Um elefante em uma loja de cristais: a lei de protesto

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Resumo: Este estudo é uma pesquisa bibliográfica que analisou alguns artigos da lei de protesto, em confronto com a Constituição Federal de 1988. É uma viagem histórica que remonta ao direito romano em sua junção com a filosofia e a religião cristã, prosseguindo pela idade média, idade moderna até os dias atuais. Destaca a dignidade da pessoa humana e a sua construção histórica, e analisa também o instituto da prescrição em um enfoque diferente, ou seja, como o perdão tácito, originário dos tempos remotos, continua vigente na atualidade. A intenção é demonstrar que o protesto no Brasil tem características e funcionamento de uma pena e o mais esdrúxulo, uma pena aplicada por particulares. Tratado como pena os artigos da lei de protesto, aqui analisados, ferem a constituição federal e deveriam ser revogados, pois são armas que visam subjugar o homem, tolhendo a sua liberdade de forma desmedida.

Palavras-chave: Lei de protesto. Inconstitucionalidade. Penalidade excessiva. Dignidade humana. Prescrição.

Abstract: This study is a literature which analyzed some articles of the law of protest in comparison with the Federal Constitution of 1988. It is a historical journey that dates back to roman law at its junction with the philosophy and the christian religion, continuing through the middle ages, modern age to the present day. Highlights the human dignity and its historical construction, and also examines the institution of prescription in a different approach, that is, as tacit forgiveness, originating in ancient times, is still alive today. The intention is to demonstrate that the protest in Brazil has features and operation of a pen and more weird, a punishment for individuals. Treated as a penalty, the articles of the law of protest, analyzed, and violated the federal constitution should be repealed because they are weapons designed to subdue the man, hindering their freedom so rampant.

Keywords: Law of protest. Unconstitutionality. Excessive fee. Human dignity. Prescription.

INTRODUÇÃO

Esse estudo questiona a constitucionalidade os artigos 9°, 27, 35 § 2° da Lei 9.492/97. Os referidos artigos ferem a Constituição Federal, o sistema jurídico, o Mercado[1] e os costumes.

Quando uma pessoa deixa de saldar um título executivo, seu nome poderá ser protestado para dar publicidade àquele fato e também preservar direitos dos credores.

Ao ser protestado, seu nome é inscrito num livro próprio no Cartório de Registros de Protesto. Ato contínuo, essa informação é passada para as instituições privadas que trabalham com a análise do risco para concessão de crédito, sendo que as mais conhecidas são a Centralização dos Serviços Bancários S. A. (SERASA) e o Sistema de Proteção ao Crédito (SCPC).

Efetuando o pagamento, o nome é retirado desta lista e o devedor volta ao Mercado consumidor. Se por qualquer motivo, o cidadão não pagar, o nome permanecerá na “lista negra”, que vulgarmente chamam de “nome sujo”.

Na atualidade o sujeito valoriza o “nome limpo”, que o permite participar dessa nova sociedade de consumo. O status social é medido pelo poder aquisitivo da pessoa, em uma batalha surda, onde os membros da sociedade disputam quem pode mais, comprando esse ou aquele bem de consumo. Para esse sujeito ficar cinco anos sem poder entrar em lojas, abrir conta em bancos, utilizar cartões de crédito, é uma penalidade sem precedentes.

Aqui se trata de penalidade em sentido lato, ou seja, tudo aquilo capaz de castigar ou punir uma pessoa. Penalidade aplicada a um particular por outro particular, que impõe a esse um castigo de não mais poder comprar os bens que a mídia divulga constantemente. Torna-se uma forma de exclusão social.

O Mercado sabe que este castigo é por deveras grande e permite ao devedor, mesmo não pagando sua dívida, após cinco anos, retornar ao Mercado consumidor. O Mercado vive do consumo e se um grande número de pessoas estiver com o “nome sujo”, logo, faltarão consumidores para as maravilhas que vão surgindo. O lapso temporal, depois de vencido, funciona como um perdão tácito.

Embora o Mercado reconheça que cinco anos é um tempo longo de penalização para aquele que não pagou e considera prescrita a dívida, para a Lei de Protesto é diferente.

Em seu artigo 9° (Lei do Protesto), o tabelião está impedido de investigar questões referentes à prescrição e à decadência; no art. 27 não poderão fornecer certidões com o mínimo de cinco anos e segundo o art. 35, § 2°, os documentos microfilmados não tem data para sua conservação. Na prática, se a pessoa não pagar, a anotação de seu nome ficará registrada, por tempo indeterminado, no livro do Cartório. Em uma pesquisa de campo, foi verificado no Cartório de Alfenas (MG), registros de 1923, e muito embora, o título prescrito não se preste a instruir ação na justiça, as anotações no cartório de protestos podem servir a outros fins escusos.

Um exemplo, nas campanhas políticas, onde “vale tudo”, esse tipo de informação pode prejudicar um candidato, ao afirmar que ele deu prejuízo a outrem há 20 anos.

Em se tratando de pena, há que se buscar o entendimento da Constituição Federal de 1988, a “Constituição Cidadã”. Em seu artigo 5°, que trata dos direitos e garantias individuais, diz que ninguém será submetido às penas de caráter perpétuo ou cruéis. Ao figurar como mal pagador em um livro de registro de protesto, o cidadão estará recebendo uma penalidade excessiva e inconstitucional. Esta prática fere a dignidade da pessoa humana, assim fere o princípio da supremacia das leis constitucionais.

Por mais que o legislador tenha cuidado, por mais que a lei seja discutida, é na labuta diária da sociedade que ela se aperfeiçoa. É preciso o estudo constante dos efeitos que essa lei provoca na sociedade, sua finalidade e seu alcance.

Desenvolvimento

A dignidade do ser humano: evolução histórica a partir do aparecimento do cristianismo

Origens do direito moderno europeu e brasileiro

A atenção se volta para o Direito Romano que é a base do direito moderno, conforme Gadet e Pecheux (2010, p. 189) “Do Direito romano até o Código Civil, que constitui a racionalização burguesa, o Direito continental europeu se apoia sobre o sistema regulamentar de um texto redigido, que tende a constituir a unidade abstrata de uma Razão escrita, feita para ser aplicada à totalidade das conjunturas da prática jurídica. Enquanto o sistema romano é da regulamentação, o direito anglo-saxão é fundamentalmente um Direito de Jurisprudência e de procedimento.”

De acordo com Marky (1995, p. 5), “o direito romano é um complexo de normas vigentes em Roma, desde a sua fundação (lendária, no séc. VIII a. C.) até a codificação de Justiano (séc. VI d. C.). A codificação justianeia foi conclusiva: foram recolhidos os resultados das experiências anteriores e considerada a obra como definitiva e imutável”.

Direito Romano

Para facilitar a compreensão didática, parte-se aqui de uma classificação proposta por Mark (1995): o período arcaico (fundação de Roma no século VIII a. C. até o século II a. C.), o período clássico (até o século III a. C.) e período pós-clássico (até o século VI d. C.).

De acordo com Mark (1995), o direito do período arcaico caracteriza-se pelo seu formalismo e pela sua rigidez, solenidade e primitividade. Ainda conforme o autor, nesse período a segurança dos cidadãos dependia mais do grupo do que do Estado, em uma evolução posterior o poder central do Estado se desenvolve visando reforçar a autonomia do indivíduo. O marco importante desse período é a codificação da Lei das XII Tábuas. Diz Flinkerbusch (2006, p. 20) “essa codificação escrita que tinha por objetivo atender às reinvindicações dos plebeus em relação aos privilégios dos patrícios […] a lei é aprovada em comício, pela população romana, e passa a vigorar em todo território romano”. Há avanços, afinal a lei é resultado da busca de igualdade de uma parcela da sociedade e já resvalava na questão da dignidade e cita alguns exemplos: “Que não se estabeleça privilégios em lei (tábua nona), que a última vontade do povo tenha força de lei (tábua décima primeira)”. (ibidem, p. 20)

Mesmo apesar de certo avanço, a lei conservava sua severidade e conforme Mark (1995, p. 6) as XII tábuas “nada mais foram que uma codificação de regras provavelmente costumeiras, primitivas, e às vezes cruéis. Aplicavam-se exclusivamente aos cidadãos romanos”. Como exemplo de crueldade tem-se a: Tábua III: Execução no caso de confissão por dívida: após condenado, o devedor tinha 30 dias para pagar. Se não pagasse, era preso e levado à presença do magistrado; se a dívida persistisse (o devedor) seria preso por correias ou com ferro de 15 libras aos pés; se continuasse não pagando, podia ser morto, esquartejado de acordo com o número de escravos ou alienado como escravo (ALTA VILA, 1989, p. 104, apud WOLKMER, 2006).

A formalidade das estipulações sacramentais e públicas, o rigor das fórmulas, […] “o que obriga o homem não é a consciência, não é a noção do justo e do injusto; é a palavra, é a religião da lettra; uti lingua nuncupassit, ità jus esto. Tudo o que está fóra da formula empregada julga-se não promettido. Por exemplo, se o vendedor dissimula um vício occulto da coisa que vende, não é obrigado a fazer boa a qualidade d’essa coisa ao comprador; porque a este respeito em nada se ha compromettido por palavra” (TOPLONG, 1852, p. 21).

Estoicismo x epicurismo. Direito estrito (stricti júris) x contratos de boa-fé (bona fides)

Direito civil (Ius civile) x equidade (ius honorium)

A filosofia começa a forçar mudanças e, de acordo com Troplong (1852), quando apareceu o cristianismo, o direito romano começa a desligar-se do elemento religioso e aristocrático. Buscando fixar-se na filosofia, seu ponto inicial. É no século de Cícero (106 a. C. – 46 a. C.), que esse fenômeno ocorre sob os auspícios do estoicismo. O epicurismo havia abalado a fé na religião e nas instituições. Pregava que os deuses são homens perfeitos, formados de átomos extremamente sutis, que vivem nos espaços intermédios entre os mundos, sem se preocupar com o destino do ser humano ou do Universo. A moral de Epicuro (341 a. C – 271 a. C.) é essencialmente individualista e hedonista: “o prazer é o começo e o fim da existência feliz”… A alma é mortal.

Troplong (1852, p. 10) chama de direito “stricto” esse direito codificado na lei das XII Tábuas. E diz que quando o direito civil caminha estruturado pelo lado do direito estrito se torna duro, rígido, autoritário “Pelo contrario o direito civil, quando se move n’uma esphera distincta da equidade, e quando se orna com o titulo de direito stricto, não é mais que um composto de creações artificiaes e arbitrarias, cujo fim é governar pelas representações materiaes o espirito do homem, ainda incapaz de se deixar governar pela razão. De acordo com Mark (1995) O ius civile provinha dos costumes, das leis, dos plebiscitos e, mais tarde, também dos senatus-consultos e constituições imperiais.

Os jurisconsultos influenciados pela filosofia estoica entendem que o homem não pode ser escravo da lei material e seu gênio filosófico criou uma ideia de justiça abstrata superior às palavras, conforme Troplong (1852, p. 23) “Aquilio, collega e amigo de Cícero, publicou as suas formulas contra o dolo. Desde então a boa fé começou a ser contada na interpretação das convenções. Aqui, pois, como na família, como na propriedade, a equidade se estabelece ao lado do direito civil.” Conforme Taborda (2010)[2] “fides é a virtude do mais poderoso, e daí, a exclamação “pro deum fidem”, que indica proteção dos deuses”. No direito romano os contratos da boa fé (bona fidei) são aqueles negócios jurídicos não solenes introduzidos pela atuação dos pretores. Ainda, de acordo com o autor (Idem) “Na linguagem do direito, a palavra ganhou extensão para significar “vínculo solene”, “garantia dada”, “boa-fé”, “lealdade”, “fidelidade à palavra dada” e “confiança”. Dessa palavra derivaram outras compostas, como fideicomissum, fideipromissor, todas elas com um sentido residual de “confiança”, “garantia”. Assim, o que ressalta da expressão é o aspecto “fidelidade”, sujeição à palavra dada, o sentir-se ligada às próprias declarações”.

A equidade, princípio básico da boa fé, já era uma ideia conhecida dos gregos, conforme Amaral Neto (2004, p. 18) “Sua origem filosófica encontra-se no pensamento grego, onde o termo epieikeia significava o que é reto, equilibrado, temperador das exigências da Justiça, aquilo que o legislador teria dito se estivesse presente”.  Ainda segundo o autor (2004), o tema foi tratado por Aristóteles nas obras Ética a Nicomaco e Retorica.

Tropolong (1852, p. 10) trata a equidade como um direito natural “A equidade é o, que outros chamam direito natural; é esse cabedal de ideias cosmopolitas, que é o apanagio commum da humanidade; é esse direito não escripto, mas innato. A equidade dá por base aos codigos que ella formula a liberdade e egualdade, — os sentimentos da natureza, — as affeições espontaneas, — as inspirações da recta rasão. Mas a preponderancia da equidade é tardia na marcha da civilisação; nem ella brilha em todo o seu esplendor senão quando o homem, erguendo-se pouco e pouco de sua queda, transpõe as edades de violencia, superstição, e ignorancia, e se torna digno de contemplar em sua sinceridade a verdade eterna, para que Deus o creára”.

De acordo com Amaral Neto (2004) a expressão/ideia Aequitas aproxima-se muito da expressão/ideia epieikeia grega que significa basicamente igualdade, proporção, simetria. “Embora não fosse sinônimo, tinha um sentido próximo, paralelo ao da epieikeia grega, ambas as palavras utilizadas com o sentido de uma solução que contorna a rigidez da norma geral e abstrata”.

O direito rígido quiritário (ius civile) era mitigado pelo ius honorium (pretoriano). O pretor, por meio dos editos, criava novas normas jurídicas. De acordo com Mark (1995), as atividades dos pretores consistiam em emitir pareceres jurídicos, sobre questões práticas a eles apresentadas (respondere), instruir as partes sobre como agirem em juízo (agere) e orientar os leigos na realização de negócios jurídicos (cavere).

Amaral Neto (2004, p.19) afirma, “A experiência romana mostra-nos que, já nos tempos mais antigos, nas épocas arcaicas e pré-clássicas, a rigidez das normas de Direito, principalmente do ius civile, era eventualmente contrariada e posta de lado em nome da aequitas, um modelo ideal de Justiça e princípio inspirador do Direito. Exemplo disso eram as exceptiones, meios judiciais que o pretor concedia para paralisar as actiones, tornando ineficazes as pretensões baseadas em normas do ius civile”.

O pretor tinha por incumbência determinar a aplicação da regra jurídica, essa função chamava jurisdição (Jus dicere), tinha um poder discricionário e podia produzir mudanças do direito quiritário. O pretor tinha um amplo poder de mando, denominado imperium. E ainda conforme Mark (1995, p. 15), “O ius honorarium era o direito elaborado e introduzido pelo pretor que, com base no seu imperirum (poder de mando), introduzia novidades, criava novas regras e modificava substancialmente as antigas do ius civile”.

Os pretores que vieram depois de Cícero, geralmente, professavam o estoicismo. Afirma Troplong (1852, p. 27) “Os jurisconsultos que floresceram depois de Cícero se possuíram em geral do stoicismo, que lhes deu regras severas e precisas de proceder entre os homens. Toda a parte moral e philosophica do direito romano, desde Labeão, esse stoico innovador, até Caio e Ulpiano, é bebida nesta eschola, cujo favor se tornou de dia em dia maior para esses homens conspicuos, que brilham aqui e alli no periodo imperial”.

Cristianismo supera a filosofia

O estóico Cícero supera o egoísmo romano e vai além, quando no seio representava os homens como concidadãos de uma mesma cidade. Esse sentimento de pertença do município, tirado do direito, é apenas um tímido esboço, em comparação ao laço de fraternidade, que une todos os homens na comunidade cristã. Sêneca supera Cícero, transformando este sentimento de pertença em uma só família, de que todos nós somos membros. Troplong (1852, p. 29) afirma que o cristianismo supera ambos os filósofos “porém já o christianismo o havia excedido, porque tinha proclamado não só o parentesco, mas também a fraternidade, e a solidariedade universaes; e tinha fundado sobre esta base a sua moral affectuosa de charidade, de egualdade, e a sua pratica infatigavel de abnegação de sacrifícios, e de auxilio desinteressado de outrem”.

Troplong (1852) demonstra esse fato, traçando um paralelo entre a pregação do apóstolo Paulo e as ideias filosóficas dos estóicos. Denuncia a semelhança e aproximação de temas como união, caridade, fraternidade, amor[3].

Sêneca escreveu um livro que versa sobre a Providencia; “Falla de Deos com a linguagem de um christão;… entre os homens um parentesco natural, que quasi toca a fraternidade universal dos discipulos de Christo. Com que ardente philantropia não reivindica elle os direitos da humanidade para o escravo nascido da mesma origem que nós, sujeito quanto ao corpo; mas livre quanto ao espírito! Não são estas as palavras de S. Paulo (citado por TROLONG, 1852, p. 37).

Conforme Troplong (1852, p. 38-39) com relação à escravidão. “Platão dizia: Se um cidadão matar a seu escravo, a lei declara o homicida exemplo de pena, comtanto que se purifique por meio de expiações; se um escravo matar o seu senhor, fazem-lhe soffrer todos os tormentos, que se julgarem a proposito, comtanto que lhe não deixem a vida! Aristóteles ia mais longe, se é possível, em sua theoria da escravidão. Ha pouca differença nos serviços, que o homem tira do escravo e do animal. A mesma natureza o quer, pois que faz os corpos dos homens livres, differentes dos escravos; dando a uns a força conveniente ao seu destino, a outros uma estatura perpendicular, e elevada.” Depois o illustre philosopho conclue assim: “É, pois evidente, que uns são naturalmente livres, e outros naturalmente escravos…”. Mas, quando chegamos aos jurisconsultos romanos, que florescem depois da era christã, e de Sêneca, a linguagem da philosophia do direito é mui differente. “A servidão, diz Florentino, é uma instituição do direito das gentes, pelo qual alguém é contra a natureza, contrà naturam submettido ao dominio de outrem. — A natureza estabeleceu entre os homens um certo parentesco”, diz o mesmo jurisconsulto: inter nos cognationem quamdam natura constituit. Os estóicos deixam claro que a escravidão é contra a natureza, feria a ética baseado no conceito estóico de viver como a natureza.

Para São Paulo[4] os homens são todos iguais perante Deus e formam um mesmo corpo, judeus, gentios, escravos; todos são livres, ou chamados a um estado de liberdade.

Afirma Troplong (1852, p. 31), citando São Paulo[5], “Porque a Providencia é egual para todos, e a terra pertence ao Senhor, com tudo quanto ella contém. Todavia se a verdade deve ser perseguida, o christão não se deve refugiar na morte voluntaria, como o stoico; mas soffra abençoando seus perseguidores, resista, e fique firme, arme-se, como guerreiro intrepido, com o escudo da fé, com o capacete da salvação, e com a espada espiritual”.

Cristianismo supera o Direito

Troplong (1852, p. 28) diz que o cristianismo ampliou as verdades recebidas da filosofia grega e, como também, supera o direito.

De acordo com Mark (1995), no período clássico, o direito romano sofre grandes avanços e modificações, provocadas pelas atividades dos magistrados e dos jurisconsultos. Conforme Tropolong (1852, p. 26) “Os pretores começavam com effeito a tomal-a abertamente debaixo de sua protecção: sôb pretexto de interpretar a lei escripta, alteravam-lhe o vigor por meio de innovações mais ou menos timidas, mais ou menos tortuosas, porém sempre cheias de um sentimento de equidade, que tinha encontrado Roma insensivel nos séculos precedentes. Cicero, principalmente em todos os papeis (filosofo, pretor, orador, escritor) que o seu genio universal representou, foi um dos mais ardentes defensores do jusnaturalismo, da lei natural – da equidade”. A moral estóica de viver conforme a natureza, buscando a virtude, a simplicidade e principalmente a justiça. E afirma Mark (1995, p. 07) “As diretrizes que o pretor ia observar eram publicadas no seu Edito, ao entrar no exercício de suas funções. Como o cargo de pretor era anual, os editos se sucediam um ao outro, dando oportunidade a experiências valiosíssimas”. Cita Troplong (1852, p. 26), acerca de Cícero “Pretor, jactava-se de collocal-a na frente de seus edictos: philosopho e homem d’estado, declara que não é nas Doze-Taboas que convém procurar a fonte e regra do direito, mas sim nas profundezas da razão; que a lei é a equidade, — a razão suprema gravada em nossa natureza, inscripta em todos os corações, immutavel, eterna, cuja voz nos traça os nossos deveres, de que o senado não nos póde desligar, e cujo imperio se extende a todos os povos; — lei que só Deus concebêra, discutíra, e publicára. O autor (1852) citando Ulpiano diz: “No que é relativo ao direito natural, todos os homens são eguaes” (Quia quod ad jus naturale attinet, omnes homines aequales sunt). E em outra parte: “Por direito natural todos os homens nascem livres” (Jure naturali omnes liberi nascerentur). Já não é, pois a natureza, que faz os escravos; a theoria de Aristoteles completou o seu tempo. Ainda de acordo com Troplong (1852, p. 48) “A propriedade natural (in bonis) favorecida pelo pretor, tem quase as mesmas vantagens que a propriedade quiritária Mas nas relações civis, a propriedade natural podia attacar e defender-se por meios tão energicos como a propriedade romana, e a linha, que as separava, era apenas nominal”.

O direito de testar que de início era permitido somente aos cidadãos romanos pais de família, é estendido aos filhos-famílias, quanto a seus bens castrenses, as mulheres, a todos os súditos do império. Muda-se a estipulação do testamento e na fórmula pretoniana, o testador já não pode dispor de seus bens sem contemplar seus próprios filhos, cita Troplong (1852, p. 49).

Surgem os codicillos e fideicommissos, meios indiretos para escapar ao domínio das fórmulas, e produzem resultados iguais aos que eram obtidos por meios legais. Afirma Troplong (1852, p. 50) “Desde então a vontade do homem equilibra a do direito civil; o direito de transmittir os bens depois da morte começa a ter apoio na espontaneidade individual, e não é mais uma pura concessão da lei e do Estado. O direito natural, que aportara na propriedade se manifesta também no direito de dispo-la entre vivos e por causa de morte”.

Para o autor (1852, p. 50) no direito civil só ha duas fontes de obrigações: “os contractos, e os delictos qualificados. Sobre essas fontes estabelece duas classificações; por exemplo, distingue os contractos perfeitos pela coisa, ou pelas palavras, ou pela escritura, ou pelo consentimento respectivo; e quer que cada especie de contrato esteja sujeita a regras proprias, e seja sufficiente a si mesma: bem intendido que estas regras se ligam especialmente ao respeito para com as palavras, ou a certas concepções de fatos previstos e determidados. Mas o direito natural não se deixa ficar neste circulo tão restrito: ao mesmo passo, que respeita o todo do sistema, altera-lhe as partes separadas: umas vezes muda as linhas de demarcação; outras vezes liga uma obrigação e uma ação a fatos não previstos, mas que violam esta regra da consciencia a ninguem é licito locupletar-se á custa alheia. Ninguem será obrigado senão por meio de um contrato, ou de um delito qualificado. Porém, responde a equidade, não haverá nas relações sociais muitas causas, que, sem entrarem precisamente na classe dos contractos e dos delictos qualificados, sejam, entretanto de natureza obrigatoria? Então os pretores ampliam o direito civil; inventam o sistema dos “quasi-contractos e quasi-delictos”, que fazem entrar no fôro exterior, deveres antes deixados às inspirações da consciência”.

Em 313 d. C. o imperador Constantino converte-se ao cristianismo, que se expande por todo império. Conforme Lima (1999, p. 41) “em seus princípios alternadamente perseguida e tolerada, tornou-se equiparada a qualquer outro culto (313 d. C.) e, passados pouco mais de seis decênios, converteu-se em religião oficial do Estado (380 d. C.), com os privilégios, honras e prerrogativas. É certo que as concessões tiveram seus preços. O império cobrou-lhe a garantia da unidade do regime com a unidade da fé; protegia a igreja, mas queria a submissão dos bispos e, consequentemente, a do rebanho; garantia-lhe a estabilidade, mas requeria que permanecessem abertos os acessos para se intrometer em assuntos eclesiásticos. Inaugurava-se, assim, o cesaropapismo com a normalidade dos imperantes não desacostumados ao titulo que havia bem pouco ostentavam, pontifex maximus, espécie de sumo mandatário religioso consagrado pelo culto dos numes do império” .

De acordo com Lima (1999, p. 42) “[…] Codex Theodosianus (438 d. C.) o império condescendeu com vários postulados cristãos” e afirma Mark (1995) é Justiniano (527 d. C. a 565 d. C.) quem compila oficialmente as leis vigentes na época (Codex Gregorianus, Codex Hermonegianus, Codex Theodosianus), e é no período de Justiniano que se concentrou estudos mais atentos deste trabalho.

Cristianismo supera o Judaismo

Segundo Troplong (1852, p. 44) além de superar a filosofia estóica grega, o cristianismo supera também a lei de Moises. De acordo com Gilissen (2003), o direito hebraico é um direito religioso. O direito é dado por Deus. As fontes do Direito hebraico estão na Bíblia.  As leis judaicas estão contidas no Pentateuco, palavra derivada do grego, penta (cinco), teuco (livro) e tem para os judeus o nome de Thora. São os primeiros cinco livros da Bíblia cristã. Essas leis ditavam a vida na sociedade judaica da época, uma ideologia de pureza e estão contidas principalmente em Levítico, Números e Deuteronômio. Conhecida também como a lei de talião, “olho por olho, dente por dente” (Lev. 24:20).

Esse trabalho se limitou ao confronto de algumas dessas leis judaicas com algumas das leis pregadas por Cristo. Na sociedade judaica era comum o sacrifício de animais e com seu sangue, expiar os pecados (violação da lei) (Lev. I). Jesus condena o sacrifício de animais e dá seu sangue para expiar os pecados, “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (João 1:29).

Leis concernentes à pureza e ao furto (Núm, 5:2) “Ordena aos israelitas que expulsem do acampamento todo leproso, todo homem atacado por gonorréia, todo o que está imundo por ter tocado num cadáver”, Jesus fez muitos de seus milagres justamente entre esse povo (Lc, 17, 11-19; Mc 1, 40-45).

Violação do sábado (Núm. 15, 32-36), Jesus disse “O Sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do Sábado” (Marcos 2:27).

Conhece-se a passagem bíblica em que Pedro perguntou a Jesus sobre o perdão: "Senhor, até quantas vezes meu irmão pecará contra mim, que eu lhe perdoe? Até sete vezes?" (Mt 18.21.) Os Judeus tinham como tradição perdoar três vezes seus irmãos faltosos. Pedro, ao sugerir sete, achava que estava sendo generoso e longânime. Por isso, provavelmente assustou-se quando ouviu Jesus responder: “Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete” (Mt 18.22.).

Para este artigo não tornar extenso, foi necessário reduzir as comparações a essas leis. O que foi escrito, acredita-se ser suficiente para esclarecer o caráter revolucionário, exercido pelo cristianismo na sociedade de sua época.

A compilação dos ius civile com o ius honorium

De acordo com Mark (1995) o período pós-clássico é a época da decadência e o Direito vivia do legado dos clássicos. O fato mais importante deste período é a codificação ordenada por Justiano (527 a 565 d. C.) das regras de direito em vigor na época. Em 529 d. C., uma comissão de juristas organizou uma coleção completa das constituições imperiais (leis emanadas dos imperadores) publicada sob o nome de Codex. Em 530 d. C, algumas obras dos jurisconsultos clássicos ficaram a cargo de Triboniano. Este as delegou a uma comissão que, em um prazo de três anos, confeccionou o Digesto (Pandectas), composto de 50 livros contendo trechos extraídos de 2000 livros, com três milhões de linhas. Esses codificadores tiveram autorização de alterar os textos recolhidos. As alterações receberam o nome de Emblemata Triboniani e hoje são chamadas de Interpolações. Foi elaborado um Manual de Direito para os estudantes, intitulado Institutiones. Justiniano reservou-se no direito de baixar novas leis, chamadas de Novellae contituitiones. O Codex, o Digesto, as Institutas e as Novellae formam o que Dionísio Godofredo no séc. XVI d. C. chamou de Corpus Iuri Civilis.

Troplong (1852, p. 65) defende que Justiano foi um renovador resoluto, “Era subtil, verboso, disputador; mas um bom senso natural, bebido nas fontes da philosophia christã, obstava aos desvarios do sophista: a velha originalidade romana, e o seu material pesado e composto, provocaram de sua parte amargas zombarias”.

O grande feito de Justiniano foi cindir os sistemas, sempre privilegiando o simples e o puro nesses sistemas jurídicos e afirma o autor, “Assim, por exemplo, a egualdade se apodera das pessoas e das coisas; extingue a differença entre todos os libertos, e nivella as classes livres, ao mesmo tempo que melhora a sorte dos escravos; não faz a distincção entre o parentesco masculino (agnatio) e o feminino (cognatio), o que faz a dissolução da familia romana e põe no mesmo pé as coisas mancipi e as nec mancipi, o que causa a dissolução da propriedade romana: cessam as differenças entre a propriedade civil e natural; entre a usucapião, essa defensora da Italia, e a prescripção, essa defensora do genero humano” (TROPLONG, 1985, p. 66).

Fim do Império e expansão da igreja – a evolução do direito natural

No séc. IV, o império romano se divide em dois impérios. Com o fim do Império Romano do Ocidente em 476 d. C. inicia-se a Idade Média. De acordo com Comby (2001), só tinha validade o que era estabelecido por juramento, as guerras civis e as invasões bárbaras dizimaram o sistema estatal criado pelos romanos. Segundo Lima (1999, p. 42-43) “Aos poucos a Igreja, das áreas anteriormente dominadas pelos romanos, conseguiu converter os bárbaros – arianos e pagãos – ou pela ação missionária ou pela conversão dos seus chefes, seguida pela de todo o povo. Transmitiu-lhes, lenta e progressivamente, o modo de ser romano cristianizado na vida familiar, social, política, intelectual e religiosa, por outro lado, deixou-se permear por sua influência nas regiões em que eles se imiscuíram e se estabeleceram”.

Essa época é caracterizada pelo feudalismo, teocentrismo, pelas invasões bárbaras e ascensão da igreja católica. O direito dos povos bárbaros (direito Germânico) afirma Gillisen (2003) “é um direito tribal arcaico e pouco desenvolvido”. Justiça sob responsabilidade dos senhores: (1) Dar regras gerais (“leis”) ou particulares (“sentenças”); (2) Processo oral; sistema de provas: ordálios, testemunhas, desafios, duelos; (3) Corte senhorial presidida pelo Senhor, pares julgam seus pares; (4) Fonte principal: costumes locais.

Cita Lima (1999, p. 43) que, “[…] o direito germânico. Os bárbaros que o possuíam e seguiam desconheciam os elementos preponderantes no Direito Romano, com a distinção entre o Direito público e o privado, daí nasceu o individualismo e, depois, o feudalismo, emprestando ao direito romano, que a igreja adotara, traços fisionômicos peculiares que se infiltraram em seu arcabouço jurídico, rachando-lhe a homogeneidade”.

Para Comby (2001) a igreja, é parte do sistema, ela possui grandes extensões de terra, principal riqueza da época, todo bispo é senhor e vassalo, possui exércitos.

Ainda de acordo com Lima (1999, p. 36) “No séc. III e mais ainda no séc. IV desponta a legislação eclesiástica, graças às primitivas coletâneas de atas de concílios e sínodos regionais, aliás, relativamente frequentes”. O direito canônico é um direito escrito, organizado em códigos.

Segundo Gillisen (2003) o único direito escrito na Europa Ocidental, entre os séc. IX e XIII é o direito canônico. A sua influência sobre o direito moderno continental europeu é considerável, visto a ampla comunidade católica e seu universalismo na idade média, além do que os tribunais eclesiásticos se ocupavam de muitas questões de direito privado civil. Esse direito perde força com a laicização do Estado a partir da Revolução Francesa de 1789. O direito romano retorna ao Ocidente no seio das Universidades, nos séc. XII e XIII, e isso vai influenciar a formação do direito moderno da Europa Ocidental – consequentemente do Brasil – exceto Inglaterra, Irlanda e os países comunistas do leste europeu.

Ainda segundo o autor (2003, p. 17) “o costume é a principal fonte de direito na Europa ocidental, do século X ao séc. XIII. Este direito é parcialmente reduzido a escrito a partir dos séc. XIII e XIV, embora continue a evoluir. A ratificação dos costumes por via autoritária e as suas redações e publicação, nos séculos XV, XVI, XVII, conservá-los-ão em vigor até os fins do antigo regime”. Na época medieval os princípios são trazidos do direito romano e germânico, mas, sobretudo nas particularidades dos institutos medievais (feudalismo, regime senhorial, dominial, desenvolvimento do comércio e da burguesia).

Para Fourez (1995, p. 156), até meados do sec. XII, as pessoas viviam na aldeia, ligado a terra. “Elas nasciam, viviam e morriam no mesmo ambiente humano… os objetos não eram inanimados, pois faziam parte do universo humano”. Não havia separação de homem-objeto. O homem era aprisionado pela magia, pelo religioso.

A filosofia vem em socorro do homem, de acordo com Haroche (1992,) a crise da dupla verdade se deu no século XIII, trazida pelo “averrorismo”, os escritos de Aristóteles, até então, desconhecidos dos europeus é traduzido pelo filosofo árabe Averrois. Trata-se de uma crise provocada pelo perigo de uma contradição no seio da ordem religiosa: contradição entre, de um lado a fé e, de outro a razão; contradição entre a origem divina do saber e da verdade, e sua origem humana, fundada do exercício da razão. As autoridades religiosas pregavam o amor incondicional a Deus e quem ama não questiona, elas temiam que à medida que o homem avançasse no conhecimento do “verdadeiro” pela filosofia, pelo raciocínio, poderia levá-lo a rejeitar os dogmas da igreja. Haroche (1992, p. 67) diz que o século XIII foi decisivo para o enfraquecimento da igreja e o surgimento de um poder jurídico. “As modificações das estruturas econômicas do século X ao século XIII e as incidências ideológicas que elas puderam ter (em particular no século XIII) sobre o direito, levam a pensar que a crise da Dupla Verdade está fundamentalmente ligada ao enfraquecimento da Igreja no sistema feudal e à escalada do jurídico político, que se exprimem, em particular, pelas das mudanças no processo jurídico. Estas irão se manifestar por um deslocamento nas formas de assujeitamento do indivíduo ao poder e modificar sensivelmente o estatuto do sujeito e sua relação do saber”. Deus já não é o centro do universo, isso possibilitou o surgimento do humanismo.

Conforme Wieacker (1967) O direito natural da antiguidade fora adaptado da igreja e inserido pela Escolástica do século XIII, na sua versão Aristotélica… Depois das lutas religiosas do início da idade moderna, o direito natural emancipou-se da teologia moral sob a influência da nova imagem fisicalista do mundo; baseava-se agora os seus postulados, não sobre a vontade do criador ou a ordem da criação, mas sobre as necessidades da razão e a experiência da realidade”.

Afirma Gilissen (2003) que o direito natural retorna e domina o pensamento jurídico do século XVII e XVIII e é sob sua influência que surgem as grandes codificações dos séculos XVIII e dos inícios do século XIX, principalmente na Alemanha e França, tendo como principais representantes Grócio (1583-1645), Puffendorf (1632-1694), Domat (1625-1696) e Pothier (1699-1772)[6].

Com seu lema “Liberdade, fraternidade e igualdade” a Revolução Francesa influenciou o direito de diversos países com seu principio da soberania nacional (a lei é a expressão da vontade da nação soberana), tendo como representantes Locke (1632-1704)[7], Rosseau (1712-1778)[8], Voltaire (1694-1778)[9], Montesquieu  (1689-1755).[10] As liberdades públicas são afirmadas em importantes declarações como o Bill of Rights, em 1689, conforme Flinkerbush (2006) “O Bill of rights britânico incorpora duas preocupações principais: limita o poder do rei à vontade do povo e proclama alguns direitos fundamentais do indivíduo, como a proibição dos castigos ilegais e cruéis”.

A declaração do Povo da Virginia, em 1776, antecipa a Declaração de independência dos Estados Unidos e serve de modelo para os demais Estados, segundo Flinkerbush (2006, p. 30) “a concepção jusnaturalista, fruto da doutrina contratualista de Locke e Rosseau, é a inspiradora do movimento de independência. Ela esta nitidamente estampada no primeiro artigo, com as expressões ’by nature’ (por natureza) e ‘inherent rights’ (direitos inerentes)”.

A declaração de independência dos Estados Unidos é de 4 de julho de 1776, portanto algumas semanas após da Virginia, ainda conforme Flinkerbush (2006, p. 32) “a declaração é dirigida a todos os homens e reconhece que todos ‘foram criados iguais, foram dotados pelo criador de direitos inalienaveis’”.

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789, de acordo com Flinkerbush (2006, p. 33) “o documento constitui um marco na positivação dos direitos humanos na modernidade e é base da Declaração Universal dos Direitos Humanos promulgada pela ONU, em 1948, e nos primeiros artigos declara a igualdade e a liberdade intrínsecas do homem, renovando a afirmação da filosofia do direito natural. O mundo fora abalado pelas atrocidades cometidas durante a 2ª. Guerra Mundial e promulga uma declaração que se inicia assim: “Artigo 1º. Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”.

A Constituição Brasileira de 1988 e a recepção do direito natural

A Constituição Federal de 1988 é também conhecida como “constituição cidadã”, por seu claro viés humanista. Já no preâmbulo expande o ideário da Revolução Francesa de “liberdade, igualdade e fraternidade” e cita outras conquistas humanas, dentre elas, a segurança, a justiça, o bem-estar social etc. Em seu artigo primeiro, inciso terceiro, cita textualmente a dignidade da pessoa humana e em seu artigo quinto diz que todos são iguais perante a lei.

Recorda-se aqui de Ulpiano, de acordo com Toplong (1852, p. 39/40) “E Ulpiano diz: No que é relativo ao direito natural, todos os homens são eguaes” (Quia quod ad jus naturale attinet, omnes homines aequales sunt). E em outra parte: “Por direito natural todos os homens nascem livres”. (Jure naturali omnes liberi nascerentur). Introduziu o homem no Estado, fazendo-o credor de direitos e serviços, cobráveis inclusive com o mandado de injunção.

De acordo com Bulos (2009, p. 29) “A Constituição é um organismo vivo que cuida da organização estrutural do Estado, forma de governo, garantia das liberdades públicas e individuais, do modo de aquisição, manutenção e exercício do poder”.

A Constituição é a mais alta lei da nação, lei das leis, todas as outras leis deve-lhe obediência. Segundo Bulos (2009, p. 56), “A idéia do principio da supremacia constitucional advém da constatação de que a constituição é soberana dentro do ordenamento (paramountcy). Por isso, todas as demais leis e atos normativos a ela devem adequar-se”.

 Nos dias atuais, os princípios, aqueles que antes viviam desprestigiados; hoje, tornam figuras centrais na solução dos conflitos.

Para o autor (2009, p. 19), “o constitucionalismo moderno, portanto, representou o estágio de reaproximação entre os fundamentos éticos da vida humana e o direito, reintroduzindo as concepções de justiça e legitimidade. Eis aí o que se pode chamar de constitucionalismo principialista, proveniente do reconhecimento da face principiológica do Direito, que irá encontrar notável sequência na etapa do constitucionalismo”.

Nesse sentido pode afirmar que o Princípio da Dignidade Humana como fundamento do Estado Democrático de Direito coloca o homem como centro de toda a organização política e do próprio Direito. Não é o homem que está a serviço do aparelho Estatal, é este que deve servir ao homem para consecução do integral desenvolvimento de sua personalidade, para que atinja seus ideais de vida e de sua própria realização pessoal, que em última instância é a busca incessante de sua felicidade.

Tem-se ainda que a Constituição de 1988 adotou uma decisão política fundamental: inserir o princípio da dignidade humana como princípio fundamental da República Federativa, proporcionando um conteúdo substancial ao sistema jurídico. Essa meta é uma demonstração da subserviência do Estado ao ser humano; da posição de anterioridade da pessoa ao ordenamento e, principalmente, da supremacia dos valores, agora positivados em princípios.

Ainda conforme Bulos (2009, p. 415), “a dignidade da pessoa humana, enquanto vetor da atividade exegética da Constituição de 1988, consigna um sobre princípio, ombreando os demais pórticos constitucionais como da legalidade (art. 5, II), o da liberdade de profissão (art. 5, XIII), o da moralidade administrativa (art. 37 etc.) […]”. Assim, a dignidade da pessoa humana é o carro chefe dos direitos fundamentais da na constituição de 1988.

O Estado deve existir e também estar a serviço da pessoa humana para suprir as suas necessidades, entre elas a de viver em liberdade e em condições que possam facilitar o seu desenvolvimento e a sua personalidade. O que significa dizer que cabe ao Estado e, portanto, ao Direito, propiciar o pleno acesso às condições necessárias para a promoção dessa realização.

Prescrição

O autor Troplong (1852) chama a Usucapião de defensora da Itália e Prescrição de defensora do gênero humano. O autor fala isso em relação ao direito de propriedade. No direito de propriedade encontra-se sempre o dualismo do res mancipi e res nec mancipi. As res mancipi eram os terrenos itálicos (não os provenciais), os animais de trabalho e carga (como o cavalo, o boi e o jumento), os escravos e as servidões prediais rústicas mais antigas, as demais coisas eram nec mancipi. As res mancipi só podiam ser adquiridas por cidadãos romanos e exigiam a mancipatio. A mancipação é uma forma solene religiosa e publica instituída pelo direito quiritário de transferência da propriedade.

Conforme Mark (1995, p. 70), assim, se alguém comprasse uma res mancipi, sem que o vendedor transferisse a propriedade dessa coisa pelos atos jurídicos solenes acima citados, mas sim, apenas pela simples tradição da coisa, o comprador não adquiria a propriedade quiritária. Era comum o vendedor agir de má-fé, baseando no formalismo do ius civile retomar as res mancipi que foram alienadas sem as formalidades da mancipação. Para proteger o comprador, o pretor socorria os prejudicados com um meio de defesa chamado exceptio rei venditae et traditae que paralizava a pretensão do antigo proprietário. De acordo com Mark (1995, p. 70) o pretor cria um novo tipo de propriedade também chamada de bonitária (in bonis), indicava o domínio concedido pelo pretor em contrapartida à propriedade quiritária (dominium ex iure quiritium).

Pela ótica do direito natural, a prescrição de uma dívida é como se fosse um perdão, uma proteção ao devedor, ou seja, se o credor não teve interesse em receber ou o se o devedor não tinha bens o bastante para suportá-la; em um determinado lapso de tempo, ela esta prescrita. Está na Bíblia no que os teólogos chamam de ano sabático e ano jubilar.

“Desde Roma, em uma linha histórica, a prescrição resiste ao tempo e está presente em todos os ordenamentos jurídicos posteriores e essa visão da prescrição é a adotada pelo Código Civil Brasileiro, de 2002, que preferiu seguir a tradição romanística para considerar a prescrição como causa de extinção da pretensão do direito de ação e não do direito subjetivo material.

Segundo Diniz (2010, p. 406) “a violação do direito subjetivo cria para o seu titular a pretensão […]. O titular da pretensão jurídica terá prazo para propor a ação […]. Se o titular deixa escoar tal lapso temporal sua inércia dará origem a uma sanção adveniente, que é a prescrição”.

A prescrição é norma de natureza de ordem pública, ou seja, interessa ao Estado para a preservação da segurança jurídica e o devido processo legal, evitando que as demandas se tornem eterno. Elas também interessam ao devedor que, diante da inércia do credor, se vê liberado da obrigação.

Esse costume pode ser verificado nos dias atuais e está completamente arraigado na cultura e na lei. O Mercado (Serasa e SCPC) e o Código de Defesa do Consumidor (CDC) operam com o lapso temporal de cinco anos, depois deste prazo o consumidor terá o seu nome restabelecido e a inscrição nos bancos de dados de instituições como a Serasa e SCPC, são eliminadas. Há inclusive um interesse que ele volte a consumir, volte ao Mercado (Código de Defesa do Consumidor. Art. 43, § 1°, 4º. e 5º.; Art. 206 – § 3°; VIII –  § 5º. I. Lei 11 101,  de 2005, Art. 158 – III).

A Lei 9.492/97 e os cartórios de protestos

Saraiva (1947) afirma que em Pisa, por volta de 1305, já era incluída entre as funções do notário, praesentatio litterarum, requisitio e protestatio.  O Tabelionato de Protesto é a instituição pública que cumpre função do Estado, mas é gerida por um particular, que recebeu delegação do Estado após concurso público de provas e títulos, na qual o credor apresenta os títulos ou documentos de dívida inadimplidos, para serem protestados. É privativo de a União legislar sobre direito notarial (art. 22, XXV) e o art. 236 da Constituição Federal cuida da sua institucionalização e ainda é regulado por várias leis infraconstitucionais, tais como: Lei No 6015/73 (de 31 de dez. de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras providências); Lei No  8935/94 (de 18 de nov. de 1994. Regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre serviços notariais e de registro. Lei dos cartórios)  e Lei No 10.169/00 (de 29 de dez. de 2000. Regula o § 2o do art. 236 da Constituição Federal, mediante o estabelecimento de normas gerais para a fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro).

O protesto cambiário é um direito do credor para provar que a obrigação que tinha o devedor, de lhe pagar uma quantia certa, reconhecida como dívida, não foi cumprida na data marcada para o pagamento. Com o protesto, o credor comprova a mora (atraso da obrigação) e a inadimplência (descumprimento da obrigação) do devedor. De acordo com Darold (1998, p. 17), “Guarda, também, a função de constranger legalmente o devedor ao pagamento, sob pena de ter lavrado e registrado contra si ato restritivo de crédito… Todavia, como meio de constrangimento, deve o protesto comportar-se rigorosa e estritamente dentro dos ditames da lei, sob pena de transfigurar-se em ato ilegal e abusivo”.

A data do protesto serve para indicar o dia inicial em que se contarão juros, taxas e correções monetárias sobre a dívida, se estes não estiverem já estipulados em contrato. Também serve o protesto para interromper a prescrição cambial, dentre outras utilidades. Assim, prescreve a Lei 9.492/97, nos artigos 1º, 2º e 3º (de 10 de set. de 1997 – define competência, regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida e dá outras providências).

O protesto como pena

A função do protesto vem sendo desvirtuada, pois passou a ser utilizado como instrumento de coação, visando forçar o devedor ao pagamento do título. O tabelião tornou-se um cobrador de luxo e valendo-se da força descomunal do Estado.

Segundo Venosa (2004, p. 480), “De há muito o sentido social e jurídico do protesto, mormente aquele denominado facultativo, deixou de ter o sentido unicamente histórico para o qual foi criado. Sabemos nós, juristas ou não, que o protesto funciona como fator psicológico para que a obrigação seja cumprida. Desse modo, a estratégia do protesto se insere no iter do credor para receber seu crédito, independentemente do sentido original consuetudinário do instituto. Trata-se, no mais das vezes, de mais uma tentativa extrajudicial em prol do recebimento do crédito. […] Não pode, porém, o cultor do direito e o magistrado ignorar a realidade social. Esse aspecto não passa despercebido na atualidade”. Para o magistrado Ermínio Amarildo Darold (1998, p. 17) “o protesto ‘guarda, também, a relevante função de constranger legalmente o devedor do pagamento’ […] evitando, assim, que todo e qualquer inadimplemento vislumbre na ação judicial a única providência formal possível”.

Por meio de convênio, amparado por lei, os cartórios fornecem diariamente à Serasa, órgão de serviço de proteção ao crédito, os nomes das pessoas protestadas para inclusão em uma lista “negra” que a manterá ativa por cinco anos.

O art. 27, da lei 9492/97, determina que o tabelião forneça no prazo de cinco dias úteis, no máximo, que abrangerá o período mínimo dos cinco anos anteriores contados da data do pedido (grifo nosso)[11]

O art. 35, § 2º preceitua, que em forma de arquivos eletrônicos não subsiste data para conservação, ou seja, esses registros podem ficar por tempo indeterminado.

O Cartório de Osasco[12] (SP) é esclarecedor e cita textualmente “Este vínculo entre credor e devedor será eterno até o pagamento da dívida ou consequente cancelamento do protesto”.

No cartório de Alfenas (MG), o notário mencionou, até com certo orgulho, ter registros datados desde a década de1923. Em tese, qualquer pessoa que se dirigir ao Cartório e por escrito, requerer uma certidão desta época, o tabelião, será obrigado a fornecer.

Ao constar em um banco de dados de maus pagadores a pena será cruel, por tempo indeterminado. Em se tratando de pena, a Constituição Federal de 1988, determina em seu art. 5°, XLVII que não haverá penas, (a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; (b) de caráter perpétuo; (c) de trabalhos forçados; (d) de banimento; (e) cruéis.

No art. 9º determina “Todos os títulos e documentos de dívida protocolizados serão examinados em seus caracteres formais e terão curso se não apresentarem vícios, não cabendo ao Tabelião de Protesto investigar a ocorrência de prescrição ou caducidade”. (grifo nosso)

A decadência e prescrição são normas da natureza de ordem pública, ou seja, interessa ao Estado para a preservação da segurança jurídica e o devido processo legal, evitando que as demandas se tornem eternas. Elas também interessam ao devedor, que diante da inércia do credor se vê liberado da obrigação. Pelo Código Civil/2002, art. 193, a prescrição pode ser alegada a qualquer tempo e no art. 219 parag. 5°, ela pode ser conhecida de ofício pelo juiz. Pela lei 9492/97 ela não pode ser conhecida pelo tabelião de protesto no momento de lavrar o feito.

Segundo Siqueira (2010) “Ontem, foi matéria no telejornal SP Record, os problemas que vêm sofrendo os devedores de todo o Brasil. Já há algum tempo tenho acompanhado as reclamações de pessoas que são protestadas fora do seu domicílio, por dívidas já prescritas. O que no mínimo se mostra suspeito, é o fato de somente os cartórios do Rio de Janeiro se prestarem a executar o protesto contra devedores domiciliados em outros estados. Grosso modo, a prática funciona da seguinte maneira: Grandes empresas do varejo, após esgotarem as tentativas de cobrança de cheques, e já considerando como perda efetiva, vendem os títulos de crédito para pseudo “empresas de cobrança”. Estes títulos são, em regra, cheques de baixo valor e vencidos há mais de 5 anos. Estas empresas levam os cheques à protesto no Rio de Janeiro, nos cartórios de Barra do Piraí, São João do Meriti (RJ) e alguns outros.  Com o protesto, a restrição junto aos órgãos de proteção ao crédito é “ressuscitada”, e o devedor, que já acreditava ter se livrado da dívida (sem pagar nada), fica surpreso com a retomada da cobrança e, em alguns casos, com valores absurdos. O que no começo se mostrou um negócio “da china” para as empresas de cobrança, hoje beira a prática de estelionato”.

CONCLUSÃO

Os artigos analisados extrapolam a eficácia pretendida da lei, ao permitir o que o mercado também não quer, ou seja, que os registros fiquem mais que o tempo prescricional das dívidas, muito menos o que o ordenamento jurídico tem como regra. Ao impedir de conhecer da prescrição e decadência e também impedir o tabelião de conceder certidões com menos de cinco anos, mantendo os seus registros por tempo indeterminado, a lei fere a dignidade da pessoa humana, com desnecessária força que beira a vingança e o que é pior, vingança privada.

O intuito deste estudo não foi o de incentivar o calote. Quem deve tem que pagar, mas, reconhecer que passados os cinco anos, se o credor não teve interesse em receber ou se o devedor não dispunha de condições para pagar, esta dívida deve ser riscada de todos os bancos de dados, sejam eles públicos ou privados.

Mesmo na época de Jesus, onde imperava a selvageria e a lei do mais forte, o perdão das dívidas era costume, os cativos eram libertos e voltavam para as suas terras.

Esse costume pode ser verificado nos dias atuais e está completamente arraigado na cultura e na lei. O mercado (Serasa) e o CDC operam com o lapso temporal de cinco anos, depois deste prazo o consumidor tem seu nome restabelecido e a inscrição nos bancos de dados de instituição como a Serasa, é eliminada. Há inclusive um interesse que ele volte a consumir, volte ao mercado. O próprio governo não cobra impostos anteriores há cinco anos.

Essa práxis opera como um perdão tácito. Se o credor não se manifestou ou se o devedor não teve capacidade para pagar sua dívida neste prazo, ela está perdoada. Portanto, o próprio Mercado e o Estado querem este perdão, até mesmo para que a pessoa volte a consumir e a pagar impostos.

 

Referências
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Notas:
[1]  Leia Mercado, que aqui e em todo o texto, propositalmente, foi grafado com letra maiúscula.
[2] http://www.vrbs.org/novapagina/publicacoesnp2-textosemgeral-taborda.htm
[3] Ver São Paulo, I aos Cor., XII, 26. Aos Rom., XII, 10, 16.  S. Paulo, I aos Cor. I, 20; II, 6, 8, 12; III, 19. Aos Efs., II, 6.
[4] Ver Aos Rom., II, 11. I. aos Cor., XII, 13. aos Galat., III, 28.
[5] Ver Aos Efe., 13, e seg.  A comparação é extensa para maiores esclarecimentos ver Troplong (1852).
[6] Hugo Grócio, Hugo Grotius, Huig de Groot ou Hugo de Groot; (1583-1645), jurista a serviço da República dos Países Baixos; Samuel Pufendorf (1632-1694), jurista alemão; Jean Domat ou Daumat (1625-1696) e Robert Joseph Pothier (1699-1772), juristas franceses.
[7] John Locke (1632-1704) filósofo inglês e ideólogo do liberalismo, sendo considerado o principal representante do empirismo britânico e um dos principais teóricos do contrato social.
[8] Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), importante filósofo, teórico político, escritor e compositor autodidata suíço. É considerado um dos principais filósofos do iluminismo e um precursor do romantismo.
[9] François Marie Arouet, mais conhecido como Voltaire (1694-1778) foi escritor, ensaísta, deísta e filósofo iluminista francês.
[10] Charles-Louis de Secondatt, ou simplesmente Charles de Montesquieu, senhor de La Brède ou barão de Montesquieu (1689-1755), político, filósofo, escritor francês e autor da Teoria da Separação dos Poderes.
[11] Os artigos citados falam em prazo máximo e a lei de protesto em prazo mínimo.
[12] http://www.protestodeosasco.com.br/quantocusta.protestar.htm

Informações Sobre o Autor

Marcial Antonio de Oliveira

Mestrando em Ciências da Linguagem pela Univas, Pouso Alegre-MG. Graduado em Marketing e graduando em Direito pela Unifenas, Alfenas-MG


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Equipe Âmbito Jurídico

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