Violência e criminalidade: Um estudo dos dados existentes em Teresina – PI

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Resumo: O presente trabalho visa analisar as fontes de informações a respeito da criminalidade em Teresina, demonstrando como são escassas e desorganizadas, o que leva a uma dificuldade de planejamento e implementação de políticas públicas que possam ser direcionadas na prevenção e combate à criminalidade. Outrossim, aponta os locais e horários onde há o maior índice de criminalidade, quais os principais crimes cometidos, causas e instrumentos utilizados. Ainda, traça um perfil das vítimas e criminosos. Por fim, aponta quais as causas e conseqüências da falta de uma compilação dos dados sobre a criminalidade na capital piauiense.[1]


Palavras-chave: Criminalidade. Violência. Dados. Estatísticas. Teresina


Résumé : Le présent travail vise à analyser les sources d’informations concernant la criminalité dans Teresina, en démontrant comme ils sont insuffisantes et  désorganisés, ce qui prend à une difficulté de planification et mise en oeuvre des politiques publiques qui puissent être dirigées dans la prévention et le combat à la criminalité. De plus, il indique les lieux et les horaires où il y a plus grand indice de criminalité, lequel les principaux crimes commis, causes et instruments utilisés. Encore, il trace un profil des victimes et des criminels. Finalement, il indique lequel les causes et les conséquences du manque d’une compilation des données sur la criminalité dans le capital du Piauí.


Mots-clés: Criminalité. Violence. Donnés. Statistiques. Teresina


Sumário: 1. Introdução. 2. O panorama nacional do crime. 3. A criminalidade em âmbito municipal. 4. As fontes de dados sobre a criminalidade. 5. O diagnóstico da criminalidade em Teresina. 5.1. Padrões Temporais. 5.1.1. Dia da Semana. 5.1.2. Hora. 5.2. Distribuição Espacial. 5.2.1. Cidades Mais Violentas. 5.2.2. Bairros. 5.2.3. Locais. 5.3. Perfil das Vítimas e Criminosos. 5.3.1. Faixa Etária. 5.3.2 .Profissão. 5.3.3. Instrumentos Utilizados. 5.3.4. Motivos. 6. Conclusões.


INTRODUÇÃO


Inicialmente, é importante trazer à baila a pertinência de uma abordagem interdisciplinar em pesquisa quando se tem a violência e a criminalidade como problema, uma vez que estamos diante de um objeto complexo de investigação. Como a violência não é uma, é múltipla, ela pode ser considerada como multifacetada, na medida em que são várias as formas como o comportamento violento pode ser expresso, tais como a violência do Estado, a criminalidade em si, as discriminações raciais ou a violação dos direitos de crianças e adolescentes, etc. Também são várias as suas modulações, diferentes seus atores e diversas as formas onde ela se manifesta, seja em nível interpessoal, familiar ou institucional, seja nos pequenos grupos, nas grandes metrópoles ou entre nações. Entretanto, o aspecto no qual nos reportamos no presente trabalho é a violência representada pela criminalidade. Este objeto vem delimitado aos principais crimes registrados em Teresina – PI, principalmente o homicídio, em torno do qual gira a maior parte da pesquisa.


O crescimento da violência, na maioria das sociedades contemporâneas, vem sendo objeto de reflexão importante entre pesquisadores da saúde coletiva. As mais diversas técnicas têm sido utilizadas, na perspectiva de esclarecer as dimensões do problema, compreender os determinantes a nível coletivo e identificar grupos e populações de risco, contribuindo, assim, para o controle desta que é a mais nova “epidemia” da população brasileira.


A magnitude e a evolução crescente dos homicídios, no Brasil, evidenciam essa causa de morte específica como um dos principais problemas da saúde pública e representam, em última instância, um indicador das condições de vida, dos padrões de relacionamentos e das garantias de cidadania de uma população.


Assim, ao investigar o problema da violência, defronta-se com a complexidade de sua abordagem, uma vez que, ao contrário de muitos outros problemas da área, a violência tem raízes em determinações múltiplas e interrelacionadas, inerentes a diferentes disciplinas e


setores da sociedade.


Seja como for, o que se verifica é a existência de um descaso, beirando quase à insignificância, a respeito dos dados existentes sobre a criminalidade e a violência nas cidades. Não existe, ao menos, uma pesquisa concreta, eficiente e confiável nesse campo. Os dados são tomados um a um, a partir de diferentes pequenas fontes, formando uma colcha de retalhos que nos permite medir os tipos de crime, a quantidade, detectar o perfil das vítimas e criminosos e traçar uma disposição espaço-temporal dos crimes cometidos na nossa cidade.


Tal descaso implica um impedimento ao planejamento de políticas públicas que possam combater a violência e a criminalidade e efetivamente auxiliar a prevenção de tais delitos.


A percepção generalizada da associação entre processos rápidos de crescimento urbano e o incremento na taxas de criminalidade e violência tem sido o grande pilar no qual se apóiam muitos estudos sociológicos sobre a criminalidade na cidade. De acordo com estas teorias, processos rápidos de industrialização e urbanização provocam fortes movimentos migratórios, concentrando amplas massas isoladas nas periferias dos grandes centros urbanos, sob condições de extrema pobreza e desorganização social e exposta a novos comportamentos e aspirações mais elevados, inconsistentes com as alternativas institucionais de satisfação disponíveis. São as rápidas mudanças sociais, o ambiente propício para a expansão da violência e criminalidade nas grandes cidades. É o que ocorre na capital piauiense, por ser a maior cidade do Estado.


A distribuição das mortes violentas, no Brasil, contudo, apresenta características bem definidas, que precisam ser compreendidas se pretendermos entender as características, a velocidade e a qualidade das políticas públicas para enfrentar o problema da violência e das respostas da sociedade civil vem produzindo ao longo desse período.


Ao que tudo indica a solução para a redução da criminalidade e da violência não se dará pela prática de policiamento aleatório, pois não se trata eficazmente de uma atividade preventiva, mas tão somente uma forma de controle, já que os delitos deixam de ocorrer no local e no momento em que está sendo executado, tão somente.


O crime e a violência são praticados, em sua maioria, por sujeitos que são definidos como “marginalizados”, advindos das classes sociais mais baixas. Assim, o tema é muito mais complexo do que parece, uma vez que a prevenção deve se dar no combate ao não surgimento de novos sujeitos que virão a delinqüir. Desta forma, o combate ao crime e a violência deve iniciar com políticas públicas que possibilitem prevenir a não iniciação de crianças e adolescentes ao uso de drogas, ao contato com armas, entre outros fatores. E isso só pode ser feito se existirem dados, informações que ajudem a detectar onde está o cerne do problema e qual a melhor forma de atuação no combate e prevenção do crime e violência. Uma correta compilação e publicidade periódicas são necessárias para que se verifique a dimensão que a criminalidade tomou em nosso território, medir o avanço da violência e identificar quais os principais pontos a serem trabalhados com políticas públicas nessa área. Daí a importância de sabermos as características do crime na nossa cidade e Estado.


2 O PANORAMA NACIONAL DO CRIME


Não é novidade que o Brasil é um dos países com o maior índice de criminalidade do mundo. As taxas de mortes violentas nos principais centros urbanos brasileiros superam as de países que vivem em conflitos armados. Comparando-se os coeficientes de mortalidade por homicídios entre diferentes países, observa-se que, no Brasil, o risco de morrer por essa causa


é quinze vezes o do Canadá, três vezes o dos Estados Unidos e 1,5 vez o do México, chegando a ser 40 vezes superior ao do Japão. A Rússia e a Colômbia, países que atravessam graves crises econômicas e sociais, apresentam taxa superior à do Brasil. O Brasil tem quase 10% dos homicídios do mundo, com 48 mil mortes por ano[2]. O risco de óbito por homicídio no Brasil em 2003 foi de 28 óbitos por 100.000 habitantes.


Essa violência é resultante de vários motivos, principalmente socioeconômicos. Tal fato também está ligado à presença e ao acesso fácil e crescente a armas de fogo, drogas e ao tráfico de armas, que com freqüência envolvem gangues e facções criminosas. Somada a isso, há falta de oportunidades econômicas e educacionais para os jovens em áreas pobres e muitos casos de violência já na infância. Tais fatores, no país que tem o oitavo pior índice de desigualdade sócio-econômica do mundo, alimentam a criminalidade e violência.


A informação geográfica é uma ferramenta eficaz para planejar campanhas de orientação à população e convencer as autoridades competentes e a comunidade a se envolver com a questão em foco. O mapa é um meio eficaz de sensibilizar os órgãos envolvidos com a segurança pública, pois a espacialização das ocorrências de crimes permite uma ação mais eficaz sobre os mesmos. Por isso, apresentamos o mapa abaixo, que apresenta a distribuição espacial das taxas de homicídios por 100 mil habitantes calculadas a partir do Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM (DATASUS) para o período de 1993 a 1995.


Como se pode observar no mapa, existem importantes diferenças entre os estados brasileiros no que se refere às taxas de homicídio. É importante ressalvar que a qualidade dos dados sobre mortes violentas produzidos no Brasil é variável, havendo estados que produzem informações mais qualificadas que outros. Por essa razão, os dados revelam grandes tendências, mas podem não ser precisos caso a caso.


 


Pelo mapa, pode-se observar que as regiões mais violentas se concentram nos grandes centros urbanos como São Paulo e Rio de Janeiro e em áreas onde existem conflitos de terras, como ocorre na região Centro-Oeste do país.


Em seguida, observemos o gráfico com os mesmos indicativos, quase uma década depois. Ele apresenta características bem parecidas, porém os números são um pouco alterados.


 



Ao fazer uma comparação do mapa 1 com o gráfico 1, pode-se perceber que, com o passar do tempo, o problema tornou-se mais sério e generalizado no país. Entretanto, existem alguns estados nos quais a violência, quando medida pela taxa de homicídios, apresenta-se muito aquém da média nacional – é o caso do Piauí. Por outro lado, em menos de uma década, a taxa de homicídios registrada no estado do Piauí teve um aumento significativo, passando de 4,58 para os 10,6 registrados em 2002.


Entretanto, ao se comparar a evolução taxa de homicídios entre os anos de 2002 a 2008, pode-se verificar que em algumas áreas do país houve uma redução nas taxas de homicídio, como é o caso do nosso Estado, onde se registrava um índice de 10,6 em 2002, que minguou para 6,36 na maior parte do Estado em 2008. Mesmo nas áreas mais violentas, o índice não teve um aumento significativo, ficando praticamente estável na faixa dos 10,0.


O que ocorre, no entanto, tanto em âmbito nacional como em outros países, é que a maior parte das ocorrências criminais sequer ingressa no Sistema de Justiça Criminal. São as chamadas cifras negras da criminalidade, que não são tão facilmente mensuradas. Os poucos estudos existentes, especialmente em termos de Brasil, não assumem uma amplitude nacional, restringindo-se, na maioria das vezes, a análises localizadas e regionalizadas, o que demonstra um certo descaso dos órgãos de segurança em buscar identificar os reais índices de criminalidade. As tentativas de se dimensionar o quantum das cifras negras são embasadas em projeções a partir de pesquisas de vitimização realizadas com a população de uma determinada área, onde as pessoas são indagadas se já foram vítimas de algum delito, qual espécie de delito, se procuraram a polícia para registrar a ocorrência, etc.


No Brasil fazer esse tipo de análise é inviável, pois aqui não se realizam pesquisas de vitimização periódicas em nível nacional, com metodologias padronizadas, mas apenas levantamentos pontuais e descontínuos em duas regiões metropolitanas do país. Os únicos dados nacionais disponíveis são antigos – as informações da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) realizada anualmente pelo IBGE, que em 1988, e só nesse ano, incluiu no seu suplemento algumas perguntas sobre vitimização. Simplesmente nunca mais se investiu na tentativa de estimar o volume de crimes cometidos em todo o Brasil – o que, já por si, atesta o descaso com que essa área tem sido tratada e a falta de base para qualquer avaliação objetiva da eficácia do Sistema de Justiça Criminal neste país[3].


Somam-se às ocorrências criminais que não são registradas no Sistema de Justiça Criminal, e que jamais serão objeto de persecução penal pelo Estado, aquelas que, apesar de adentrarem ao referido Sistema, se perdem em seus meandros.


Entretanto, em 2002, durante o processo de eleições presidenciais, o Partido dos Trabalhadores apoiou a elaboração de um Programa Nacional de Segurança[4], que resultou de um amplo processo nacional de consultas e contou com a participação de mais de cem de especialistas. Pela primeira vez, o país conta com um programa elaborado a partir de um diagnóstico sistemático e uma visão estratégica do problema da violência, com a preocupação de combinar políticas sociais e preventivas com políticas policiais e repressivas e de controle


e modernização das Polícias. O programa preconiza o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), por meio do qual trabalhariam integradas as polícias estaduais, a polícia federal e as guardas municipais, compartilhando informações, bases de dados e cadastros e planejando e executando suas ações.


Para ilustrar uma parte do que sejam as informações a respeito da criminalidade e violência no nosso país, tomamos o crime de homicídio, um dos principais crimes cometidos em todo o país, para demonstrarmos para onde apontam os índices de criminalidade registrados: há uma predominância das classes mais baixas no envolvimento, seja como vítima, seja como autor, nos crimes que são registrados e quantificados nos escassos bancos de dados existentes a esse respeito. 


 


De acordo com o gráfico acima, os jovens pobres, predominantemente negros, moradores de favelas e das periferias dos grandes centros são os principais suspeitos da polícia. A distribuição das próprias operações policiais são variáveis por bairro, predominando as abordagens a pé na rua, com revistas corporais, nas áreas pobres e as “blitz” de automóveis, quase sempre sem revistas corporais, nas áreas mais ricas. Assim, pode-se afirmar que as variáveis cor e idade, combinadas, são um fator de risco para ser considerado suspeito pela polícia.


Paralelamente à idade, estudos recentes têm identificado a existência de uma dramática concentração de mortes violentas na população negra, indicando que a distribuição desigual de riquezas e recursos sociais como educação, saúde e saneamento entre brancos e negros no Brasil, acaba por provocar outro tipo de desigualdade: aquela na distribuição da morte violenta. Assim, são os negros e, entre estes, os mais jovens, as vítimas preferenciais da violência letal.


As taxas de homicídios para negros são mais altas em todas as idades, embora muito mais acentuadas entre os 14 e 19 anos, faixa em que os números aumentam sistematicamente. Enquanto a diferença é de 2,8% aos 13 anos de idade, esta sobe para 10,3% aos 14 anos, e 17,2% aos 19 anos de idade. Em seguida, a diferença vai diminuindo, chegando a 6% depois dos 26 anos e a menos de 1% depois dos 48 anos de idade.[5] Quando observamos apenas a população masculina, os contrastes são ainda mais acentuados.


Para alguns analistas, está em curso, no país, um verdadeiro genocídio de jovens pobres, sobretudo negros, decorrente da expansão veloz das dinâmicas criminais e do acesso ilimitado às armas de fogo.[6]


Finalmente, é preciso sublinhar que a violência atinge diferentemente a sociedade. Por exemplo, homens e mulheres: enquanto os homens são as principais vítimas de homicídios dolosos, as mulheres são as principais atingidas por lesões dolosas.


Além disso, há muita subnotificação desses crimes, sobretudo se pensarmos que os principais autores de agressões contra a mulher são os próprios maridos ou parceiros. Ademais, a maior parte dos casos de violência contra a mulher fica invisível nos prontuários médicos do sistema público de saúde. Apenas 10% das mulheres que passaram por postos de saúde, no período de um ano, foram registradas como vítimas de violência sexual doméstica. No entanto, em entrevistas pessoais, verificou-se que este percentual subia para 57%.


O mesmo ocorre quanto ao crime de homicídio, que atinge mais a população masculina, principalmente os jovens entre 15 e 24 anos, do que as mulheres. O gráfico seguinte ilustra bem o que acabamos de afirmar:


 


Segundo esses dados, enquanto o homicídio entre as mulheres não supera a marca de 10 por 100 mil habitantes, entre os homens esse índice chega a atingir absurdos 90 por 100 mil habitantes.


3 A CRIMINALIDADE EM ÂMBITO MUNICIPAL


A criminalidade em Teresina, capital do Piauí, aumenta a cada dia, motivada naturalmente pelo seu crescimento (atraindo bandidos de outros estados) e também pelo aumento da população pobre, que se acumula na periferia, fruto da ausência de políticas públicas eficientes voltadas a diminuição da pobreza no Estado e que devem ser executadas pelo governo.


“A cidade de Teresina, no Piauí, em 11.04.2005 foi classificada como a 20ª cidade mais segura do país, com risco de homicídio a cada 100 habitantes na escala de 24,21%. É um dado, se comparado a inúmeros estados brasileiros como o Rio de Janeiro e São Paulo que tem alarmantes 60%, bastante tranqüilo. Sendo assim, a prori seria uma cidade tranqüila.[7]


De acordo com uma pesquisa realizada pela assessoria técnica da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Piauí, os principais crimes cometidos na capital piauiense são o furto, o roubo, a lesão corporal, o estelionato, a tentativa de homicídio e o homicídio doloso, conforme demonstra a tabela a seguir:


 


Uma outra fonte de dados sobre o crime em Teresina vem das estatísticas disponibilizadas mensalmente pelo Sistema de Procedimentos Policiais – SisProceP da Polícia Civil do Estado do Piauí. Através de planilhas estatísticas (anexo A), cada distrito policial da capital que tem disponível o sistema de informatização lança os dados referentes às ocorrências criminais registradas em sua circunscrição e os encaminha à Delegacia Geral da Polícia Civil, que compila os dados recebidos por todos os DPs e os lança no sistema SisProceP. Abaixo o demonstrativo referente ao mês de Agosto de 2010:


 


O município de Teresina apresenta algumas regiões que podem ser denominadas de favelas ou assentamentos. Essas regiões se distinguem por serem locais onde a população residente apresenta uma baixo “status socioeconômico”, são regiões menos privilegiadas por não serem assistidas, diretamente, por instituições de proteção social tais como posto de saúde, escolas, creches, e até mesmo postos policiais. Esta ausência do Estado conduz a níveis de relações pouco convencionais.


Como anteriormente mencionado, a criminalidade violenta cresceu predominantemente em favelas e bairros pobres das periferias urbanas. É nesses territórios pobres e carentes de serviços públicos que se registram os mais altos índices de violência letal. Nas cidades brasileiras mais violentas é possível identificar uma geografia da morte, em que as maiores vítimas são jovens negros e pobres.


Muitos acreditam que a violência, quando medida pelos homicídios, tem correlação direta com a desigualdade e a pobreza. Outros ligam a violência homicida a falta de emprego e ao subdesenvolvimento. Mas, a maior correlação entre uma variável e o homicídio se dá com o aspecto institucional, ou seja, governos responsivos na área da segurança pública tem papel decisivo para a redução da violência homicida. desmistificação esteve ligada a questão da pobreza e da desigualdade. Por exemplo, houve uma redução da concentração de renda medida pelo Gini[8] e pela renda domiciliar per capita, seguida de maior investimento em programas de transferência de renda e maior inserção dos pobres na classe média. Mesmo assim, os homicídios continuaram sendo praticados num ritmo bastante acelerado.


4 AS FONTES DE DADOS SOBRE A CRIMINALIDADE


Como anteriormente mencionado, são poucos os trabalhos quantitativos sobre crime no Brasil. As principais fontes de dados sobre crime e violência no Brasil são: o Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde, os registros das polícias civil e militar, as pesquisas de vitimização, o Anuário Estatístico do IBGE e os registros do Sistema Judicial.


há uma escandalosa – e negligenciada – defasagem entre a relevância da segurança pública e a carência de estudos especializados, analíticos ou propositivos. Segundo o autor, há uma produção crescente, ainda que insuficiente, voltada para o diagnóstico analítico da violência e da criminalidade, mas uma ausência quase absoluta de trabalhos sobre políticas públicas de segurança. As conseqüências dessa ausência, combinadas com o desdém que as fundações de apoio à pesquisa devotam ao campo da segurança pública, são a falta de acúmulo de conhecimentos especializados e massa crítica para o debate. pouco se avançou no Brasil, até mesmo pela ausência de uma cultura investigativa nas polícias brasileiras.


O Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do DATASUS é gerido pelo Centro Nacional de Epidemiologia (CENEPI). Trata-se de uma base de micro-dados que, aos efeitos das análises sobre crime, permite calcular taxas de mortalidade por homicídios para qualquer nível de agregação. Existem também no Brasil dados compilados pelas policias civil (polícia judiciária, ou seja com função de apurar os crimes cometidos) e militar (encarregada do policiamento ostensivo e preventivo) de alguns estados. É o caso do Piauí, onde têm sido geradas estatísticas anuais para diversos tipos de crimes, tanto contra a pessoa quanto contra o patrimônio, entre eles roubo, furto, homicídios, estupros etc.


Quanto às pesquisas de vitimização, a primeira de que temos notícia no Brasil é a pesquisa incluída no suplemento sobre Participação Político-Social da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE de 1988.


Além dos dados de mortalidade, das estatísticas policiais, e das pesquisas de vitimização, vale mencionar, finalmente, os dados do Anuário Estatístico do IBGE e os registros do Sistema Judicial. Nos anuários do IBGE são apresentados dados sobre reclusos em presídios, pelo menos desde 1947 (não nos foi possível consultar anuários anteriores) e até 1989, para todos os estados da federação.


Quanto aos registros do Sistema Judicial, eles permitem analisar, segundo Vargas (2000), a incidência da criminalidade e da sua repressão através de estatísticas derivadas dos autos de processos e de fichas de controle interno das organizações judiciais sobre o andamento dado aos processos.


As instituições policiais, outrossim, não se utilizam nem repassam entre si as informações estatísticas que coletam como ferramenta de combate e prevenção à violência. Além disso, o detalhamento das poucas informações que se tem é ínfimo, não se prestando à utilização para elaboração de políticas preventivas integradas. É o caso, por exemplo, dos dados acerca da criminalidade coletados pela Polícia Civil do Piauí, e centralizados no DPJ – Departamento de Polícia Judiciária. Diariamente alguém da Delegacia Geral, geralmente lotado no DPM – Departamento de Polícia Metropolitana, via telefone, solicita dos distritos policiais e delegacias especializadas as ocorrências criminais relativas ao dia anterior, as quais se restringem, exclusivamente, à espécie criminógena e o respectivo quantitativo.


Essa sistemática revela-se ineficaz e deficiente por vários aspectos. Em função da inexistência de uma padronização nos distritos, é muito comum a utilização de tipologias diversas para um mesmo crime, por exemplo, “agressão física” / “lesão corporal”, “furto qualificado” / “arrombamento”, “roubo qualificado” / “assalto” etc. Outro aspecto que depõe contra a atual sistemática é a fragilidade das informações, as quais podem ser repassadas pelos distritos de forma incorreta, ou ainda, nas etapas seguintes serem manipuladas de forma indevida. Por fim, o simples indicativo do quantitativo de crimes é insuficiente para se traçar um perfil da criminalidade numa determinada área. Diversos outros dados devem ser coletados para que, a posteriori, possam ser submetidos a diversas análises estatísticas, visando à produção de informações úteis à gestão e planejamento das políticas públicas de segurança por parte dos órgãos institucionalmente criados para tal desiderato.


Ressalta-se, ainda, que essas informações, mesmo incipientes, não são repassadas de forma sistemática pelas Delegacias situadas na área metropolitana e no interior do Estado.


Depreende-se, pelo exposto, que o ponto de partida para que a Polícia Civil possa dispor de informações criminais consistentes, transparentes e de acesso célere por todos os gestores de Segurança, será a implantação do Sistema de B.O. Eletrônico em todos as Unidades Policiais do Estado. Nesse sentido, implementamos e já se encontra em pleno funcionamento referido sistema em 06 (seis) unidades da capital, com mais de 25.000 ocorrências já registradas. Visando à expansão desse sistema a todas as unidades da capital, apresentamos projeto à SENASP – Secretaria Nacional de Segurança Pública, no mês de Setembro/2003, no qual postulamos recursos para a aquisição de antenas / rádios que possibilitarão a integração lógica de todos os distritos / especializadas. Para o próximo ano, estamos projetando a conexão das delegacias metropolitanas e regionais.


Uma das limitações desta base de dados, que se restringe aos crimes que envolvem mortes, é que nem sempre os óbitos são apropriadamente classificados como homicídios, ou seja, uma parcela destes acabam somando-se às cifras das mortes por lesões em que se ignora se foram acidental ou intencionalmente infligidas.


Um outro problema associado aos dados do SIM é o de sub-registro de ocorrências, isto é, o fato de que há mortes sem registro nenhum. Segundo Levin (2000), não existem estimativas do nível de sub-registro dos óbitos por causas externas), mas sabe-se que ele tende a ser baixo nas áreas urbanas e maior nas áreas rurais e mais carentes.


Os dados registrados pelas polícias também sofrem do problema de “erro de medição”. Como mencionado anteriormente, há problemas tanto de sub-denúncia quanto de sub-registro de crimes. Principalmente quando a confiança da população no sistema policial e judicial é reduzida, sabe-se que um grande número de crimes não é denunciado à polícia.


Há também seletividade por parte desta última (em alguns casos associada a simples deficiências administrativas) quanto à escolha das ocorrências devidamente registradas.


Com base nas evidências internacionais, espera-se que a incidência da sub-denúncia seja particularmente elevada no caso de crimes menores, crimes sexuais e violência doméstica.


Outra crítica aos dados coletados pelas polícias é seu baixo nível de padronização.


A explicação para tanto é que a existência de muitas forças policiais sem centralização alguma acaba por favorecer a aplicação de critérios devidos a fatores locais. Além disso, dentro da mesma força policial podem existir critérios diferenciados para classificar uma mesma ocorrência.


Dados os mencionados problemas nas fontes oficiais de dados, uma alternativa é o uso de estimativas da incidência do crime baseadas em pesquisas de vitimização. Trata-se de pesquisas por amostra de domicílios com perguntas específicas sobre os episódios de vitimização dos entrevistados. Entre as vantagens desta fonte de dados, incluem-se a cobertura de crimes não denunciados à polícia e a inclusão de informações detalhadas sobre as características das vítimas e não vítimas (e seus respectivos domicílios), o que permite estudar fatores de risco pessoais e familiares. Em menor medida estas pesquisas também incluem informações sobre os vitimários e sobre a motivação e o contexto da vitimização.


Entre as limitações das pesquisas de vitimização contam-se a sua dependência em relação à memória do respondente  e, principalmente, o fato de que a cobertura e periodicidade das mesmas é muito limitada. No Brasil não existe um sistema regular de produção periódica desse tipo de estatística. Além disso, que é praticamente impossível comparar os dados das pesquisas de vitimização existentes devido a diferenças metodológicas tanto nos questionários quanto, principalmente, no desenho da amostra, e na escolha do período de referência e da população alvo[9].


Entre outras vantagens, as pesquisas de vitimização permitem avaliar a percentagem de crimes denunciados à polícia.


A quarta fonte mencionada, o Anuário Estatístico do IBGE, fornece dados adicionais relativos a prisões e condenações. Entretanto, eles não parecem ser completamente confiáveis, dado que vários estados apresentam, de um ano para outro, saltos gigantescos nos números absoluto de prisões. Além disso, as séries apresentam descontinuidades consideráveis. Finalmente, os dados do Sistema Judicial Criminal apresentam problemas relacionados principalmente com as dificuldades de acesso aos mesmos.


5 O DIAGNÓSTICO DA CRIMINALIDADE EM TERESINA


Neste capítulo são publicadas as estatísticas relevantes acerca da violência e criminalidade no município, bem como de demais fatores que afetam a vulnerabilidade no espaço urbano e a sensação de segurança da população.


As estatísticas e indicadores sociais aqui apresentados servem essencialmente a três grupos de interesses distintos e complementares: aos cidadãos, para avaliarem uma dimensão crucial de sua qualidade de vida; aos que detêm o poder de decisão e implementação de políticas, para planejamento das ações, distribuição dos recursos; e aos especialistas e pesquisadores de políticas públicas, para o desenvolvimento de estudos acerca dos fenômenos, de suas causas e dinâmicas próprias.


Com a divulgação de tais dados, os órgãos competentes procuram cumprir seu papel de atuar como fonte de informações sobre os problemas elencados, intensificando a sua disseminação para a construção de políticas mais capazes de atingir seus objetivos na área.


A mortalidade por homicídios tem sido considerada um indicador significativo da violência social, relacionada a crescentes desigualdades sociais e econômicas, retração do papel do Estado nas políticas públicas, precariedade no desempenho das medidas de segurança pública e de justiça. Juntos, esses fatores levam ao predomínio da impunidade, à organização de grupos de extermínio, à organização do narcotráfico e de grupos de seqüestradores, à posse de armas, entre outros processos.[10] Por isso, buscou-se ilustrar o diagnóstico da violência em Teresina baseando-se principalmente pelo crime de homicídio.


Vemos nos gráficos a seguir a evolução da criminalidade e da violência na cidade a partir dos principais indicadores criminais, baseados nos registros feitos nas delegacias da capital.


5.1 PADRÕES TEMPORAIS


Como já foi dito anteriormente, o crescimento da violência e, principalmente, das mortes por homicídio reflete o aprofundamento ou intensificação da violência estrutural. Os determinantes desse tipo de comportamento são principalmente o crescimento da desigualdade sócio-econômica; os baixos salários e renda familiar que leva à perda do poder aquisitivo; ausência de políticas públicas integradas e condizentes com as necessidades da população em relação à saúde, educação, moradia e segurança; priorização do desenvolvimento econômico em detrimento do social com sacrifício para população e maior ônus para os pobres; intenso apelo ao consumo, conflitando com o empobrecimento do país.


Um outro fator, entretanto, merece destaque na influência da ocorrência de crimes em Teresina – o fator temporal, que demonstra o padrão de comportamento dos criminosos de acordo com os dias e horas mais propensos ao cometimento de crimes. A população demonstra-se cada vez mais preocupada com esse fator – segundo uma pesquisa encomendada pelo Ministério da Justiça com 1.600 pessoas em dez capitais cujo objetivo foi avaliar o impacto da criminalidade na população, 50% dos moradores das capitais evitam sair à noite com medo dos assaltantes, 38% já não circulam por algumas ruas que consideram perigosas e 24% mudaram o trajeto até a escola ou até o trabalho para se esquivar do contato com ladrões.


5.1.1 DIA DA SEMANA


Ao tomarmos como padrão de análise para o crime de homicídio os dias da semana de sua ocorrência, verificamos, de acordo com o gráfico, que os finais de semana são os períodos em que há um alarmante aumento no número de casos. Durante os dias úteis, as taxas de ocorrência de homicídios oscilam entre os 10% e os 12%, enquanto nos fins de semana, chegam a dobrar, atingindo os 24%.


 


5.1.2 HORA


O fator hora também é um ponto determinante para a constatação dos horários em que é maior o risco de ocorrência de crimes. Determinados horários são mais propícios à ocorrência de crimes, e merecem ser identificados para que um policiamento de melhor qualidade e mais estratégico possa ser planejado, além de outras medidas a serem adotadas.


Exemplo disso se deu com o chamado Boa Noite Teresina, que em 2005 determinou o fechamento de bares, restaurantes, casas de shows e similares às 02h00 de domingo a quinta-feira e às 03h00 nas sexta-feiras, sábados e feriados. Essa foi uma medida de segurança que baseou-se no fator horário para buscar uma maior segurança à população teresinense.


Conforme o demonstrado no gráfico abaixo, aproximadamente 80% dos homicídios registrados na área do 8º DP ocorrem entre as 18h00 e as 03h00.


 


Em crimes contra o patrimônio, como o furto e o roubo, as estatísticas são bem parecidas: novamente o intervalo entre as 00h00 e as 02h59min aparecem como picos da ocorrência de furto. Esse intervalo de tempo junto com o intervalo que vai das 09h00 às 11h59min somam juntos 38% das ocorrências.


 


Para os delitos de roubo, praticamente 50% acontecem entre as 18h00 e as 03h00. Isso pode ser verificado no gráfico abaixo:


 


5.2 DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL


A necessidade de mudar o enfoque de investigação em relação aos homicídios para o ambiente social e não apenas para os fatores de risco individuais da vítima ou do criminoso, em relação aos homicídios, tem levado a que estudos epidemiológicos incorporem o conceito de espaço como categoria de análise, ao estudar a violência. O desenvolvimento teórico do conceito de espaço social, vem permitir uma melhor compreensão dos processos sociais envolvidos na rede causal da violência por homicídio.


5.2.1 CIDADES MAIS VIOLENTAS


Como a capital concentra a maior parcela da população do Estado, a proporção de crimes aí ocorridos é também proporcionalmente maior do que nas cidades do interior juntas. É o que se verifica pelos dados demonstrativos da ocorrência do crime de homicídio em alguns meses entre os anos de 2007 e 2009. A capital, Teresina, sozinha concentrou quase 50% do número de homicídios ocorridos no Piauí em números absolutos.



5.2.2 BAIRROS


Não se pode avaliar se a incidência de criminalidade é maior ou menor do que a de outra área nos apegando, exclusivamente, ao caráter absoluto dos números. Com certeza, na maioria das vezes, a área de maior densidade populacional será aquela com maior ocorrência de delitos. Dessarte, é por isso que o 8º DP por abranger a maior densidade populacional na sua área é o distrito onde o número absoluto de ocorrências é maior.



No ano passado, conforme pesquisa realizada pelo Sinpoljuspi, Teresina registrou 11 assassinatos, o mesmo número dos demais municípios do interior do Estado e litoral, juntos. Na Capital, as zonas Norte e Sudeste ficaram rigorosamente empatadas com 18% enquanto a Leste registrou a metade dos crimes das duas zonas citadas, ou seja, 9%.


Apesar dos números variarem com freqüência, num apanhado geral dos últimos anos, a zona Sul sempre fica em primeiro, na média geral, mesmo ela tendo registrado apenas 7% de todos os homicídios dolosos ocorridos na Capital no mês de julho deste ano.


 A pesquisa “Perfil dos Homicídios Dolosos do Piauí” é realizada mensalmente pelo Sinpoljuspi com base nas informações publicadas pelos meios de comunicação do estado, como jornais impressos, TVs e portais de internet.


Com relação aos números absolutos, aconteceu uma queda no total de assassinatos no Estado em agosto em comparação com o mês de julho, ambos de 2009, que registraram, respectivamente, 22 e 28 crimes.


 


Ao colocarmos em análise os somente os bairros do maior DP da zona sul, o 8º, verificamos que o Itararé é o campeão de ocorrências dos três crimes mais comuns da região – o homicídio, o furto e o roubo.


 


 



5.2.3 LOCAIS


Com relação aos locais onde mais ocorrem crimes na área do 8º DP, há uma predominância das vias públicas em detrimento de casas e prédios comerciais para os delitos de homicídio e roubo. Apenas quanto ao delito de furto, o índice de residências atingidas foi maior que os demais locais.



 



5.3 PERFIL DAS VÍTIMAS E CRIMINOSOS


Outros fatores, que não somente o contingente populacional, são decisivos para a mensuração da maior ou menor incidência de crimes em uma determinada região, como, por exemplo: o nível educacional da população, a existência de infra-estrutura básica de saneamento e urbanização, a taxa de ociosidade etc.


Segundo os padrões analisados, criminalidade e violência são fenômenos cuja origem se deve essencialmente a fatores de natureza econômica: privação de oportunidades, desigualdade social e marginalização, os quais constituiriam estímulos para o comportamento criminoso.


5.3.1 FAIXA ETÁRIA


Uma outra característica muito intensa e preocupante no panorama brasileiro é a concentração dos homicídios na população jovem. Na faixa etária dos 15 aos 24 anos, as taxas são extraordinariamente mais altas do que as verificadas para a população como um todo.


 



5.3.2 PROFISSÃO


Fazendo uma análise do problema da violência, em Teresina, investigado no presente trabalho, pode-se observar que a maior parcela das vítimas de homicídios são empregados, ao contrário dos autores dos crimes, que geralmente são os excluídos do setor


formal da economia e que terminam por se incorporarem no mundo do tráfico de drogas como forma de sobrevivência, ou a integrar gangues de delinqüentes na cidade.


 



 5.3.3 INSTRUMENTOS UTILIZADOS


Sem dúvida, a combinação explosiva entre armas e drogas foi determinante para a escalada das taxas de criminalidade violenta nos grandes centros urbanos[11].8 A posse de arma de fogo, seja através da compra legal ou através do circuito ilegal, vem levando a sociedade civil cada vez mais a se armar. A constatação empírica da expansão generalizada da mortalidade por armas de fogo se contrapõe às afirmações corriqueiras de que a concentração da violência ocorre nos bolsões de pobreza das metrópoles brasileiras. O problema deve ser abordado sob diferentes aspectos, enfocando questões tanto em relação à proliferação de armas entre a população, vinculada ao contrabando internacional de armas, devido à expansão do tráfico de drogas e exclusão de oportunidades sociais, como no que se refere às relações e interações dos jovens com seu ambiente, na família, na escola e na sociedade.


Estudo realizado pela ONU revelou que o Brasil é o país com o maior percentual de homicídios por arma de fogo, tendo um crescimento de 117%, no período de 1980 a 1996. Esses números podem ser traduzidos para a realidade teresinense, onde se verificou que as armas de fogo ocupam o primeiro lugar entre os instrumentos mais utilizados para se cometer crimes.


 



5.3.4 MOTIVOS


De acordo com a pesquisa, a maioria dos homicídios tem como suposto motivo brigas de gangues e uso de drogas e bebidas alcoólicas.


Em alguns casos, o assassinato é o desfecho de uma desavença entre vizinhos ou o saldo de uma briga entre marido e mulher. Em outros casos, a vítima devia dinheiro ao assassino ou a alguém para quem ele trabalha. No terreno da droga, é muito comum a cobrança de dívidas com balas na testa do inadimplente. O gráfico abaixo demonstra claramente a proporção de ocorrência de cada um desses motivos nos crimes de homicídio ocorridos em Teresina:


 



CONCLUSÕES


Muitos estudos sociológicos convencionais sobre cidades apóiam a percepção generalizada da associação entre processos rápidos de crescimento urbano e o incremento nas taxas de criminalidade e violência. De acordo com estas teorias, processos rápidos de industrialização e urbanização provocam fortes movimentos migratórios, concentrando amplas massas isoladas nas periferias dos grandes centros urbanos, sob condições de extrema pobreza e desorganização social e exposta a novos comportamentos e aspirações mais elevados, inconsistentes com as alternativas institucionais de satisfação disponíveis. São as rápidas mudanças sociais, o ambiente propício para a expansão da violência e criminalidade nas grandes cidades.


Embora a criminalidade esteja presente em toda a cidade de Teresina, ela se distribui de forma desigual no espaço e no tempo. Homicídios seguem um padrão temporal ocorrendo, em sua maioria, à noite e nos finais de semana. No espaço, pode-se detectar áreas na cidade que são de maior risco de crime. Percebe-se que as taxas de homicídio aumentaram progressivamente e apresentam uma forte tendência em se manter neste ritmo. Esta tendência de crescimento pode ser verificada tanto para os dados da Polícia Civil quanto da Militar.


Os resultados obtidos no presente estudo evidenciam uma distribuição desigual da violência no espaço urbano analisado, o que implica numa divisão da cidade em áreas de maior e menor risco. Pode-se pensar, diante dos resultados, que os índices de criminalidade e as chances de ser vítima de algum tipo de crime mostram claramente a distinção entre protegidos e socialmente excluídos.


A ocupação do espaço não ocorre de forma aleatória e, sim, revela desigualdades de condições de vida que, por sua vez, intermediam o risco diferenciado de determinados grupos sociais serem alvos preferenciais da violência. As diferenças na organização do espaço no município de Teresina e interior refletem processos sociais específicos, como industrialização, urbanização, marginalidade, desigualdade socioeconômica. O aprofundamento das contradições sociais, da concentração de renda e o aumento, em termos relativos e absolutos da pobreza e da miséria, constituem o pano de fundo para o aprofundamento da violência estrutural. A emergência de outros processos sociais decorrentes da organização social, como a inserção na economia informal, geram situações de exposição ao risco de morte por homicídios, preponderantemente nos homens jovens, de 15 aos 49 anos.


A nossa intenção, ao trazer à baila esses dados e informações, é induzir uma mudança de postura que vislumbre a importância da estatística criminal e, por conseguinte, de toda a sistemática de Gestão do Conhecimento, para que nossa instituições policiais passem a planejar suas políticas e ações de segurança alicerçadas em fontes e dados confiáveis, que, interpretados de forma integrada, sistemática e sistêmica proporcionem um conhecimento capaz de minimizar de forma mais eficaz esse grave problema social que é o crime.


Diante do tema complexo que é a violência, o desenvolvimento das pesquisas científicas e a formulação de indicadores confiáveis constituem passos fundamentais para subsidiar a elaboração de políticas de segurança pública, por sua vez, elemento necessário (ainda que não suficiente) para a solução do problema.


A implantação do banco de dados em grande medida dependerá da capacidade de pressão que a sociedade for capaz de exercer para que o governo federal e os governos locais reconheçam a urgência dos temas da violência e a prioridade da segurança pública por detrás da cortina de silêncio favorecida pela baixa capacidade de vocalização de suas principais vítimas. Com raras exceções,[12] as respostas predominantes dos governos ao fenômeno da violência parecem ser, ainda nesses primeiros anos do novo século, a lentidão de respostas e a naturalização da violência e da criminalidade (especialmente quando ela atinge populações marginalizadas), por um lado; e por outro, os ímpetos de indignação e as ondas de “lei e ordem”,[13] quando de ocorrências criminais rumorosas.


As iniciativas governamentais dos últimos anos, dentre as quais o Plano Nacional de Segurança Pública (PNSP) (que até dezembro de 2000 financiou convênios no valor de R$ 251 milhões – leia a avaliação de um ano do Plano), parecem indicar uma disposição das autoridades em enfrentar o problema. Mas há críticas ao processo.


Em momento algum podemos dar por encerrado qualquer assunto, principalmente quando o que se está em debate é um tema de profunda relevância ao conjunto da sociedade.


Há muito a fazer nesse campo. Políticas corajosas e determinadas de ciência e tecnologia, que recuperem o atraso de quase duas décadas de indiferença em relação ao fenômeno da violência e da criminalidade, que afeta predominantemente jovens pobres das periferias urbanas deste país, podem fazer a diferença.


Pôde-se testar o potencial de utilização de uma metodologia bastante simples, mas que joga luz sobre uma série de problemas relacionados aos fenômenos do crime e da violência. Mais do que sofisticadas ferramentas e modelos, a produção de informações na área de justiça criminal e segurança pública carece de investimento na criação de uma política de tratamento e comunicação dos dados disponíveis. É óbvio que todos os instrumentos analíticos devem e podem ser usados, mas soluções simples e originais são importantes passos na transformação do modelo de gestão


O escopo precípuo do presente estudo residiu, exatamente, em a partir de uma constatação fática buscar, através de pesquisa de campo, identificar fatores impeditivos a uma melhor performance da Polícia Civil piauiense, no tocante a essa figura delituosa, para, ao final, pugnar-se por proposições não definitivas e nem integrais, mas atenuantes e minorantes, contribuindo-se assim na reversão desse lastimável quadro de inoperância e descrédito junto à sociedade teresinense.


 


Referências:

ANDRADE, Maria Margarida de. Introdução à Metodologia do Trabalho Científico. 2 ed. São Paulo: Atlas, 1997.

ANDRADE, Mônica V. e Marcos Lisboa. 2000. Desesperança de Vida: Homicídio em Minas Gerais, Rio de janeiro e São Paulo: 1981 a 1997. Mimeo, Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro.

ARAÚJO JR., A.F. 2001. Crime e Economia no Brasil: dois ensaios empíricos. Dissertação de Mestrado, CEDEPLAR/UFMG, julho de 2001.

ARAÚJO JR., A.F. e Pablo Fajnzylber. 2000. “Crime e Economia: um Estudo das Microregiões Mineiras”. Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v. 31, n. especial.

ARAÚJO JR., A.F. e Pablo Fajnzylber. 2001. O Que Causa a Criminalidade Violenta no Brasil? Uma Análise a Partir do Modelo Econômico do Crime: 1981 a 1996. Texto de Discussão nº162, CEDEPLAR/UFMG, setembro de 2001.

BITTAR, Eduardo C. B. Metodologia da Pesquisa Jurídica: Teoria e Prática da Monografia Jurídica para os cursos de Direito. São Paulo: Saraiva, 2001.

CARRERA-FERNANDEZ, J. e Pereira, R. 2000. A Criminalidade na Região Policial da Grande São Paulo sob a Ótica da Economia na Criminalidade. Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v. 31, n. especial.

MENDONÇA, M.J.C. 2001. Um Modelo de Criminalidade para o Caso Brasileiro. IPEA/DF. Mímeo.

PIQUET, Leandro e Pablo Fajnzylber. 2001. A Criminalidade nas Regiões Metropolitanas do Rio de Janeiro e São Paulo: Determinantes da Vitimização e Políticas Públicas. In Pablo Fajnzylber, Daniel Lederman e Norman Loayza, Eds. 2001c. Crimen y Violencia em America Latina.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico. 22 ed. rev. e ampl. de acordo com a ABNT – São Paulo: Cortez, 2002.

SOARES, Luiz Eduardo. Pacto pela paz: o consenso possível, novembro de 2003, in: www.luizeduardosoares.com.br.

VARGAS, J.D 2000. Uma Alternativa Metodológica para o Uso e a Interpretação das Fontes de Informações do Sistema de Justiça Criminal. Fórum de Debates, agosto 2000. IPEA

Aumenta a criminalidade no Piauí. Disponível em: <http://istoepiaui.blogspot.com/2008/09/aumenta-criminalidade-no-piaui.html>. Acesso em: 10 de agosto de 2010


Notas:

[1] Monografia apresentada ao Centro de Ensino Unificado de Teresina – CEUT no curso de Especialização em Ciências como parte dos requisitos para a obtenção do título de Especialista em Ciências Criminais. Orientadora: Prof. Msc. Adriana Borges Ferro Moura.

[2] Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Saúde Brasil 2007: uma análise da situação de

saúde. Brasília; 2008.

[3] LEMGRUBER, Julita. Verdades e Mentiras sobre o Sistema de Justiça Criminal. Disponível em: < http://www.cjf.gov.br/revista/numero15/mesaredonda13.pdf>. Acesso em: 10.jul.2004.

[4] http://www.mj.gov.br/senasp

[5] Informações contidas no estudo A cor da morte, de Gláucio Soares e Doriam Borges, originalmente apresentado no seminário Violência e Racismo, organizado pelo CESec/UCAM no ano 2002 e publicado na Revista Ciência Hoje, outubro de 2004.

[6] Soares, L. E. ( 2003).


[8] O índice de desigualdade de renda de Gini é utilizado para calcular a desigualdade de distribuição de renda mas pode ser usada para qualquer distribuição. Ele consiste em um número entre 0 e 1, onde 0 corresponde à completa igualdade de renda, ou seja, todos têm a mesma renda) e 1 corresponde à completa desigualdade, onde uma pessoa tem toda a renda, e as demais nada têm. O índice de Gini é o coeficiente expresso em pontos percentuais (é igual ao coeficiente multiplicado por 100).

[9] Ver Catão (2000) e Piquet e Fajnzylber (2001).

[10] Minayo MCS. Inequality, violence, and ecology in Brazil. Cad Saúde Pública 1994;10:241-50.

[11] 8 Musumeci (2002) e Lemgruber (2003).

[12] Entre elas, vale mencionar o esforço do governo de Minas Gerais para apoiar um importante processo de modernização, reforma e transparência nas Polícias, com apoio de grupos de pesquisa e entidades civis.

[13] No repertório de “medidas duras para combater” são freqüentes a retomada de temas como: redução da maioridade penal; inclusão de novos delitos na qualificação de crimes hediondos; redução de direitos para os presos e aumento do isolamento; pena de morte.

Informações Sobre o Autor

Laura Castro de Carvalho dos Santos

Advogada, Especialista em Ciências Criminais, em Direito Público e em Direito Privado


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Equipe Âmbito Jurídico

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