Tombamento e desapropriação: A intervenção do Estado na revitalização da região portuária do Rio de Janeiro

Resumo: Este trabalho busca retratar as características sociais e a relação jurídica que envolve a revitalização de áreas degradadas, bem como a necessidade de preservar e restaurar o patrimônio material e imaterial da cidade. Conhecido como Projeto Porto Maravilha (PMRJ), traz em seu contexto a revitalização da área portuária do Rio de Janeiro devido a importância histórica e ao papel econômico que desempenha, ganhando novo aporte, de forte impacto turístico, com a escolha da Cidade do Rio de Janeiro para sediar os Jogos Olímpicos em 2016. O projeto propõe a refuncionalização dos espaços e requalificação do cenário urbano da região com áreas destinadas a cultura e lazer, novas moradias, centros educacionais profissionalizantes, atraindo projetos empresariais de médio e grande porte.


Palavras-chave: Desapropriação. Tombamento. Porto. Revitalização. Requalificação.


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Sumário: Introdução 1. Propriedade. 2. Intervenção do Estado na propriedade privada. 3. Tombamento. 4. Desapropriação 5. Revitalização da Zona Portuária. Conclusão.


Introdução


A história revela que as intervenções pontuais sofridas na área não acompanharam a evolução do restante da cidade. Os casarios antigos foram mantidos em grande parte da região e, desta forma, foi preservada a imagem do passado. Tal preservação além de manter quase que na totalidade o patrimônio edificado, manteve também as tradições e modos de vida do povo carioca.


Vivendo um processo de abandono, desertificação e degradação, a área que outrora foi de fundamental importância para a abertura da economia necessita da urgente intervenção do poder público para lhe dar novos usos e funções.


A intervenção do Estado na propriedade privada advém deste processo evolutivo do próprio modelo do Estado no contexto social e visa, primordialmente, restabelecer o equilíbrio nas relações sociais.


O estado contemporâneo assumiu o papel de estado do bem-estar. Assegurando a prestação de serviços essenciais e aumentando sua abrangência de ação social, busca amparar a sociedade como um todo, considerando que a própria cidade tenha um cunho de função social, onde seus habitantes devem conviver de forma harmônica, respeitando os valores de cada sociedade local.


Silva (2008), ao definir a origem e a estrutura das cidades, afirma que “a cidade é fruto da organização e da sociabilidade humana, possuindo atualmente estruturas e formas políticas legítimas para a sua organização e o desenvolvimento de seus habitantes.”


Na atualidade, o conflito se estabelece quando o Estado, na intenção de atender interesses coletivos e usando da prerrogativa do direito público, atinge interesses individuais e norteando esta relação verifica-se o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado ou particular. Baseado neste princípio se observa a atuação do Estado nesta região com a proposta de recuperar o centro histórico.


Os espaços irão se transformar em pólo turístico, com auxílio de alta tecnologia construções antigas estão passando por um processo denominado retrofit. Em geral, isto tem sido feito em cidades como Paris, Barcelona e Buenos Aires que revitalizaram áreas urbanas estabelecendo novos usos, gerando trabalho e renda, integrando estes espaços a nova dinâmica sociocultural e econômica da cidade.


O bem estar da população e os interesses econômicos envolvidos têm gerado a busca de modelos eficazes de gestão territorial para a recuperação de áreas degradadas.


1. Propriedade


A Constituição Federal em seu art. 5º, XXII, reconhece o direito à propriedade devendo, entretanto, atender a função social. Em seu art. 182, caput e parágrafos, posiciona-se a favor do coletivo ao determinar ser facultado ao Poder Público Municipal promover a desapropriação do solo urbano quando este não cumprir a sua função social, estando não edificado, subutilizado ou não utilizado.


Art. 182 – A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.


§ 1º – O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.


§ 2º – A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.


§ 3º – As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro.


§ 4º – É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:


I – parcelamento ou edificação compulsórios;


II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;


III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.”


O conceito de função social da propriedade tem origem nas desigualdades sociais em contra partida com a crescente consciência e reivindicação da sociedade moderna por igualdade.


A propriedade é um direito real e condicionado, afirmado pelo descrito no art. 1.228 do Código Civil/2002:


Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.


§ 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.[…]


§ 3o O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente.”


O desrespeito ao preconizado no artigo 1.228, § 1º concede ao Estado o poder de intervir com vistas a assegurar-lhe os fins sociais a ela atribuídos.


Resumidamente, podemos afirmar que a intervenção do Estado na propriedade privada, amparada por lei, visa estabelecer um equilíbrio e ajustar alguns fatores advindos com a função social que ela deva atender. Neste contexto, outro ato exercido contra a propriedade particular que não observe este escopo estará corrompido e contaminado pela ilegalidade.


O Estado age de forma vertical restringindo o uso da propriedade, usando de sua supremacia, amparado pelo interesse coletivo. Desta forma, toda vez que observamos a colisão de interesses públicos e privados, os primeiros prevalecem aos segundos. Diante disso, sofrendo as imposições exercidas pelo Estado, o particular contrariado em seus interesses é obrigado a cumprir algo em relação àquela propriedade.


A intervenção do Estado pode ser exercida sob duas modalidades, a saber: restritiva ou supressiva, a primeira impõe restrições ao uso da propriedade sem retirá-la de seu domínio, devendo o particular se subordinar as diretrizes emanadas do poder público, mantendo a propriedade na esfera de seu patrimônio; e a segunda, transfere para si, Estado, a propriedade de terceiro coercitivamente. Trataremos em especial neste trabalho do Tombamento, que reflete a intervenção restritiva e da Desapropriação, que figura no campo da intervenção supressiva.


2.Intervenção do Estado na Propriedade Privada


É dever de o Estado intervir para promover a preservação e garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais. Para tanto, consagra o art.205 CF como direito de todos a Educação, estimulada pela sociedade com o objetivo de promover maior grau de cultura a população, pois quanto maior for seu grau de compreensão e conhecimento, maior será o valor atribuído ao seu patrimônio cultural. A interligação entre educação e cultura promovida pelo Estado deverá fomentar a proteção dos monumentos e edificações para barrar atos de vandalismo e depredação, e promover o acesso às fontes e manifestações culturais (art.215 CF), que se expressam em bens de natureza material e imaterial, assumidos individualmente ou em conjunto, perpetuando referências à identidade, ação ou memória dos grupos sociais, constituindo o patrimônio cultural brasileiro (art.216 CF). Entre estes bens encontram-se as edificações e os conjuntos urbanos, que representam um estilo e uma época e retratam o modo de vida da sociedade.


A participação da sociedade na preservação do patrimônio cultural poderá ser verificada na apresentação de projetos de lei; na fiscalização de execução de obras e na proteção legal. Segundo Santos (2009), através da propositura de lei municipal, os cidadãos podem apresentar projetos de lei de interesse específico do município, desde que preencham os requisitos do art.29, XI da Constituição Federal. Poderão ainda, fiscalizar a execução de obras que podem causar impacto ao meio ambiente ou ao patrimônio cultural, acompanhando os estudos de impacto ambiental e seu relatório (EIA-RIMA), nos termos da legislação ambiental (Lei 6.938/81), e proteger juridicamente o patrimônio cultural através da Ação Civil Pública prevista na Lei 7.347/85, a qual rege as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados ao meio ambiente e a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.


A iniciativa popular também será exercida pela representação à Câmara dos Deputados de projetos de lei, desde que preencha o número de eleitores previsto no art.61, §2º da Constituição Federal. A Ação Civil Pública pode ser proposta pela União, Estados, Municípios, autarquias, empresas públicas, fundações, sociedades de economia mista, o Ministério Público e associações que estejam constituídas pelo menos há um ano e tenham entre suas atividades a proteção ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.


Através da Ação Popular (Lei 4.717, 29.6.65) poderá o cidadão postular a anulação de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades autárquicas, de sociedades de economia mista de fundações etc., considerando-se como patrimônio público os bens de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico (art.1º, caput e §1º). Uma nação que não conhece, não preserva e não valoriza seu patrimônio cultural é uma nação sem “alma e sem sentido”, que fatalmente estará fadada a se extinguir, afirma Santos (2009) .


A intervenção do Estado na propriedade privada visa proteger o interesse social e se manifesta através de ato compulsório do Poder Público que retira ou restringe o direito à propriedade, sujeitando o uso dos bens particulares a uma destinação de interesse público, a saber: a preservação da identidade cultural, entre outros. Seus fundamentos se dividem em político, que tem por objetivo proteger os interesses da sociedade contra conduta anti-social praticada pelo particular; e jurídico, quando dispuser a Constituição Federal ou na legislação infraconstitucional. Tem como modalidades o tombamento e a desapropriação.


3.Tombamento


O vocábulo advém do verbo tombar no sentido de inventariar, registrar ou inscrever bens. Segundo Oliveira (2008), no direito português o vocábulo referia-se a registrar nos arquivos do reino guardados na Torre do Tombo, portanto, tombamento significava inscrever em um dos quatro livros do Tombo: Belas Artes; Histórico; Arqueológico e Etnográfico; e Paisagístico.


É a forma com que o Poder Público protege o patrimônio cultural com vistas à preservação da memória nacional, refletindo o aspecto histórico do país, fazendo parte da sua cultura e retratando inúmeros aspectos sociais, políticos, econômicos, artísticos, científicos, paisagísticos e turísticos. Nesta abrangência de fatores, esses bens, embora permaneçam na propriedade privada, passam a ser objeto de proteção estatal, impondo ao particular certas restrições quanto ao uso e obrigações quanto a conservação.


Pode ser definido como o procedimento pelo qual o Poder Público impõe ao proprietário particular de um bem com valor comprovadamente de interesse cultural, restrições administrativas visando a sua preservação e proteção.


Com o objetivo de fomentar a cultura a Emenda Constitucional n.º 48 acrescentou o § 3º no art. 215, prevê o estabelecimento do Plano Nacional de Cultura, com duração plurianual.


Tem por fundamento a adequação do domínio particular às necessidades de interesse público resguardando o interesse coletivo e mantendo a função social da propriedade.


Encontramos na arquitetura a forma de mais fácil exemplificação destes bens tombados, seja pelo seu aspecto histórico retratando a predominância de determinado estilo, ou por sua importância cultural quando retratam aspectos culturais antigos e que de alguma forma marcaram época.


Atualmente, outras necessidades movem o Estado no sentido de tombar áreas urbanas para impedir que a especulação imobiliária exerça um forte impacto no meio ambiente pela incompatibilidade que será criada entre a demanda e a oferta de serviços públicos disponíveis, entretanto, o estado vem usando de forma ilegal esta prerrogativa que nenhuma relação verdadeira mantém com o real motivo do tombamento, podendo se valer de outros instrumentos para instituir limitações ao uso, bastando alterar critérios para a edificação mantendo determinado gabarito, por exemplo, ou impedindo determinada atividade. Carvalho (2009) aponta uma “conduta dissimulada do governo municipal, aplicando indevidamente o tombamento, que, como regra, não enseja indenização ao proprietário, em lugar de estabelecer limitações urbanísticas individuais.” Observa-se uma conduta muito mais de origem política do que de interesse público, revestindo o fundamento do instituto.


Diverge a doutrina sobre a natureza jurídica considerando-o ora como servidão administrativa, ora como limitação administrativa ou especificamente, se tratar de um bem de interesse público, não obstante que acima de tudo se constitui por ato administrativo devendo conter todos os pressupostos legais, decorrendo de procedimentos administrativos.


Seu objeto recai sobre bens móveis e imóveis, segundo o art. 1º do Decreto n.º 25/37, lex specialis, entretanto, para este estudo, trataremos apenas dos bens imóveis que reflitam importância no contexto histórico nacional.


Podemos analisar o instituto através de suas espécies reunidas considerando a manifestação de vontade (voluntário ou compulsório) ou eficácia do ato (provisório ou definitivo). A doutrina ainda admite o tombamento individual, quando atinge bem determinado e geral quando atinge uma área ou bairro.


Como regra, o tombamento possui caráter individual, direcionado a determinado bem e proprietário e sendo o suposto tombamento geral, de caráter abstrato e genérico, incompatível com a natureza jurídica do instituto. Ensina Carvalho . que “quando várias edificações de um bairro ou uma cidade são alvo de tombamento, tal ocorre porque foi considerada cada uma delas per se como suscetível de proteção histórica ou cultural.”


O processo administrativo que dá origem ao ato propriamente dito, geralmente, se reveste de conflitos entre o interesse do Estado e o particular, sendo passível de verificação quanto a sua forma, motivo e legalidade, dando amplo direito do contraditório e defesa, permitindo todos os meios de prova cabíveis para demonstrar a inexistência de relação entre o bem a ser tombado e a proteção ao patrimônio nacional.


O Decreto Lei n.º 3.365/41, que trata de desapropriações quanto aos bens públicos, concede a União o poder de tombar bens estaduais, distritais e municipais e o Estado pode exercer tal direito sobre os Municípios.


O seu desfazimento pode ser efetivado ex officio ou a pedido do proprietário sendo possível quando comprovada a ausência do fundamento que o decretou.


Quanto aos efeitos oriundos do ato se observa a sua importância no que tange o uso e a alienação do bem, sendo vedada a sua demolição, destruição ou mutilação, devendo o proprietário conservá-lo de forma que mantenha as características culturais inerentes a proteção decretada, devendo solicitar prévia autorização para pintar, reparar ou restaurar. Inexistindo a possibilidade de dispor de recursos financeiros para a sua manutenção deverá comunicar ao órgão que a decretou que tratará da execução as suas expensas. Fica assegurado ao Estado à possibilidade de fazê-lo tomando para si a obrigação de providenciar as obras, em caso de urgência.


O tombamento atinge a área vizinha ao prédio tombado, impondo restrições quanto a qualquer construção que impeça ou reduza a sua visibilidade, além de outras restrições de menor relevância.


Ressalvamos que, entretanto, sendo provado o prejuízo ao proprietário quanto ao valor do bem devido ao tombamento decretado poderá este solicitar uma indenização ao Poder Público, no prazo de 5 (cinco) anos, contado do ato que instituiu o tombamento.


Sendo omisso o Estado no seu papel de preservar o patrimônio cultural, poderá ser utilizado o direito de petição por via administrativa, embasado no art. 5º, XXXIV da CF por qualquer pessoa para requerer ao Poder Público que providências sejam tomadas no sentido proteger determinado patrimônio. Através da via judicial caberá a Ação popular, prevista no art. 5º, LXXIII da CF, para anular atos lesivos ao patrimônio histórico e cultural, tendo legitimidade ativa o cidadão, regulamentada pela Lei. N.º 4.717/65.


A Ação Civil Pública regulamentada pela Lei n.º 7.347/85, cujo objetivo principal é a proteção dos interesses coletivos, em seu art. 1º, III define o alcance de proteção do diploma legal, a saber: aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.


Conforme alerta Santos (2009), deve-se observar que a decisão administrativa de tombamento poderá ser objeto de discussão na esfera do Judiciário, pois não se pode excluir da apreciação do Poder Judiciário nenhuma lesão ou ameaça a direito (art.5º,XXV, Const. Federal), o que propicia a discussão com a sociedade do processo de tombamento


4.Desapropriação


Desapropriar é a forma mais contundente do Estado intervir na propriedade privada em caráter supressivo, retirando e desapossando seus então proprietários, ou seja, provocando a perda da propriedade.


No seu papel de ente público, o Estado se apropria de determinado bem amparado por razões de utilidade pública ou interesse social, geralmente, através de indenização paga.


Norteado por uma série de atos administrativos e judiciais, a desapropriação é um procedimento de direito público, embora o Código Civil em seu art. 1.228, § 4º tenha concebido o instituto de expropriação que se assemelha a desapropriação sendo que este promovida pelo particular. Nesta concepção, reside à expropriação social de caráter coletivo, e, neste prisma, será matéria a ser tratada pelo direito privado.


Art. 1.228 O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer injustamente a possua ou detenha […]


§ 4º O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.”


A desapropriação, revestida pelos pressupostos do interesse social e utilidade pública, reside sob a égide do direito público e traz como objetivo a transferência do bem para o patrimônio do expropriante, sendo, normalmente, o particular indenizado pelo fato e o não pagamento desta indenização configura-se como uma exceção.


Tratando-se de matéria de interesse público afetando diretamente o interesse privado, é comum advirem conflitos e, neste caso, o poder judiciário atuará para garantir o direito seja da desapropriação ou pela manutenção da propriedade.


Neste contexto, cabe avaliar o que seria a utilidade pública e o interesse social que legitima o Estado a intervir na propriedade privada. O interesse social se configura pelo aspecto da função social da propriedade, assumindo o Poder Público a função de mitigar possíveis desigualdades coletivas. A utilidade pública abrange a necessidade pública de caráter emergencial onde tão somente a desapropriação solucionaria a situação. Ambos os pressupostos revelam conceitos subjetivos e indeterminados cabendo a lei defini-los.


O Decreto Lei n.º 3.365/41 enumera no art. 5º os casos de desapropriação por utilidade pública:



Art. 5º – Consideram-se casos de utilidade pública:


a) a segurança nacional;


b) a defesa do Estado;


c) o socorro público em caso de calamidade;


d) a salubridade pública;


e) a criação e melhoramento de centros de população, seu abastecimento regular de meios de subsistência;


f) o aproveitamento industrial das minas e das jazidas minerais, das águas e da energia hidráulica;


g) a assistência pública, as obras de higiene e decoração, casas de saúde, clínicas, estações de clima e fontes medicinais;


h) a exploração e a conservação dos serviços públicos;


i) a abertura, conservação e melhoramento de vias ou logradouros públicos; a execução de planos de urbanização; loteamento de terrenos, edificados ou não, para sua melhor utilização econômica, higiênica ou estética; a construção ou ampliação de distritos industriais;



Alínea “i” com redação determinada pela Lei 6602, de 7 de dezembro de 1978.


j) o funcionamento dos meios de transporte coletivo;


l) a preservação e conservação dos monumentos históricos e artísticos, isolados ou integrados em conjuntos urbanos ou rurais, bem como as medidas necessárias a manter-lhes e realçar-lhes os aspectos mais valiosos ou característicos e, ainda, a proteção de paisagens e locais particularmente dotados pela natureza;


m) a preservação e a conservação adequada de arquivos, documentos e outros bens móveis de valor histórico ou artístico;


n) a construção de edifícios públicos, monumentos comemorativos e cemitérios;


o) a criação de estádios, aeródromos ou campos de pouso para aeronaves;


p) a reedição ou divulgação de obra ou invento de natureza científico, artística ou literária;


q) os demais casos previstos por leis especiais.


§ 1º – A construção ou ampliação de distritos industriais, de que trata a alínea i do caput deste artigo, inclui o loteamento das áreas necessárias a instalação de indústrias e atividades correlatas, bem como a revenda ou locação dos respectivos lotes a empresas previamente qualificadas.


§ 1º acrescentado pela Lei 6602, de 7 de dezembro de 1978.


§ 2º – A efetivação da desapropriação para fins de criação ou ampliação de distritos industriais depende de aprovação, prévia e expressa, pelo Poder Público competente, do respectivo projeto de implantação.


§ 2º acrescentado pela Lei 6602, de 7 de dezembro de 1978.”


Outros diplomas foram publicados com o objetivo de alterar ou criar normas para regular o sistema normativo vigente desde 1941 adequando-o as transformações sociais, a saber: Lei n.º 2.786/56, Decreto Lei n.º 856/69 que acresceu o § 3º ao art. 2º, o Decreto Lei n.º 1.075/70, que tratou da imissão liminar de posse em imóvel urbano, Lei n.º 6.071/74, que adaptou a lei básica ao Código de Processo Civil, a Lei 6.602/78, que lhe acrescentou e exclui textos, a Lei n.º 9.785/99 que alterou a redação, a Medida Provisória n.º 2.183-56/01, que introduziu alteração no DL 3.365/41 e, recentemente, pela Lei 11.977/09 incluindo §§ ao artigo 32.


A Lei n.º 4.132/62 define os casos de desapropriação por interesse social:


Art. 1º A desapropriação por interesse social será decretada para promover a justa distribuição da propriedade ou condicionar o seu uso ao bem estar social, na forma do art. 147 da Constituição Federal.


Art. 2º Considera-se de interesse social:


I – o aproveitamento de todo bem improdutivo ou explorado sem correspondência com as necessidades de habitação, trabalho e consumo dos centros de população a que deve ou possa suprir por seu destino econômico;


II – a instalação ou a intensificação das culturas nas áreas em cuja exploração não se obedeça a plano de zoneamento agrícola, VETADO;


III – o estabelecimento e a manutenção de colônias ou cooperativas de povoamento e trabalho agrícola:


IV – a manutenção de posseiros em terrenos urbanos onde, com a tolerância expressa ou tácita do proprietário, tenham construído sua habilitação, formando núcleos residenciais de mais de 10 (dez) famílias;


V – a construção de casa populares;


VI – as terras e águas suscetíveis de valorização extraordinária, pela conclusão de obras e serviços públicos, notadamente de saneamento, portos, transporte, eletrificação armazenamento de água e irrigação, no caso em que não sejam ditas áreas socialmente aproveitadas;


VII – a proteção do solo e a preservação de cursos e mananciais de água e de reservas florestais.


VIII – a utilização de áreas, locais ou bens que, por suas características, sejam apropriados ao desenvolvimento de atividades turísticas.


§ 1º O disposto no item I deste artigo só se aplicará nos casos de bens retirados de produção ou tratando-se de imóveis rurais cuja produção, por ineficientemente explorados, seja inferior à média da região, atendidas as condições naturais do seu solo e sua situação em relação aos mercados.


§ 2º As necessidades de habitação, trabalho e consumo serão apuradas anualmente segundo a conjuntura e condições econômicas locais, cabendo o seu estudo e verificação às autoridades encarregadas de velar pelo bem estar e pelo abastecimento das respectivas populações.”


Limitamos este estudo a área urbana da cidade e, desta forma, tratará apenas da legislação que se refira à desapropriação urbanística abrangendo a área delimitada pela legislação municipal no Plano Diretor da Cidade, que traça as diretrizes para ocupação do solo, urbanização e ordenamento, possibilitando um crescimento de maneira eficaz e sustentável, tratando de maneira diferenciada as regiões de acordo com suas necessidades específicas.


O atual Plano Diretor da Cidade do Rio de Janeiro, em vigor desde 1992 e com prazo de vigência de 10 anos, é objeto de discussões e um novo Plano tramita na Câmara Municipal.


A Constituição Federal trata em seu art. 182, § 4º, III da modalidade de desapropriação denotando a mesma um caráter sancionatório quando determina a adequação do uso sob pena de, não o fazendo, ser desapropriado:


Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.[…]


§ 4º – É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:[…]


III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.”


Tal se consolidou na Lei n.° 10.257/01, denominada Estatuto da Cidade, em seu art. 8º, a saber:


Art. 8º Decorridos cinco anos de cobrança do IPTU progressivo sem que o proprietário tenha cumprido a obrigação de parcelamento, edificação ou utilização, o Município poderá proceder à desapropriação do imóvel, com pagamento em títulos da dívida pública.”


Trata, ainda, o ordenamento jurídico de uma modalidade de exceção que consiste em não haver indenização pela desapropriação denominando-se na doutrina de desapropriação confiscatória, definido na Constituição Federal, art. 243 que descrevemos abaixo e regulamentado pela Lei n.° 8.257/91 que trata da expropriação em áreas de culturas ilegais de plantas psicotrópicas, o que não seria o caso deste estudo por se tratar de propriedade em área rural.


Art. 243 – As glebas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão imediatamente expropriadas e especificamente destinadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.” (Constituição Federal).


De modo sui generis a desapropriação é uma modalidade de aquisição da propriedade, devendo o Poder Público declarar o interesse social ou a utilidade pública que recai sobre o bem.


A desapropriação urbana, de competência do Município, se fundamenta nos arts. 30, I e VIII e 182, caput e § 3º da Constituição Federal assim como o art. 5º, I do Decreto-lei n.º 3.365/41.


Mesmo diante de todas as regras e normas estabelecidas no Direito brasileiro é comum ocorrerem desvios de finalidade na destinação dos bens e mesmo perda de interesse de determinado bem tombado, o que dá ao Estado o benefício da Reconversão, que torna o bem livre de restrições.


A regra é que os bens desapropriados integrem o patrimônio do ente público, adquirindo o status de bem público, podendo, após a transferência, ser desfrutado ou até mesmo repassado a terceiros, no caso de reforma agrária por exemplo.


Atendendo a demanda de modernização e revitalização da área portuária da Cidade do Rio de Janeiro, um grande número de imóveis foram desapropriados e outros tombados no sentido de se conservar e preservar a memória cultural da cidade e de garantir o desenvolvimento e utilização adequada da área central que se encontrava em processo de esvaziamento onde foram investidos recursos e infraestrutura dando um caráter de subutilização aos bens e serviços disponíveis na região.


A Secretaria Municipal de Habitação concluiu o processo de desapropriação de 499 imóveis e em parceria com a Caixa Econômica Federal (CEF), esses prédios serão reformados e os apartamentos vendidos para famílias com renda mensal de 3 a 6 salários mínimos (de R$ 1.395 a R$ 2.790).


A reforma urbana ou a adaptação urbanística às novas necessidades sociais não se configura somente ao acesso à moradia, mas também ao acesso à boa qualidade de vida, traduzida pela infraestrutura e equipamentos sociais aplicados a cidade, à segurança e ao meio ambiente harmonizado, como direito de todos os cidadãos.


Ao lidar com interesses diversos, a matéria revela polêmicas e atinge a diferentes pessoas sejam físicas ou jurídicas, como exemplo, se verifica na certificação dada à comunidade Quilombola Pedra do Sal, residente no Morro da Conceição, no Bairro da Saúde, que busca o seu reconhecimento para obter em caráter definitivo o certificado de propriedade dos terrenos, feito pelo secretário de Cultura do Estado do Rio de Janeiro, à época, Darcy Ribeiro, no dia 20 de novembro de 1984:


O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN realizou o tombamento de cinco bens, os quais são considerados parte da primeira fase da preservação do patrimônio no País, privilegiando a arquitetura colonial, sendo quatro localizados na Saúde e um na Gamboa, tombados em 1938, na época da fundação do IPHAN, sendo o contexto urbano desconsiderado.


Com a finalidade de orientar os planos de renovação em 1992 foi implantado o Plano de Estruturação Urbana da Zona Portuária pela Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente, com a proposta de ser decretado o tombamento de edifícios históricos, além da criação de áreas para preservação, e reabilitação, incluindo o incentivo ao uso habitacional, reestruturação do sistema viário e uso do solo, estabelecendo-se o potencial cultural, social e econômico da área.


O plano concebido em 1992 tratava a região como um espaço estratégico de desenvolvimento, tinha por meta atrair novos empreendimentos privados (serviços, comércio, lazer cultural, e habitação para classe média), rompendo o caráter de isolamento dos bairros portuários (melhorias nos sistemas de locomoção) e reintegrando a área à paisagem e ao uso da Baía de Guanabara (lazer, esporte e contemplação). Buscava a valorização e preservação do patrimônio arquitetônico e urbano local, criando uma política para o reaproveitamento de imóveis de valor histórico para fins habitacionais, comerciais ou de serviços, instituindo para este fim um órgão gestor para o desenvolvimento da região.


Além da legislação constitucional e específica encontramos nas Constituições Estaduais a previsão do tombamento, sendo tanto este quanto a Desapropriação objeto de súmulas e julgados.


5.Revitalização da Zona Portuária


O Projeto de revitalização da Zona Portuária do Rio de Janeiro, denominado Porto Maravilha (PMRJ), se mantém, praticamente, fiel a perspectiva de revitalização, valorização e incremento sociocultural elaborada para a região em 1992.


A região se caracteriza por três bairros completos (Santo Cristo, Gamboa e Saúde); e 3 setores de bairros (São Cristovão, Centro e Cidade Nova), com 5 Milhões de m² de área total e 22 mil habitantes, IDH: 0,775 – um dos menores do Rio, 24º lugar no ranking das 33 regiões administrativas . Possui em seu entorno e proximidades os principais modais de transporte, tais como: a Rodoviária Novo Rio, o Aeroporto Internacional, o Porto Operacional, o Terminal marítimo de passageiros, a Central do Brasil, o Aeroporto Santos Dumond, a futura Estação do Metrô – Cidade Nova, e o futuro terminal do Trem de Alta Velocidade além de terminais de Ônibus. Encontram-se na região empresas de grande porte, por exemplo: Triunfo, Multiterminais, Libra, Moinho Fluminense, Xerox do Brasil, INT, Lojas Americanas, Píer Mauá S.A., INPI, Cia. Docas do Rio, Metrô Rio, Embratel, Light, Socicam e outras.


Os objetivos do Projeto são a revitalização completa da região, a ser financiada na 1ª fase com recursos públicos e, na 2ª fase, com recursos privados oriundos de uma Operação Urbana Consorciada, compreendendo as seguintes demandas: habitação; cultura e entretenimento; comércio e indústria; recuperação completa da infraestrutura urbana, de transportes e do meio ambiente da região, de acordo com os novos usos do solo previstos; preservação e melhoria do meio ambiente, com arborização de calçadas (aprox. 40km c/ 11 mil árvores), novas praças e parques, e limpeza do canal do mangue, criando aproximadamente, 20 mil empregos diretos durante as fases 1 e 2 com Investimentos previstos na ordem de 3 bilhões de reais; melhoria das condições habitacionais da população existente e atração de novos moradores para a região projetando-se um crescimento de moradores na região de 20 mil para 100 mil (~30 mil casas); recuperação do casario através do programa novas alternativas; e instalação de unidade de polícia pacificadora (UPP) no Morro da Providência.


A ocupação do porto será priorizada através do reforço das vocações já existentes em cada setor, tais como: turismo e entretenimento; universidades e ensino; turismo / cultural e comercial; habitação de interesse social e comercial.


Encontra-se em andamento os projetos do Píer Mauá; Museu do Amanhã (Guggenheim); Pinacoteca do Rio; novo prédio da Polícia Federal; AquaRio; nova sede do Banco Central; Escola Técnica de Audiovisual e Restauro; reurbanização do Bairro da Saúde e Morro da Conceição; restauro da Igreja de São Francisco da Prainha; recuperação e retrofit no edifício “A Noite”; garagem subterrânea; unidade de Polícia Pacificadora da Providência e a nova estação do Metrô – Cidade Nova.


Em relação ao meio ambiente o projeto prevê a implantação de sistema de tratamento de água em tempo seco para o Canal do Mangue, Rio Comprido e Rio Maracanã; criação do corredor verde, com a implantação de 11 mil árvores na região e novas praças e parques; reurbanização de aproximadamente 40km de vias (pavimentação, drenagem, sinalização, iluminação, arborização de calçadas e canteiros) e implantação de novas vias e trechos de ciclovias; implantação de novas redes de esgotamento sanitário, abastecimento de água, energia elétrica, telefonia e gás encanado, melhoria da qualidade das águas do Canal do Mangue e da via de mão dupla interna, paralela à Rodrigues Alves (Binário do Porto); demolição do Elevado da Perimetral no trecho entre a Pça Mauá e a Av. Francisco Bicalho; construção de túnel entre a Pça. Mauá e a Av. Rodrigues Alves (na altura do Armazém 5) com aproximadamente 2,0 km de comprimento (dois sentidos); construção de duas rampas ligando o viaduto do Gasômetro ao Santo Cristo; ampliação do atual túnel ferroviário sob o Morro da Providência para receber tráfego de automóveis e a implantação de mobiliário urbano, tais como: abrigos para automóveis, pontos de ônibus, lixeiras, totens, painéis informativos, bicicletários, etc.


O Projeto é complexo, demandou uma série de estudos e análises sobre a região como um todo e ainda é objeto de reavaliações tendo em vista a escolha da Cidade para sediar os jogos olímpicos em 2016, o que traz conseqüências diretas ao planejamento inicial, pela proposta de incorporar a Vila Olímpica a Zona Portuária.


A revitalização da Zona Portuária foi objeto de programa de outros governos como se observa no discurso de posse do presidente Rodrigues Alves, em 1902, quando declarou: “O meu programa de governo vai ser muito simples. Vou limitar-me quase que exclusivamente a duas coisas: o saneamento e o melhoramento do porto do Rio de Janeiro.” O Porto do Rio foi objeto de reformas há exatos 100 anos (julho/1910 – 2010).


Para a obtenção do sucesso esperado, o projeto vem promovendo uma verdadeira construção de parcerias através de um consórcio, entre os atores engajados no processo, órgãos públicos das 3 esferas, investidores e incorporadores, administradores, moradores e grupos socioculturais locais e para tal se encontra amparado no Estatuto da Cidade


De acordo com o Estatuto da Cidade, uma Operação Urbana Consorciada deve delimitar um perímetro de abrangência, ser objeto de leis específicas, estipular um estoque de área adicional a ser comercializado, estabelecer, programa de investimentos e utilizar todos os recursos arrecadados na realização do programa estabelecido na lei.


Art. 32, §1º Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental.”


O Projeto prevê uma estimativa de arrecadação de impostos na ordem de R$ 200 milhões, através da criação do novo Pólo Turístico com a recuperação do patrimônio histórico e cultural já existente e a implantação de novos equipamentos culturais e de entretenimento e pela atração de sedes de grandes empresas, empresas de tecnologia e inovação, modernização e incremento da atividade portuária de carga e do turismo marítimo.


Conservar as referências culturais, valorizar os conhecimentos adquiridos e afirmar suas ambições, no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida, são os corolários indispensáveis a qualquer projeto de desenvolvimento de cidades portuárias.


Programas e planos dessa natureza só podem ter sucesso se forem apoiados pelos atores que decidem os usos da cidade e que possuem os instrumentos apropriados para a implementação dos planos.


Transformar os conflitos em cooperação para construir as soluções socioambientais e econômicas para a complexa realidade dos portos é uma tarefa desafiadora, porém fundamental para os diversos segmentos produtivos que têm operações portuárias como atividade.


Espera-se que a melhoria da infraestrutura existente e a requalificação dos espaços públicos aumentem os índices de qualidade de vida dos habitantes da Saúde, Gamboa e do Santo Cristo, permitindo a inserção de novos extratos sociais sem, contudo expulsar a população local. Os galpões tombados e reciclados acrescidos da grande extensão de áreas verdes projetadas ao longo do antigo cais transformarão a área pela implantação de atividades turísticas, alavancando o desenvolvimento econômico da cidade, e permitindo a visibilidade para o mar.


Conclusão


A revitalização é polêmica e provoca debates entre a população no que tange aos verdadeiros interesses e quais necessidades estariam atendendo, tendo em vista que parte das propriedades desapropriadas retornarão ao uso residencial após recuperação e adequação através de alienação.


Os portos são objeto recente de atenção especial da política ambiental brasileira, cujas atividades têm dado origem a inúmeros conflitos. As áreas portuárias sofrem com o desafio de se adequarem às necessidades da globalização. Entretanto, apesar dos conflitos que permeiam esta relação, o desgaste poderá ser produtivo se desenvolver estratégias e reunir esforços para atender aos interesses comuns.


O porto do Rio de Janeiro possui atenção especial pelo potencial turístico da Cidade. Pela análise da proposta, pressupõe-se que foram realizados levantamento de dados ambientais; diagnóstico de potencialidades e limitações; avaliação dos impactos; e proposições de medidas. Como escopo se verifica uma análise de oferta, ou seja, uma avaliação das composições entre aptidões e usos do território e levantamentos em diferentes células básicas (localização estratégica; modais de transporte; empresas instaladas na região e pólo turístico) resultando na conjugação de parâmetros ambientais.


O desafio do Poder Público ao priorizar o Projeto é transformar a Zona Portuária num pólo multifuncional com enfoque na cultura, lazer e turismo, com uso de alta tecnologia, criando novas habitações e integrando-o a dinâmica do núcleo central da cidade, estabelecendo propostas e direcionamentos para o desenvolvimento local dos habitantes estabelecidos e daqueles que têm a área como local de trabalho: empresas de navegação, sindicatos, associações, comércio local, escolas, igrejas, hospitais entre outros.


Os tombamentos e as desapropriações decorrentes do projeto derivam de manifestação expressa do poder público para garantir o interesse público sobre o privado através de ato administrativo, revestido pelos pressupostos do interesse social e utilidade pública em cumprimento da máxima da função social. O mérito do poder público residirá no benefício sociocultural, econômico e ambiental que poderá trazer para a cidade, integrando um espaço em estado de degradação e estagnação a um novo contexto social, dando novas utilidades aos prédios antigos e atendendo as necessidades básicas da região, ampliando as redes de saneamento e infraestruturas, dando suporte às novas construções que se deslumbram, justificando a sua intervenção direta naquele espaço.


 


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Informações Sobre o Autor

Márcia Regina Martins Lima Dias

Advogada, Especialista em Direito Imobiliário (UGF), Análise Ambiental e Gestão do Território (ENCE) e Docência no Ensino Superior (UCAM). Desenvolve pesquisa na área do Direito Urbanístico. Consultoria jurídica e empresarial.


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Equipe Âmbito Jurídico

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