public Power, and only have to act in compliance with the administrative principles.
Keywords: “System S”. Public tenders or tenders. Dispensable. Administrative principles. Respected.
Sumário: Introdução; 1. Considerações sobre serviço social autônomo; 1.1. Peculiaridades relativas aos entes de cooperação; 1.2. Classificação das entidades do “Sistema S”; 2. Temas recorrentes envolvendo entidades do Sistema “S”; 2.1 Controvérsias sobre a (des) necessidade de sujeitar os serviços sociais autônomos às normas gerais de licitação; 2.2 Evolução jurisprudencial dos tribunais acerca da contratação de pessoal pelas entidades do “Sistema S”; 2.3 Os recursos financeiros dos serviços sociais autônomos na ótica do TCU; 3. A atuação das entidades do Sistema “S” na sociedade; 3.1 Serviço público e serviço de utilidade pública; 3.2 A má prestação do serviço: informações que o cidadão precisa saber para solucionar conflitos por vias judiciais; Considerações finais.
INTRODUÇÃO
As entidades do “Sistema S” surgiram no século XX, numa época em que o Brasil passava por um intenso processo de industrialização. Inicialmente tinham finalidade assistencialista, mas com a crescente inserção das máquinas no ambiente de trabalho, essas pessoas jurídicas também passaram a conceder certos benefícios às categorias profissionais.
Enquadram-se como entidades paraestatais por atuarem paralelamente ao Estado, em sua colaboração. Prestam, dessa forma, serviço de utilidade pública, o qual não é essencial à sociedade, mas proporcionam mais comodidades aos usuários.
As entidades do “Sistema S” – SENAI, SENAC, SEST, SENAT, SENAR, SEBRAE – possuem características que as individualizam tanto da Administração Pública, como da iniciativa privada, pois não estão inseridas no rol de entidades administrativas e não possuem fins lucrativos. Suas peculiaridades as distinguem até mesmo da outra classe de serviços sociais autônomos, na qual estão incluídas a Apex-Brasil e a ABDI.
Em seus julgados, o Tribunal de Contas da União tem flexibilizado as exigências quanto à adoção de procedimento licitatório e concurso público para a contratação de pessoal, por compreender que as entidades do “Sistema S” não possuem subordinação à Administração Pública. Há certa rigidez nos entendimentos cujo tema é os recursos financeiros desses entes de cooperação, em razão do controle finalístico. Tendo em vista sua obrigatoriedade, as contribuições arrecadadas pelas entidades do “Sistema S” tem caráter público. Para os três casos, o TCU determina que sejam respeitados os princípios administrativos da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Os serviços prestados pelas pessoas de cooperação governamental não se confundem com os serviços públicos propriamente ditos pela ausência de essencialidade. O Estado exerce uma atividade de fomento, e não a transferência da titularidade ou execução mediante delegação. Essas subvenções servem para garantir a manutenção das entidades, uma vez que, por não acumularem capital, sua principal ameaça é a falta de estabilidade financeira.
O princípio da inafastabilidade jurisdicional garante aos usuários o direito de recorrer ao Judiciário para que seja examinada lesão ou ameaça a direito, tendo a parte direito a ver apreciadas pelo juízo competente as suas razões e a receber fundamentadas as decisões que lhes negam conhecimento.
Em uma sociedade que vivia um intenso processo de industrialização em meados do século XX, as entidades integrantes do serviço social autônomo surgiram como alternativa para amenizar as demandas sociais e profissionais. Apesar de pessoas jurídicas de direito privado, tais entidades não tinham fins lucrativos, bem como não estavam inseridas na Administração Pública; eram, portanto, pessoas de cooperação governamental[3]. Sua constituição foi relevante para executar serviços de utilidade pública que não eram prestados com a mesma eficiência pela máquina estatal.
Especificamente na área da educação, a atuação dessas pessoas jurídicas é possível por se tratar de um serviço não exclusivo do Estado[4]. Para Grau[5], o que torna o serviço público não privativo é a possibilidade de ser prestado pelo setor privado, independentemente de concessão, permissão e autorização. Essa circunstância se dá em razão da não essencialidade do serviço, por isso pode ser prestado diretamente pelo Estado ou por particulares[6].
Dispõe, inclusive, o artigo 209 da Constituição Federal de 1988 que o ensino é livre à iniciativa privada, desde que as normas gerais da educação nacional sejam cumpridas e o Poder Público promova autorização e avaliação de qualidade[7].
Uma das modalidades de ensino previstas na legislação brasileira é a educação profissional e tecnológica (art. 39, Lei nº 9.394/1996)[8], a qual é comumente prestada pelas entidades do “Sistema S”. Estas estão inseridas nos serviços sociais autônomos e, de acordo com Carvalho Filho[9], são pessoas jurídicas de direito privado que exercem atividades capazes de produzir algum benefício para grupos sociais ou categorias profissionais.
A respeito dos destinatários da atividade desempenhada pelas entidades do Sistema S, ratifica Justen Filho[10]:
“Entidade paraestatal ou serviço social autônomo é uma pessoa jurídica de direito privado criada por lei para, atuando sem submissão à Administração Pública, promover o atendimento de necessidades assistenciais e educacionais de certos setores empresariais ou categorias profissionais, que arcam com sua manutenção mediante contribuições compulsórias”.
Por isso que, antes de esmiuçar as peculiaridades das entidades do “Sistema S”, faz-se necessário contextualizar de forma breve a educação profissional na história brasileira, visto que as pessoas jurídicas de cooperação governamental tratadas neste trabalho são voltadas ao ensino e formação de categorias profissionais.
Essa modalidade de ensino surgiu com um propósito assistencialista, servindo para “amparar os órfãos e demais desvalidos da sorte”[11]. Atender àqueles que não tinham condições sociais satisfatórias, educando-os para que não continuassem a praticar ações que estavam na contraordem dos bons costumes, demonstra que essa educação tinha um viés puramente social, sem preparar diretamente os hipossuficientes para o exercício de uma profissão que lhes trouxesse lucros.
A mudança começou no início do século XX, quando houve um esforço público de organização da formação profissional, modificando a preocupação mais nitidamente assistencialista de atendimento a menores abandonados e órfãos, para a da preparação de operários para o exercício do labor[12]. Assim, em 1906, a educação profissional passou a ser atribuição do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, mediante a busca da consolidação de uma política de incentivo para preparação de ofícios dentro destes três ramos da economia.
“Na década de 20 a Câmara dos Deputados promoveu uma série de debates sobre a expansão do ensino profissional, propondo a sua extensão a todos, pobres e ricos, e não apenas aos “desafortunados”. Foi criada, então, uma comissão especial, denominada “Serviço de Remodelagem do Ensino Profissional Técnico”, que teve o seu trabalho concluído na década de 30, à época da criação dos Ministérios da Educação e Saúde Pública e do Trabalho, Indústria e Comércio[13]”.
Posteriormente, deu-se o surgimento do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), em 1942, e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), em 1946, a partir de determinação constitucional (art. 129, Constituição Federal de 1937)[14], exigindo que o ensino vocacional e pré-vocacional passassem a ser dever do Estado, com a colaboração das empresas e dos sindicatos econômicos. A Constituição de 1937 possibilitou, dessa forma, a definição de Leis Orgânicas do Ensino Profissional, a criação dessas entidades especializadas, e ainda a transformação das antigas escolas de aprendizes artífices em escolas técnicas federais[15].
Em suma, dispõe Oliveira (2012, p. 45 apud VARESCHINI, 2016, p. 2):
“Em apertada síntese, podemos afirmar que os Serviços Sociais Autônomos (concepção antiga) já tiveram sua justificação fundada no dever assistencial genérico do Estado. Hoje, em sua faceta moderna (como entidades de colaboração governamental), mais do que uma atividade meramente educacional e assistencial, elas se justificam como atividades de fomento público, em que o Estado tenta promover e desenvolver uma plena aptidão técnica, física ou mental do homem para progredir no trabalho.
(…)
Nestes termos, os entes de colaboração governamental impactam de sobremaneira na busca do pleno emprego, na medida em que maximizam, por meio de ações concretas estabelecidas em seus objetivos institucionais, as oportunidades de emprego produtivo, seja por meio do comércio, indústria, cooperativismo, micro e pequenas empresas, transporte, agricultura e exportação, visando à justiça social e ao desenvolvimento nacional.
Com efeito, verifica-se que as ações das entidades de colaboração governamental revestem-se, indubitavelmente, de elevados objetivos de ordem pública, podendo ser qualificadas como sendo benemerentes e de assistência social, na medida em que materializam a consecução do ideário consagrado no art. 203, inciso III, da Constituição Federal, ou seja, a promoção da integração ao mercado de trabalho”.
Relativamente às entidades do “Sistema S”, sua criação, organização e direção são realizadas por confederações nacionais, por força de legislação específica[16]. Segundo Di Pietro[17], “as leis que deram origem a tais entidades não as criaram diretamente, nem autorizaram o Poder Executivo a fazê-lo, como ocorre com as entidades da Administração Indireta. Tais leis atribuíram às Confederações Nacionais o encargo de fazê-lo”.
O SENAI, por exemplo, foi organizado e dirigido pela Confederação Nacional da Indústria, nos termos do artigo 3º, Decreto-lei no 4.048/42[18], e, por se tratar de uma entidade de ensino, passou a ser fiscalizado pelo Ministério da Educação e Cultura (art. 11 do Decreto no 494/62)[19].
Em virtude de o tema ser um pouco incerto, a princípio o leitor pode ter a impressão que “Sistema S” é uma expressão sinônima ao serviço social autônomo. Ocorre que este é o gênero, enquanto que aquele é espécie. Dentre outras características, as entidades dos serviços sociais autônomos tradicionais – “Sistema S” – não têm subordinação hierárquica às autoridades públicas, ficando apenas vinculadas ao órgão estatal que tenha relação com suas atividades, para fins de controle finalístico[20]. Além disso, prestam contas ao TCU, em razão do uso do dinheiro público recebido para sua manutenção.
Em contrapartida, uma categoria mais atual do serviço social autônomo tem regime e perfil jurídicos bem diversos dos atribuídos tradicionalmente às entidades da mesma natureza, sendo que o Presidente da entidade é nomeado pelo Presidente da República; há supervisão compete ao Poder Executivo; inclusão de dotações consignadas no Orçamento-Geral da União; dentre outras singularidades[21].
Em razão dessas diferenças, portanto, faz-se necessário desenvolver uma reflexão sobre o conceito de entidades do serviço social autônomo, bem como analisar as suas classificações.
1.1 PECULIARIDADES RELATIVAS AOS ENTES DE COOPERAÇÃO
Frequentemente, fala-se em Terceiro Setor como aquele ramo do direito administrativo que abrange pessoas jurídicas remanescentes, ou seja, que não se enquadram nem no Primeiro Setor – Estado –, nem no Segundo – mercado. Necessário fazer uma breve consideração sobre ambos – o Poder Público e a iniciativa privada –, para compreender o porquê de as entidades do Terceiro Setor não se confundirem com esses outros grupos.
Diz-se que as entidades integrantes do serviço social autônomo não compõem a Administração Pública primeiramente por não estarem inseridas no rol legal de entes administrativos. A Administração Federal compreende, nos termos do artigo 4º do Decreto-Lei nº 200/67[22], a Direta – conjunto de órgãos que integram as pessoas federativas -, e a Indireta, formada pelas autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas. Diversos procedimentos que devem ser adotados pelas entidades estatais não são exigidos com a mesma rigidez às pessoas de cooperação governamental, como a licitação e contratação de pessoal, temas que serão estudados adiante.
Segundo Di Pietro, a dificuldade na fixação da natureza jurídica dessas entidades, bem como enquadramento ou não entre a Administração Pública Indireta, decorre do fato de que, na vigência da Constituição de 1946, época em que surgiram, ainda não havia normas específicas no direito brasileiro sobre a administração indireta, trazendo incertezas à classificação[23]. Não é o que ocorre hoje em dia, já que as leis informam expressamente quem compõe a Administração Pública Indireta.
Sobre essa distinção, Marques Neto e Cunha[24] esclarecem o seguinte:
“E é justamente por isso que os serviços sociais autônomos não se confundem com o rol de figuras administrativas constantes do Decreto-Lei no 200/1967. Em primeiro lugar, embora exerçam atividade de interesse público sem caráter econômico, não se confundem com as autarquias porque não são pessoas jurídicas de direito público. Por outro lado, não se confundem com as empresas estatais ou sociedades de economia mista porque, ainda que estas possuam natureza de direito privado, os serviços sociais autônomos não exercem atividades econômicas com fins lucrativos. De mais a mais, não se confundem com as fundações estatais porque não têm estrutura fundacional, ou seja, não decorrem da afetação de um patrimônio a uma finalidade de interesse público. Daí a conclusão lógica de não integrarem a estrutura administrativa do Estado porque não se adéquam aos figurinos disciplinados pelo Decreto-Lei no 200/1967”.
Surgem dúvidas a respeito da aproximação entre as entidades do serviço social autônomo e a Administração Indireta quando se analisa o conceito de entidades paraestatais. Como se verá mais adiante, as pessoas de cooperação governamental fazem parte do grupo de entidades paraestatais, mas há posicionamentos doutrinários no sentido de que pessoas da administração indireta também estariam incluídas nesse gênero. Para Carvalho Filho, por exemplo, a expressão paraestatal “deveria abranger toda pessoa jurídica que tivesse vínculo institucional com a pessoa federativa, de forma a receber desta os mecanismos estatais de controle”. Estariam, pois, enquadradas como entidades paraestatais as pessoas da administração indireta e os serviços sociais autônomos[25].
Trata-se de pessoas jurídicas de Direito Privado dispostas paralelamente ao Estado, para executar cometimentos de interesse público, mas não privativos da Administração. Os entes de cooperação são verdadeiras entidades paraestatais, e entre as espécies de entes de cooperação – que podem ser compreendidas na expressão “entidades paraestatais” – estão os serviços sociais autônomos[26].
No entanto, a colocação que é mais aceita no direito administrativo brasileiro é a de Meirelles, ao informar que entidades paraestatais são do regime jurídico de direito privado, com autonomia administrativa e financeira, mas executam atividades públicas impróprias do Poder Público, ou seja, que não são essenciais, mas ainda assim são de utilidade pública, de interesse da coletividade (MEIRELLES, 1981. p. 13 apud MARQUES NETO; CUNHA, 2013, p. 139). Não é o que ocorre com as entidades administrativas, que recebem, por delegação, a titularidade e/ou execução do serviço; neste caso, a atividade pública é própria, típica[27]. As atividades exercidas pelas entidades paraestatais são fomentadas pelo Estado, ficando sujeitas à supervisão do órgão da entidade estatal a que se encontrem vinculadas, para o controle de desempenho estatutário (MEIRELLES, 2006. p. 67 apud MARQUES NETO; CUNHA, 2013, p. 140). Ora, por esse conceito fica mais clara a distância entre os serviços sociais autônomos e a Administração Indireta.
A respeito do Segundo Setor, ou seja, o mercado, trata-se de uma instituição jurídica fruto do liberalismo, que exige, “para a satisfação do seu interesse, o afastamento ou a redução de qualquer entrave social, político ou moral ao processo de acumulação de capital”. Esse setor espera que a interferência estatal seja mínima para não comprometer o lucro e a livre concorrência[28]. Esse sistema capitalista espera proteção estatal à autonomia individual dos seus agentes econômicos, a qual começa pela liberdade de atuação.
Não há a possibilidade dos serviços sociais autônomos se enquadrarem nesse setor, porque não possuem qualquer finalidade lucrativa. As contribuições compulsórias que recebem são devidamente fiscalizadas pelo Tribunal de Contas da União, com o intuito de garantir a sua destinação para a finalidade específica; por isso, não representam acumulação de capital. Tais entidades têm como objetivo executar alguma atividade caracterizada como serviço de utilidade pública[29].
Diferenciam-se das pessoas jurídicas do segundo setor pela ausência de fins lucrativos, recebimento de incentivos estatais para a sua manutenção, dever de prestar contas desses recursos públicos, entre outras características, conforme dispõe ADI 1.864[30]:
“[…] os serviços sociais autônomos são entes paraestatais cujo objetivo é promover a cooperação com o Poder Público no desempenho de suas atribuições. Com personalidade de direito privado, prestam assistência ao Estado e são mantidas por meio de dotações orçamentárias ou contribuições parafiscais. Estão sujeitos à prestação de contas dos recursos públicos que recebem para a sua manutenção, sendo que seus servidores, sujeitos ao regime privado de emprego, equiparam-se aos funcionários públicos exclusivamente para fins de responsabilidade criminal por delitos funcionais”.
Os serviços sociais autônomos atuam, portanto, junto à Administração Pública Direta e Indireta, só que sem compô-la[31]. Possuem autonomia na sua gestão, mas, por receberem recursos públicos, são fiscalizados pelo Tribunal de Contas da União para que a verba seja destinada à finalidade para qual foram criados, não podendo ter fins lucrativos. Por essas peculiaridades que as pessoas de cooperação governamental não podem nem ser incluídas na Administração Pública e nem na iniciativa privada. Percebe-se, dessa forma, que as entidades do Terceiro Setor são assim identificadas por exclusão.
Quanto à natureza da atividade prestada pelos serviços sociais autônomos, confirma o Acórdão 3554/14, do Plenário do TCU (apud VARESCHINI, 2016, p. 5):
“Os Serviços Sociais Autônomos realizam atividade privada de interesse público e, por isso, são incentivadas pelo Poder Público. Ou seja, não prestam serviço público delegado pelo Estado. A participação do Estado ocorre para incentivar a iniciativa privada, mediante subvenção garantida por meio da instituição compulsória de contribuições parafiscais destinadas especificamente para essa finalidade. É atividade privada de interesse público que o Estado resolveu incentivar e subvencionar”.
Dessa forma, um dos instrumentos que terá como objeto a prestação de serviço de utilidade pública por um ente de cooperação é o convênio. Trata-se de um acordo – e não contrato – firmado por entidades públicas de qualquer espécie, ou entre estas e organizações particulares, para realização de objetivos de interesse comum dos partícipes. Ao contrário dos contratos, no convênio há interesses comuns e coincidentes[32].
Numa relação entre entidades públicas e privadas, o convênio não é possível como forma de delegação, porque nos serviços públicos o Estado assume uma atividade de atendimento às necessidades coletivas, exercendo-a parcial ou totalmente sobre as regras públicas. De outro modo, convênio é possível como modalidade de fomento, pois a atividade é prestada pela iniciativa privada, restando ao Estado incentivar a sua concretização[33].
Quanto ao início da personalidade jurídica, a existência legal dos serviços sociais autônomos surge com a inscrição do ato constitutivo no cartório próprio, no caso o Registro Civil de Pessoas Jurídicas[34], precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo, com fulcro no artigo 45 do Código Civil[35].
Os estatutos são delimitados por meio de regimentos internos, normalmente aprovados por decreto do Chefe do Executivo. Neles, desenha-se a organização administrativa da entidade, fazendo-se referência aos objetivos, órgãos diretivos, competências e normas relativas aos recursos e à prestação de contas[36].
O Regimento do SENAI, por exemplo, tem como objetivos a assistência aos empregadores na elaboração e execução de programas gerais de treinamento do pessoal dos diversos níveis de qualificação; a apresentação, aos trabalhadores maiores de 18 anos, das oportunidades de completar, em cursos de curta duração, a formação profissional parcialmente adquirida no local de trabalho; cooperação no desenvolvimento de pesquisas tecnológicas de interesse para a indústria e atividades assemelhadas. Sobre os recursos que constituem sua receita, incluem-se as contribuições previstas em lei, as doações e legados, as subvenções, as multas arrecadadas por infração de dispositivos legais e regulamentares, rendas oriundas de prestações de serviços e mutações patrimoniais, inclusive as de locação de bens de qualquer natureza, as rendas eventuais[37].
A manutenção dessas entidades é feita mediante contribuição parafiscal exigida dos empregados, ou seja, dos industriais e comerciantes, garantida nos diplomas legais[38]. O Superior Tribunal de Justiça confirmou que os exercentes dessas atividades estão sujeitos às contribuições, quando declarou, na Súmula 499, que as empresas prestadoras de serviços também poderiam auxiliar financeiramente o SESC e SENAC, salvo se integradas noutro serviço social.
Os recursos públicos transferidos a qualquer título para essas entidades submeter-se-ão à fiscalização, com a finalidade de verificar o cumprimento de metas e objetivos para os quais foram destinados[39]. Dispõe o artigo 34 do Decreto n° 61.843/67[40] que nenhum recurso do SENAC, quer na administração nacional, quer nas administrações regionais, será aplicado, seja qual for o título, senão em prol das finalidades da instituição, de seus beneficiários, ou de seus servidores, na forma prescrita neste Regulamento. Havendo valor remanescente dos recursos distribuídos às entidades de serviço social autônomo, constitui-se superavit – e não lucro -, e devem ser revertidos para os mesmos objetivos[41].
A instituição dessas contribuições parafiscais, nos termos do art. 149, § 1º da CRFB/88, será de competência da União. Os demais entes políticos – Estados, Distrito Federal e os Municípios – apenas poderão instituir contribuições para o costeio de sistemas de previdência e assistência social, a serem cobradas de seus servidores, em seu benefício (RE n° 138.284-8/CE, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ: 28/08/1992, p. 7).
A jurisdição do Tribunal de Contas da União abrange os responsáveis por entidades dotadas de personalidade jurídica de direito privado que recebam contribuições parafiscais e prestem serviço de interesse público ou social, nos termos do art. 5º, V, Lei nº 8.443/92[42]. Ainda sobre os dirigentes dos serviços sociais autônomos, para fins de sanção por atos de improbidade administrativa, eles são considerados agentes públicos (art. 2º, pela Lei 8.492/92), devendo, ademais, apresentar declaração de bens antes da posse e do exercício (art. 13º, pela Lei 8.492/92)[43].
Dentre tantas as características relativas aos serviços sociais autônomos que foram mencionados nesse tópico, como a natureza jurídica e o objeto dessas pessoas jurídicas, faz-se necessário localizar as entidades do “Sistema S” no gênero que foi estudado, visto que o presente trabalho focaliza os entes de cooperação tradicionais.
1.2 CLASSIFICAÇÃO DAS ENTIDADES DO “SISTEMA S”
Classificar as entidades do “Sistema S” demanda uma análise minuciosa, tendo em vista que, para chegar a esse grupo é necessário localizá-lo dentro das subdivisões do Terceiro Setor. Sabe-se que estão inseridas neste microssistema, porque não integram o Estado (primeiro setor), e nem se enquadram inteiramente na iniciativa privada (segundo setor), como dito anteriormente. Em seguida, as peculiaridades das entidades do Sistema S levaram juristas e membros dos órgãos de controle a incluí-las nas paraestatais. As camadas não se esgotam nessas duas classes, pois os serviços sociais autônomos ainda se subdividem, como será mencionado a seguir.
São consideradas paraestatais pelo fato de não integrarem nem a Administração Pública Direta, nem a Indireta, desempenhando suas tarefas ao lado do Estado, o qual as tornou oficiais e lhes deu amparo. Podem arrecadar as contribuições parafiscais, quando não estejam sendo subsidiadas diretamente por recursos orçamentários da entidade pública que as tenha criado[44].
Na doutrina brasileira há uma imprecisão conceitual quanto à entidade paraestatal[45], visto que alguns estudiosos entendem como uma espécie de autarquia, conservando fortes laços de dependência burocrática; outros alegam que se trata de uma pessoa jurídica de direito privado, cuja criação é autorizada por lei específica, para a realização de atividades de interesse coletivo, sob normas e controle do Estado; e para outros o conceito abrange entidades que exercem função típica, embora não exclusiva, do Estado. No último posicionamento, estão incluídas as que amparam os hipossuficientes, de assistência social e de formação profissional.
O ilustre professor José Cretella Júnior[46], por exemplo, alega que os entes paraestatais são sinônimos de autarquias, do que extrai o conceito de autarquias paraestatais, as quais “conservam fortes laços de dependência burocrática, possuindo, em regra, cargos criados e providos conjuntamente com as demais repartições do Estado, num âmbito de ação coincidente com o do território do Estado e participam amplamente do ‘jus imperii’”.
Para Diogo de Figueiredo Moreira Neto[47], paraestatais seriam as pessoas jurídicas de direito privado criadas por lei para desempenhar atribuições de natureza executiva no campo social e econômico. Dividir-se-iam, à luz dessa classificação, em paraestatais integrantes da administração indireta (as empresas públicas, as sociedades de economia mista, as subsidiárias destas duas figuras e as fundações públicas) e paraestatais associadas, que são os entes privados criados por lei e que recebem delegação legal para a prática de atividades administrativas públicas, mas sem vínculo com a hierarquia estatal.
Por outro lado, é o conceito de paraestatal criado por Meirelles[48] que mais se consagrou no direito administrativo brasileiro. Segundo este autor:
“O étimo da palavra paraestatal está indicando que se trata de ente disposto paralelamente ao Estado, ao lado do Estado, para executar cometimentos de interesse do Estado, mas não privativos do Estado. Enquanto as autarquias devem realizar atividades públicas típicas, as entidades paraestatais prestam-se a executar atividades públicas atípicas, impróprias do Poder Público, mas de utilidade pública, de interesse da coletividade, e, por isso, fomentadas pelo Estado, que autoriza a criação de pessoas jurídicas com personalidade privada para a realização de tais atividades com apoio oficial.
O paraestatal não é o estatal, nem é o particular; é o meio-termo entre o público e o privado. Justapõe-se ao Estado sem o integrar como o autárquico, ou alhear-se como o particular. Tem personalidade privada, mas realiza atividades de interesse público, e, por isso, os atos de seus dirigentes, revestindo certa autoridade e gerindo patrimônio público, expõem-se a determinados controles administrativos e sujeitam-se a mandado de segurança e a ação popular”.
Já mais recentemente, acrescentou também o professor Meirelles (2006. p. 67 apud MARQUES NETO; CUNHA, 2013, p. 140) que as entidades paraestatais configuram:
“[p]essoas jurídicas de Direito Privado que, por lei, são autorizadas a prestar serviços ou realizar atividades de interesse coletivo ou público, mas não exclusivos do Estado. (…) As entidades paraestatais são autônomas, administrativa e financeiramente, têm patrimônio próprio e operam em regime da iniciativa particular, na forma de seus estatutos, ficando sujeitas apenas à supervisão do órgão da entidade estatal a que se encontrem vinculadas, para o controle de desempenho estatutário. São os denominados entes de cooperação com o Estado”.
Para Di Pietro[49], além dos serviços sociais autônomos, dentre as entidades paralelas ao Estado podem ser incluídas as entidades de apoio (em especial fundações, associações e cooperativas), as organizações sociais e as organizações da sociedade civil de interesse público. Como foi dito no início do tópico, os serviços sociais autônomos são uma espécie de entidade paraestatal, e não uma expressão sinônima.
Os primeiros serviços sociais autônomos surgiram em meados do século XX, e foram batizados de entidades do “Sistema S”: SESI (Serviço Social da Indústria), SESC (Serviço Social do Comércio), SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e o SENAC (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial), destinados à formação profissional e educação para o trabalho, também com vistas, respectivamente, à indústria e ao comércio[50].
O denominado Sistema “S” é vinculado às entidades patronais de grau superior e patrocinados, basicamente, por recursos recolhidos do próprio setor produtivo beneficiado. Receberam das legislações que os criou inegável autonomia administrativa, limitada, formalmente, ao controle finalístico pelo Tribunal de Contas, de aplicação dos recursos recebidos[51].
Conforme reconheceu o Supremo Tribunal Federal, no RE nº. 789.874/DF[52], as entidades do “Sistema S” apresentam caráter sindical em virtude da sua criação, organização e administração terem sido responsabilidade de Confederações Nacionais:
“Presentes no cenário brasileiro desde a década de 1940, as entidades integrantes do denominado Sistema ‘S’ resultaram de iniciativa estatal destinada a desenvolver a prestação de certos serviços de elevado valor social. Conferiu-se a entidades sindicais dos setores econômicos a responsabilidade de criar, organizar e administrar entidades com natureza jurídica de direito privado destinadas a executar serviços de amparo aos trabalhadores. Como fonte financiadora desses serviços, atribui-se às empresas vinculadas a cada um dos setores econômicos envolvidos a obrigação de recolher uma contribuição compulsória, incidente sobre suas folhas de pagamento”. (RE nº. 789.874/DF, STF, Plenário, Min. Rel. Teori Zavascki, DJ: 17/9/2014, p. 2)
Posteriormente, foram criadas outras pessoas dessa natureza: o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), focada em planejar, coordenar e orientar programas técnicos, projetos e atividades de apoio às micro e pequenas empresas, em conformidade com as políticas nacionais de desenvolvimento, particularmente as relativas às áreas industrial, comercial e tecnológica; o SENAR (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), com o objetivo de organizar, administrar e executar o ensino da formação profissional rural e a promoção social do trabalhador rural; o SEST (Serviço Social do Transporte), servindo para gerenciar, desenvolver, executar, direta ou indiretamente, e apoiar programas voltados à promoção social do trabalhador em transporte rodoviário e do transportador autônomo, notadamente nos campos da alimentação, saúde, cultura, lazer e segurança no trabalho; e o SENAT (Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte), voltado à aprendizagem do trabalhador em transporte rodoviário e do transportador autônomo, notadamente nos campos de preparação, treinamento, aperfeiçoamento e formação profissional[53].
O SEBRAE passou a ter natureza jurídica de entidade de cooperação governamental com a entrada em vigor da Lei nº 8.029/1990[54], a qual dispôs em seu artigo 8° que “é o Poder Executivo autorizado a desvincular, da Administração Pública Federal, o Centro Brasileiro de Apoio à Pequena e Média Empresa – CEBRAE, mediante sua transformação em serviço social autônomo”. A mudança de denominação da entidade está disposta no artigo 1º, parágrafo único, do Decreto nº 99.570/1990[55]. Quanto aos seus líderes, o Decreto dispõe que o Presidente do Conselho Deliberativo será eleito dentre seus membros (art. 10, §2°), em sinal de desvinculação ao Poder Público, e a Diretoria Executiva será composta por 1 (um) Presidente e 2 (dois) Diretores, eleitos pelo Conselho Deliberativo, com mandato de 4 (quatro) anos (art. 10, §3°).
O SENAR é organizado e administrado pela Confederação Nacional da Agricultura (art. 2°, Lei nº 8.315/1991[56]). Quanto às rendas, a arrecadação da contribuição será feita juntamente com a Previdência Social e o seu produto será posto, de imediato, à disposição do SENAR, para aplicação proporcional nas diferentes Unidades da Federação, de acordo com a correspondente arrecadação, deduzida a cota necessária às despesas de caráter geral (art. 3º, §3º). Os membros titulares do Conselho Deliberativo serão indicados juntamente com seus respectivos suplentes (art 4°, §1º, Decreto n° 566/1992[57]), tendo cada conselheiro direito a um voto em plenário. Cabe ao Presidente, além do seu, o voto de qualidade (art 4°, §2º, Decreto n° 566/1992).
Ligados à Confederação Nacional do Transporte – CNT (art. 1º, Lei nº 8.706/1993[58]) estão o SEST e o SENAT. As rendas para a manutenção de ambos serão compostas, dentre outras, pelas atuais contribuições compulsórias das empresas de transporte rodoviário, calculadas sobre o montante da remuneração paga pelos estabelecimentos contribuintes a todos os seus empregados e recolhidas pelo Instituto Nacional de Seguridade Social, em favor do Serviço Social da Indústria – SESI, e do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI, que passarão a ser recolhidas em favor do Serviço Social do Transporte – SEST e do Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte – SENAT, respectivamente (art 7º, I).
Deve-se atentar para os serviços sociais autônomos ainda mais recentes, como a APEX-Brasil (Agência de Promoção de Exportações do Brasil) e a ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial)[59]. A primeira com o objetivo de promover a execução de políticas de promoção de exportações, em cooperação com o Poder Público, especialmente as que favoreçam as empresas de pequeno porte e a geração de empregos; e a segunda, destinada a executar políticas de desenvolvimento industrial, especialmente as que contribuam para a geração de empregos, em consonância com as políticas de comércio exterior e de ciência e tecnologia.
Cumpre anotar que dentro da própria categoria dos serviços sociais autônomos há uma subdivisão. Há as entidades do “Sistema S” clássicas, desvencilhadas do Estado, sem qualquer relação hierárquica, apenas submetidas a controle finalístico e dever de prestar contas dos recursos públicos recebidos para a sua manutenção. Há também as entidades de serviços sociais autônomos atuais, detentoras de regime e perfil jurídicos bem diversos dos atribuídos tradicionalmente às pessoas jurídicas da mesma natureza[60].
Ao contrário das entidades do Sistema “S” tradicionais, os novos serviços sociais autônomos, apesar de levarem essa denominação nas leis que as instituíram, foram implementadas pelo Poder Executivo, e não por entidades sindicais; não tem como objetivo a prestação de serviços sociais ou de formação profissional; não possuem a mesma independência administrativa e financeira que os entes de cooperação tradicionais têm, por estarem ligadas ao Poder Público.
Ratificando o posicionamento de Carvalho Filho, dispõe a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal[61]
“É importante não confundir essas entidades, nem equipará-las com outras criadas após a Constituição de 1988, cuja configuração jurídica tem peculiaridades próprias. É o caso, por exemplo, da Associação das Pioneiras Sociais – APS (serviço social responsável pela manutenção da Rede SARAH, criada pela Lei 8.246/91), da Agência de Promoção de Exportações do Brasil – APEX (criada pela Lei 10.668/03) e da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial – ABDI (criada pela Lei 11.080/04). Diferentemente do que ocorre com os serviços autônomos do Sistema “S”, essas novas entidades (a) tiveram sua criação autorizada por lei e implementada pelo Poder Executivo, não por entidades sindicais; (b) não se destinam a prover prestações sociais ou de formação profissional a determinadas categorias de trabalhadores, mas a atuar na prestação de assistência médica qualificada e na promoção de políticas públicas de desenvolvimento setoriais; (c) são financiadas, majoritariamente, por dotações orçamentárias consignadas no orçamento da própria União (art. 2º, § 3º, da Lei 8.246/91, art. 13 da Lei 10.668/03 e art. 17, I, da Lei 11.080/04); (d) estão obrigadas a gerir seus recursos de acordo com os critérios, metas e objetivos estabelecidos em contrato de gestão cujos termos são definidos pelo próprio Poder Executivo; e (e) submetem-se à supervisão do Poder Executivo, quanto à gestão de seus recursos.
(…)
Bem se vê, portanto, que ao contrário dos serviços autônomos do primeiro grupo, vinculados às entidades sindicais (SENAC, SENAI, SEST, SENAT e SENAR), os do segundo grupo (APS, APEX e ABDI) não são propriamente autônomos, pois sua gestão está sujeita a consideráveis restrições impostas pelo poder público, restrições que se justificam, sobretudo, porque são financiadas por recursos do próprio orçamento federal. Essas limitações atingem, inclusive, a política de contratação de pessoal dessas entidades. Tanto a lei que autorizou a criação da APS, quanto aquelas que implementaram a APEX e a ABDI têm normas específicas a respeito dos parâmetros a serem observados por essas entidades nos seus processos seletivos e nos planos de cargos e salários de seus funcionários” (ex: art. 3º, VIII e IX, da Lei 8.246/91, art. 9º, V e VI da Lei 10.668/03 e art. 11, §§ 2º e 3º da Lei 11.080/04).
A Lei n° 10.668/2003[62], por exemplo, prevê expressamente em seu artigo 1º que o Poder Executivo tem autorização para instituir o Serviço Social Autônomo Agência de Promoção de Exportações do Brasil – Apex-Brasil, na forma de pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos, de interesse coletivo e de utilidade pública. No entanto, percebe-se que, diferentemente das entidades de cooperação governamental tradicionais, o Presidente da Diretoria Executiva da Apex-Brasil será indicado pelo Presidente da República (art. 6°). Também será elaborado contrato de gestão, cujos termos serão definidos pelo Poder Executivo (art. 9º, I), e o processo de seleção para admissão de pessoal efetivo observará os mesmos princípios aplicados à Administração Pública (art. 9º, V).
Da mesma forma, o Presidente e os Diretores da Diretoria Executiva da ABDI serão escolhidos e nomeados pelo Presidente da República para o exercício de mandato de 4 (quatro) anos, podendo ser por ele exonerados a qualquer tempo, de ofício ou por proposta do Conselho Deliberativo, aprovada por maioria absoluta de seus membros (art. 6º, Lei nº 11.080/2004). A ABDI, com observância aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e economicidade (art. 11), firmará contrato de gestão com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior para execução das finalidades previstas na lei que autorizou a sua instituição (art. 10)[63].
Ademais, constituem receitas adicionais da ABDI os recursos que lhe forem transferidos em decorrência de dotações consignadas no Orçamento-Geral da União, créditos adicionais, transferências ou repasses (art. 17, I, Lei nº 11.080/2004)[64]. Nos serviços sociais clássicos, todavia, não há recebimento de recursos diretos do erário.
Esses serviços sociais autônomos mais recentes afastaram-se do modelo clássico e mais se aproximaram do sistema da Administração Pública descentralizada. Levando em consideração seu objeto institucional, poderiam ser corretamente enquadradas como agencias executivas, sob a forma de autarquias. No caso, acabou surgindo um regime híbrido: são típicas pessoas administrativas, embora excluídas formalmente da Administração Indireta.
Classificar as entidades do “Sistema S”, mostrando que são uma espécie de entidades paraestatais, além de uma subdivisão dos serviços sociais autônomos, foi relevante para facilitar a análise dos problemas jurídicos que giram em torno especificamente desses entes. Necessário, agora, trazer à baila assuntos que frequentemente são discutidos nos Tribunais sobre as entidades do “Sistema S” tradicionais.
Conforme mencionado no capítulo anterior, as entidades do “Sistema S” atuam paralelamente ao Estado e possuem autonomia administrativa, submetendo-se a controle finalístico para que seja analisado o destino que está sendo dado aos recursos públicos que recebem para a sua manutenção. O presente capítulo não inclui os serviços sociais autônomos mais recentes justamente por apresentarem características de subordinação ao Estado.
As controvérsias estudadas a seguir levam ao mesmo questionamento: qual dos regimes jurídicos influencia mais as relações com as entidades do “Sistema S”? O público ou o privado?
Em grande parte, o regime jurídico aplicável a essas entidades é o de direito privado, no entanto, a natureza supraindividual dos interesses atendidos e o cunho tributário dos recursos envolvidos faz com que algumas regras do direito público tenham brechas para serem aplicadas[65].
Esse entendimento é perceptível em decisões do Tribunal de Contas da União, como no caso do Acórdão 1.589/2014, 2ª. Câmara, de relatoria do Ministro Aroldo Cedraz[66]:
“A jurisprudência do Tribunal é pacífica no sentido de considerar que as entidades do chamado “Sistema S” não estão sujeitas a todos os comandos da Lei nº 8.666/1993, mas que devem obedecer os princípios inerentes à licitação pública e a realização da despesa pública de uma forma geral” (Acórdãos 88/2008, 556/2010, 1.029/2011, 526/2013, todos do Plenário, dentre diversos outros).
Um ponto que diferencia essas entidades da iniciativa privada é o fato de serem criadas por lei. Ainda que sejam dotadas de personalidade jurídica de direito privado e geridas por particulares, isso significa que não se trata propriamente de entidades resultantes da livre escolha dos particulares. Sua existência, sua estrutura e seu funcionamento estão contemplados em dispositivos legais[67].
Além disso, Os bens e serviços do SENAI gozam da mais ampla isenção fiscal, nos termos do artigo 9º do Decreto nº 494/62[68]. A prestação de contas também é uma distinção à iniciativa privada e deve ser feita por qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária[69].
Nesse sentido, já estabelecia o artigo 183 do Decreto-lei 200/1967[70]:
“As entidades e organizações em geral, dotadas de personalidade jurídica de direito privado, que recebem contribuições parafiscais e prestam serviços de interesse público ou social, estão sujeitas à fiscalização do Estado nos termos e condições estabelecidas na legislação pertinente a cada uma”.
Por administrarem verbas decorrentes de contribuições parafiscais e desfrutarem de prerrogativas próprias dos entes públicos, estão sujeitas a normas parecidas às da Administração Pública, inclusive no que diz respeito a licitação, processo seletivo para a contratação de pessoal, prestação de contas, submissão ao controle[71], equiparação dos seus empregados aos servidores públicos para fins criminais (art. 327, CP)[72] e improbidade administrativa (Lei nº 8429/92).
O relacionamento entre o serviço social autônomo e a realização dos seus fins envolve uma atividade de satisfação de interesses coletivos. Segundo Justen Filho[73], ainda que não exista exercício de competências estatais nem possibilidade de atuação dotada de coercitividade, tem-se de reputar que a atuação desempenhada pelos serviços sociais autônomos é norteada pelos mesmos princípios e regras fundamentais que disciplinam a atividade administrativa. Logo, os integrantes da categoria profissional subordinados a determinado serviço social autônomo, podem exigir a observância pelos administradores dos princípios e regras fundamentais do direito administrativo.
Falar em princípios administrativos e sua influência sobre as entidades do “Sistema S” direciona o estudo à (in)dispensabilidade na adoção de procedimento licitatório, bem como à necessidade – ou não – do uso de concurso público para a contratação de pessoal.
2.1 CONTROVÉRSIAS SOBRE A (DES)NECESSIDADE DE SUJEITAR OS SERVIÇOS SOCIAIS AUTÔNOMOS ÀS NORMAS GERAIS DE LICITAÇÃO
Optou-se por intitular o segundo capítulo do presente trabalho de “Temas recorrentes envolvendo as entidades do Sistema S”, e não “Temas atuais […]”, porque, em se tratando de licitação, o assunto apresenta controvérsias datadas antes mesmo da entrada em vigor da Lei nº 8.666/93. Ora, em virtude de a questão estar sempre sendo discutida pela doutrina e jurisprudência, necessário levantar suas interpretações.
Os fundamentos que justificam a (des)necessidade das entidades do “Sistema S” se sujeitarem às normas gerais de licitação são questões históricas e que ainda não chegaram a uma conclusão. É uma polêmica antiga, mas que perdura até o momento, podendo usar como exemplo a Decisão nº 24/1993.
A Associação das Pioneiras Sociais-APS formulou consulta no Tribunal de Contas da União, Processo nº 010.982/1992-2, ata nº 06/1993, 17/02/1993, buscando conhecer o entendimento desta Corte sobre o art. 3º, inciso XV, da Lei nº 8.246, de 22/10/91, que prevê a instituição e posterior publicação no Diário Oficial da União de manual de licitação. Esta lei autorizou o Poder Executivo a instituir a referida entidade – na forma de Serviço Social Autônomo – e a extinguir a antiga Fundação das Pioneiras Sociais[74].
O Decreto nº 371, de 21/12/91[75], instituidor da referida entidade, também especificou em seu artigo 11 que, em 90 (noventa) dias, contados da sua instauração, será publicado o regulamento que disciplinará os procedimentos licitatórios do órgão, adequado às suas finalidades, observados os princípios básicos da licitação. Dispôs o parágrafo único que, enquanto essa publicação não for feita, o Serviço Social Autônomo “Associação das Pioneiras Sociais” ficará sujeito às determinações do Decreto-lei nº 2.300, de 21 de novembro de 1986.
Naquela época, a Lei Geral sobre Licitações e Contratos era este Decreto-lei nº 2.300/86[76], e informava em seu art. 85, parágrafo único, que as entidades submissas ao mesmo não poderiam ampliar casos de dispensa, inexigibilidade e vedação de licitação. As sociedades de economia mista, empresas públicas e demais entidades controladas pela União, até que editassem seus regulamentos próprios, deveriam agir com observância às normas gerais de licitação, nos termos do art. 86.
No caso, o entendimento do Ministério Público foi no sentido de que se sujeitar às normas do Decreto-lei nº 2.300/86 não era uma obrigação atribuída apenas às entidades da Administração Indireta, mas, ainda, atingia todos aqueles entes “controlados direta ou indiretamente pela União Federal”, em cujo rol se inclui os Serviços Sociais Autônomos. Por outro lado, a posição adotada pelo relator[77] foi que os serviços sociais autônomos, como entes de cooperação, do gênero paraestatal, vicejam ao lado do Estado e sob seu amparo, mas sem subordinação hierárquica a qualquer autoridade pública. Por isso, a entidade não seria destinatária das regras impostas pelo art. 86 do Decreto-lei nº 2.300/86, salvo quanto aos princípios básicos expressamente anunciados no seu art. 3º.
Atualmente, o mesmo debate perdura no Tribunal de Contas da União. A controvérsia ainda recai sobre a expressão “entidades controladas”. Há decisões que, em virtude das suas peculiaridades, incluem as entidades do “Sistema S” no grupo de pessoas jurídicas submissas à União, e alegam que os regulamentos internos devem se sujeitar à Lei nº 8.666/93. Em contrapartida, há decisões que defendem só ser aplicável a expressão “entidades controladas” às empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 243, § 2º, da Lei nº 6.404/1976 (Lei das Sociedades Anônimas).
Quanto à expressão “entidades controladas”, eis a previsão legal que as prevê:
“Art. 119. As sociedades de economia mista, empresas e fundações públicas e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União e pelas entidades referidas no artigo anterior editarão regulamentos próprios devidamente publicados, ficando sujeitas às disposições desta Lei.
Parágrafo único. Os regulamentos a que se refere este artigo, no âmbito da Administração Pública, após aprovados pela autoridade de nível superior a que estiverem vinculados os respectivos órgãos, sociedades e entidades, deverão ser publicados na imprensa oficial.”[78]
Carvalho Filho[79] discorda do entendimento de que a expressão “controladas indiretamente” se refira somente às sociedades reguladas pela Lei nº 6.404/1976. Alega que, embora organizadas pelas Confederações Nacionais – setor privado -, tais entidades têm sua existência autorizada por previsão legal; além disso, há suas contribuições parafiscais, pagas obrigatoriamente pelos contribuintes, caracterizando-se como recursos públicos. Tais fundamentos, para este jurista, são suficientes para submetê-las a controle do Poder Público, que já acontece com relação às suas contas, mas que deve se estender aos procedimentos licitatórios e de contratação.
As Decisões nº 47/1995 (1ª Câmara, Ata nº 8/1995), nº 408/1995 (Plenário, Ata nº 37/1995) e nº 166/1996 (2ª Câmara, Ata nº 23/1997), são exemplos de posicionamentos do Tribunal de Contas da União no sentido de ser uma obrigação do SENAI observar em seu regulamento as regras do Estatuto Geral (Lei nº 8.666/93). Estas decisões também entendem pela vedação de que essas disposições fossem contrariadas por regulamentos internos[80].
“2. Faculta-se, por evidente, às entidades retromencionadas a elaboração de regulamentos internos de licitação e contrato. Apenas se exige que tais normas endógenas estejam em consonância com o texto legal. Ao Tribunal cabe, verificando a desconformidade do regulamento com a lei, determinar à entidade que providencie o ajuste do texto normativo interno com os dispositivos legais”[81].
In verbis, para Carvalho Filho[82], as entidades do “Sistema S” não são excluídas da Lei nº 8.666/93:
“Por outro lado, estão obrigadas a realizar licitação antes de suas contratações, como o exige a Lei nº 8.666/1993, que, de forma clara, consigna que se subordinam a seu regime jurídico, além das pessoas da Administração Indireta, “as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.”
[…]
Para deixar bem clara a nossa posição, queremos deixar registrado que não estamos questionando se é conveniente ou não que o Estatuto as alcance. Apenas estamos interpretando os dizeres da lei para entender que o texto legal, além de não ofender a Constituição, inclui realmente as pessoas de cooperação governamental. E que, se mudança tiver que acontecer, que o seja através de nova lei federal, e não por interpretação dissonante do texto legal vigente. Em suma, parece-nos que a melhor interpretação era aquela que o Colendo TCU dispensava à matéria anteriormente”.
De outro modo, as Decisões nº 907 de 11/12/1997 e nº 461 de 22/07/1998 do Plenário do TCU são dois dos entendimentos que o SENAC utiliza para justificar a desnecessidade da sua submissão à Lei n° 8.666/93. Conforme a primeira decisão[83], a norma geral de licitações não alargou o seu alcance e nem poderia, pois extrapolaria os limites permitidos pela Constituição para entidades não pertencentes à Administração Direta e Indireta.
O parágrafo único do artigo 1º, Lei nº 8.666/93[84], informa que se subordinam ao regime desta Lei, “além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios”. A expressão ‘entidades controladas’ diz respeito apenas às empresas ou sociedades nas quais a União ou suas empresas – considerando-se a Administração Pública Federal – detenha a maioria absoluta dos direitos de voto, nos termos do art. 243, § 2º, da Lei nº 6.404/76[85].
“Art. 243.
[…]
Em outras palavras, para uma entidade se enquadrar como controlada, basta que a suposta controladora detenha o poder de eleger a maioria dos diretores e tomar as principais decisões na vida da empresa que a ela se submete.
Assim, segundo a Decisão nº 907/97, tanto o parágrafo único do art. 1º quanto o art. 119 da Lei nº 8.666/93 não podem abranger os serviços sociais autônomos, visto que eles não se inserem entre as entidades que compõem Administração Pública, tampouco são entidades controladas direta ou indiretamente pela União, nos termos definidos na Lei das Sociedades por Ações.
Outra polêmica gira em torno do alcance da Lei nº 8.666/1993, se ela poderia ou não alargar o seu domínio para abranger as entidades do “Sistema S” em seu raio de incidência, independente do questionamento se são ou não entidades controladas pela União.
A previsão constitucional que trata da competência da União para legislar sobre normas gerais de licitação e contratação, art. 22, XXVII, informa que sua aplicação, em todas as modalidades, deve se estender às administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III. Se seguir a disposição constitucional à risca, o dever de licitar se dirige à administração direta e indireta, na qual não estão as pessoas de cooperação governamental[86].
Nesse sentido também se posiciona a Decisão nº 907/97[87], alegando que a competência atribuída à União para legislar em matéria de licitações e contratos não abrange os serviços sociais autônomos porque, embora sendo beneficiários de recursos oriundos de contribuições parafiscais, não se incluem entre aquelas unidades e entidades classificadas nos dois grupos da Administração Pública, indicados no art. 22, inciso XXVII, da Constituição Federal. Se a Lei nº 8.666/93, em perfeita consonância com a Constituição, não enumerou essas instituições entre aquelas a que se destina, é defeso ao intérprete fazê-lo.
Carvalho Filho[88] alega que, primeiramente, o fato de o art. 22, XXVII, da CF/88, aludir apenas à administração direta e indireta não exclui a possibilidade de o legislador exigir que outras pessoas se submetam também à Lei nº 8.666/1993. Afinal, se a própria lei autorizou a criação de tais pessoas, nada impediria que instituísse mecanismos especiais de controle, pois que afinal todas têm algum elo com o Poder Público. Desse modo, o Estatuto, como lei federal que é, poderia alargar o alcance do dispositivo constitucional para incidir sobre tais entidades (como o fez realmente no art. 1º, parágrafo único), por isso que a Constituição em nenhum momento limitou a lei licitatória apenas às pessoas da Administração Direta e Indireta; exigiu-se tão somente que para estas sempre haveria subordinação ao Estatuto.
Após a exposição dos fundamentos que defendem a sujeição das entidades do Sistema “S” à Lei nº 8.666/93, bem como os que opinam pela obediência apenas ao Regulamento Interno, far-se-á um breve comparativo entre ambas as normas, a fim de compreender suas distinções.
Quanto às modalidades de licitação, algumas das diferenças são: a) a quantidade de convidados no Convite, visto que, nos termos da Lei nº 8666/93[89], cadastrados ou não, são escolhidos e convidados pelo menos 3 (três) interessados pela unidade administrativa (artigo 22, § 3º), enquanto que pelo Regulamento de Licitações do SENAI[90] (art. 5º, II) o mínimo é de 5 (cinco) interessados; b) o prazo de publicação do edital no Concurso, com 45 dias mínimos de antecedência se seguir a Lei nº 8.666/93 (art. 22, §4º), e sem menção no Regulamento do SENAI (artigo 5º, III); c) o objetivo no Leilão, por que, pela Lei nº 8.666/93, há a venda de bens móveis inservíveis para a administração, venda de produtos legalmente apreendidos ou penhorados e a alienação de bens alienar bens imóveis adquiridos em procedimento judicial ou através de dação em pagamento (art. 22, §5º, Lei nº 8.666/93). O Regulamento do SENAI dispõe, apenas, que é “modalidade de licitação entre quaisquer interessados, para a venda de bens, a quem oferecer maior lance, igual ou superior ao valor da avaliação” (art. 5º, IV).
A Decisão nº 408/1995 (Plenário, Ata nº 37/1995)[91] faz uma comparação entre o que estabelece o art. 12, § 3º, do Regulamento do SENAI, e o art. 22, § 3º, da Lei nº 8.666/93, no intuito de demonstrar a afronta aos princípios regentes da Administração Pública:
“O ponto central da Representação de fls. 04/06 reside no fato de o SENAI/PE não ter aceito a interessada como licitante, na forma do art. 22, § 3º, da Lei nº 8.666/93, alterada pela de nº 8.883, de 08/06/94, que encampou a possibilidade de quaisquer outros interessados, não convidados, participarem de licitação na modalidade Convite, desde que manifestem seu interesse com antecedência de até 24 horas da apresentação das “propostas” e sejam cadastrados.
[…]
16. Percebe-se, assim, que o conceito de Convite, na acepção do SENAI, não permite que os interessados manifestem seus interesses com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas de participarem do procedimento licitatório, o que vai de encontro aos ditames estabelecidos pela Lei nº 8.666/93.
17. Dessa forma, podemos concluir que a Diretoria Regional, ao realizar o certame baseando-se apenas no Regulamento Interno do SENAI, feriu o direito da empresa CONTHÁBIL candidatar-se à licitação, violando, pois, o princípio da legalidade e da igualdade a que se refere o art. 3º da mencionada Lei”.
Tendo em vista o valor estimado da contratação, os limites das modalidades de licitação são: a) para obras e serviços de engenharia, até R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais) no Convite e acima de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais) na Concorrência, em observância à Lei nº 8.666/93[92] (art. 23, I); até R$ 1.179.000,00 (um milhão, cento e setenta e nove mil reais) no Convite e acima de R$ 1.179.000,00 (um milhão, cento e setenta e nove mil reais) na Concorrência, segundo o Regulamento do SENAI[93] (art. 6º, I); b) para compras e demais serviços, até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) no Convite e acima de R$ 650.000,00 (seiscentos e cinqüenta mil reais) na Concorrência, em observância à Lei nº 8.666/93 (art. 23, II); até R$ 395.000,00 (trezentos e noventa e cinco mil reais) no Convite e acima de R$ 395.000,00 (trezentos e noventa e cinco mil reais) na Concorrência, segundo o Regulamento do SENAI (art. 6º, II).
Dentre os tipos de licitação, o Regulamento do SENAI[94] não acrescentou a melhor técnica (art. 8º), sendo o tipo técnica e preço utilizado preferencialmente para contratações que envolvam natureza intelectual ou nas quais o fator preço não seja exclusivamente relevante e, neste caso, desde que justificado tecnicamente (§1º, art. 8º).
O Regulamento do SENAI[95] traz as seguintes hipóteses em que a licitação poderá ser dispensada (art. 9º): I) nas contratações de até R$ 79.000,00 (setenta e nove mil reais) para obras e serviços de engenharia e de até R$ 44.000,00 (quarenta e quatro mil reais) para compras e demais serviços; II) nas alienações de bens no valor máximo de R$ 44.000,00 (quarenta e quatro mil reais); III) quando não acudirem interessados à licitação e esta não puder ser repetida sem prejuízo para o SENAI, mantidas, neste caso, as condições preestabelecidas; IV) nos casos de calamidade pública ou grave perturbação da ordem pública; V) nos casos de emergência, quando caracterizada a necessidade de atendimento a situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens; VI) na aquisição, locação ou arrendamento de imóveis, sempre precedida de avaliação; VII) na aquisição de gêneros alimentícios perecíveis, com base no preço do dia; VIII) na contratação de entidade incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, científico ou tecnológico, desde que sem fins lucrativos; IX) na contratação, com Serviços Sociais Autônomos e com órgãos e entidades integrantes da Administração Pública, quando o objeto do contrato for compatível com as atividades finalísticas do contratado; X) na aquisição de componentes ou peças necessários à manutenção de equipamentos durante o período de garantia técnica, junto a fornecedor original desses equipamentos, quando tal condição for indispensável para a vigência da garantia; XI) nos casos de urgência para o atendimento de situações comprovadamente imprevistas ou imprevisíveis em tempo hábil para se realizar a licitação; XII) na contratação de pessoas físicas ou jurídicas para ministrar cursos ou prestar serviços de instrutoria vinculados às atividades finalísticas do SENAI; XIII) na contratação de serviços de manutenção em que seja pré-condição indispensável para a realização da proposta a desmontagem do equipamento; XIV) na contratação de cursos abertos, destinados a treinamento e aperfeiçoamento dos empregados do SENAI; XV) na venda de ações, que poderão ser negociadas em bolsas; XVI) para a aquisição ou restauração de obras de arte e objetos históricos, de autenticidade certificada, desde que compatíveis ou inerentes às finalidades da Entidade; XVII) na contratação de remanescente de obra, serviço ou fornecimento em consequência de rescisão contratual, desde que atendida a ordem de classificação da licitação anterior e aceitas as mesmas condições oferecidas pelo licitante vencedor, inclusive quanto ao preço, devidamente corrigido.
A licitação será inexigível[96] quando houver inviabilidade de competição, em especial (art. 10, Regulamento SENAI): I) na aquisição de materiais, equipamentos ou gêneros diretamente de produtor ou fornecedor exclusivo; II) na contratação de serviços com empresa ou profissional de notória especialização, assim entendido aqueles cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica ou outros requisitos relacionados com sua atividade, permita inferir que o seu trabalho é o mais adequado à plena satisfação do objeto a ser contratado; III) na contratação de profissional de qualquer setor artístico; IV) na permuta ou dação em pagamento de bens, observada a avaliação atualizada; V) na doação de bens.
A dispensa de licitação é outro assunto que provoca constantes debates. Há entendimento do Tribunal de Contas da União alegando que os Serviços Sociais Autônomos não podem, em seus regulamentos próprios de licitações e contratos, estabelecer novas hipóteses de contratação direta[97]. Reconhece que, por se tratar de uma pessoa jurídica de direito privado, as entidades de cooperação governamental não seguem os estritos termos da Lei 8.666/93, mas alerta que as hipóteses de contratação direta devem ter correspondência às já estabelecidas por norma geral, de competência privativa da União, como é possível observar a seguir:
“3. As entidades do Sistema S não podem instituir em seus regulamentos novas hipóteses de contratação direta, haja vista que a matéria deve ser disciplinada por norma geral, de competência privativa da União.
Pedido de Reexame interposto pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex- Brasil) requerera, dentre outras demandas, a insubsistência de determinação do TCU que a obrigara a promover alteração de dispositivo constante em seu regulamento de licitações e contratos para adequá-lo aos princípios constitucionais da impessoalidade, da moralidade e da igualdade. O dispositivo em questão permite a dispensa de licitação ‘para a participação da Apex-Brasil em feiras, exposições, congressos, seminários e eventos em geral, relacionados com sua atividade-fim’. Contrapondo os argumentos do relator, e em consonância com o posicionamento da unidade técnica, o revisor destacou que a redação do dispositivo ‘abre ampla margem para que a entidade contrate, por dispensa de licitação, quaisquer serviços necessários a sua participação em eventos’, em afronta aos princípios da impessoalidade, da igualdade, da moralidade e da publicidade. Mencionando que a jurisprudência do TCU, de um lado, reconhece que as entidades do Sistema S não se submetem aos exatos termos da Lei 8.666/93, o revisor afirmou que, de outro lado, é pacífico que essas entidades devem obediência aos princípios elencados no art. 37 da Constituição Federal e no caput do art. 3º do Estatuto das Licitações, bem como ‘não podem inovar na ordem jurídica e instituir, por meio de normas infralegais, novas hipóteses de contratação direta (Acórdão 2.790/2013-TCU-2ª Câmara)’. Voltando a atenção ao caso concreto, o revisor assinalou que a liberalidade prevista no regulamento da Apex-Brasil ‘tanto infringe os princípios que regem as contratações realizadas com recursos públicos como constitui inovação que extrapola as hipóteses de dispensa de licitação hoje já existentes’. Por fim, o revisor asseverou que a atual redação do dispositivo tem grande potencial de repercussão sobre as demais integrantes do Sistema S e sob ‘suposto argumento de que se trata de prática mais célere e eficiente, a disposição pode passar a respaldar contratações relacionadas à atividade fim de tais entidades, prejudicando a obtenção de contratações mais vantajosas e violando os princípios da impessoalidade, da moralidade e da igualdade’. Acolhendo os argumentos do revisor, o Colegiado manteve intacto o item da deliberação recorrida. Acórdão 3195/2014-Plenário, TC 005.708/2013-3, revisor Ministro Bruno Dantas, 19.11.2014.”[98]
No mesmo sentido, dispõe o Informativo de Licitações e Contratos n° 159/2013 do Tribunal de Contas da União[99]:
“3. As entidades do Sistema S não podem inovar na ordem jurídica, por meio de seus regulamentos próprios, instituindo novas hipóteses de dispensa e de inexigibilidade de licitação, haja vista que a matéria deve ser disciplinada por norma geral, de competência privativa da União.
Auditoria com o objetivo de analisar processos licitatórios e contratos de aquisição de bens e prestação de serviços na Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) – decorrente de Solicitação do Congresso Nacional para que o TCU realizasse auditoria nas despesas das entidades do Sistema S – apontou, dentre outras falhas, a existência, no Regulamento de Licitações e Contratos da entidade, de hipótese de dispensa de licitação ‘para a participação em feiras, exposições, congressos, seminários e eventos em geral, relacionados à atividade-fim’. Sobre o assunto, anotou o relator que ‘não obstante o fato de os serviços sociais autônomos não se sujeitarem aos ditames da Lei n. 8.666/1993, devem seus regulamentos próprios atender aos princípios básicos que regem a Administração Pública, dispostos no art. 37 da Constituição Federal, em especial os da impessoalidade, da moralidade e da igualdade’. Relembrou voto revisor vitorioso na prolação do Acórdão 2790/2013 – Segunda Câmara, oportunidade em que ficou assente que ‘embora não se exija a plena submissão dos entes integrantes do Sistema S à Lei n. 8.666/1993, eles não detêm competência para legislar sobre este assunto, por se tratar de matéria de lei ordinária (reserva legal segundo a vontade do legislador constituinte), de competência privativa da União, consoante o art. 22, XXVII, da Lei Maior’. Nesse passo, caracterizada a ilegalidade da inovação normativa, o relator perfilou a proposta da unidade instrutiva no sentido de se determinar à Apex-Brasil alteração em seu regulamento próprio de licitações e contratos. O Tribunal, ao acolher a proposta do relator, determinou à entidade que ‘promova a devida alteração no Regulamento de Licitações e de Contratos, aprovado pela Resolução/Apex-Brasil”.
O TCU, sob o prisma dos princípios constitucionais previstos no art. 37 da Constituição Federal, entende que o Sistema “S” não pode inovar na ordem jurídica, estabelecendo novas hipóteses de dispensa de licitação, tendo em vista o disposto no art. 22, inc. XXVII, da Constituição Federal de 1988, segundo o qual somente a União tem competência para legislar sobre normas gerais de licitações e contratos, o que inclui as situações de dispensa.
Como bem ponderou o E. Ministro José Jorge, relator do Acórdão 3195/2014 Plenário:
“(…) a licitação homenageia sobremaneira o princípio da isonomia ao assegurar igualdade de condições a todos que desejam contratar com o poder público, daí porque o legislador constituinte determinou que as exceções ao dever de licitar fossem contempladas em legislação específica (lei em sentido formal, editada pelo Congresso Nacional). Trata-se, pois, de exceção ao princípio da igualdade, exceção essa que foi legitimada pelo próprio constituinte. Em apertada síntese, o constituinte determinou que fosse observado o princípio da isonomia nas contratações envolvendo recursos públicos e ele mesmo admitiu exceções a essa regra, as quais, segundo ele, deveriam ser objeto de lei em sentido formal[100]”.
Desse modo, entende-se que a situação merece cautela por parte dos Serviços Sociais Autônomos ao pretenderem alterar seus regulamentos, no que concerne às situações de dispensa de licitação, posto que segundo o entendimento majoritário da Corte Federal de Contas estes devem guardar correspondência com o já estabelecido em lei de caráter geral sobre licitações e contratos, de competência privativa da União, ainda que os recentes debates travados no âmbito da Suprema Corte e do TCU pareçam colocar em xeque as orientações até então expendidas.
Ora, outra questão que desperta debates sobre a maior influência das regras de direito público, ou não, é a contratação de pessoal. O posicionamento atual parece pacificado no âmbito do Tribunal de Contas da União, além de o Supremo Tribunal Federal ter reconhecido a sua repercussão geral, no entanto, far-se-á uma análise histórica sobre o tema, tendo em vista que gradualmente os julgados foram se modificando.
2.2 EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL DOS TRIBUNAIS ACERCA DA CONTRATAÇÃO DE PESSOAL PELAS ENTIDADES DO “SISTEMA S”
A temática envolvendo a contratação de pessoal nas entidades do “Sistema S” passou por uma evolução nos julgados do Tribunal de Contas da União, desde o entendimento acerca da necessidade de submissão destas pessoas jurídicas ao concurso público, até chegar à concordância pela não obrigatoriedade desse tipo de seleção. Esta posição foi firmada ainda mais após o Supremo Tribunal Federal reconhecer a repercussão geral do assunto, nos autos do RE 789.874/DF.
Antes entendia-se que as entidades do “Sistema S”, por serem são custeadas com recursos públicos, tinham o dever de realizar concurso público para a contratação de funcionários. Embora sejam pessoas jurídicas de direito privado, a sua fonte de renda – as contribuições compulsórias – tem caráter público e, por isso, se assemelham aos tributos. Este era o posicionamento do Tribunal de Contas da União, conforme determinação desta Corte a entidade do “Sistema S” em Acórdão inserido na Relação nº 003/2000, (Ata nº 005/2000)[101]:
“a) utilizar concurso público para o provimento de cargos de natureza permanente, conforme a Constituição Federal, art. 37, inciso II, e o Regulamento de Pessoal do [entidade], art. 8º;
O concurso público é a ferramenta que melhor representa o sistema do mérito, posto à disposição da Administração Pública para garantir a moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público. Além disso, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei, fixados de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, consoante determina o art. 37, II, da Constituição Federal. Por se tratar de um conjunto de atos administrativos, deve ser realizado através de bancas ou comissões examinadoras, regularmente constituídas com elementos capazes e idôneos dos quadros do funcionalismo ou não, e com recurso para órgãos superiores, visto que o regime democrático é contrário a decisões únicas, soberanas e irrecorríveis[102].
Quanto às características que tornam esse estilo de recrutamento o ideal para, teoricamente, garantir a observância aos princípios constitucionais, pode-se citar: a) em concursos públicos de provas e títulos geralmente a etapa de análise curricular é utilizada como elemento classificatório – e não eliminatório -, a fim de garantir a impessoalidade; b) é vedada a transferência de servidor entre cargos de carreira diversos sem prévia aprovação em concurso, em respeito à moralidade administrativa; c) se o edital não menciona o número de vagas, pelo menos o candidato classificado em primeiro lugar tem direito à nomeação, assegurando a segurança jurídica[103].
No entanto, a burocracia, comum a todas as etapas de um concurso público, passou a levantar questionamentos sobre a necessidade deste tipo de seleção ser adotado nas entidades do “Sistema S”. Além disso, com a leitura literal do artigo 37, inciso II, da Constituição Federal de 1988, constatou-se que as entidades do “Sistema S” não se enquadravam no presente dispositivo. A partir daí surgiram julgados autorizando a adoção de um processo seletivo mais simplificado.
Originadas após a Reforma da Administração Pública, essas entidades são o resultado de uma busca dos governantes por soluções: na época, institutos novos, com medidas inovadoras e que permitiam ao Estado obter maior eficiência na prestação dos serviços que lhe são afetos[104]. Na opinião de Meirelles[105], “não integram a Administração direta nem a indireta, mas trabalham ao lado do Estado, sob seu amparo, cooperando nos setores, atividades e serviços que lhes são atribuídos, por serem considerados de interesse específico de determinados beneficiários”. Ora, por se tratar de entes de cooperação, e não pessoas jurídicas integrantes da Administração Pública, não necessitam se sujeitar às mesmas regras destinadas a estas – como o concurso público –, porque isso tiraria a razão pela qual os serviços sociais autônomos são criados, que é proporcionar mais eficiência na prestação do serviço de utilidade pública.
Levando em consideração que o artigo 37, inciso II, da Constituição Federal de 1988 determina a aprovação prévia em concurso público para ocupar cargos na Administração Pública Direta e Indireta, e os Serviços Sociais Autônomos não integram essas entidades administrativas, a exigência de concurso público passou a ser questionada. As entidades do “Sistema S”, no entanto, estão sujeitas aos princípios aplicáveis à Administração Pública, tendo em vista que recebem recursos públicos. Em face disso, o Tribunal de Contas da União, em diversos julgados, manifestou entendimento segundo o qual as entidades do Sistema “S”, em respeito aos princípios gerais do regime jurídico administrativo previstos no art. 37, “caput”, da CF/88, devem realizar regular processo seletivo para a contratação do pessoal que irá compor os seus quadros funcionais. Ora, começaram a surgir decisões no sentido de permitir a inaplicabilidade de concurso nos moldes do art. 37, II, CF/88; havendo possibilidade de processo seletivo público.
“Parece estar pacífico no âmbito desta Corte o entendimento da inaplicabilidade do concurso público para admissão de pessoal, previsto no art. 37, inciso II, da Constituição Federal, visto não pertencer a Entidade em questão à estrutura da Administração Pública direta ou indireta (Decisão nº 272/97 – Plenário, Ata nº 17/97; Acórdão 17/1999 – Plenário). Todavia, é reconhecida a necessidade de que as admissões de pessoal efetuadas pela entidade deveriam ser precedidas de processo seletivo público (Acórdão 2.142/2005 – 2ª Câmara)[106]”.
De acordo com Carvalho Filho[107], necessário salientar que o art. 37, II, da Constituição Federal tem como únicos destinatários os entes da Administração Direta e Indireta e, por isso mesmo, não pode ser aplicado a entidades de outra natureza a exigência de concurso público para contratação de pessoal. Essa conclusão do ilustre jurista é baseada na literalidade do mencionado artigo. Para ele pode exigir-se, isto sim, a observância dos princípios gerais da legalidade, moralidade e impessoalidade.
Na mesma linha, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho entende que a contratação de pessoal sem a prévia aprovação em concurso público não enseja ofensa à previsão contida no inciso II do art. 37 da Constituição Federal, visto que as normas que autorizaram a criação das entidades do “Sistema S” tradicional não determinam a realização de concurso público para ingresso nos quadros do ente. A realização de certame público é inexigível quando não houver disposição legal, própria ou especial, impondo tal procedimento.
“3. EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO PARA CONTRATAÇÃO PELO SEBRAE a) Conhecimento No Recurso de Revista, o Recorrente alega a obrigatoriedade de concurso público para contratação pelo SEBRAE, sob pena de violação do art. 37, II da Constituição da República. Transcreve parecer do Tribunal de Contas da União, que se manifesta, em relação aos Serviços Sociais Autônomos, sobre a necessidade de se adotar um processo seletivo público para admissão de pessoal.
Não sendo o Recorrente um ente público, não se submete às exigências do art. 37, II da Carta Magna. A exigência do Tribunal de Contas da União é que haja um processo seletivo público, tendo em vista que este órgão recebe recursos públicos, o que, de forma alguma, confunde-se com o concurso público a que faz referência o artigo constitucional supracitado. Não conheço.’[108] (RR- 565/2006404-14-40, TST, 8ª Turma, Rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJ 4.4.2009)”.
O Edital nº 001/2013, do SENAI/RN, por exemplo, em conformidade ao que estabelece a Resolução Nº 374/2009 do Conselho Nacional do SENAI, tornou público a segunda fase do Processo Seletivo que se destinou ao provimento de 144 (cento e quarenta e quatro) vagas. Foi executado pelo Instituto Euvaldo Lodi, e teve como etapas a análise curricular (primeira), a prova de conhecimentos gerais e específicos (segunda) e a prova de desempenho (terceira). A análise curricular consistiu na comprovação e avaliação da formação acadêmica, técnica e experiência profissional do candidato, realizada por banca examinadora. Para a classificação, a análise de títulos foi realizada exclusivamente aos candidatos aprovados na prova de conhecimentos gerais e específicos[109].
A prova de conhecimentos gerais e específicos teve caráter eliminatório e classificatório, com 20 (vinte) questões objetivas contendo cinco opções de resposta de letras “a” até “e”, e as seguintes regras para a sua aplicação: 4.2.4 – Não serão fornecidas informações sobre os gabaritos das provas […], 4.2.11 – Não haverá segunda chamada, seja qual for o motivo alegado […], 4.2.17 – No dia de realização da prova de conhecimentos gerais e específicos, não serão fornecidas, por qualquer membro da coordenação de aplicação destas, informações referentes ao seu conteúdo e/ou aos critérios de avaliação e de classificação; […] 4.2.21 – A prova de conhecimentos gerais e específicos terá a duração de 03 (três) horas. Iniciada a prova, nenhum candidato poderá retirar-se da sala antes de decorrida 1 (uma) hora; […] 4.2.26 – Não haverá substituição da folha de resposta, salvo em caso de defeito em sua impressão[110].
A prova de desempenho para os cargos descritos no item 4.1, foi composta de uma aula expositiva ou atividade laboratorial, com data, horário, local conforme Anexo III, realizada perante banca examinadora. Às três etapas foi admitido o recurso para questionar seus resultados. Além disso, o aviso de divulgação do resultado final foi publicado em jornal de grande circulação e site do processo[111].
Em julgado do TCU ainda mais recente, defendeu-se a ideia da possibilidade de processo seletivo interno, sem desrespeitar os princípios previstos no caput do artigo 37, Constituição Federal de 1988. A recomendação do Acórdão nº 369/2009, às entidades integrantes do Sistema ‘S’ foi no sentido de que, em conjunto, “elaborem um regulamento que discipline a utilização dos processos de recrutamento interno para o preenchimento de cargos de seus quadros, fixando regras claras e objetivas que resguardem o atendimento dos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência e publicidade”[112].
“É admissível que os serviços sociais autônomos, por não serem parte da Administração Pública e terem independência para a criação de seus cargos, de natureza privada, possam promover, à sua discricionariedade, processos seletivos externos e internos para o recrutamento de pessoal, resguardados os princípios de ordem constitucional que objetivam impedir favorecimentos e outras ilicitudes do gênero e preservado o processo seletivo público externo para o ingresso de funcionários em seus quadros (Acórdão 2.305/2007 – Plenário)[113]”.
No tocante à contratação de pessoal com inobservância dos mencionados princípios, dispõe o Acórdão 2.073/2012, 1ª. Câmara, relatora Ministra Ana Arraes[114], que na prática as contratações se deram mediante, exclusivamente, análise de fichas de qualificação pessoal, entrevistas, dinâmicas de grupo, entre outros procedimentos marcados pela subjetividade e que não se coaduna com a jurisprudência desta Corte.
O Acórdão nº 2.305/2007, Plenário, que serviu como paradigma em diversos outros julgados, estabeleceu a necessidade de o Sistema “S” observar os seguintes critérios para a seleção e contratação de seus empregados: I) ampla publicidade do edital de seleção; II) como regra, recrutamento externo; III) critérios objetivos de avaliação; IV) critérios para contratação urgente; e V) critérios para aproveitamento de candidato aprovado em seleção anterior[115].
Fazer constar, nos autos do processo, a comprovação de todas as inscrições realizadas, assim como de todos os currículos/documentos recebidos dos participantes; informar aos candidatos, nos editais de convocação para o processo seletivo, sobre a programação de todas as etapas do referido processo, as matérias das provas, os meios de divulgação dos resultados e os critérios e pesos utilizados para avaliação; e constar previsão, nos editais do processo seletivo, do direito recursal dos candidatos foram algumas das medidas recomendadas pelo TCU (Acórdão nº. 5.666/2013, Primeira Câmara) para aprimorar os processos seletivos, a fim de torná-los mais objetivos[116].
Sobre a obrigatoriedade de respeitar os princípios do art. 37 da Constituição Federal/88, se posicionou o Tribunal Superior do Trabalho:
“O réu indubitavelmente consiste em entidade de direito privado, não integrando a administração direta ou indireta. Desta forma, não lhe são aplicáveis os preceitos contidos no artigo 37 da Constituição Federal, em especial quanto à obrigatoriedade de realização de concurso público ou processo seletivo objetivo diferenciado para a admissão de pessoal, mediante princípios e regras aplicáveis à Administração Pública. A percepção de recursos públicos e contribuições parafiscais não altera sua natureza jurídica de direito privado, ainda que estejam, por essa peculiaridade, sujeitos ao controle dos Tribunais de Contas (Recurso de Revista n° TST-RR-91900-66.2008.5.04.0028)[117]”.
Recentemente, no intuito de fixar critérios objetivos de avaliação, o TCU (Acórdão 500/2010, Plenário)[118] determinou que constasse previamente em edital, dentre outros, a identidade e qualificação dos membros que integrarão a banca examinadora, nos casos em que a realização de entrevistas seja imprescindível para a seleção dos candidatos, para que, em atenção ao princípio da impessoalidade, sejam afastadas quaisquer suspeitas de favorecimento e subjetivismos; os pesos a serem atribuídos a cada uma das etapas para a obtenção da nota final dos candidatos; o quantitativo de vagas para cada cargo; os critérios para desempate.
“9.3. dar ciência ao [unidade do Sistema “S”] das seguintes irregularidades/impropriedades, com vistas a aprimorar os controles internos e evitar sua ocorrência: (…) 9.3.13. necessidade de fazer constar das normas concernentes ao ingresso de pessoal no (…), inclusive para cargos de nível médio, a exigência de prévio processo seletivo, que pode ser simplificado, baseado nos princípios constitucionais da legalidade, publicidade, moralidade, impessoalidade, finalidade e isonomia, entre outros (…), observando, principalmente, o seguinte: 9.3.13.1. conferir ampla publicidade aos atos praticados no decorrer do processo seletivo, especialmente no que se refere à divulgação do edital, ao conteúdo programático e às notas atribuídas aos candidatos, inclusive os motivos para a atribuição da pontuação de cada item avaliado, de modo a permitir que os interessados possam apresentar recurso em face do resultado alcançado, se for o caso; 9.3.13.2. utilizar critérios objetivos de seleção de pessoal, assegurando a isonomia entre os interessados, a impessoalidade, a transparência e a publicidade dos procedimentos, abstendo-se de adotar critérios subjetivos, tais como pesquisa de referências, entrevistas e análise curricular;” (Acórdão 4.685/2012 – 1ª Câmara)[119].
Como informado anteriormente, havia previsão no Edital nº 001/2013, do SENAI/RN, de que nas três etapas do processo seletivo os candidatos poderiam utilizar recurso para questionar seus resultados. Para o TCU, mesmo o “Sistema S” podendo adotar formas de seleção de pessoal com menor rigor do que as exigidas para o concurso público, ainda assim deve respeitar os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, isonomia, eficiência, publicidade, e a adoção de critérios objetivos nos procedimentos de seleção e recrutamento. Em atendimento a esses princípios e ao da transparência, deve haver, portanto, uma etapa recursal que possibilite aos interessados justificarem suas respostas e questionar a avaliação das provas.
Nesse sentido, orienta o Acórdão nº 4510/2018, Segunda Câmara[120]:
“13. Relativamente à ausência de previsão de etapa recursal no certame para a contratação de funcionários do Senai/DN, não se pode olvidar que a jurisprudência deste Tribunal já se assentou há tempos no sentido de que o Sistema S pode adotar formas de seleção de pessoal com menor rigor do que as exigidas para o concurso público, desde que assegurada a observância aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da isonomia, da eficiência, da publicidade, e a adoção de critérios objetivos nos procedimentos de seleção e recrutamento.
15. Assim, em homenagem aos mesmos princípios constitucionais já mencionados, além do da transparência, creio que os certames instaurados pelo Senai/DN devem, necessariamente, prever a etapa recursal devida”.
O Supremo Tribunal Federal em decisão marcante, proferida nos autos do RE 789.874/DF[121], ratificou o atual entendimento do Tribunal de Contas ao definir a não obrigatoriedade de submissão das entidades do Sistema ‘S’ aos ditames do art. 37, notadamente ao seu inciso II, da Constituição Federal de 1988:
“Os serviços sociais autônomos, por possuírem natureza jurídica de direito privado e não integrarem a Administração Pública, mesmo que desempenhem atividade de interesse público em cooperação com o ente estatal, não estão sujeitos à observância da regra de concurso público (CF, art. 37, II) para contratação de seu pessoal. Essa a conclusão do Plenário, que negou provimento a recurso extraordinário no qual se discutia a necessidade de realização de concurso público para a contratação de empregados por pessoa jurídica integrante do chamado “Sistema S”. De início, a Corte afastou preliminar de ilegitimidade do Ministério Público do Trabalho para interpor o presente recurso extraordinário. Destacou que, nos termos dos artigos 83, VI, e 107, “caput”, ambos da LC 75/1993, incumbiria àquele órgão oficiar perante o TST, o que abrangeria a atribuição de interpor recurso perante o STF. Esclareceu que os precedentes citados pelo recorrido (SEST – Serviço Social do Transporte) não se aplicariam à espécie, porque neles o Ministério Público do Trabalho teria atuado de forma originária perante o STF, o que seria vedado. No mérito, o Tribunal lembrou que a configuração jurídica dessas entidades relacionadas aos serviços sociais teriam sido expressamente recepcionadas pelo art. 240 da CF e pelo art. 62 do ADCT. Recordou ainda que os serviços sociais do Sistema “S” (SEST – Serviço Social do Transporte; SESCOOP – Serviço Nacional de Aprendizagem no Cooperativismo; SESC – Serviço Social do Comércio; SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem; SESI – Serviço Social da Indústria; SENAI – Serviço de Aprendizado Industrial; e SENAR – Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), vinculados às entidades patronais de grau superior e patrocinados, basicamente, por recursos recolhidos do próprio setor produtivo beneficiado, teriam inegável autonomia administrativa. Asseverou que essa autonomia teria limites no controle finalístico exercido pelo TCU quanto à aplicação dos recursos recebidos, sujeição que decorreria do art. 183 do Decreto-lei 200/1967 e do art. 70 da Constituição. Ademais, mencionou que, no caso concreto, a entidade estaria sujeita às auditorias a cargo do Ministério dos Transportes e à aprovação de seus orçamentos pelo Poder Executivo. Assinalou que a não obrigatoriedade de submissão das entidades do denominado Sistema “S” aos ditames constitucionais do art. 37, notadamente ao seu inciso II, não as eximiria de manter um padrão de objetividade e eficiência na contratação e nos gastos com seu pessoal. Enfatizou que essa exigência traduziria um requisito de legitimidade da aplicação dos recursos arrecadados na manutenção de sua finalidade social, porquanto entidades de cooperação a desenvolver atividades de interesse coletivo”.
Após esse posicionamento do STF, o Acórdão 1.869/2015, do Plenário do TCU, discutiu os limites da competência desta Corte na fiscalização das contratações realizadas pelo Sistema “S”, enfatizando a necessidade de que referida fiscalização seja mais finalística. In verbis:
“Parece-me que o STF está a sinalizar para um modelo de maior flexibilidade das instituições que compõem o Sistema S e a exigir não um controle de mero procedimento, mas sim de fiscalização da eficiência institucional das relevantes atividades por ele desenvolvidas. Autoriza-se assim, um maior grau de liberdade nas ações dos serviços sociais autônomos, livrando-os de um engessamento administrativo, e, em contrapartida, enfatiza-se um aprofundamento da avaliação da efetividade dos resultados obtidos.
(…)
Diante de todo o quadro até aqui exposto, em que tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o próprio TCU fazem uma leitura em que prepondera a flexibilização da autonomia gerencial e administrativa do Sistema S e em que se aponta um horizonte em que os controles devem ser menos procedimentais e mais finalísticos das atribuições institucionais e dos resultados efetivos das entidades que integram esse sistema, não tenho dúvidas de que, se vencida a preliminar suscitada neste parecer, deve, no mérito, ser conhecido e provido o pedido de reexame do IEL/PR – que, por excelência e natureza – detém caráter eminentemente privado e, embora mantido parcialmente pelo sistema Sesi/Senai, sequer se constitui em entidade da mesma natureza de seus mantenedores[122]”.
Cumpre enfatizar, finalmente, que a não obrigatoriedade de submissão das entidades do Sistema “S” aos ditames do art. 37, notadamente ao seu inciso II, da Constituição, não isenta tais pessoas jurídicas de manter critérios objetivos e eficientes na contratação de pessoal. Essa exigência destina-se principalmente à proteção dos recursos que arrecadam para a sua manutenção, no intuito de que sua finalidade social seja atendida.
2.3 OS RECURSOS FINANCEIROS DOS SERVIÇOS SOCIAIS AUTÔNOMOS NA ÓTICA DO TCU
A falta de finalidade lucrativa foi uma das razões que levou as entidades do Terceiro Setor a ter um equilíbrio financeiro frágil, por isso que, ao desempenhar serviço de utilidade pública, necessitavam de fomento do Estado para se manter[123]. Como a captação de recursos ainda é visualizada como uma das ameaças à sustentabilidade financeira da instituição, o fomento surge como medida protetiva adotada pelo Estado, no intuito de incentivar o exercício de serviço de utilidade pública pelas entidades do “Sistema S”.
A atividade de fomento caracteriza-se como uma intervenção subsidiária do Estado, servindo como auxílio na ampliação de direitos[124]. Esse auxílio é exercido através da transferência de recursos públicos, que acontece com a formalização de termos de parceria, contratos de gestão e convênios. Em contrapartida, cabe à entidade prestar contas ao seu fornecedor, comprovando que o dinheiro está sendo destinado corretamente para o objetivo que motivou o repasse.
No convênio entre o Poder Público e entidades particulares, por exemplo, inexiste perseguição de lucro, e os recursos financeiros empregados servem para cobertura dos custos necessários à operacionalização do acordo[125]. Esse instrumento, formado por pessoas que têm competências institucionais comuns e vão prestar mútua colaboração para atingir seus objetivos[126], pode ser utilizado como modalidade de fomento. O incentivo é dado principalmente sob a forma de auxílios financeiros ou subvenções por conta do orçamento público.
Os serviços sociais autônomos, de acordo com o Acórdão nº 2079/2015[127], Plenário, sujeitam-se ao controle do TCU, uma vez que administram recursos públicos de natureza tributária, advindos de contribuições parafiscais e destinadas ao atendimento de fins de interesse público, com fulcro no parágrafo único do art. 70 da Constituição Federal de 1988.
“Art. 70. fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.
Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária”.
Dispõe o Acórdão nº 10119/2017 (Segunda Câmara, rel. Marcos Bemquerer)[128] que, embora sejam pessoas jurídicas não pertencentes ao Poder Público, os serviços sociais autônomos arrecadam contribuição compulsória, que é considerada recurso público, razão pela qual se impõe a essas entidades o dever de observar os princípios gerais aplicáveis à Administração Pública, nos termos do art. 6º do Decreto-lei 200/1967.
Essa é a posição majoritária do TCU, mas há aqueles que opinam pelo reconhecimento das contribuições compulsórias como recursos privados. Percebe-se na ementa a seguir:
“EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÕES – MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL – SUPOSTA IRREGULARIDADE NA APLICAÇÃO DE RECURSOS POR ENTE SINDICAL E SERVIÇO SOCIAL AUTÔNOMO – INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA DIRIMIR O CONFLITO – SÚMULA 516 DO STF – ATRIBUIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO.
I – O SENAI, a exemplo do Serviço Social da Indústria – SESI, está sujeito à jurisdição da Justiça estadual, nos termos da Súmula 516 do Supremo Tribunal Federal. Os serviços sociais autônomos do denominado sistema “S”, embora compreendidos na expressão de entidade paraestatal, são pessoas jurídicas de direito privado, definidos como entes de colaboração, mas não integrantes da Administração Pública.
II – Quando o produto das contribuições ingressa nos cofres dos Serviços Sociais Autônomos perde o caráter de recurso público. Precedentes.
III – Seja em razão da pessoa, seja em razão da natureza dos recursos objeto dos autos, não se tem por justificada a atuação do Ministério Público Federal, posto que não se vislumbra na hipótese a incidência do art. 109 da Constituição Federal.
IV- Agravo regimental a que se nega provimento. (grifo nosso).[129]”.
Apesar deste posicionamento do ministro Ricardo Lewandowski, o TCU entende que as contribuições compulsórias das entidades do serviço social autônomo se assemelham a tributos, pois seu pagamento é obrigatório, para o cumprimento de uma finalidade específica de interesse do Estado. Sendo assim, são vistas como recursos públicos.
“Em nossa experiência como Ministro dessa Corte, temos, em algumas oportunidades, ouvido vozes de representantes dos Serviços Sociais Autônomos, indagando: ‘por quê temos que prestar contas e atender ao Tribunal de Contas da União, se estamos gerindo uma entidade desvinculada da Administração e patrocinada com recursos privados?’.
Creio que a resposta para tal questão, nesse momento de nossa exposição, fluirá naturalmente. A subsunção do SEBRAE – e dos demais Serviços Sociais Autônomos – às normas que regem o controle praticado pelo Tribunal de Contas da União existe em decorrência da gestão dos recursos parafiscais por ele arrecadados. Lembro que o SEBRAE, exemplificando, recebe percentuais de contribuições previdenciárias, nos termos da Lei nº 8.029/90, alterada pela Lei nº 8.154/90. Tais contribuições são impostas, ou seja, não são pagas apenas por quem deseja pagá-las; não se confunde, ademais, como se fôra um contrato de adesão ou um acordo entre partes. E são impostas, referidas contribuições, justamente porque se almeja que sejam utilizadas para o cumprimento de uma finalidade específica de interesse do Estado, qual seja o apoio ao desenvolvimento das micro e pequenas empresas. Cabe ao Tribunal de Contas verificar o nexo causal existente entre a aplicação dos recursos e a finalidade para a qual foram arrecadados.
A verificação levada a efeito pela Corte de Contas não se prende, contudo, à simples verificação desse nexo causal, uma vez que se espera não apenas que os recursos sejam utilizados na finalidade prevista, mas também que sejam utilizados consoante os procedimentos prescritos em lei e mediante a busca de otimização dos resultados alcançados”[130].
Trata-se de exegese antiga, consoante sobressai do voto que impulsionou o Acórdão 873/2012 – 1ª Câmara (rel. min. Valmir Campelo):
“15. É pacífico o entendimento desta Corte de que os serviços sociais autônomos devem obedecer aos princípios da Administração Pública, principalmente pelo fato de arrecadarem e utilizarem recursos públicos, sob a forma de contribuições sociais, que têm natureza de tributos”[131].
Tais recursos não provêm do erário, sendo normalmente arrecadados pela autarquia previdenciária – o Instituto Nacional de Seguridade Social – e repassados diretamente às entidades. Ainda assim caracterizam-se como dinheiro público, em razão da expressa previsão legal das contribuições, e por serem obrigatórias. Essas contribuições não são facultativas, mas, ao revés, compulsórias, com inegável similitude com os tributos. Esses recursos, portanto, estão vinculados aos objetivos institucionais definidos na lei, constituindo desvio de finalidade quaisquer dispêndios voltados para fins outros que não aqueles[132].
Desse modo, no intuito de promover o desenvolvimento econômico-social do País, as atividades das pessoas jurídicas do Sistema S observarão um planejamento, norteado segundo programas gerais, setoriais e regionais de duração plurianual (art. 6º, I, Decreto-lei 200/1967[133]); uma coordenação permanente (art. 6º, II), cujo objeto é a atividade desenvolvida pela entidade (art. 8º); uma descentralização institucional (art. 6º, III) para melhor execução das atividades (art. 10), utilizando contratos e convênios, por exemplo, para formalizar essa divisão de tarefas com outras pessoas jurídicas.
Ademais, os outros princípios[134] serão a delegação de competência (art. 6º, IV, Decreto-lei 200/1967), que será utilizada como instrumento de descentralização administrativa, para assegurar maior rapidez e objetividade às decisões (art. 11); e o controle das atividades (art. 6º, V), que deverá exercer-se, no caso, pelos órgãos do sistema de contabilidade e auditoria na aplicação dos dinheiros públicos (art. 13).
Há entendimento do STF no sentido de que as contribuições compulsórias se caracterizam como de intervenção no domínio econômico, podendo, portanto, ser instituídas por lei ordinária[135], conforme RE nº 635.682, em 25.4.2013:
“Recurso extraordinário. 2. Tributário. 3. Contribuição para o SEBRAE. Desnecessidade de lei complementar. 4. Contribuição para o SEBRAE. Tributo destinado a viabilizar a promoção do desenvolvimento das micro e pequenas empresas. Natureza jurídica: contribuição de intervenção no domínio econômico. 5. Desnecessidade de instituição por lei complementar. Inexistência de vício formal na instituição da contribuição para o SEBRAE mediante lei ordinária. 6. Intervenção no domínio econômico. É válida a cobrança do tributo independentemente de contraprestação direta em favor do contribuinte. 7. Recurso extraordinário não provido. 8. Acórdão recorrido mantido quanto aos honorários fixados”.
A contribuição voltada ao custeio do serviço que tem por objetivo, no caso, executar o ensino de formação profissional pertence à categoria das contribuições de intervenção no domínio econômico. Prevê a Constituição Federal que ficam ressalvadas do disposto no art. 195 (Seguridade Social) as atuais contribuições compulsórias dos empregadores sobre a folhaF de salários, destinadas às entidades privadas de serviço social e de formação profissional vinculadas ao sistema sindical (Art. 240).
“O fato de a contribuição destinada ao Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (SESCOOP) não estar prevista no art. 240 da Constituição também não lhe retira, numa primeira análise, a validade. É certo que as contribuições sociais recepcionadas pelo art. 240 não se submetem à reserva de lei complementar para a respectiva instituição. O art. 195, § 4º, da Constituição, contudo, somente se aplica às novas fontes de custeio da seguridade social, hipótese diversa da versada nos autos. Com efeito, nos termos do art. 174, § 2º, da Constituição, o estímulo ao cooperativismo é parte do programa de regulamentação da atividade econômica que incumbe à União. Por isso, a contribuição destinada ao custeio do serviço nacional que tem por objetivo “organizar, administrar, e executar em todo o território nacional o ensino de formação profissional, desenvolvimento e promoção social do trabalhador em cooperativa e dos cooperados” (art. 8º da MP 2.168-40/2001) pertence à classe das contribuições de intervenção no domínio econômico, não se configurando como nova contribuição social destinada ao custeio da seguridade social (art. 149 e 194, caput, da Constituição). Ademais, a recepção constitucional das contribuições sociais previstas no art. 240 da Constituição não lhes outorga, evidentemente, imunidade a ulterior modificação. Ressalva-se quanto a elas, tão somente, a das restrições previstas no art. 195 da Constituição”.[136]
Apesar de algumas decisões judiciais, como a ACO 1.953 AgR (rel. min. Ricardo Lewandowski, j. 18-12-2013, P, DJE de 19-2-2014), entenderem que quando o produto das contribuições ingressa nos cofres dos serviços sociais autônomos perde o caráter de recurso público, o posicionamento majoritário do TCU ainda é o de que a contribuição compulsória se assemelha a tributo e, por isso, deve-se prestar contas ao Estado, bem como atuar com observância aos princípios do Decreto-lei 200/1967.
Após analisar os problemas jurídicos presentes no âmbito das entidades do “Sistema S”, necessário refletir sobre a posição que essas pessoas jurídicas assumem diante do cidadão ao exercer suas funções, e como é possível à sociedade protestar o não cumprimento – ou de forma inadequada – do serviço de utilidade pública.
Essa modalidade de serviço prestado pelos entes do “Sistema S” não impede o Estado de prestar a mesma atividade. É o caso dos cursos de educação profissional e tecnológica, que tanto são prestados pelo SENAC como pelos Institutos federais, nos estágios de educação profissional tecnológica de nível médio, graduação e pós-graduação[137].
O serviço de utilidade pública prestado por pessoa jurídica de direito privado, por isso, representa uma comodidade ao cidadão. Não é essencial como o serviço público, mas auxiliará na melhoria da qualidade de vida daqueles que compõem categorias sociais e profissionais específicas. Ora, trata-se de uma atividade privada de interesse público[138].
Havendo má prestação do serviço, seus usuários poderão recorrer ao Judiciário para que este examine lesão ou ameaça a direito, tendo a parte direito a ver apreciadas pelo juízo competente as suas razões e a receber fundamentadas as decisões que lhes negam conhecimento[139].
No que concerne ao foro no qual devam tramitar os processos em que sejam autoras ou rés tais entidades, já se pacificou o entendimento de que a competência é da Justiça Estadual, já que se trata de pessoas de direito privado e não integrantes formais da estrutura da Administração Pública[140].
3.1 SERVIÇO PÚBLICO E SERVIÇO DE UTILIDADE PÚBLICA
Dentre tantos temas envolvendo as entidades do “Sistema S”, um que merece especial atenção é o seu objeto. Apesar de ser pacífico o entendimento de que as entidades de serviço social autônomo prestam serviço de utilidade pública, e não serviço público, poucas são as produções que esmiúçam as diferenças entre essas duas atividades.
Serviço público para Di Pietro[141] seria “toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente de direito público”. Para Carvalho Filho[142], serviço público é “toda atividade prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob regime de direito público, com vistas à satisfação de necessidades essenciais e secundárias da coletividade”.
Serviços públicos em si são aqueles que a Administração presta diretamente à comunidade, por reconhecer necessidade para a sobrevivência e ordem do grupo social e do próprio Estado. Tais serviços são considerados privativos do Poder Público, no sentido de que só a Administração deve prestá-los, porque geralmente exigem atos de império e medidas compulsórias em relação aos administrados, como o dever de tributar, fiscalizar, punir[143].
Não é a atividade propriamente dita que caracteriza o serviço público, pois algumas tarefas podem ser exercidas pelos cidadãos como objeto da iniciativa privada. A previsão legal é que fixa quais são os serviços públicos.
Em contrapartida, os serviços de utilidade pública se destinam diretamente aos indivíduos[144], ou seja, são proporcionados para sua fruição direta. Se fosse um serviço público em sentido estrito, a transferência aconteceria por delegação, mas isso não é viável para os entes de cooperação. Na prestação de serviço de utilidade pública o que há é fomento do Estado para a sua concretização.
Meirelles[145] conceitua serviço de utilidade pública da seguinte forma:
“1.1.2.2 Serviços de utilidade pública: são os que a Administração, reconhecendo sua conveniência (não essencialidade, nem necessidade) para os membros da coletividade, presta-os diretamente ou aquiesce em que sejam prestados por terceiros (concessionários, permissionários ou autorizatários), nas condições regulamentadas e sob seu controle, mas por conta e risco dos prestadores, mediante remuneração dos usuários”.
Essas atividades não se caracterizam como serviços públicos exatamente porque não se sujeitam ao regime jurídico de direito público. Ainda que possam se submeter à fiscalização, controle ou, mesmo, autorização, em nenhum desses casos há delegação de serviço público[146]. É o que ocorre com os serviços de previdência social, assistência social, educação e saúde.
A título histórico, opiniões como a do ilustre Themístocles Brandão Cavalcanti[147] alegavam que a atividade desempenhada pelos entes de cooperação se aproximava de serviço público:
“Algumas entidades existem que escapam à estrutura geral dos órgãos administrativos. São organizações privadas, mas criadas por lei e que gozam de certas prerrogativas e a que se atribuem finalidades mais próximas dos serviços públicos do que mesmo privadas e lucrativas.
Não se confundem com o serviço público quanto à sua estrutura e subordinação aos órgãos hierarquizados na administração, mas dele se aproximam quanto aos objetivos e finalidades”.
Serviço público quanto à finalidade ou objeto, de acordo com Coelho[148], pode se dividir em serviços administrativos, serviços industriais e serviços públicos sociais. No primeiro, trata-se dos serviços que a Administração executa para atender suas necessidades internas, ou preparar outros serviços. No segundo, são os serviços que produzem renda para quem os presta, mediante a remuneração da utilidade usada ou consumida[149]. Essa tarifa é fixada pelo Poder Público, seja a atividade prestada por pessoas jurídicas de direito privado, ou diretamente pelos órgãos e entes públicos. Por se tratar de atividade econômica, os serviços industriais são atividades impróprias do Estado, pois só podem ser exploradas diretamente pelo Poder Público quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo.
Serviço público social, por fim, são aqueles que atendem às necessidades sociais, nas quais a atuação do Estado é essencial, seja na prestação, na regulamentação ou fiscalização dos serviços, mas que podem ser permitidos aos autorizados à iniciativa privada, por exemplo, à saúde complementar e a previdência[150].
Os serviços públicos em sentido amplo, em razão do interesse coletivo, podem ser essenciais ou apenas úteis à comunidade, daí a necessária distinção entre serviços públicos e serviços de utilidade pública.
De forma brilhante, Meirelles[151] distingue serviço público de serviço de utilidade pública, informando que no primeiro há essencialidade na sua prestação, por visar à solução de demandas gerais; enquanto que o segundo não é essencial, mas oferece comodidades ao cidadão.
“No primeiro caso (serviço público), o serviço visa a satisfazer necessidades gerais e essenciais da sociedade, para que ela possa subsistir e desenvolver-se como tal; na segunda hipótese (serviço de utilidade pública), o serviço objetiva facilitar a vida do indivíduo na coletividade, pondo à sua disposição utilidades que lhe proporcionarão mais conforto e bem-estar. Daí se denominarem, os primeiros, serviços pró-comunidade e, os segundos, serviços pró-cidadão, fundados na consideração de que aqueles (serviços públicos) se dirigem ao bem comum e estes (serviços de utilidade pública), embora reflexamente interessem a toda a comunidade, atendem precipuamente às conveniências de seus membros individualmente considerados”.
Ora, os serviços públicos essenciais – ou primários – são aqueles necessariamente prestados pelo Poder Público; os não essenciais são os que podem ser executados pelas entidades do “Sistema S”, mantendo-se com fomento estatal. O professor Carvalho Filho distingue ambos os serviços da seguinte forma[152]:
“A grande diversidade dos interesses coletivos exige sua caracterização em primários ou essenciais, de um lado, e secundários ou não essenciais, de outro. Quando o serviço é essencial, deve o Estado prestá-lo na maior dimensão possível, porque estará atendendo diretamente às demandas principais da coletividade. Inobstante, ainda que seja secundário, a prestação terá resultado de avaliação feita pelo próprio Estado, que, por algum motivo especial, terá interesse em fazê-lo”.
Em se tratando de serviço público de utilidade pública o Estado não abriu mão da execução que a lei lhe atribui, nem extinguiu qualquer de seus órgãos ou entidades. Ele manteve intactas suas atividades e entidades, apenas fomentando, através de contribuição parafiscal, a iniciativa privada na instituição de entidades que iriam exercer serviços de interesse público (não serviço público)[153].
É o caso dos cursos na área da Educação Profissional e Tecnológica, que interessam a categorias profissionais específicas e são fornecidos pelos entes do “Sistema S”. Eles podem, concomitantemente, ser disponibilizados pelo Poder Público, como ocorre nos Institutos Federais. A educação profissional será desenvolvida em articulação com o ensino regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições especializadas ou no ambiente de trabalho[154]. As instituições de educação profissional e tecnológica, além dos seus cursos regulares, oferecerão cursos especiais, abertos à comunidade, condicionada a matrícula à capacidade de aproveitamento e não necessariamente ao nível de escolaridade.
Nota-se que, apesar de interessarem a toda sociedade, os serviços de utilidade pública atendem principalmente às conveniências de seus usuários por um ponto de vista individual. Caso a sua finalidade social não seja cumprida devidamente, podem os consumidores dos seus serviços reclamar judicialmente pela regularização da atividade.
3.2 MÁ PRESTAÇÃO DO SERVIÇO: INFORMAÇÕES QUE O CIDADÃO PRECISA SABER PARA SOLUCIONAR CONFLITOS POR VIAS JUDICIAIS
Além da fiscalização pelo Tribunal de Contas da União, as atividades dos serviços sociais autônomos podem ser investigadas pelo Poder Judiciário, em observância ao princípio da inafastabilidade da jurisdição[155]. Está entre os direitos e garantias fundamentais a apreciação pelas vias judiciais de lesão ou ameaça a direito, podendo o usuário dos serviços sociais autônomos reclamar judicialmente a má prestação do serviço.
Os dirigentes de serviço social autônomo, no desempenho de suas funções[156], podem ser passíveis de mandado de segurança por se equipararem às autoridades, para os efeitos da Lei nº 12.016/09[157]. Os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições, assemelham-se às figuras públicas (art. 1º, §1º), não sendo possível impetrar esse remédio constitucional contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público (art. 1º, §2º).
Autoridade coatora é aquela que tenha “poder de decisão”, não se configurando como tal nem os subalternos, meramente executores da ordem. Não podem, desse modo, os responsáveis pelas entidades de cooperação governamental se escusarem das obrigações sob a justificativa de que não executam a atividade.
Como já foi visto anteriormente, o serviço prestado não tem cunho econômico ou comercial, pois não visa à acumulação de capital e a livre concorrência, por isso não está entre os casos em que o mandado de segurança não será cabível.
O impetrante de início precisará ter em mãos os elementos de prova que conduzam à certeza e à liquidez dos fatos que amparam o direito – direito líquido e certo –, caso contrário, só poderá ajuizar ações comuns[158].
Carvalho Filho informa equívocos presentes no Poder Judiciário a respeito do foro competente para que o mandado de segurança seja impetrado:
“O próprio STJ, surpreendentemente, decidiu que mandado de segurança impetrado contra dirigente do SENAI é da competência da Justiça Federal, invocando, como argumento, o fato de que a contribuição adicional, prevista no art. 6º do Decreto-lei nº 4.048/1942, foi criada pela União (STJ, Confl. Compet. nº 123.713, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, em 8.8.2012). O fundamento é inconsistente, porquanto o citado diploma delegou ao próprio SENAI a arrecadação e a cobrança da referida contribuição, funções que não têm qualquer relação com as do governo federal. Além disso, ofende o art. 109, VIII, da CF, que prevê a competência da Justiça Federal para processar e julgar mandados de segurança contra autoridade federal, o que, à evidência, não é o caso dos dirigentes dos serviços sociais autônomos. Vê-se, pois, que a confusão é geral até no Judiciário”[159].
A ação constitucional que prevê expressamente a participação do serviço social autônomo é a ação popular[160]. Se o ato ou contrato for lesivo ao patrimônio dessa entidade, qualquer cidadão poderá ingressar com ação popular para responsabilizar pessoalmente quem o praticou ou ordenou sua prática[161]:
“Art. 1º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades autárquicas, de sociedades de economia mista (Constituição, art. 141, § 38), de sociedades mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes, de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de instituições ou fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos”.
Ação popular é a garantia de nível constitucional que visa à proteção do patrimônio público, da moralidade administrativa e do meio ambiente.
Para instruir a inicial, o cidadão poderá requerer às entidades, a que se refere este artigo, as certidões e informações que julgar necessárias, bastando para isso indicar a finalidade das mesmas[162]. A peculiaridade no rito da ação popular, quanto à legitimação passiva, reside na possibilidade de a pessoa jurídica ré deixar de contestar a ação e atuar ao lado do autor, quando tal posição atender ao interesse público[163].
No âmbito processual, são notadas divergências entre as regras aplicadas aos entes da Administração Pública e aos serviços sociais autônomos. A respeito do prazo contado em dobro para interposição de recurso, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal entende que não é cabível tal prerrogativa às entidades paraestatais, visto que não são os mesmos regimes jurídicos da Administração Pública.
“EMENTA: RECURSO – APLICABILIDADE ESTRITA DA PRERROGATIVA PROCESSUAL DO PRAZO RECURSAL EM DOBRO (CPC, ART. 188) – PARANAPREVIDÊNCIA – ENTIDADE PARAESTATAL (ENTE DE COOPERAÇÃO) – INAPLICABILIDADE DO BENEFÍCIO EXTRAORDINÁRIO DA AMPLIAÇÃO DO PRAZO RECURSAL – INTEMPESTIVIDADE – RECURSO NÃO CONHECIDO. – As empresas governamentais (sociedades de economia mista e empresas públicas) e os entes de cooperação (serviços sociais autônomos e organizações sociais) qualificam-se como pessoas jurídicas de direito privado e, nessa condição, não dispõem dos benefícios processuais inerentes à Fazenda Pública (União, Estados-membros, Distrito Federal, Municípios e respectivas autarquias), notadamente da prerrogativa excepcional da ampliação dos prazos recursais (CPC, art. 188). Precedentes.” (AI 349477 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 11/02/2003, DJ de 28-02-2003).
No que concerne ao foro no qual devam tramitar os processos em que sejam autoras ou rés tais entidades, já se pacificou o entendimento de que a competência é da Justiça estadual, já que se trata de pessoas de direito privado e não integrantes formais da estrutura da Administração Pública.
Nesse sentido, aliás, invoque-se a Súmula 516, do STF: “O Serviço Social da Indústria – SESI – está sujeito à jurisdição da Justiça Estadual”. Para Gasparini[164], essa súmula se aplica a todas as entidades do Sistema “S”.
“EMENTA: Competência: Justiça comum: ação popular contra o SEBRAE: L. 4717/65 (LAP), art. 20, f; CF, art. 109, IV; Súmula 516. 1. O SEBRAE não corresponde à noção constitucional de autarquia, que, para começar, há de ser criada por lei específica (CF, art. 37, XIX) e não na forma de sociedade civil, com personalidade de direito privado, como é o caso do recorrido. Por isso, o disposto no art. 20, -f-, da L. 4717/65 (LAP), para não se chocar com a Constituição, há de ter o seu alcance reduzido: não transforma em autarquia as entidades de direito privado que recebam e apliquem contribuições parafiscais, mas, simplesmente, as inclui no rol daquelas – como todas as enumeradas no art. 1º da LAP – à proteção de cujo patrimônio se predispõe a ação popular. 2. Dada a patente similitude da natureza jurídica do SESI e congêneres à do SEBRAE, seja no tocante à arrecadação e aplicação de contribuições parafiscais, seja, em conseqüência, quanto à sujeição à fiscalização do Tribunal de Contas, aplica-se ao caso a fundamentação subjacente à Súmula 516/STF: “O Serviço Social da Indústria – SESI – está sujeito à jurisdição da Justiça estadual” (RE 366168, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 03/02/2004, DJ de 14-05-2004).
O TRF-4ª Região, equivocadamente, insistia em apontar a Justiça Federal como competente para feitos que envolvam as entidades do “Sistema S”. No caso, o SEBRAE foi erroneamente considerado autarquia federal. A decisão, em boa hora, foi reformada pelo Supremo Tribunal Federal no RE 414.375-SC, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, em 31.10.2006 (Informativo STF nº 446, nov. 2006)[165].
Ora, constata-se que no campo processual os serviços sociais autônomos não gozam de privilégios, como prazo recursal em dobro, pois já é pacífica a sua independência à Administração Pública.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percebe-se que as questões que provocam controvérsias no âmbito das entidades do “Sistema S”, como licitações, concurso público para contratação de pessoal e recursos financeiros, estão ligadas ao regime jurídico de direito privado e à natureza pública de suas contribuições. Em respeito à autonomia administrativa, já foram quebradas várias exigências que antes se destinavam às entidades do “Sistema S”, visto que não restam dúvidas que elas apenas agem em colaboração com a Administração Pública, mas sem compô-la. Cabe aos serviços sociais autônomos, no entanto, respeitar os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, além de adotar critérios objetivos. Na sua gestão, assim como não precisam adotar os procedimentos rígidos relativos às entidades administrativas, também não podem fazer o que bem entenderem com as contribuições que recebem, pois não integram a iniciativa privada e recebem dinheiro público.
Os serviços que desempenham não são essenciais e, por isso, não precisam seguir às mesmas exigências do serviço público propriamente dito, como respeitar o princípio da continuidade. A atividade privada de interesse público traz benefícios a certas categoriais profissionais que auxiliam no bem-estar dos indivíduos e, por isso, não deixa de ter caráter público.
Além disso, o Poder Judiciário examinará o exercício dessas atividades quando puderam causar lesão ou ameaça a direito. A ação popular, por exemplo, poderá questionar a moralidade administrativa no âmbito dos serviços sociais autônomos.
Tais características tornam as entidades do “Sistema S” bastante singulares para o Direito Administrativo e atuais, já que frequentemente são levantados pela doutrina e jurisprudência assuntos as envolvam.
REFERÊNCIAS
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[1] Doutorado e Mestrado pela Universidade Federal de Pernambuco, Recife/PE, (Brasil); Professora da UNICAP; Professora do Curso de Especialização de Direito Administrativo na UFPE; Presidenta da Subcomissão de Direitodo Terceiro Setor da OAB-PE; Gestora do Escritório Theresa Nóbrega Advocacia.
² Especialização em Direito Administrativo pela Universidade Federal de Pernambuco, Recife/PE, (Brasil); Graduação na Faculdade dos Guararapes – FG; Advogada no escritório Cardoso Albuquerque Advocacia; email: anaclara.ctsb@gmail.com.
[3] MEIRELLES, Hely Lopes; BURLE FILHO, José Emmanuel. Direito Administrativo Brasileiro. 42º ed. atual. até a Emenda Constitucional 90, de 15.09.2015. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 481;
[4] BRASIL, Supremo Tribunal Federal, ADI 1.266, rel. min. Eros Grau, j. 6-4-2005, P, DJ de 23-9-2005;
[5] GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 12ª. Ed. rev. e atual. São Paulo, SP: Malheiros, 2007, p. 124;
[6] MEIRELLES, op. cit., p. 422;
[7] BRASIL, Constituição Federal de 1988, art. 209;
[8] Id., Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), art. 39;
[9] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 28º ed. rev, ampl. e atual até 31-12-2014. São Paulo, SP: Atlas, 2015, p. 555;
[10] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 12ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 173;
[11] MOURA, Dante Henrique. Educação básica e educação profissional e tecnológica: dualidade histórica e perspectivas de integração. In: Holos. Ano 23, Vol. 2 – 2007. Revista eletrônica do CEFET-RN, p. 6;
[12] Ibid., p. 6;
[13] BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CEB nº 16/99, de 05 de outubro de 1999, p. 6.
[14] BRASIL, Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 10 de Novembro de 1937, art. 129: “[…] O ensino pré-vocacional profissional destinado às classes menos favorecidas é em matéria de educação o primeiro dever de Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensino profissional e subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou associações particulares e profissionais.
É dever das indústrias e dos sindicatos econômicos criar, na esfera da sua especialidade, escolas de aprendizes, destinadas aos filhos de seus operários ou de seus associados. A lei regulará o cumprimento desse dever e os poderes que caberão ao Estado, sobre essas escolas, bem como os auxílios, facilidades e subsídios a lhes serem concedidos pelo Poder Público.”;
[15] Parecer CNE/CEB Nº 16, 1999, p. 7;
[16] GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 516;
[17] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 27ª ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 573;
[18] BRASIL. Decreto-Lei nº 4.048, de 22 de Janeiro de 1942, art. 3º;
[19] Id. Decreto nº 494, de 10 de janeiro de 1962, art. 11;
[20] MEIRELLES, op. cit., p. 482;
[21] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 557;
[22] BRASIL, Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, art. 4º;
[23] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. 3º Ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 206;
[24] MARQUES NETO, Floriano de Azevedo; CUNHA, Carlos Eduardo Bergamini. Serviços sociais autônomos. revista de direito administrativo, rio de Janeiro, v. 263, p. 135-174, maio/ago. 2013, p. 142;
[25] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 483;
[26] MEIRELLES, op. cit., p. 481;
[27] Ibid., 422;
[28] GRAU, op. cit., p. 35;
[29] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 554;
[30] BRASIL, Supremo Tribunal Federal, ADI 1.864, rel. p/ o ac. min. Joaquim Barbosa, j. 8-8-2007, P, DJE de 2-5-2008. P. 10.
[31] GASPARINI, op. cit., p. 517;
[32] MEIRELLES, op. cit., p. 511;
[33] DI PIETRO, op. cit., p. 180;
[34] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 555;
[35] BRASIL, Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002, art. 45;
[36] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 555;
[37] Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial. Regimento do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI): atualizado pelo decreto nº 6.635, de 5 de novembro de 2008. Brasília, DF: Departamento Nacional, 2009. p. 9;
[38] GASPARINI, op. cit., p. 517
[39] BRASIL, Lei nº 12.465, de 12 de agosto de 2011, art. 109;
[40] BRASIL, Decreto nº 61.843, de 5 de dezembro de 1967, art. 34;
[41] CARVALHO FILHO, 2010. P. 581
[42] BRASIL, Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992, art. 5º, inciso V.
[43] MEIRELLES, op. cit., p. 482
[44] BRASIL, Supremo Tribunal Federal, RE nº. 789.874/DF, Rel. Min. Teori Zavascki. Stf.jus. Brasília. DJ: 17/9/2014, p. 33;
[45] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22º Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 488;
[46] CRETELLA JÚNIOR, 2005. p. 110 e 111 apud MARQUES NETO; CUNHA, 2013, p. 139;
[47] MARQUES NETO; CUNHA, 2013, p. 139;
[48] MEIRELLES, 1981. p. 13 apud MARQUES NETO; CUNHA, 2013, p. 139;
[49] DI PIETRO, 2009, p. 489
[50] CARVALHO FILHO, op. cit. P. 556
[51] VARESCHINI, op. cit, p. 6
[52]BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº. 789.874/DF, Plenário, Min. Rel. Teori Zavascki, DJ: 17/9/2014, p. 2
[53] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 556;
[54] BRASIL. Lei nº 8.029, de 12 de abril de 1990, art. 8º;
[55] Id. Decreto nº 99.570, de 09 de outubro de 1990, art. 1º, parágrafo único; art. 10, §2° e §3°;
[56] Id. Lei nº 8.315, de 23 de dezembro de 1991, art. 2º; art. 3º, §3º;
[57] Id. Decreto n° 566, de 10 de junho de 1992, art 4°, §1º e §2º;
[58] BRASIL. Lei nº 8.706, de 14 de setembro de 1993, art. 1º; art 7º, I;
[59] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 556
[60] Ibid. p. 557;
[61] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº. 789.874/DF, Plenário, Min. Rel. Teori Zavascki, DJ: 17/9/2014, p. 18;
[62] Id. Lei n° 10.668, de 14 de maio de 2003, art. 1°; art. 6°; art. 9º, incisos I e V;
[63] BRASIL. Lei nº 11.080, de 30 de dezembro de 2004, art. 6º; art. 11; art. 10;
[64] Ibid., art. 17, I;
[65] JUSTEN FILHO, 2016, p. 176;
[66] Ibid., p. 177;
[67] Ibid., p. 173;
[68] BRASIL. Decreto nº 494, de 10 de janeiro de 1962, art. 9°;
[69] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 70;
[70] Id., Decreto-lei 200, de 25 de fevereiro de 1967, art. 183;
[71] Id. Tribunal de Contas da União. Regimento Interno. art. 1º, inciso I;
[72] Id. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), art. 327: “Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
[73] JUSTEN FILHO, op. cit., p. 176.
[74] BRASIL, Tribunal de Contas da União. Decisão 24/1993, Plenário, Processo n º 010.982/1992-2, ata nº 06/1993, Data da sessão 17/02/1993, Relator Luciano Brandão Alves de Souza.
[75] Id., Decreto n° 371, de 20 de dezembro de 199, art. 11;
[76] Id. Decreto-lei nº 2.300, de 21 de novembro de 1986, art. 85, parágrafo único; art. 86;
[77] BRASIL, Tribunal de Contas da União. Decisão 24/1993, Plenário, Processo n º 010.982/1992-2, ata nº 06/1993, Data da sessão 17/02/1993, Relator Luciano Brandão Alves de Souza.
[78] BRASIL, Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, art. 119;
[79] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 559;
[80] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 559;
[81] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Decisão nº 166/1997, Segunda Câmara, Processo nº 650.243/1993-5, Ata nº 23/1997, Relator Bento José Bugarin, Data da sessão 24/07/1997;
[82] CRVALHO FILHO, op. cit., p. 559;
[83] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Decisão nº 907/1997, Processo nº 011.777/1996-6 Plenário, Ata nº 53/1997, Relator Lincoln Magalhães da Rocha, Data da sessão 11/12/1997.
[84] Id., Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, art. 1º, parágrafo único;
[85] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Decisão nº 907/1997, Processo nº 011.777/1996-6 Plenário, Ata nº 53/1997, Relator Lincoln Magalhães da Rocha, Data da sessão 11/12/1997.
[86] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 22, XXVII;
[87] Id. Tribunal de Contas da União. Decisão nº 907/1997, Processo nº 011.777/1996-6 Plenário, Ata nº 53/1997, Relator Lincoln Magalhães da Rocha, Data da sessão 11/12/1997.
[88] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 559;
[89] BRASIL, Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, artigo 22, § 3º, §4º, §5º;
[90] SENAI. Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial. Regulamento de Licitações e Contratos do Senai: com as modificações da Resolução 516/2011. Departamento nacional. Brasília, 2011. art. 5º, II, III, IV;
[91] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Decisão nº 408/1995, Plenário, Processo nº 500.085/1995-1, Ata nº 37/1995, Relator Bento José Bugarin, Data da sessão 16/08/1995;
[92] Id., Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, artigo art. 23, I, II;
[93] SENAI. Op. cit. art. art. 6º, I, II;
[94] Ibid., art. 8º, §1º;
[95] SENAI. op. cit., art. art. 9º;
[96] SENAI. Op. cit., art. art. 10;
[97] MACHADO, Ana Carolina Coura Vicente. Serviço Social Autônomo: (Im)possibilidade de Criação de Novas Hipóteses de Dispensa de Licitação. JML Consultoria e Eventos. 29 mai 2015. p. 2;
[98] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Informativo de Licitações e Contratos n° 224/2014.
[99] MACHADO, op. cit., p. 4;
[100] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão 3195/2014, Plenário, revisor Ministro Bruno Dantas, 19.11.2014.
[101] BRASIL. Tribunal de Contas da União. O TCU e a contratação de empregados nos Serviços Sociais Autônomos. Portal.tcu. p. 5;
[102] MEIRELLES, 2016, p. 542;
[103] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 652
[104] DI PIETRO, 1999, p. 37;
[105] MEIRELLES, op. cit., p. 481;
[106] BRASIL. Tribunal de Contas da União. O TCU e a contratação de empregados nos Serviços Sociais Autônomos. Portal.tcu. p. 8;
[107] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 562;
[108] BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. RR: 6900920115220001, Relator: Lelio Bentes Corrêa, Data de Julgamento: 04/06/2014, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 06/06/2014
[109] SENAI. Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial. Processo Seletivo – SENAI/DR/RN: Edital nº 001/2013 – 2ª fase. Rn.iel. p. 1;
[110] SENAI. Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial. Processo Seletivo – SENAI/DR/RN: Edital nº 001/2013 – 2ª fase. Rn.iel. p. 6;
[111] Ibid., p. 7;
[112] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 369/2009. Plenário. Processo 005.452/2008-7, Ata nº 9/2009, Relator Marcos Vinicios Vilaça, Data da sessão 11/03/2009;
[113] BRASIL. Tribunal de Contas da União. O TCU e a contratação de empregados nos Serviços Sociais Autônomos. Portal.tcu. p. 9;
[114] JUSTEN FILHO, 2016, p. 177;
[115] Id. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 2.305/2007, Plenário, Processo 019.946/2005-4, Ata nº 46/2007, Relator Marcos Bemquerer, Data da sessão 31/10/2007;
[116] Id. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº. 5.666/2013, Primeira Câmara, Processo 033.680/2011-6, Ata nº 29/2013, Relator Augusto Sherman, Data da sessão 20/08/2013;
[117] BRASIL. Tribunal de Contas da União. O TCU e a contratação de empregados nos Serviços Sociais Autônomos. Portal.tcu. p. 14;
[118] Id. Tribunal de Contas da União. Acórdão 500/2010, Plenário, Processo 014.483/2007-4, Ata nº 8/2010, Relator André de Carvalho, Data da sessão 17/03/2010;
[119] Id. Tribunal de Contas da União. Acórdão 4.685/2012, 1ª Câmara. Processo 012.422/2006-1, Ata nº 28/2012, Relator Ana Arraes, Data da sessão 14/08/2012
[120] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 4510/2018 – Segunda Câmara, Processo 046.857/2012-5, Rel. Marcos Bemquerer, Ata º 19/2018, data da sessão: 05/06/2018;
[121] Supremo Tribunal Federal. RE 789.874/DF. Rel. Min. Teori Zavascki. Stf.jus. Brasília. DJ: 17/9/2014;
[122] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão 1.869/2015, Plenário, Processo 004.531/2004-5, Ata nº 30/2015, Relator Ana Arraes, Data da sessão 29/07/2015;
[123] SOUZA, Rodrigo Pagani de. Controle Estatal das Transferências de Recursos Públicos para o Terceiro Setor. São Paulo: USP, 2009. p. 22;
[124] CASSAGNE, 1992, p.103 apud DI PIETRO, 1999, p. 180;
[125] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 229;
[126] DI PIETRO, op. cit. , p. 181;
[127] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 2079/2015, Plenário, Processo 008.002/2013-4, ata 33/2015, rel. Min. Marcos Bemquerer, Data da sessão 19/08/2015
[128] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 10119/2017, Segunda Câmara, Data da sessão 28/11/2017, Rel. Min. Marcos Bemquerer;
[129] Id. Supremo Tribunal Federal. ACO: 1953 ES, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, Data de Julgamento: 18/12/2013, Tribunal Pleno.
[130] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Decisão nº 381/1999, Processo 525.064/1997-4, Segunda Câmara, Ata nº 46/1999, Relator Lincoln Magalhães da Rocha, Data da sessão 29/12/1999.
[131] Id. Tribunal de Contas da União. Decisão nº 907/1997, Processo nº 011.777/1996-6 Plenário, Ata nº 53/1997, Relator Lincoln Magalhães da Rocha, Data da sessão 11/12/1997
[132] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 557;
[133] BRASIL. Decreto-lei 200, de 25 de fevereiro de 1967, art. 6º, I, II, III; art. 8º; art. 10;
[134] BRASIL. Decreto-lei 200, de 25 de fevereiro de 1967, art. 6º IV, V; art. 11; art. 13;
[135] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 558;
[136] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 1.924 MC, voto do rel. p/ o ac. min. Joaquim Barbosa, j. 20-5-2009, P, DJE de 7-8-2009;
[137] DI PIETRO, 1999, p. 207
[138] MEIRELLES, op. cit., p. 420;
[139] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 5º, XXXV (princípio da inafastabilidade jurisdicional): a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
[140] Supremo Tribunal Federal. STF – Súmula 516: O Serviço Social da Indústria – S. E. S. I. – está sujeito à jurisdição da Justiça Estadual.
[141] DI PIETRO, Direito administrativo, p. 80 apud CARVALHO FILHO, 2015, p. 333;
[142] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 333
[143] MEIRELLES, op. cit., p. 420;
[144] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 336;
[145] MEIRELLES, op. cit., p. 420;
[146] MEIRELLES, op. cit., p. 418;
[147] CAVALCANTI, Themístocles Brandão. Curso de Direito Administrativo. 10ª. Ed. Rio de Janeiro, RJ: Biblioteca Jurídica Freitas Bastos, 1964. p. 245;
[148] COELHO, Paulo Magalhães da Costa. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 123;
[149] MEIRELLES, op. cit., p. 422;
[150] COELHO, op. cit., p. 124;
[151] MEIRELLES, op. cit., p. 420;
[152] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 334;
[153] DI PIETRO, 1999, p. 207;
[154] BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, art. 40, art. 42;
[155] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 5º, XXXV
[156] MEIRELLES, op. cit., p. 482;
[157] BRASIL. Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009., art 1º, §1º e §2º;
[158] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 1071;
[159] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 561.
[160] MEIRELLES, op. cit., 482
[161] BRASIL. , Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965, art 1º;
[162] Ibid. art 1º, § 4°;
[163] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 1091;
[164] GASPARINI, op. cit., p. 518;
[165] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 561;
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