Resumo: Teletrabalho é uma nova forma de se ver a necessidade do trabalho associado a uma melhor qualidade de vida. Ele surge como resposta às novas necessidades do Homem moderno e da sociedade atual. Trata de um fenômeno em pleno crescimento, sendo uma consequência inevitável da sociedade hoje tão informatizada e em busca de uma melhor qualidade de vida.
Palavras-chave: Teletrabalho, Relação Emprego, Relação De Trabalho, Direito Do Trabalho.
INTRODUÇÃO
Chegou a vez de o trabalhador não se deslocar até ao trabalho, e sim o trabalho vir até o trabalhador. Trabalhar no âmbito de sua residência parece ser cada vez mais a hipótese acertada numa altura em que a qualidade de vida se tornou um dos assuntos da ordem do dia, sem contar, incondicionalmente, com a informatização.
Com vistas a buscar a origem do teletrabalho, mister se faz averiguar e resgatar sua historicidade. Daí, observa-se também a necessidade de discorrer sobre os diversos conceitos que identificam tal tipo de trabalho, inclusive com enfoque em outros países.
Pretende-se com a confecção desta pesquisa evidenciar a necessidade de difusão e regulamentação dessa nova modalidade de trabalho, de forma que não cause malefícios nem para o empregado e nem o empregador, pois a intenção é justamente uma melhor qualidade de vida, uma melhor aplicação e utilização do tempo, Com isso, o prestador de serviço/trabalhador disporá de suas tarefas profissionais de acordo com o seu dia-a-dia, concomitante com o cumprimento da sua obrigação e suas tarefas domésticas, aproveitando assim efetivamente suas horas tanto de trabalho quanto de lazer.
E, como é um fenômeno global, abordar-se-á na forma comparada, a repercussão dessa prática em países como Estados Unidos, França, Itália e Brasil, para, ao final, destacar a legislação que regulamenta o teletrabalho.
Por fim, é inquestionável a relevância do tema tendo em vista o princípio fundamental da Constituição Federal do Brasil que preceitua o enorme valor à dignidade da pessoa humana. E, ao se flexibilizar o trabalho e o horário do empregado lhe proporciona uma vida muito mais agradável, saudável e feliz.
1. DAS RELAÇÕES DE TRABALHO
O Direito do Trabalho constrói seus princípios e regras a partir da relação empregatícia advinda de um contrato de trabalho. Ressalva-se que toda relação de emprego é relação de trabalho, mas nem toda relação de trabalho é de emprego, sendo esta última uma modalidade especial da relação de trabalho.
Daí a necessidade de buscar a evolução histórica do trabalho como adiante se vê.
1.1.Origem e Evolução Histórica do Trabalho
No início dos tempos, mormente quando se fala em relação de trabalho, o que predominou durante muito tempo foi o trabalho escravo e o trabalho forçado, de forma que “não há que se falar em Direito nas relações de trabalho”[1]. Estamos aqui nos referindo ao período pré-industrial, cabendo citar a existência, ainda nesse período, das corporações de ofício[2] e da locação[3].
Maurício Godinho Delgado entende que não se pode falar em Direito do Trabalho enquanto ramo científico no período escravocrata, frisando que
[…] não há que se falar em ramo jurídico (direito do trabalho) normatizador da relação de emprego sem que o próprio pressuposto dessa relação seja estruturalmente permitido na sociedade enfocada. Desse modo, apenas a contar da extinção da escravatura (1888) é que se pode iniciar uma pesquisa consistente sobre a formação e consolidação histórica do Direito do Trabalho no Brasil”[4].
Esse entendimento é fundamental para que fique assentada o que vem a ser uma relação de emprego, dando a esta toda a contextualização e características que lhe é peculiar.
1.1.1.Sociedade Industrial
Pode-se considerar que é nessa fase que nasce o Direito do Trabalho, pois, segundo Alice Monteiro de Barros[5], “a Revolução industrial acarretou mudanças no setor produtivo e deu origem à classe operária, transformando as relações sociais”. Esta revolução[6], acontecida no século XVIII, é entendida como um conjunto de transformações, decorrentes da mecanização da produção resultando numa expansão da indústria e do comércio.
Já se observa o trabalho assalariado numa escala crescente. Em decorrência dessa massa de trabalhadores, surgem os sindicatos, na situação de representantes dos trabalhadores com o intuito de reivindicar em nome destes condições melhores de trabalho e salários, tendo em vista a contratação de mulheres e menores em situações de trabalho e de higiene lastimáveis, e ainda, com relatos de um grande número de acidentes.
Alice Monteiro de Barros realça que surge “uma liberdade econômica sem limites, com opressão dos mais fracos, gerando, segundo alguns autores, uma nova forma de escravidão”[7]. O trabalho não passava de uma mercadoria e a concorrência que ditava os preços da produção.
Entretanto, toda essa situação estava atingindo níveis intolerantes diante da inobservância de condições saudáveis e humanas para o trabalho e completa opressão da classe trabalhadora. E, observe-se, que é uma era permeada por ideais liberais.
Contudo, os ideais liberais continuam a ser largamente clamados por diversos povos em todo o mundo, simplesmente porque figura para essa corrente filosófica a valorização do indivíduo na sociedade bem como a defesa de seus direitos.
1.1.2.Sociedade Brasileira
A problemática das relações de emprego no Brasil não foi muito diferente do resto do mundo. Reforça-se que, como já dito, só depois do final da escravidão que pode se falar em direitos para os trabalhadores, haja vista o tratamento desumano delegado ao escravos, oa quais assumiam uma situação de coisa e não de ser para o mercado.
Até mesmo no Brasil, as relações de trabalho eram extremamente frágeis, conforme Vera Regina Loureiro Winter[8], fruto da sistemática política que “coibia um controle sindical efetivo”.
Tem-se notícias de definição de relações de trabalho na forma da lei datada dos anos 40, recordando-se que o mundo está prestes a romper uma guerra mundial, posto que em 31 de agosto de 1942 foi declarado o estado de guerra em todo o território nacional.[9] E já vivíamos a ditadura de Vargas.
A Consolidação das Leis do Trabalho, decreto que reúne toda a legislação trabalhista da época, surge nessa época, em 1943 e sofre críticas até hoje por julgarem-na paternalista demais e também por não absorver as transformações ocorridas nas relações sindicais e trabalhistas.
Mister se faz enunciar os direitos e deveres trabalhistas advindos com as muitas constituições brasileiras, conforme tabela abaixo (TABELA 1) a seguir:
TABELA 1 – Os direitos trabalhistas nas constituições brasileiras
É irrefutável o marco que a constituição cidadã (1988), como muitos citam, traz para o ordenamento jurídico nacional, particularmente em relação às liberdades civis e os direitos elencados em seu artigo 7º, o que não torna menos interessante os outros momentos vividos.
1.2.Diferença entre Relação de Trabalho e Relação de Emprego
Deve-se ter em mente que relação de emprego é espécie do gênero relação de trabalho. Frisa, pois, Maurício Godinho Delgado:
“A primeira expressão (relação de trabalho) tem caráter genérico: refere-se a todas as relações jurídicas caracterizadas por terem sua prestação essencial central em uma obrigação de fazer consubstanciada em albor humano. Refere-se, pois, a toda modalidade de contratação de trabalho humano modernamente admissível. A expressão relação de trabalho englobaria, desse modo, a relação de emprego, a relação de trabalho autônomo, a relação de trabalho eventual, de trabalho avulso e outras modalidades de pactuação de prestação de labor (como trabalho de estágio, etc.) traduz, portanto, o gênero a que se acomodam todas as formas de pactuação de prestação de trabalho existentes no mundo jurídico atual.
A relação de emprego, entretanto, é, do ponto de vista técnico-jurídico, apenas uma das modalidades específicas de relação de trabalho juridicamente configuradas. Corresponde a um tipo legal próprio e específico, inconfundível com as demais modalidades de relação de trabalho ora vigorantes.”(DELGADO, 2006, p. 285/286)
Desta análise, tem-se que o teletrabalho vem a ser uma relação de emprego e, diante desse contrato de trabalho, são sujeitos dessa relação o empregado e o empregador, não podendo, então, desconsiderar os cinco elementos (ou pressupostos) que caracterizam a relação de emprego[10], quais sejam:
a) Trabalho prestado por pessoa física: prestação de serviços por uma pessoa física ou natural;
b) Pessoalidade: o contrato de trabalho, em relação ao empregado é pessoal, infungível; não poderá o obreiro fazer-se substituir dado o caráter intuitu personae;
c) Não eventualidade: o trabalho prestado deve ter caráter permanente, ainda que por um curto período de tempo. Não pode ser esporádico.
d) Onerosidade: o contrato de trabalho envolve prestações e contraprestações recíprocas, que podem ser economicamente mensuráveis. Observa-se a intenção das partes (animus contrahendi) em formar o vinculo;
e) Subordinação: expressão derivada do latim subordinatio (submissão, sujeição, delegação), que expressa a situação jurídica pela qual o empregado se compromete a acolher o poder de direção do seu empregador, quando da realização dos serviços.
1.3.A Normatização das Relações de Emprego
O Direito reflete os fatos sociais, de modo que as transformações surgem (revolução industrial, neoliberalismo) e vão exigindo que a elas o Direito se adeque. Particularmente abordar-se-á o desenvolver do Direito do Trabalho.
As primeiras leis, após o advento da Revolução Industrial, visavam a proteção de um grupo em particular, mulheres e menores, diante das condições e ambiente de trabalho inadequados. Só com o passar do tempo que a proteção se deu para todo o trabalhador, e, conforme Amauri Mascaro Nascimento[11], não eram, à época, leis constitucionais e sim meras leis ordinárias.
Em 1802 surge na Inglaterra a “Lei de Peel” ((VIDE ANEXO I). É o primeiro registro histórico da preocupação com o trabalhador, reduzindo, por exemplo, a jornada de trabalho de menores para 12 horas, não podendo mais iniciar antes das 06 horas ou terminar após as 21 horas. Isso, após um amplo processo de negociação, já fruto da pressão social. Há relatos que, infelizmente, a lei ficou só no papel, apesar do industrial inglês, criador da lei, Sir Robert Peel, a ter adotado em suas indústrias.
Em 1813, a França trata da edição de lei que proiba o trabalho de menores nas minas e, em 1841 veda que menores de 08 anos trabalhem e estabelece jornada de 08 horas para menores de 12 anos.[12]
Na Alemanha, em 1869, também surge lei proibindo o trabalho de menores de 09 anos e “as leis sociais de Bismarck (1833) criaram um sistema previdenciário de proteção à vida, saúde e integridade física do trabalhador”[13]–[14].
Observa-se que o povo agora tem vez e voz, e o Manifesto Comunista, originariamente denominado Manifesto do Partido Comunista (1848), foi uma tentativa de tomada de poder por parte dos proletários[15]. Foi um despertar de consciência dessa nova classe.
Em 1891, a igreja edita a Enciclíca Rerum Novarum (Papa Leão XIII) debatendo sobre as condições das classes trabalhadoras, apoiando a formação de sindicatos e a defesa da propriedade privada.
Consolida-se a formação do direito do trabalho com o Tratado de Versalhes e a concomitante criação da OIT – Organização Internacional do Trabalho, com a finalidade de lutar por condições mais dignas de trabalho tanto nacional como internacionalmente, com a confecção de convenções e recomendações. Fábio Ferraz, sobre o Tratado de Versalhes, cita que
“[…] significou a humanização das condições de trabalho, auxiliando na busca pela paz social. O tratado foi um sopro estimulante em matéria de legislação trabalhista. Ele cristaliza o novo espírito, que contribuiu para o aceleramento do processo de regulamentação do trabalho”[16].
Com esse sentimento surge o constitucionalismo social que refere-se à inclusão de leis trabalhistas nas constituições de alguns países como o México, que foi o precursor, a Alemanha, a França e o Brasil, entre outros.
Encontra-se no artigo 123 (VIDE ANEXO II), da Constituição do México (1917), a regulamentação da jornada de trabalho diurna e noturna, a proibição do trabalho de menores de 12 anos, a proteção à maternidade, direito ao salário mínimo, direito de sindicalização e greve e seguros sociais, entre outros. Observa-se descrições extensivas na Constituição que visam, justamente, resguardar o trabalhador e, dada sua importância no contexto do Direito do Trabalho, tomar ciência do conteúdo abordado é deveras interessante para a pesquisa em tela.
A Constituição de Weimar, de 1919, veio em seguida, regulamentando a participação dos empregados na fixação dos salários, condições dignas de trabalho e a representação e participação de trabalhadores na empresa.
Na contramão das reformas evidentes, convém citar a Carta del Lavoro, de 1927, que inspirou outros sistemas políticos tais como: Portugal, Espanha e o Brasil. Ressalta-se o cunho altamente fascista do documento, onde o Estado interferiria nas relações entre as pessoas com vistas a organizar a sociedade, regulando dessa forma, praticamente tudo. Era a supremacia do interesse nacional sobre o dos particulares. Inclusive seu lema era “tudo dentro do Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado”[17], havendo com isso grande prejuízo para o desenvolvimento sindical. Certamente é um modelo a se evitar ao se propor uma reforma trabalhista.
Francisco Edivar Carvalho releva que, hodiernamente, “com o advento da globalização, a competitividade, os avançadíssimos métodos de produção e a tecnologia ganharam outro enfoque”[18]. Sabe-se, no entanto, que essa situação gerou uma sociedade que produzia mais, mas a exigência de mão-de-obra era menor. Amauri Mascaro Nascimento assim traduziu:
“[…] a substituição do trabalho humano pelo software; a desnecessidade, cada vez maior, de um quadro numero de empregados pra obter os mesmos resultados, com redução da demanda de trabalhadores; a informatização e a robótica como principais fatores do crescimento da produtividade; o aumento do desemprego e do subemprego em escala mundial; o avanço da sociedade de serviços maior do que a sociedade industrial; novas profissões; sofisticados meios de trabalho, enfim, uma realidade bem diferente daquela na qual o direito do trabalho nasceu”[19].
Diante de uma sociedade globalizada, o mercado não poderia reagir diferente. E esse mercado exige profissionais cada vez mais capacitados, profissionais hábeis o que gera, nos dizeres de Mara Vidigal Darcanchy[20], “um batalhão de excluídos”. Esses profissionais e aqueles que o procuram criam um vínculo através de uma relação de trabalho que difere da relação de emprego, pelo menos no universo acadêmico. Mauricio Godinho Delgado[21] frisa, nesse pormenor, que
“[,,,] a expressão relação de trabalho englobaria, […], a relação de emprego, a relação de trabalho autônomo, a relação de trabalho eventual, de trabalho avulso e de outras modalidades de pactuação de labor (como trabalho de estágio, etc.). Traduz, portanto, o gênero a que se acomodam todas as formas de pactuação de prestação de trabalho existentes no mundo jurídico atual.”
Em face de tudo acima citado, a vertente contemporânea do Direito do Trabalho passa a proteger além da relação de emprego os bens jurídicos, como os direitos fundamentais e a dignidade do empregado.
1.3.1.No Brasil
Como já citado, só após o final da escravidão, em 1888, é que se pode falar em direitos, e, a partir de 1888 até 1930, consagrou-se a época denominada, segundo Mauricio Godinho Delgado, das manifestações incipientes ou esparsas[22]. Refere-se, particularmente, às relações empregatícias adotadas na cultura do café nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro.
Por volta de 1890, vislumbra-se legislação com vias a proteger o menor e a mulher brasileiros. Isso em função de serem ambos mão de obra fácil e barata, que, dessa forma, eram explorados e maltratados, inexistindo qualquer preocupação do empregador quanto à saúde dessa classe de funcionários.
Outro marco importante a salientar é a Era Vargas (1930-1945) tendo em vista as inúmeras alterações e criações de Vargas[23], tanto sociais quanto econômicas diante de sua política de modernização, que, sem dúvida, repercurtiram na seara do direito trabalhista.
Apesar de Vargas ter fechado o Congresso Nacional[24], após derrubar a Constituição e declarar o Estado Novo[25], é dessa época a criação da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT (1943). Frisa-se, contudo, que não é um código, haja vista não ter criado leis novas, tratando apenas de uma reunião de leis esparsas já existentes. E, embora sofrendo reformulações, vige até os dias atuais.
Este presidente ainda contribuiu para o direito trabalhista criando:
– a carteira de trabalho e previdência social – CTPS (1932);
– jornada de trabalho de oito horas (1934);
– repouso semanal (1934);
– férias remuneradas (1934);
– a Justiça do Trabalho (1939);
– o salário mínimo (1940), entre outros.
Observa-se, então, que apesar de ter sido um ditador, as medidas de Vargas foram bastante favoráveis para a classe operária, surge até mesmo a geração de mais empregos no Brasil.
Discorrendo ainda sobre fatos importantes para o direito trabalhista brasileiro, em 1962 (Lei nº 4.090), sob o regime parlamentarista, institui-se o décimo terceiro salário ou gratificação de natal.
Em 1966, cria-se a figura do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, hoje regulamentado pela Lei 8.036/1990. Instituiu-se um regime híbrido até a Constituição de 1988, a qual pôs fim ao instituto da estabilidade no emprego após 10 anos de serviço, não restando mais a possibilidade de optar por algum regime.
Aliás, a Constituição de 1988 supracitada, não é conhecida como a Constituição Cidadã à toa, haja vista a ampliação que se observou quando da sua promulgação no campo das liberdades civis e direitos e garantias individuais. Em seu artigo 7º e incisos, essa constituição arrola os direitos sociais e outros que visem a melhoria de condições, tanto dos empregados urbanos quanto rurais, fazendo menção em seu parágrafo único aos trabalhados domésticos quanto à incidência de alguns direitos aos quais também lhe são concedidos.
A própria equiparação dos trabalhadores urbanos aos rurais já é tida por muitos, como Alice Monteiro de Barros, uma das “inovações e alterações importantes”[26] que surgiram com o advento do artigo supra citado na carta maior.
Coube ainda conceder ao empregado rural direito ao FGTS, pondo fim ao regime hibrido até então mantido por conta da estabilidade daqueles com dez anos no mesmo emprego. Ressalta-se, entretanto, o inciso I, do artigo 7º, que dispõe sobre a proteção ao emprego contra despedida arbitrária ou sem justa causa.
E também, parafraseando ainda Alice Monteiro de Barros[27]:
– trouxe a unificação nacional do salário mínimo (inciso IV) que até então era regionalizado, ampliando o entendimento de que este deveria atender também a necessidades como educação, saúde, lazer e previdência social, e não só alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte;
– instituiu o piso salarial (inciso V), até então inconstitucional;
– a irredutibilidade do salário mínimo foi relativizada para os casos de convenção ou acordo coletivo (inciso VI) que dispusesse em contrário, visando aqui evitar demissões em massa;
– estendeu ao rurícola o salário família (inciso XII), bem como ao trabalhador de baixa renda;
– proporcionou uma redução da carga semanal de 48 para 44 horas (inciso XIII);
– garantiu adicional de horas extras: passou de 20/25 % para 50 %, no mínimo (inciso XVI), facultado o regime de compensação (inciso XIII);
– determinou a majoração da remuneração de férias em 1/3 (inciso XVII);
– concedeu a licença maternidade prolongada de 84 para 120 dias (inciso XVIII);
– introduziu a licença paternidade (inciso XIX) de cinco dias;
– houve a proteção ao mercado da mulher minimizando as desvantagens e desigualdades destas no contexto social, sem ferir o princípio da isonomia[28], proibindo expressamente a diferença de salarios, funções, admissões, nos termos do inciso XXX;
– criou o aviso prévio proporcional, e fixou em 30 (trinta) dias no mínimo (inciso XXI);
– previu o adicional de penosidade (inciso XXIII);
– garantiu a proteção contra a automação (inciso XXVII);
– proibiu a discriminação quanto ao trabalhador portador de deficiência (inciso XXXI); e
– equiparou os trabalhadores avulsos aos empregados (inciso XXXIV).
A Constituição de 1988 ainda garantiu e garante o emprego do empregado eleito para cargo de direção de comissão interna de prevenção de acidentes (CIPA) bem como à empregada gestante.
É ainda, de suma importância também, realçar a liberdade de atuação dos sindicatos, prevista no artigo 8º, da nossa Constituição, garantindo-se, contudo, a não obrigatoriedade de filiar-se ou manter-se filiado (art. 8º, V, CLT).
Por fim, aborda-se a questão da greve. Esta vem regulamentada no artigo 9º, da Constituição Federal de 1988, direito esse já consagrado em outras constituições. No entanto, segundo Alice Monteiro de Barros, “mas não de forma irrestrita, absoluta, a ponto de induzir à concepção de se tratar de uma expressão de liberdade plena […]”[29].
O direito de greve é assegurado, em condições diferenciadas, aos trabalhadores em geral (CF, art. 9º e Lei nº 7.783/89) e aos servidores públicos civis (CF, art. 37, VII). Para suprir a omissão legislativa e assegurar o direito de greve aos servidores públicos civis, o Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão de 25 de outubro de 2007, em sede de mandado de injunção (instrumento de concretização das cláusulas constitucionais), decidiu estender a aplicação da Lei nº 7.783/89 ao setor público, até a edição de lei específica.
2.O TELETRABALHO
O teletrabalho destaca-se por possibilitar que o trabalho vá de encontro ao trabalhador em vez deste ter que ir ao encontro do trabalho, e, em sendo uma atividade exercida à distância, faz uso de avançadas tecnologias tanto de informação quanto de comunicação. Manuel Martin Pino Estrada[30] o retrata como um “novo paradigma, […]. Essencialmente, baseia-se numa descentralização física acompanhada por uma descentralização da informação, o que hoje se chama uma forma de trabalho distribuída.”
Desta forma, mister se faz trabalhar detalhamente, conforme abaixo, seu conceito e sua evolução.
2.1.Conceito, natureza jurídica e tipologia
As definições sobre o teletrabalho são diversas e encontram-se constantemente em evolução. Por isso, não existe um consenso para uma definição universal do conceito de teletrabalho.
O seu termo remonta à publicação, em 1969, de um artigo no “Washington Post”, com a introdução do termo “dominetics”; e, só após, teríamos o surgimento, com J. Nilles, em 1973, do termo “telecommuting”[31].
Na hora de conceituar, cabe observar a relação entre a utilização ou não de tecnologias de informação e comunicação e a periodicidade da quantidade de horas/mês despendidas em atividades que são desenvolvidas fora do escritório tradicional, principalmente para não confundir teletrabalho com trabalho em domicílio, porque, segundo Alice Monteiro de Barros[32],
“[…] o teletrabalho distingue-se do trabalho tradicional não só por implicar, em geral, a realização de tarefas mais complexas do que as manuais, mas também porque abrange setores diversos como: tratamento, transmissão e acumulação de informação; atividade de investigação,; secretariado; consultoria, assistência técnica e auditoria; gestão de recursos, venda e operações mercantis em geral. Desenho, jornalismo, digitação, redação, edição, contabilidade, tradução, além de utilização de novas tecnologias, como informática e telecomunicações, geralmente afetas ao setor terciário.”
Ainda nesta seara, ressalta-se que o trabalho em domicílio vem conceituado na CLT, em seu artigo 83, sendo pois “[…] aquele que, diversamente da maioria dos empregados, trabalha em sua própria residência ou em oficina de família, por conta de empregador que o remunere” (CLT, art. 83). Frise-se que este tem direito a todas as disposições protetoras do trabalho existentes na CLT, o que ainda não vemos em se tratando do teletrabalhador.
Para Carla Carrara da Silva Jardim, “o teletrabalho é uma modalidade de trabalho a distância, voltado preponderantemente às atividades administrativas que possibilitam a execução longe do seio da empresa”[33]. A referida autora, e isso é importante em termos de conceito, ainda diferencia telework, de teleworking e telecommuting; firmando o entendimento de que:
“o telework é entendido como o trabalho a distância, que atualmente está voltado a tarefas e atividades que existiam anteriormente, mas que, com o paradigma da desconcentração do trabalho do interior da empresa, ganham novo colorido, como, por exemplo, no setor de vendas, em que os relatórios padronizados já existiam, sendo que o bloco de contratos, o de relatórios e o de notas fiscais foram substituídos pelos formulários computadorizados; estes antes eram remetidos via correio, ou eram entregues pessoalmente pelos vendedores ao Departamento de Vendas, toda sexta-feira ou segunda-feira, dias em que geralmente eles vinham até a sede ou a filial da empresa para reuniões com os supervisores. Outros setores que se beneficiaram com o teletrabalho são os de administração, de serviços jurídicos, de ensino e formação, atualmente em grande expansão, de serviços bancários, de companhias de seguros, públicos, de vendas por correspondência e de telemarketing, entre outros tantos setores de serviços
O teleworking, como qualquer forma de substituição da viagem ao local de trabalho pelas tecnologias da informação, está adstrito ao conteúdo do trabalho, que contém diretrizes para a consecução dos objetivos. No “teleworking”, a informação é a ferramenta do trabalho. A informação viaja pelos meios de telecomunicações. Assim, o teleworking pode estender-se aos teletrabalhadores que lidam diretamente com as tecnologias nas áreas de biotecnologia, biologia molecular, física, especificamente nas áreas de novas modalidades energéticas, no tratamento de novos materiais, no desenvolvimento de novas tecnologias de telecomunicações, no desenvolvimento de novas ferramentas informáticas, no uso da eletrônica avançada, entre outras, o que mostra que o teleworking não está ligado somente às atividades nas áreas de serviços e nas áreas notadamente burocráticas. O teleworking é a inovação que permite que um novo conceito de trabalho e uma nova mentalidade de trabalhar esteja em curso
O telecommuting é o trabalho periódico realizado fora do escritório principal. Na Itália, o conceito de telecommuting refere-se “ao empregado que trabalha ao menos um dia da semana em sua casa utilizando conexões informáticas (telefone, fax, correio eletrônico), redes locais, regionais ou internacionais para receber ou transmitir dados”. Especialistas italianos, como Domenico De Masi, não fazem a distinção entre teletrabalho e telecommuting e salientam, de modo genérico, que essa nova modalidade de trabalho pode ser adotada só por formas de trabalho que se prestem à descentralização por razões de índoles técnicas, organizativas ou humanas e pode ser limitada a alguns dias da semana ou a algumas semanas do mês. Esses autores também salientam que teletrabalho não significa trabalho em domicílio, já que é possível executá-lo em centros-satélites da empresa que se localizem próximos à residência do trabalhador”[34].
Sendo este um assunto relevante para toda a sociedade, as sociólogas Maria Helena Teixeira da Silva e Lídia Segre, citadas por Sérgio Coutinho em seu artigo sobre a prova da relação de emprego no teletrabalho[35], também trataram de conceituar teletrabalho, donde temos que é o “trabalho exercido fisicamente fora da sede da empresa e com o uso sistemático de serviços telemáticos para a comunicação com a empresa”
Já a Organização Internacional do Trabalho (OIT) define o Teletrabalho como “o trabalho efetuado distante dos escritórios centrais ou das oficinas de produção, porém os trabalhadores mantêm-se conectados com alguns de seus colegas por meio das novas tecnologias”[36].
Desta forma, o teletrabalho implica em trabalho, distância e tecnologia. Ou seja, trabalho à distância facilitado pelas tecnologias de informação e comunicação no espaço e no tempo.
Assim, o teletrabalho é uma forma de trabalho exercida à distância de forma autónoma onde se utiliza ferramentas telecomunicacionais e de informação que asseguram um contato direto entre o teletrabalhador e empregador. Pode ser exercido a partir do domicílio, telecentros, centros satélites e o tão conhecido teletrabalho móvel que poderá ser exercido a partir de qualquer ponto onde se encontre o tele-trabalhador[37].
Dada as diferentes modalidades que o teletrabalho pode se desenvolver, encontra-se dificuldades em definir sua natureza jurídica. Ter-se-á que identificar como centro da natureza jurídica “a existência ou não da subordinação e da avaliação dos casos concretos”[38].
No entanto, quanto a tipologia[39], aqui relacionada ao modo de execução e transmissão do resultado do trabalho, diz-se ser:
1. On line – quando o trabalho é transmitido à empresa matriz em tempo real, constante;
2. Off line – o instante da transmissão do trabalho à empresa será determinado; e, por fim
3. One way line – o trabalhador faz uso de um software de suporte para entregar o trabalho por meio de um Floppy disk ou Modem.
No entanto, deve-se ficar claro que o uso de software e equipamentos para a execução e transmissão desses resultados serão de propriedade da empresa, ficando pendente de autorização da empresa que, por sua vez, concede o uso ao telempregado como instrumento de trabalho.
Equipamentos que acompanhem a modernidade tecnológica, promoverão melhor resultado, observando-se uma relação entre a tecnologia utilizada e o trabalho realizado a distância: se o nível tecnológico evolui, o potencial do trabalho remoto evolui também.
2.2.Evolução do Teletrabalho
As novas tecnologias permitem a disponibilização da informação independentemente do local onde cada um se encontra, e conduzem a novas formas de executar tarefas.
Assim, o teletrabalho corresponde a uma nova forma de organização do trabalho, que diferencia dos empregos atuais e possibilita novas formas, desvencilhando-se do modelo burocrático/mecânico vigente na fase do sistema de produção industrial para um modelo orgânico/flexível, elaborado pelo empregado, da sua melhor forma e como melhor lhe atender.
Vera Regina Loureiro Winter, citando Kugelmass, relata que o trabalho remoto surge em 1857, quando John Edgar Thompson utilizou-se do telégrafo para controlar o uso de equipamentos de sua empresa Penn Railroad.
Quando Nobert Wiener[40] surge com a Cibernética, revoluciona a década de 50, comentando que assim “um arquiteto, vivendo na Europa, poderia supervisionar, a distância, a construção de um prédio nos EUA utilizando a comunicação por fac-símile.”[41]. Sem dúvida, um grande avanço se observou desde então pra diversos campos do conhecimento e, particularmente, nos processos de informação e sua transmissão, processos esses imprescindíveis à implementação do teletrabalho.
O trabalho a domicílio ganha espaço e reaparece em 1960 nas áreas de produção de vestuários e calçados e, em 1970 se expande para outras áreas (artigos eletrônicos, bebidas, cosméticos…), até mesmo porque sofreu o mundo nessa época a crise do petróleo, havendo ainda uma “convergência do trabalho a distância e do trabalho em casa”[42], surgindo o conceito de teletrabalho.
Em 1971, Jack Nilles[43] surge com as expressões teleworking e telecommuting entendendo-as distintas entre si, conforme abordado quando se definiu o conceito de teletrabalho.
Já na década de noventa, para a comunidade européia,
“[…] assistiu-se à intensificação dos apoios ao desenvolvimento da sociedade da informação e ao teletrabalho, tendo como base a existência de uma política de construção da Sociedade da Informação (S. I.) europeia, assente na liberalização das telecomunicações, no apoio ao desenvolvimento tecnológico e na criação de condições apropriadas para os novos negócios. Estas orientações tiveram como contrapartida a implementação de políticas sociais, tanto mais necessárias quanto se recorde que a Europa Comunitária conhecia níveis particularmente elevados de desemprego, situação, de resto, ainda não completamente superada”.[44]
Frederico Silveira e Silva[45] entende que a globalização foi um dos fatores que propiciaram e elevou o surgimento dos teletrabalhadores, pois diante dela temos a “divulgação ou migração de tecnologias, antes só utilizadas por países desenvolvidos, para os países periféricos em desenvolvimento.”
Por fim, entende ainda Frederico Silveira e Silva que é o momento, o terceiro milênio, da revolução nas telecomunicações, trazendo agilidade para as transações comerciais com o “desaparecimento das distâncias”.
2.3.O posicionamento da OIT em relação ao Teletrabalho
A OIT – Organização Internacional do Trabalho, fundada em 1919, tem com o objetivo promover a justiça social. Inclusive, é a única das Agências do Sistema das Nações Unidas que tem estrutura tripartite (representantes dos empregadores, dos trabalhadores e governo).
No Brasil, a OIT tem mantido representação desde 1950, com programas e atividades que têm refletido os objetivos da Organização ao longo de sua história[46]. E, em suas convenções e recomendações[47], a OIT refere-se particularmente ao trabalho em domicílio.
A Convenção 177[48] ou C177, de 1996, em seus dezoito artigos, apesar de se relacionarem com o trabalho em domicílio, em alguns itens podem ser aplicados ao teletrabalho, ressalvando mais uma vez que teletrabalho e trabalho em domicílio não são sinônimos, embora guardem entre si algumas semelhanças.
Pode-se observar na Convenção, por exemplo, o combate às interpretações errôneas de que haviam condições mínimas de trabalho e higiene aos trabalhadores em domicílio[49], bem como o seu direito de se organizar e se representar por um órgão de classe. Carla Carrara da Silva Jardim ressalta, ainda, a preocupação da OIT que
“[…] atenta às mudanças que estão em curso, a OIT, principalmente diante da modalidade de trabalho, denominada teletrabalho, preconiza que uma pessoa que tenha a condição de assalariado não será considerada trabalhador em domicílio para efeitos da Convenção n. 177, pelo fato de realizar ocasionalmente seu trabalho como assalariado em seu domicílio, em vez de realizá-lo em seu lugar habitual (art. 1º)”.[50]
Deve-se analisar a convenção nº 177 juntamente com a Recomendação 184 ou R184[51]. Esta recomendação, segundo Carla Carrara da Silva Jardim,
“[…] em suas disposições gerais, trata da necessidade de designar a autoridade ou as autoridades encarregadas de definir e aplicar a política nacional em matéria de trabalho em domicílio e de manter atualizadas as informações sobre as características desse trabalho, bem como o universo que o compõe, para servir de base à política nacional em matéria de trabalho em domicílio, tudo isso aliado aos esforços de órgãos tripartites ou consultas a organizações de empregadores e trabalhadores, em razão da imutabilidade que caracteriza as relações e as formas de trabalho. A Recomendação n. 184 ressalta a preocupação da OIT com os trabalhadores em domicílio, ao dispor que estes devem manter-se informados sobre suas condições específicas de emprego. Essas informações devem ser fornecidas por escrito ou de outro modo, respeitada a legislação do país, constando nome e endereço do empregador e do intermediário, quando houver, valor da remuneração e seus métodos de cálculo e tipo de trabalho que deverá ser realizado”
Sendo responsável pelas normas internacionais de trabalho, a OIT não poderia deixar, também nessa recomendação, de se preocupar com a saúde e a segurança do trabalho, fixando ainda o direito desses trabalhadores em domícilio a férias, repouso semanal e licenças médicas, dentre outros.
2.4.Breve análise do Teletrabalho em outros países
O teletrabalho por poder ser produzido de qualquer local adaptado com tecnologia, ele quebra assim as barreiras geográficas atuais, a quem já conceitue até como “teletrabalho transfronteiriço”[52] por conta disso.
Dessa forma, cabe a análise nesse estudo do entendimento em outros países acerca de como eles vem regulamentando essa nova modalidade, até mesmo para fins de aprendizagem e futura implantação em nosso próprio ordenamento.
E os dados relevam a grande adesão a essa nova modalidade, a saber:
“População mundial de funcionários de empresas que trabalham em casa pelo menos um dia por semana(1)
– 1998 – 9,8 milhões
– 2000 – 14,4 milhões
– 2002 – 21,4 milhões
– 2004 – 30,5 milhões(2)
– 2006 – 36,8 milhões(2)
– 2008 – 41,4 milhões(2)”
(Fonte: http://info.abril.com.br/edicoes/224/arquivos/4745_1.shl, acesso em 27-05-2009)
2.41.O Teletrabalho nos Estados Unidos
Diante do fator histórico já relatado, os Estados Unidos estão deveras adiantados em se tratando de legislação acerca do teletrabalho.
Interessante frisar que ele surge, como já dito, com a crise do petróleo (1970), mas decresce o interesse por ele, retornando só em 1990, particularmente em 1994 com a edição do Clean Air Act, legislação ambiental dos EUA que não exigia das empresas a implantação do teletrabalho, entretanto, ainda que fosse apenas uma recomendação para atingir as metas, diminuir-se os carros circulantes, aplicou-se perfeitamente o teletrabalho.
Segundo Carla Carrara da Silva Jardim[53],
“[…] os programas de teletrabalho nos Estados Unidos da América revestem-se de características peculiares; uma delas é que os programas do teletrabalho estão implantados fundamentalmente mediante os chamados programas de telecommuting e cada Estado os implanta seguindo suas próprias diretrizes”.
Entretanto, os trabalhadores, telecommuters, estão protegidos pelas maiores leis trabalhistas americanas, a saber: a Lei Federal ou Ato de Normas de Trabalho Justas – FLSA (Fair Labor Standards Act), o Código de Trabalho da Califórnia e o Ato de Segurança e Saúde Ocupacional – OSHA (Occupational Safetyand Health Act).
Nos Estados Unidos, segundo Álvaro Mello, “[…] trabalhar em casa já é quase tão comum quanto escovar os dentes ou ir à escola”[54]. Este autor traz ainda, dados estatísticos interessantes, ressalvando ser o artigo consultado do ano de 2000, de que 300 das 500 maiores companhias deste país já têm programas de Telecommuting em andamento, com pelo menos 11 milhões de pessoas sediadas em casa. E esse número de telecommuters tem crescido entre 10% e 15% ao ano.
Ilustrativamente, com dados mais atuais, datados de 2006, temos uma pesquisa da Consumer Electronics Association (VIDE ANEXO III), que retrata, diante de diferentes fontes pesquisadoras o quadro evolutivo do teletrabalho de 2000 a 2006, chegando-se à marca de 16,3 milhões de trabalhadores autônomos e 12,4 milhões de trabalhadores regularmente empregados que trabalham remotamente pelo menos uma vez por mês (tradução da autora).
2.4.2.O Teletrabalho na França
O teletrabalho surge na França, segundo Carla Carrara da Silva Jardim, na década de 80, denominado télétravail. E lá também aplicou-se o Código do Trabalho Francês que só previa o trabalho em domicílio, como já observado nos EUA.
Em 1994, edita-se a Lei n. 94-126, denominada Lei Madelin, bastante benéfica no sentido de determinar-se o contrato de trabalho, identificando se o trabalhador é um assalariado ou um trabalhador independente, com base na observância do vínculo da subordinação.
Os franceses adotaram formular um contrato de trabalho para o que eles denominam de teletrabalhadores em domicílio, de forma que neste contrato tem-se a previsão de pagamentos e de que equipamentos são necessários para realizar a tarefa, bem como riscos com gastos extras e provisão de materiais.
Entretanto, Carla Carrara da Silva Jardim deixa clara a preocupação de se inserir as cláusulas de reversibilidade e de não-concorrência nos referidos contratos, para, “assim sendo, se uma das partes não estiver satisfeita com essa nova modalidade de trabalho, qualquer um deles pode exigir o retorno à situação anterior.”[55]
Salienta-se que, na Europa, assinou-se um acordo sobre o teletrabalho de forma a regulamentá-lo por meio de acordos coletivos. Mas, o número de teletrabalhadores nos EUA suplantam em muito, ainda, o da Europa.
Para fins estatísticos, relata-se em artigo publicado sobre teletrabalho (Teletrabalho: um empecilho à ascensão profissional?), em 19-09-2007, que, de acordo com um levantamento feito periodicamente pelo portal de empregos Monster, 35% dos 8.000 europeus consultados trabalham em casa, um percentual que entre os entrevistados na Espanha cai para 26%. De acordo com esse mesmo levantamento, a Espanha está entre os países europeus com menos teletrabalhadores, superando apenas os italianos, com 19%, e os franceses, com 20%[56].
2.4.3.O Teletrabalho na Itália
Na Itália tem-se o “telelavoro”, palavra italiana para teletrabalho, que aqui se enquadra tanto para uma atividade autônoma quanto como trabalho parassubordinado, nos termos dos artigo 2.083 e 2.082, respectivamente, do Código Civil Italiano[57].
Carla Carrara da Silva Jardim frisa que
“[…] a jurisprudência centra-se na vontade das partes para configurar se o vínculo jurídico que se estabelece é de natureza subordinada ou autônoma, respeitando-se as condições que de fato determinarem o contrário. E com diversos projetos de lei em exame no Parlamento, o papel da jurisprudência será determinante, visto que os projetos guardam relação com o teletrabalho subordinado e o parassubordinado”[58].
Já se observa também, segundo a autora supracitada, o emprego do teletrabalho na administração pública italiana, graças à edição da Lei 191/1998, que segue com seus decretos legislativos para regular questões como qual modalidade pode ser aplicado o teletrabalho, bem como controles de horário, qualidade de serviço, e normas de prevenção e segurança.
2.5.O Teletrabalho no Brasil
O teletrabalho no Brasil é uma realidade. Casos de empresas como a Cisco do Brasil e a IBM, sem contar o SERPRO, no setor público.
Um exemplo real do vivenciamento do teletrabalho no Brasil é a implantação de um projeto piloto de Teletrabalho na empresa pública SERPRO – Serviço Federal de Processamento de Dados, desde 2005.
O Serpro fornece ao funcionário virtual notebook, celular, acesso de banda larga e até a mesa de trabalho. Os funcionários recebem treinamento de informática e de segurança da informação com o objetivo de conservar os equipamentos.
A cada dois meses, a Coordenação de Teletrabalho do SERPRO envia relatórios com todas as informações gerenciais possíveis à diretoria da Empresa para o acompanhamento dos indicadores de qualidade de vida e produtividade de cada um dos 21 empregados engajados no projeto (dados da Coordenação de Comunicação Empresarial do Serpro, Luciana Azevêdo, 6 de fevereiro de 2006, in: http://www.serpro.gov.br/noticias-antigas/noticias-2006/20060206_03/?searchterm =teletrabalhom, acesso em 16-05-2009)
Entende-se não haver maior adesão tendo em vista a legislação trabalhista brasileira, apontada por diversas companhias,
“[…] como um obstáculo à adoção de programas de trabalho virtual no país. As empresas temem ser processadas por funcionários que alegam ter ficado à sua disposição ininterruptamente no momento em que casa e trabalho passaram a ocupar o mesmo local. Recomenda-se cautela nesses casos, mas há saídas que não representem um prejuízo nem para o funcionário nem para o empregador”[59].
E ainda, grande parte das empresas que adotam o teletrabalho, continuam amarradas aos mecanismos clássicos de controle, como a supervisão da presença física e do tempo utilizado pelo trabalhador.
Em 2006, na cidade de São Paulo, foi realizado o CBT 2006 – 1º Congresso Brasileiro de Teletrabalho, evento promovido pela SOBRATT – Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades, com vistas a discutir a situação do teletrabalho, trocar experiências e apresentar soluções inovadoras para essa nova modalidade de trabalho.
Segundo um estudo da Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades (Sobratt), o número de profissionais remotos chega a 3,5 milhões e o crescimento médio atinge 10% ao ano. As principais vantagens do teletrabalho são o ganho de tempo, já que não é necessário o deslocamento, a facilidade de concentração, uma vez que a pessoa trabalha sozinha, e a possibilidade de equilibrar melhor a vida pessoal[60].
3.REGULAMENTAÇÃO DO TELETRABALHO
É deveras difícil argumentar acerca da regulamentação do teletrabalho, particularmente aqui no Brasil. Em regra, opta-se por identificá-lo com a legislação existente acerca do que se refere ao trabalho em domicílio, de uma forma geral. Entretanto, o teletrabalhador, que não é o home office, tem, em regra, os direitos daquele trabalhador que se encontra na empresa, e isso deve ser observado.
3.1.Dispositivos normativos aplicáveis ao Teletrabalho
O sistema jurídico nacional ainda não está preparado para lidar com a questão do teletrabalho, ao menos dada a sua importância no contexto atual. Apesar da previsão expressa constitucional, entre os direitos dos trabalhadores, da “proteção em face da automação, na forma da lei” (Art. 7º, XXVII, CF/88), como ocorre com tantos outros preceitos constitucionais, ainda não há uma regulamentação do princípio constitucional. Em que pese a ausência de posições doutrinárias consolidadas sobre o tema, há importantes indícios para a investigação jurídica no Direito Constitucional, quando da observância dos princípios, pois estes dão unidade e harmonia à ordem jurídica, atenuando possíveis tensões normativas.
Cabe ressaltar o art. 8º da CLT, que versa sobre o uso da analogia e equidade, a saber:
“Art. 8º – As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.”
Há que se observar, também, o artigo 6º, CLT que iguala o trabalho executado na sede da empresa com o realizado na residência do empregado, com base no qual alguns doutrinadores entendem que aqui se enquadraria o teletrabalhador, apesar de Carla Carrara da Silva Jardim, entender essa legislação como “além de elástica, é incompleta”[61]:
“Art. 6º – Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado, desde que esteja caracterizada a relação de emprego.”
Frisa-se que temos no Direito do Trabalho princípios específicos que enfatizam com propriedade a questão das relações de trabalho. Assim, Sérgio Coutinho, em seu artigo sobre a prova da relação de emprego no tele-trabalho[62], traz que
“[…] se as atividades do trabalhador ocorrem predominantemente através do celular, automóvel, fac-simile, computador portátil (notebook, handheld, palm, laptop), quando estes instrumentos de trabalho estiverem em função da empresa estará o trabalhador em jornada de trabalho. Logo, ocorrerá expansão do local de trabalho, com as conseqüências legais aplicáveis, a todo local onde o trabalhador utilizar as ferramentas que lhe permitem desempenhar sua função”.
Carla Carrara da Silva Jardim ressalva a questão do trabalho subordinado e do trabalho autônomo. O primeiro elenca todas as características citadas no início desse trabalho quando tratamos da relação de emprego, particularmente, a pessoalidade, a não eventualidade e a onerosidade. Já o trabalho autônomo não mantém vínculo de subordinação, não se dispondo ao controle diretivo e disciplinar do empregador. A autora supracitada entende que “a linha demarcatória entre o trabalho subordinado e o trabalho autônomo está no modo como o trabalho é prestado”[63]. E, por conta disso, o teletrabalhado nao encontra uma legilação que contemple sua categoria.
3.2.Legislação Específica
Em termos mais concretos, no Brasil, temos o projeto de lei 4.505/08, do deputado Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB/ES), que visa regulamentar o trabalho à distância, trazendo que somente uma percentagem de 40% de utilização do tempo de trabalho do empregado fora dos locais regulares que caracterizaria o teletrabalho.
Pela proposta, a relação de emprego no teletrabalho será regida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT – Decreto-Lei 5.452/43). Entre outras prerrogativas, o teletrabalhador terá direito a salário, férias, feriados, licenças previstas na CLT e faltas por doença.
Em se tratando de horas extras, pelo projeto em questão, não são cabíveis ao teletrabalhador, haja vista a jornada deste ser “aberta”.
Sugere-se, ainda, que o teletrabalho sirva como instrumento para criação de vagas destinadas a pessoas com capacidade física reduzida.
Atualmente, o PL 4505/08 tramita em caráter conclusivo e será analisado pelas comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Nos Estados Unidos, têm-se programas de teletrabalho, implantados conforme os “Programas de Telecommuting”[64], e cada estado tem suas diretrizes. Carla Carrara da Silva Jardim focou-se na legislação da Califórnia[65]. Há grandes incentivos das Agências estaduais em favorecer o telecommuting, sendo a maior preocupação a questão ambiental, mas observando também a produtividade do empregado,sua maior flexibilidade e qualidade de vida. Quanto às horas de trabalho, considera-se a jornada de oito horas, tal qual no Brasil, considerando o excedente como horas extras. Um empregador não pode recusar-se a pagar ao empregado não isento por horas extras trabalhadas, argumentando que o trabalho foi realizado em casa, de acordo com o Fair Labor Standards Act – FLSA (Ato de Normas de Trabalho Justas).
Quanto à preocupação dos empregadores em relação às responsabilidades nos acordos de telecommuting, regulamentou-se na Califórnia acordos que definem itens como abaixo:
“1. A definição de telecommuting e a formação de telecommuters eficientes são ainda assuntos de todas as políticas dos empregadores e até mesmo em processos daqueles empregados que trabalham fora.
2. A obrigação de o empregado devolver qualquer equipamento fornecido pelo empregador ao término do acordo do telecommuting ou quando da finalização do emprego.
3. A obrigação de o empregado devolver toda informação que é propriedade do empregador, sob pena de demanda.
4. A confirmação, por parte do empregado, de que ele ou ela recebeu uma lista de verificação para garantir a segurança do meio ambiente do trabalho. Qualquer lista de verificação de segurança para o escritório em casa deveria concordar com as prescrições em vigor do OSHA e deveria ser desenhada como sendo derivada dessas prescrições-guias.
5. A declaração das horas e dos dias de trabalho para os telecommuters.
6. A advertência aos telecommuters do direito de o empregador pôr fim ao acordo de telecommuting a qualquer momento, sem causa ou aviso prévio.
7. O direito de o empregador inspecionar o escritório de trabalho na casa do telecommuter e de estabelecer quando essa inspeção poderá ocorrer.
8. A obrigação dos empregados não isentos de trabalhar não mais de quarenta horas na semana sem a permissão expressa do supervisor e de levar um registro preciso do tempo de trabalho.
9. A ausência de critério discriminatório para proteger os empregadores, em um acordo de telecommuting, por denúncias de que este tenha sido negado a determinados empregados por razões discriminatórias.
10. A obrigação de o empregado reportar prontamente qualquer acidente que ocorrer enquanto ele estiver trabalhando no escritório em casa.
11. Os lineamentos específicos na consideração do reembolso de despesas relacionadas ao escritório em casa.
12. Os detalhes do equipamento que será usado pelo telecommuter, de quem irá fornecê-lo, de quem será responsável por sua manutenção, indenização, perda, etc.
13. A consideração da confidencialidade e da proteção das políticas de segredo comercial e industrial.
14. O compromisso numa apólice de seguro dos acidentes que ocorram no escritório na casa do empregado. A consideração na definição e na limitação do espaço de trabalho no qual o empregador tem responsabilidade sobre o que venha a ocorrer com o empregado.”[66]
Desta forma, define-se toda a situação, desde horas trabalhadas, ao uso de equipamentos, propriedade da informação e reembolso de despesas.
4.CONSIDERAÇÕES FINAIS
O teletrabalho pode ser entendido como uma forma alternativa e diferente de organização de trabalho. O que importa é o que se faz, quando se faz e o local onde se faz. Economizar tempo é algo fundamental, se o faz no trabalho com vistas a ter mais tempo para si e sua família, melhor ainda. Sem contar na melhoria para o meio ambiente, que não sofre com degradações de poluentes em sua atmosfera.
Na verdade, o teletrabalho traz a inovação, de forma que “a supervisão pela observação cedeu lugar à supervisão pelos resultados, ou seja, prevalece o resultado sobre os procedimentos efetuados”, conforme Kugelmass
O futuro não pode ser uma continuação do passado. E o telecommuting não é modismo, é a nova ferramenta organizacional para empresas empreendedoras e cientes da sua missão.
Entretanto, entender a Revolução Tecnológica como uma vilâ, produzindo desemprego, é um caminho incorreto de análise, pois esta simplesmente exige soluções que emanem de toda a sociedade, ou seja, do empregado, do empregador e do legislador. Isso porque para o Teletrabalho não há que se falar em cor, raça, idade, sexo, deficiência física ou o local onde o trabalhador se encontra. Veja que essas barreiras, comuns para o mercado tradicional de trabalho, aqui desaparecem.
O Teletrabalho é eficaz tanto para o empregado especializado quanto para o de menor especialização. Dessa forma, alcança um maior número de trabalhadores, inclusive, frise-se, aqueles que hoje encontram-se excluídos do mercado de trabalho.
Essa modalidade de emprego é boa para os dois lados. As empresas gastam menos com manutenção de estrutura física e os empregados ganham em qualidade de vida e produzem mais. E, por essas razões que entende-se que deve ser mais divulgada, difundida e aplicada nos mais diversos setores, seja público ou privado.
graduada em Direito pela Faculdade Metodista do Espírito Santo, funcionária do quadro da Justiça Federal – Seção Judiciária do Espírito Santo, desde 1998
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