Valor venal é base de cálculo tanto do IPTU, como também do ITBI (arts. 33 e 38 do CTN).
A definição da base de cálculo é matéria submetida ao princípio da reserva legal (art. 97, IV do CTN), precedida de prévia definição em caráter de norma geral, por lei complementar (art. 146, III, a da CF).
Mas, será suficiente que a lei municipal prescreva que a base de cálculo é o valor venal do imóvel, ou dos bens ou direitos transmitidos, como pondera parcela da doutrina especializada?
Parece-nos que não, pois a base de cálculo espelha o aspecto quantitativo do tributo, que representa um conceito determinado, sendo, portanto, elemento essencial à sua existência.
Como se sabe, o elemento quantitativo do fato gerador compõe-se de base de cálculo, que é uma ordem de grandeza sobre a qual incide a alíquota.
Logo, não basta dizer que a base de cálculo é o valor venal do imóvel, ou dos bens ou direitos transmitidos para aplicar na operação de lançamento o conceito doutrinário.
Conceituamos o valor venal como sendo aquele preço que seria alcançado em uma operação de compra e venda à vista, em condições normais do mercado imobiliário, admitindo-se a diferença de até 10% para mais ou para menos (Cf. nosso Direito financeiro-tributário, 17ª edição, Atlas, 2008, p. 423).
Dessa conceituação, da qual não discrepa a doutrina especializada, verifica-se que se trata de um mero parâmetro dirigido ao legislador, a quem incumbe a definição da base de cálculo, de sorte a não extrapolar o valor de mercado, admitindo-se a diferença aí apontada. Sendo o tributo um conceito determinado, o que é raro em Direito, resta evidente que descabe a cogitação de incidência de uma alíquota sobre um valor que não seja certo. Quem exige tributo deve apontar o seu exato valor, o que se obtém por meio do lançamento tributário, um procedimento administrativo vinculado, na forma do art. 142 do CTN.
Logo, pressupõe preexistência de lei definindo critérios objetivos para a apuração do valor unitário do metro quadrado da construção e do terreno considerando os diferentes tipos e padrões de construção, bem como sua localização nas diferentes zonas fiscais em que se subdividem a zona urbana do Município.
Cabe ao agente administrativo tributário competente promover o enquadramento de cada imóvel a ser tributado pelo IPTU nas definições da lei para apuração do valor venal do imóvel, aplicando sobre o imóvel considerado os valores unitários do metro quadrado da construção e do metro quadrado do terreno correspondentes.
No Município de São Paulo vigora a Lei nº 10.235/86, que aprovou seis tabelas anexas contendo listagem de valores, possibilitando a apuração do valor unitário do metro quadrado de construção e do terreno (art. 2º). Essa lei é conhecida também como lei que aprova a Planta Genérica de Valores (PGV).
Por conseguinte, tanto o IPTU, como o ITBI devem buscar o exato valor da base de cálculo (valor venal) na sua lei de regência, não sendo permitido o apego ao conceito doutrinário de valor venal para, por meio de uma interpretação canhestra, exigir o recolhimento do ITBI com base em valores de mercado fixados concretamente para todos os imóveis cadastrados, com fundamento em “pesquisas de mercado”, o que é um verdadeiro absurdo jurídico.
Pesquisas de mercado servem para orientar a ação do legislador na fixação de critérios objetivos para apuração do valor unitário do metro quadrado da construção e do terreno, jamais para proceder ao lançamento tributário. O Executivo deve efetuar essa pesquisa para efeito de elaboração de projeto de lei de apuração do valor venal ou de sua atualização para se ajustar à nova realidade imobiliária.
O que é relevante juridicamente para aplicação da alíquota do ITBI sobre o valor venal não é o seu conceito doutrinário, mas a sua definição legal, que outra coisa não é senão aquele valor total que resulta da aplicação do valor unitário do metro quadrado da construção e do terreno correspondente, previsto em lei, sobre as áreas da construção e do terreno objetos de lançamento tributário.
O conceito legal de valor venal, base de cálculo do imposto, no Município de São Paulo, há de ser buscado na Lei nº 10.235/86, afastando-se de vez a interminável confusão entre o valor de mercado, ou da efetiva transação imobiliária, com o valor venal que resulta da aplicação da lei de regência da matéria.
A disponibilização, pela Prefeitura, com efeito vinculante, do valor venal de cada imóvel cadastrado, por meios eletrônicos e periodicamente reajustável com base em pesquisas de mercado, como determina da legislação do Município de São Paulo, é absolutamente inconstitucional por implicar afastamento da lei de regência da matéria e conseqüentemente vulnerar o princípio da legalidade tributária. A coleta de dados servem para embasar o projeto de lei de apuração do valor venal, nunca para efetuar o lançamento, que é procedimento administrativo vinculado.
SP, 05-05-08.
Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.
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