Teoria Agnóstica da Pena: por uma justificação legítima da sanção criminal

Resumo: O presente artigo científico articula-se, através de pesquisa eminentemente doutrinária, como uma reflexão crítica acerca das fundamentações jurídico-oficiais da pena, estas divididas em teorias absolutistas e relativistas. Ante o combate teórico realizado contra as doutrinas utilitaristas, concluiu-se pela ilegitimidade das mesmas, haja vista a impossibilidade daquelas em comprovarem suas premissas cientificamente, bem como na inafastável colisão existentes com o moderno Estado Democrático de Direito. Diante de tal demonstração, este artigo concluiu pela Teoria Agnóstica da Pena como única doutrina válida a ensejar a aplicação da sanção penal, posto entender a pena como ato decorrente do poder político e não mero ato jurídico, sendo o direito o limite da política e tendo a finalidade de minimizar o quanto possível a aflição coercitiva, assim como, por fim, entende a pena como um direito do próprio delinquente em ser punido tão somente pelo Estado.

Palavras-chave: Teoria Agnóstica da Pena. Teorias Relativistas. Teorias Absolutistas. Estado Democrático de Direito. Pena.

Abstract: This research paper is articulated through eminently doctrinal research as a critical reflection on the legal and official justifications of punishment, divided into absolutist and relativist theories. Compared to the theoretical conducted combat against the utilitarian doctrine, it was concluded by the illegitimacy of the same, given the inability of those in their assumptions prove scientifically as well as unremovable existing collision with the modern democratic state. Faced with such evidence, this article concludes by agnostic theory of punishment as the only valid entail the application of criminal sanctions, put pen to understand how to act from political power and not mere juridical act doctrine, the right being the limit of the policy and taking order to minimize the possible coercive distress, as well as, ultimately , understand the penalty as a law of the delinquent himself being punished solely by the state.

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Keywords: Agnostic Theory of Punishment. Relativistic Theories. Absolutists Theories. Democratic Sstate of the Right. Punishment.

Sumário: Considerações Iniciais. 1. Teorias absolutistas. 1.1. Kant e o retributivismo penal. 1.2. Hegel e a negação da negação do direito. 2. Teorias relativistas. 2.1. A prevenção especial. 2.2. A prevenção geral. 3. Teoria agnóstica da pena. Considerações Finais.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A pena, entendida enquanto elemento essencial à manutenção da ordem social, imprescindível à força coercitiva do próprio direito, adquiriu, ao passar dos tempos, os mais diversos significados, exteriorizando-se em diferentes formas e legitimando-se através de variadas finalidades, tendo demonstrado, com maior limpidez, a partir do século XVIII, sua indispensável existência, onde o ramo do direito até então denominado de criminal passou a chamar-se Direito Penal, em evidente referência ao instituto da pena como consequência principal do delito.

BOBBIO (2003, p. 16), observando a diferença fundante entre sanção interior (moral) e exterior (pena), entende ser aquela incapaz de conferir às normas plena eficácia social, por consequência da insegurança jurídica inerente ao subjetivismo, não logrando êxito em direcionar todos os indivíduos “à concórdia e à paz”, sendo, então, a pena indispensável para o convívio social (WELZEL, 1997, p. 281/282), posto que, se assim não fosse, o direito resumir-se-ia a um mero conselho, ante a inexistência de coercibilidade em seus preceitos.

Nesse sentido, a determinação da origem etimológica da pena não é pacífica entre os estudiosos da penalogia. Alguns entendem que a palavra provém do latim poena, que significa sofrimento. Na mitologia romana, Poena é a Deusa do castigo. Outros, entretanto, creem que a palavra pena deriva do grego ponos, que significa dor. Ponos também era um Deus da mitologia grega que denotava o sentimento de tristeza. Por fim, há também quem compreenda que a pena tem como origem etimológica o sânscrito, derivado da palavra punya, que significa purificação.

Na conformidade de sua origem na língua sânscrita, a sanção culmina no entendimento de que o indivíduo poderá, mediante a imposição da pena, melhorar a si mesmo, bem como a toda sociedade (GOMES, 2008, p. 27). Diante disto, a coerção está presente não só como preceito secundário da norma incriminadora, com vistas ao aperfeiçoamento da sociedade, como também na vida familiar e profissional de cada pessoa, objetivando o contínuo disciplinamento.

Por este sentido, o Direito Canônico absorveu a ideia de penitência como forma de purificação do pecado cometido.

Numa função de exegese restritivamente gramatical, visando o afastamento de quaisquer circunstâncias axiológicas ou teleológicas, entender-se-á a pena como imposição de castigo, aflição, acoimo ou sofrimento, sendo, portanto, sempre representativa da ideia de um mal, conforme anota BRANDÃO (2008, p. 279), posto que implicará, necessariamente, na perda de um bem jurídico, quer seja a vida, a liberdade, o patrimônio ou qualquer outro.

Em consonância com o entendimento acima referido, CARNELUTTI (2003, p. 14) afirmara que “a pena, do mesmo modo que o delito, é um mal, ou em termos econômicos, um dano”.

LISZT, ao seu turno, entende ser a pena, por conseguinte, marcada, quando estudada ao revel dos caracteres utilitaristas que se agregaram em momento posterior na história do mundo, pelo brocardo latino malum passionis quod infligitur propter malum actiones, ou seja, um mal infligido àqueles que um mal provocaram, configurando, então, em verdadeira imposição no âmbito da vontade do transgressor que tumultuou a esfera do poder e da pretensão de outrem (LISZT, 2006, p. 5).

Todavia, através de um sentido jurídico propriamente dito, a pena pode ser definida, de acordo com as palavras do inexorável mestre pernambucano Aníbal Bruno (1976, p. 10) como sendo “a reação que uma comunidade politicamente organizada opõe a um fato que viola uma das normas fundamentais da sua estrutura e, assim é definido na lei como crime”, conceituação esta que introduz, na pena, a característica de ser a mesma uma consequência jurídica direta do delito.

Diante de tudo quanto fora exposto, convém ressaltar que o presente artigo foi subdividido em dois capítulos com fito no melhor entendimento decorrente da exposição didática a qual este trabalho se propõe.

O primeiro procura-se elencar as doutrinas que circundam a ideia da pena, quer para negar a sua legitimidade, quer para afirmá-la. Disto, resultou-se a bifurcação das teses em: abolicionistas e justificacionistas (utilitaristas), sendo a primeira compreendida entre aquelas que retiram da pena a sua legitimidade, ao passo que as segundas congregam aquelas que buscam justificar a imposição da sanção ante a infração cometida.

No referido item, além da descrição de cada teoria da pena, realizou-se críticas às concepções utilitaristas e abolicionistas da sanção penal face o atual estágio do Estado Democrático de Direito, tendo em vista, também, a possibilidade de comprovação empírico-científica das teses expostas.

No segundo tópico, expôs-se as bases que fundamentam a teoria agnóstica da pena, doutrina essa que forneceu o título do presente artigo. Neste ponto, procurou-se identificar a teoria agnóstica como a doutrina capaz de esclarecer os questionamentos inquietos da penalogia, quais sejam: “por que punir?” e “para que punir?”, permitindo-se a minimização do estado polícia e a maximização do estado direito.

1.TEORIAS ABSOLUTISTAS:

1.1. KANT E O RETRIBUTIVISMO PENAL

“O direito penal terá de ser substancialmente um ordenamento para o castigo da falta de fidelidade”. (Hans Frank, Ministro da Justiça do Reich nazista).

A teoria absoluta da pena, hodiernamente mais denominada de teoria retributiva, remete-nos a um direito pelo qual era, única e exclusivamente, através da pena que se fazia a “verdadeira justiça”. Entende-se o seu conceito através de sua própria denominação, pois, aqui, a finalidade da sanção é retribuir o mal provocado pelo agente com fundamentação puramente ética ou jurídica.

Cumpre registrar, assim como fez FERRAJOLI (2002, p. 204), que a principal diferença existente entre as teorias absolutas e as relativas consiste no fato de que as primeiras são aquelas que idealizam a pena como um fim em si mesma, ou seja, como uma expiação, um reflexo reparatório do mal causado, ao passo que as segundas identificam a pena como meio à consecução de um fim desejado, o qual geralmente é vinculado a intenção de prevenir futuros delitos, quer pela intimidação, quer pela ressocialização.

Dentre os defensores das teorias absolutistas encontram-se principalmente como maiores expoentes: MAGGIORE, WELZEL, KANT e HEGEL, os quais entendiam, direta ou indiretamente, que tendo o autor do fato delituoso a livre capacidade de decisão e compreendendo o que a sociedade acha justo e injusto deveria, portanto, caso negasse a legalidade estabelecida, responder pela atitude tomada.

Contudo, muito embora todos eles comungassem do mesmo sentimento retribucionista, foram KANT e HEGEL que melhor explicitaram as razões de tal doutrina, diferenciando-se no tocante ao valor atribuído à pena, sendo que o primeiro entendia-a se tratar de significação ética, enquanto o segundo conferia-a um sentido jurídico.

Dizia Kant que:

“Mesmo se a comunidade de cidadãos, com a concordância de todos os membros, se dissolvesse, o último assassino encontrado na prisão deveria ser previamente executado, para que cada um receba o valor de seu fato e a culpa do seu sangue não pese sobre o povo que não insistiu na punição”. (SANTOS, 2008, p. 462)

Disto, portanto, inferir-se que a ideia absolutista kantiana possui raízes primitivas na pena de vingança de sangue, haja vista legitimar, sem qualquer dissimulação, o sentimento de vingança que passa a ser protegido pelo ordenamento jurídico, ainda que somente exercido pelo Estado, como se traduz pela experiência do talião.

A ligação umbilical da justificação do absolutismo kantiano para com a ideia da vingança divina distancia-se pelo fato de que nas sociedades primitivas a pena era aplicada como consequência da quebra de uma ordem natural, estabelecida pela divindade, enquanto para KANT a sanção penal deveria decorrer da simples culpabilidade do ofensor, pelo exercício da sua maldade, posto entender que a lei penal trata-se de um imperativo categórico, onde cada indivíduo deve receber o valor de seu fato para que a sociedade não se torne seu cúmplice.

A sanção penal é, aqui, tão somente, “a imposição de um mal justo contra o mal injusto do crime” (SANTOS, 2008, p. 461), fundado na ideia clássica do punitur, quia peccatum est (punido, porque pecou)[1], distanciando-se de quaisquer incumbências utilitaristas, haja vista a mesma justificar-se pela simples existência do delito (PRADO, 2004).

Em que pese a autoridade do mestre alemão, a noção kantiana de retribuição do mal causado pelo mal da pena não pode ser aceito pela moderna teoria do direito, haja vista que o Direito Penal não deve ter a finalidade vingativa, onde o Estado, expropriando o sentimento reacionário do indivíduo, imporia ao ofensor toda carga retaliatória do particular vitimado. O Direito Penal possui, sim, como objetivo: a proteção de bens jurídicos fundamentais e não o exercício da vingança.

O pensamento de aplicar um mal (pena) como simples retribuição de outro mal (crime) não corresponde aos caracteres fundantes do moderno Estado Democrático de Direito, posto ser impossível o Estado encampar, como justificativa, qualquer anseio vingativo, haja vista o poder por ele exercido se dar em nome do próprio povo que o constitui.

Ademais, a teoria retributiva, pensada por KANT, não assume contornos científicos, sendo construída por um inequívoco ato de fé, sendo que a suposição de uma correspondente retribuição se tratar de “um dado indemonstrável” (SANTOS, 2008, p.463), inadmitindo prova empírica, conforme preleciona ROXIN:

“A própria idéia de retribuição compensadora só pode ser plausível mediante um ato de fé. Pois, considerando-o racionalmente, não se compreende como se pode pagar um mal cometido, acrescentando-lhe um segundo mal: sofrer a pena. É claro que tal procedimento corresponde ao arraigado impulso de vingança humana, do qual surgiu historicamente a pena; mas considerar que a assunção da retribuição pelo estado seja algo quantitativamente distinto da vingança, e que a retribuição tome a seu cargo ‘a culpa de sangue do povo’, expie o delinqüente etc., tudo isto é concebível apenas por um ato de fé, que, segundo a nossa Constituição, não pode ser imposto a ninguém, e não é válido para uma fundamentação, vinculante para todos, da pena estatal”. (ROXIN, 2004, p. 19).

1.2. HEGEL E A NEGAÇÃO DA NEGAÇÃO DO DIREITO

A teoria absolutista da pena, sob o enfoque fornecido por HEGEL, afasta-se da atribuição axiológica ética conferida por KANT para fundamentar-se na compensação pela quebra do equilíbrio legal existente, ou seja, somente em sua referência ao próprio delito, enquanto ente jurídico conservador da ordem social, concedendo-lhe significação jurídica para a existência de uma retribuição penal.

Conforme a teoria hegeliana, a sanção penal traduz-se numa pura exigência de justiça, posto que expiação do delinquente assume característica obrigatória ante a necessidade do restabelecimento do equilíbrio legal, sendo a sanção penal a consequência direta, imediata e imperiosa do crime, tendo como finalidade a reafirmação do direito.

O referido jusfilósofo alemão entende que “o direito é a realização da liberdade do espírito” (BRANDÃO, 2008, p.282), ao passo que o delito, muito embora não possa ser considerado como a destruição do direito, posto ser este último invulnerável, é a ranhura ou lesão a esse direito. Diante da lesão, a ordem legal reage a tal prática com a pena, que na visão de HEGEL é a “lesão da lesão do direito” (BRANDÃO, 2008, p.282).

Portanto, daí concluir-se que se o delito é a negação (lesão) do direito e a pena é a negação (lesão) do delito, então, logicamente a pena é a negação da negação do direito, ou seja, a reafirmação da ordem jurídica. Consonante o retratado entendimento, a aplicação da pena é pressuposto necessário para o restabelecimento da ordem violada.

Para SANTOS, a doutrina retribucionista hegeliana é “uma antecipação de dois séculos da prevenção geral positiva de JAKOBS, da pena como ‘afirmação da validade da norma’” (2008, p. 463), tendo-se como exemplo, no direito brasileiro, o quanto disposto no art. 59 do Código Penal, que estabelece a aplicação da pena como meio necessário e suficiente para a reprovação do crime, ou seja, para a revalidação do direito.

Do mesmo modo como acontece com a teoria absolutista kantiana, a reafirmação jurídica proposta por HEGEL padece de vício de ausência comprobatória de cientificidade, haja vista ser, por muito subjetivo a mensuração do quanto de medida compensatória dever ser aplicada para a reafirmação da ordem jurídica, fundamentando tal possibilidade em mera suposição metafísica, inexistindo limites para o exercício do jus puniendi, haja vista este ter como fim a justiça, sendo esta entendida como conceito inafastavelmente íntimo.

Ainda nessa esteira, a pena como compensação de culpas coaduna-se com os fundamentos de regimes autoritários, posto conferir total liberdade ao legislador para criminalizar quaisquer condutas, haja vista que o delito passa a ser entendido como mera negação do direito, e sabido que o direito é uno, qualquer fato contrário à ordem jurídica poderá ser tida como crime.

2. TEORIAS RELATIVISTAS:

2.1A PREVENÇÃO ESPECIAL

“A pena justa modera os homens, tornado-os mais justos, e acaba por tornar-se uma medicina da alma”. (Platão)

Na esteira da tentativa de romper-se com os ideais propagados pelos defensores da retribuição como forma justificadora e finalista da pena surgiu-se, então, as denominadas teorias relativas, que imprimem à pena um olhar para o futuro e não mais para o passado como ocorria com a doutrina absolutista. Daí, portanto, afirmar-se que enquanto os ensinamentos retribucionistas fundamentam a sanção penal pelo brocardo punitur, quia peccatum est, ou seja, punido, porque pecou, as teorias relativistas justificam a pena pelo aforismo punitur et ne peccetur, ou seja, punido para que não peque mais.

As doutrinas relativistas podem ser subdivididas, hodiernamente, em: de prevenção especial e de prevenção geral.

A teoria relativa denominada teoria da prevenção especial diferencia-se da prevenção geral no que toca ao sujeito principal do finalismo penal, pois, enquanto nesta (geral) a busca pela adequação do comportamento para com a ordem social se destina a sociedade como um todo, naquela (especial) a atuação dos efeitos da pena visam recair tão somente sobre a figura do autor do delito.

A referida doutrina utilitarista preventiva especial, tese esta adquiriu grande prestígio entre os séculos XIX e XX, entende a pena como o meio necessário e suficiente para prevenir que futuros delitos sejam novamente cometidos pelo condenado, utilizando-a como processo evolutivo do indivíduo enquanto considerado como um dever-ser, tendo como finalidade direta a “harmônica integração social do condenado (art. 1º da LEP – Lei 7.210/84)” (SANTOS, 2008, p. 465).

Nesse sentido, os executores de uma sentença criminal são considerados verdadeiros “ortopedistas da moral”, conforme afirma FOUCAULT (1991, p.15), haja vista que objetivam moldar o condenado sobre os padrões morais aceitáveis na ordem jurídica estabelecida.

Faz-se mister, contudo, esclarecer que a teoria da prevenção especial fora abordada, ao longo da história, sob três enfoques distintos, quais sejam: a) a pena como medida pedagógica de emenda; b) a pena como terapia de defesa social; e c) a pena como atributo ressocializante do condenado.

Sob o primeiro aspecto (a pena como medida pedagógica de emenda), a teoria preventiva especial remonta à concepção canônica de punição, admitindo a ideia da sanção como poena medicinalis, ou seja, como forma de reeducação moral do condenado mediante a expiação da culpa pela submissão voluntária ao castigo, posto somente pelo sacrifício chegar-se-ía a uma reconciliação com Deus.

A pena, então, adquire contornos pedagógicos e disciplinares com vistas à extinção da possibilidade da reincidência pelo concerto moral do individuo, consoante demonstra FERRAJOLI o qual, utilizando as palavras de FIRPO, constata que:

“A ninguém é negada a esperança de poder recuperar um dia a liberdade, desde que suporte, obedeça e dê de si mesmo boas expectativas de um honesto comportamento no futuro”. (FERRAJOLI, 2002, p. 243)

A segunda feição da teoria preventiva especial se baseia na pena como terapia de defesa social, possuindo, esta, duplo caráter de proteção à sociedade, quais sejam: a cura do condenado, considerado como indivíduo doente, e a sua neutralização pela segregação, considerado como indivíduo perigoso.

A referida doutrina, encampada pela Escola Positiva italiana, entende o delinquente como ser inferior e perigoso, devendo ser, necessariamente, classificado como criminoso ocasional, passional, habitual, louco ou nato, dependendo do resultado do estudo antropológico realizado, tendo, por conseguinte, a pena, a finalidade de blindar a sociedade contra os ataques emitidos por aqueles, quer pela solução de sua doença delinquencial, que pelo seu isolamento celular.

O ponto diferencial a se salientar neste momento histórico reside no fato de que o delinquente, por se tratar de um ser doente, não possui livre-arbítrio quanto as suas escolhas, consoante discorre o mestre italiano GIUFFRÈ:

“O delinqüente é uma pessoa psiquicamente defeituosa, e portanto nele o jogo do choque e do contrachoque dos motivos da ação voluntária se desenvolve de modo anormal, principalmente pela força motivadora do impulso criminoso que anula os poderes de resistência. É claro, com essas premissas deterministas, que a função da pena não pode ser a intimidação, que pressupõe a liberdade de querer, mas somente a neutralização e/ou a correção de quem é naturalmente predisposto ao delito, ou é perigoso”. (FERRAJOLI, 2002, p. 246/247)

Diante disto, o direito penal assume a característica da responsabilidade objetiva, posto que os motivos do crime apenas importam para determinar a terapia correta, haja vista que o criminoso será sempre um doente, quer sua delinquência seja ocasional ou inata, sendo imperioso a aplicação da pena para sua cura ou afastamento da sociedade.

Como terceiro enfoque da teoria preventiva especial encontra-se a pena como atributo ressocializante do condenado que compreende a pena como meio intimidatório do delinqüente, mantendo o caráter individual da pena sob a forma do temor imposto ao agente visando o não retorno deste às atividades criminosas (ou criminalizadas).

De acordo com os ensinamentos de LISTZ (2006), a teoria da prevenção especial está umbilicalmente ligada a três finalidades, quais sejam: a) a preventivo-individual, resultante do medo imposto pelo Estado ao condenado visando a não mais realizações de tais condutas ilícitas sob pena de novamente ser punido da mesma forma ou mais gravosa; b) a corretiva, exteriorizada pela ressocialização do delinquente, sendo, em última análise, a adequação do mesmo para com os padrões sociais existentes. Esta finalidade é uma consequência imediata da prevenção-individual, pois somente quando a intimidação alcançar o efeito pretendido é que o indivíduo passará a agir conforme “os padrões”; c) o asseguramento, que se baseia na manutenção do estado de paz por consequência da permanência subjetiva no delinquente, quando reincorporado à sociedade, do medo anteriormente imposto, sendo, por derradeiro, a real segurança e certeza pelos demais cidadãos que aquele não virá a reincidir, haja vista a repreensão contínua existente no subjetivo deste.

Contudo, convém destacar que tal teoria não poderia alçar grandes voos no Direito Penal moderno, pois reinantes seriam as incertezas geradas pela mesma, tal como a impossibilidade de punição nos crimes altamente graves (homicídio qualificado, estupro, extorsão mediante seqüestro, genocídio, terrorismo etc.) quando não existisse mais qualquer perigo na repetição de tais condutas por parte de seus agentes, como perceptível nos casos dos assassinos dos campos de concentração da II Grande Guerra Mundial, ficando, os mesmos, por fim, impunes.

Nesta esteira, também não se pode admitir que a (re)socialização de determinadas pessoas sejam realizadas de maneira coativa, imponderável, como uma imposição da verdade absoluta de único dono, sem respeitar a autonomia voluntária do preso de querer ou não ajuda, haja vista que ninguém pode ser compelido a querer ser melhor conforme critério morais de outrem (SANTOS, 2008, p. 466).

Consoante tal entendimento, ROXIN formula sua crítica da seguinte forma:

“Exprimindo numa só frase: a teoria da prevenção especial não é idônea para fundamentar o Direito Penal, porque não pode delimitar os seus pressupostos e conseqüências, porque não explica a punibilidade de crimes sem perigo de repetição e porque a idéia de adaptação social coativa, mediante a pena, não se legitima por si própria, necessitando de uma legitimação jurídica que se baseia noutro tipo de considerações”. (ROXIN, 2004, p. 21)

2.2. A PREVENÇÃO GERAL

Por teoria relativista da pena como prevenção geral, entender-se-á a tomada, por parte do Estado, do poder-dever de sancionar o delinquente como forma de intimidar a sociedade em geral a não praticar, também, tais delitos, ou seja, a pena imposta não mais tem caráter de retribuir o injusto ou corrigir o criminoso-doentio, mas sim de demonstrar à sociedade que quem cometer aquele tipo de infração será punido, o que, por conseguinte, geraria uma ideia de diminuição da criminalidade face ao medo da repreensão.

No auge do iluminismo penal, BECCARIA já havia afirmado que “a certeza de um castigo, mesmo moderado, causará sempre a impressão mais intensa que o temor de outro mais severo, aliado à esperança de impunidade” (BECCARIA, 2002, p. 73).

Para tanto, através do desenvolvimento histórico do direito penal, teses foram congregadas sob o manto de teorias utilitarista de prevenção geral, denominando-se: prevenção geral negativa e prevenção geral positiva.

No que tange a prevenção geral negativa, esta tem por finalidade a intimidação da sociedade, quer seja pelo exemplo da aplicação da pena, quer seja pela própria cominação legal do prenúncio da sanção.

A referida doutrina negativista possui como fronte orientadora a “teoria da coação psicológica” de FEUERBACH que, enunciando os fins da pena, conferiu-a natureza intimidatória, posto entender que a desestimulação para o cometimento de crimes se dá pela mera ameaça legal de imposição da pena.

A crítica feita às teorias relativistas generalistas negativas da pena repousa no fato de que a referida doutrina desconsidera o homem como fim em si mesmo, para entendê-lo como mero meio à consecução de objetivos sociais, atribuindo ao indivíduo condenado a utilidade de, pela sua punição, servir de exemplo para a sociedade, como se simples objeto fosse.

Ademais, a finalidade intimidatória propugna a legitimidade da maximização da punição como forma de intimidar pelo exemplo, seja na elaboração seja na aplicação das leis, não existindo limites para punição, causando verdadeiro “terrorismo estatal” (SANTOS, 2008, p. 467).

No que toca à teoria preventiva positiva, oriunda no final do século XX, esta tem por escopo o reforço na confiança da ordem jurídica por parte dos cidadãos, como forma de manter validamente reconhecido os postulados básicos do contrato social. Daí dizer-se que a pena tem função de reafirmar a proteção dos bens jurídicos.

Temerosa deve ser, porém, a percepção idealística da prevenção generalista, posto que, de acordo com suas bases, não se saberia ao certo quais seriam as condutas em que o Estado teria a faculdade de intimidar.

O aceite à teoria da prevenção geral é, certamente, o estabelecimento do Estado de Pânico, que vigerá enquanto perdurar o medo da punição. Ademais, mister se faz indagar se é legítima a atribuição conferida por esta teoria à conduta do ente estatal, que, envolta na missão de intimidação da sociedade, castigue um indivíduo, desconsiderando-o quanto a sua individualidade, mas sim em relação a outrem, ou seja, o castigo imposto se dará, não em representação ao próprio agente, mas sim como tentativa de demonstração intimidatória do restante da sociedade.

Diante de tal constatação, inadmissível é, portanto, conceber a pena como descrita pela teoria da prevenção geral, face a possibilidade real de perda do caráter pessoal da pena e, por conseguinte, a geração de uma falsa dosimetría da sanção e o estabelecimento do Estado de Pânico.

3 TEORIA AGNÓSTICA DA PENA

Das críticas efetuadas aos embasamentos doutrinários das teorias justificadoras da pena, quer sejam absolutas ou retributivas, quer sejam relativas gerais ou especiais, negativas ou positivas, gerou-se o fortalecimento de uma construção teórica acerca de um modelo garantista quanto à concepção da pena, haja vista que, consoante o quanto exteriorizado nos tópicos acima, os questionamentos e censuras às funções manifestamente oficiais da pena desconstrói o arcabouço teórico de formulação da sanção penal como vingança, reafirmação da lei penal, correção moral, ou ainda como intimidação social.

Denunciando a seletividade e ferocidade existente no sistema penal, BATISTA, ZAFFARONI, ALAGIA e SLOKAR (2003) visualizam a dispensabilidade das teorias da pena, objetivando possibilitar a reconstrução do direito penal com a finalidade de reduzir a violência do exercício do poder.

Afirma CARVALHO, interpretando os ensinamentos do mestre argentino ZAFARRONI, que reduzir dor e sofrimento seria o único motivo de justificação da pena nas atuais condições em que é exercida, principalmente nos países periféricos.

A teoria agnóstica da pena possui como base fundante da sua construção doutrinária a pacífica coexistência entre os modelos ideais de estado de polícia e estado de direito (SANTOS, 2008, p. 472).

O estado de polícia se fundamenta através do exercício do poder de forma vertical e autoritário (SANTOS, 2008, p. 473), solucionando os litígios existentes na sua base de incidência através da aplicação dos pressupostos declaradamente justificadores do discurso da penalogia clássica (teorias absolutas e relativas) pelos detentores da classe social hegemônica no poder.

O estado de direito, ao seu turno, se baseia no exercício horizontal e democrático de poder, ocasionando a resolução dos conflitos mediante as regras do jogo já dispostas, consoante doutrina de CALAMANDREI (1995), sendo as mesmas validadas pela exteriorização dos direitos humanos, considerando estes sempre em perfeita evolução, garantindo ao acusado a máxima limitação possível ao jus puniendi (estado de polícia).

Nesse sentido, a teoria agnóstica da pena tende a negar legitimidade às doutrinas oficiais e declaradas que buscam motivos justificantes para a imposição da pena, sem, contudo, negar o próprio direito de punir.

Aliás, sob tal ponto se faz mister a transcrição dos ensinamentos de BARRETO sobre os fundamentos do direito de punir, em obra de igual nome:

“O conceito de pena não é um conceito jurídico, mas um conceito político. Este ponto é capital. O defeito das teorias correntes em tal matéria consiste justamente no erro de considerar a pena como uma conseqüência do direito, logicamente fundada […] Que a pena, considerada em si mesma, nada tem que ver com a idéia do direito, prova-o de sobra o fato de que ela tem sido muitas vezes aplicada e executada em nome da religião, isto é, em nome do que há de mais alheio à vida jurídica”. (BARRETO, 1996, p. 649/650).

Diante disto, a pena readquire a sua verdadeira característica de ato de poder político e não jurídico, natureza esta que BARRETO identificou em sua clássica frase:

“Quem procura o fundamento jurídico da pena deve também procurar, se é que já não encontrou, o fundamento jurídico da guerra”. (BARRETO, 1996, p. 650).

Ante a identificação da pena como ato do poder político, ZAFFARONI, contestando, ainda que indiretamente, as doutrinas abolicionistas por entender necessário, ao menos nos países periféricos, o estado de polícia, face a sua transcendência em relação a pena criminal para vigiar e controlar a ordem social, então, potencializa a possibilidade de restrição do exercício do poder punitivo do estado de polícia pela ampliação do estado de direito.

A teoria agnóstica da pena, ao reputar como ilegítimas as bases oficias que justificam juridicamente a sanção penal, tem como objetivo precípuo a realização de uma contenção máxima do poder punitivo pela maximização do estado democrático de direito, possibilitando, ao entender a pena como fonte eminentemente política, a realização de políticas criminais voltadas ao humanismo democrático, posto que, como muito bem afirmara SANTOS:

“Afinal, definir pena como ato de poder político, atribuir à pena o mesmo fundamento jurídico da guerra e rejeitar como falsas as funções manifestas ou declaradas da pena criminal significa ruptura radical e definitiva com o discurso de lei e ordem do poder punitivo”. (SANTOS, 2008, p. 474).

Abdicar das teorias da pena, portanto, corresponderia na abolição do viés que oficialmente encobre a real finalidade da pena, voltando à sua natureza eminente de ato político.

Pode-se afirmar, diante disto, que a teoria agnóstica da pena se funda na máxima estabelecida por BARRETO (1996), minudenciada por ZAFFARONI (2003) e exteriorizada por CARVALHO (2007) de que a pena é um ato político e o direito, como limite da política, é o parâmetro negativo da sancionabilidade, estruturando-a sob a negação das teorias da pena e fundando-a em critérios de limitação da sanção.

FERRAJOLI (2002), em sua teoria do garantismo penal, concebe à pena o fundamento de prevenção à reação informal, desmedida, automática e arbitrária que a falta das penas poderia ensejar.

Desse ponto de vista, a pena se apresenta como guardiã do direito do infrator em não ser punido senão pelo Estado, ou seja, o ideal de minimização da aflição infligida pela aplicação da pena e a refutação da violência privada como legítima confere a transmudação da ideia de pena-retaliação para a concepção de pena-garantia, passando esta a ser, inequivocamente, um direito do delinquente de ver-se punido somente pela regras do jogo.

Impedir o mal da vingança arbitrária e desmedida operada pela vítima, ou pelas forças solidárias a ela, e o excesso punitivo (de violência) do Estado é o escopo deste novo modelo de direito.

A pena apresenta-se, por derradeiro, como instrumento político de negação da vingança, como limite ao poder punitivo, como o mal menor em relação às possibilidades vindicativas que se produziriam na sua inexistência.

Tal característica identificadora simbolizada através da teoria agnóstica da pena, impõe uma reorientação teleológica do direito penal e do processo penal, sendo fundada: a) na rejeição dos discursos oficias/declarados/manifestos da pena (retributivismo ético ou jurídico e preventivismo especial ou geral, negativo ou positivo); b) na qualificação da pena como ato do poder político e não jurídico; c) na coexistência do estado de polícia e do estado de direito, pela restrição do primeiro e maximização do segundo; e d) na referência da sanção penal como direito do próprio ofensor em não se ver punido senão pelo Estado, justificando, portanto, uma ideia minimalista da pena.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após a leitura do quanto exposto no transcurso deste artigo, tem-se como resultado um somatório de ideias que buscam clarear os reais objetivos e a valorização do tema estudado: teoria agnóstica da pena.

É por demais inquestionável que em momento algum se pretendeu esgotar o tema, até porque esse é sempre objeto de interpretações e de aplicações variadas no Direito Penal.

Deste modo, buscou-se, preliminarmente, elencar as mais diversas conceituações de pena existentes na doutrina, com fito em conhecer os variados sentidos por ela assumidos em relação ao intérprete-observador.

A sensibilidade do tempo pelo homem, aliada à constante transformação da sociedade com fito no desenvolvimento (do controle) social modificaram a pena ao longo da história, fazendo com que à mesma fossem agregadas justificações que, atuando como verdadeiro plus ao contorno conceitual da sanção penal enquanto consequência jurídica do crime, tratavam de conferir àquela legitimidade para perpetração de suas “utilidades”, denominando-se tais teorias de justificacionistas.

Desde então, a pena desvincula-se da noção de mera consequência do crime para imbuir-se de finalidades. Mais do que nunca, a sua aplicação ganha fundamentos utilitaristas, que, encampando as vestes do Estado contratualista de ROSSEU, assume qualquer forma desejável para a obtenção do êxito do controle social. Consoante tal entendimento, em razão da busca para legitimação das utilidades na punição penal, sugiram três correntes filosófico-doutrinárias, as quais lograram, de certo modo, êxito em influenciarem o Direito Penal até a modernidade.

A impossibilidade de cognição da pena como vingança (teoria absolutista kantiana) ou de sua comprovação empírico-científico como exato meio compensatório do delito (teoria absolutista hegeliana); a ausência de comprovação quanto a retração da reincidência e o desrespeito com a autonomia volitiva do condenado em querer ser “corrigido” (teoria relativista especial); assim como a imagem do homem como um meio para alcançar objetivos e a perda do caráter proporcional na dosimetria da pena (teoria relativista geral) fazem das Teorias Justificantes da pena meros discursos desprovidos de qualquer razão.

Diante disto, a Teoria Agnóstica da Pena se demonstra como doutrina mais apta a solucionar as dúvidas advindas dos questionamentos: “por que punir?” e “para que punir?”.

A pena, aqui, é vista como ato decorrente do poder político do Estado, e não jurídico, haja vista seu conceito derivar de uma afirmação política do ente estatal. Assim sendo, a Teoria Agnóstica da Pena descreve a sanção penal como medida desprovida dos utilitarismos conferidos pelas Teorias Justificacionistas.

Destarte, para tal doutrina, a punição tem seu porquê na própria vontade política do Estado, assim como acontece com a guerra, inexistindo qualquer finalidade jurídica para tal.

Deste modo, o direito assume seu papel de autêntico limitador da política, restringindo as hipóteses de punição no máximo possível, ao passo que garante ao condenado o direito de ser punido tão somente pela entidade estatal, afastando todas as hipóteses de punições privadas, haja vista ser dado somente ao Estado o jus puniendi.

Portanto, negando as finalidades declaradas da sanção penal, a Teoria Agnóstica entende que a pena passa a ser, também, um direito do condenado em não ser punido por outrem, senão pelo próprio Estado, refutando as justificações ultrapassadas das teorias utilitaristas clássicas, assim como congregando a moderna ideia de redução de danos, posto que entende ser possível a coexistência entre estado de direito máximo e estado de polícia mínimo.

Por derradeiro, impõe salientar que a Teoria Agnóstica da Pena propicia o entendimento de que, em sendo o Estado moderno fundamentado no contrato social, decorrente da disponibilidade das parcelas de autonomia dos indivíduos a ele pertencente, a pena passa a ser entendida, não só como garantia da pessoa de ser punida somente pelo Estado, como também a possibilidade de uma política criminal voltada para a máxima redução possível na aplicação da sanção penal, posto que ninguém doaria parcela de sua autonomia para ser punido com a maior repressão possível.

 

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Notas:
[1] Encampando a referida máxima, as Sagradas Escrituras trazem em suas linhas que: “aquele que derramar sangue humano, por mão de homem será derramado o seu; porque o homem foi feito à imagem de Deus” (Gênesis, 9,6); “não terá teu olho piedade; vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé” (Deuteronômio, 19,21).

Informações Sobre o Autor

Gleison dos Santos Soares

Juiz de Direito Substituto do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia. Mestrando em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia. Pós-graduado em Ciências Criminais pela Universidade Estácio de Sá – RJ. Professor de Direito Penal.


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Equipe Âmbito Jurídico

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