Resumo: O presente artigo se dedica ao estudo do desenvolvimento sustentável enquanto alternativa apresentada no final da década de 1980, para solucionar as crises econômicas, sociais e ambientais que se intensificaram a partir do final do século XIX. Para tanto, analisa as crescentes interações do homem com a natureza, as primeiras declarações internacionais relacionadas à proteção do meio ambiente e verifica como a Constituição Federal brasileira de 1988, procede à tutela deste bem comum. Ao final, apresenta o desmatamento como um exemplo de dano ambiental na região Amazônica, capaz de contrariar os preceitos da sustentabilidade.[1]
Palavras-chave: Meio Ambiente. Desenvolvimento Sustentável. Danos Ambientais.
Resumen: Este artículo está dedicado al estudio del desarrollo sostenible como una alternativa presentada a finales de 1980, para resolver las crisis económicas, los factores sociales y ambientales que se han intensificado desde fines del siglo XIX. Se analiza la creciente interacción entre el hombre y la naturaleza, las primeras declaraciones internacionales relacionadas con la protección del medio ambiente y los controles a que la Constitución brasileña de 1988, por lo que el recurso de este bien común. El artículo concluye con la deforestación como un ejemplo de daños ambientales en la región amazónica, capaz de contrarrestar los principios de sostenibilidad.
Palabras claves: Medio ambiente; Desarrollo sostenible; Daños ambientales.
Sumário: Introdução. 1. A Evolução do protecionismo ambiental.2. O meio ambiente e o desenvolvimento sustentável na Constituição Federal de 1988. 3. Declaração do Rio de Janeiro sobre meio ambiente e desenvolvimento de 1992. 4. A aplicabilidade do desenvolvimento sustentável diante dos danos ambientais. Considerações finais.
INTRODUÇÃO
As preocupações com a defesa do meio ambiente surgiram a partir da década de 1960, quando o homem atravessou os primeiros problemas ambientais em razão da industrialização exagerada, que se associaram às mudanças econômicas, sociais e políticas. A partir de então, foram realizados os primeiros estudos e conferências relacionados à economia e meio ambiente.
Em 1987, surge da proposta do desenvolvimento sustentável, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida humana, através do equilíbrio entre crescimento econômico, necessidades sociais e proteção ambiental.
Diante disso, o Direito, enquanto instrumento destinado à regular as relações sociais e tendo em vista o bem comum, não poderia ficar distante das relações do homem com o meio ambiente, porquanto este seja indispensável para a sua subsistência do ser humano.
Portanto, a Constituição Federal de 1988, estabelece a tutela do meio ambiente ecologicamente equilibrado, sob os fundamentos do desenvolvimento sustentável, destacando a proteção ambiental para que as futuras gerações também possam usufruir dos recursos naturais.
De outra parte, embora o meio ambiente esteja disposto constitucionalmente como direito de natureza transindividual, ou seja, de interesse coletivo, nos deparamos com danos ambientais graves na região Amazônica, tais como o desmatamento desenfreado, cujos prejuízos ultrapassam o respectivo limite territorial.
Assim, serão analisados os principais aspectos do desenvolvimento sustentável, e do meio ambiente enquanto patrimônio indissociável da sadia qualidade de vida humana.
1. A EVOLUÇÃO DO PROTECIONISMO AMBIENTAL
Desde os primórdios da humanidade, o homem se relacionava com a natureza para garantir a sobrevivência, por meio dela se alimentava e se protegia das intempéries naturais. De acordo com Duarte, “A existência do homem no planeta sempre se deu com o consumo de bens e recursos a que convencionamos chamar de natureza.”[2]. Assim, a natureza foi compreendida sob uma visão mítica, cujo pensamento perdurou até os primeiros filósofos da Grécia antiga.
Com o surgimento do período áureo da filosofia grega, composto por Sócrates, Platão e Aristóteles, a racionalidade do homem passou a ser mais valorizada do que os fenômenos naturais, despontando as primeiras tendências ao antropocentrismo, em que o homem se torna o ser principal do universo.
Com o advento da Idade Média, foi desenvolvido o sistema feudal e instituída a religião monoteísta, em que se fez uma separação entre Deus, natureza, corpo e alma. Neste período, surge o teocentrismo, em que Deus é a razão de ser do universo. Segundo Duarte, citando Pelizzoli:
“A visão teocentrista impedirá a tentativa de desvendar o mistério da criação, resguardando-se um distanciamento respeitoso, já que a chave dessa descoberta não pode e não deve estar sob o domínio humano”[3].
Nos séculos XV e XVI, os absolutistas visavam o desenvolvimento econômico e o acúmulo de riquezas, para tanto, adotaram a política econômica mercantilista, e intensificaram as rotas marítimas e o comércio voltado à exploração dos recursos naturais.
Com a Revolução científica no século XVII, a ciência se dedicou à compreensão do mundo, concebido como um objeto a ser dominado e de livre disposição pelo homem. Esse período é marcado pelo antropocentrismo, em que os interesses do homem passaram a predominar cada vez mais em detrimento da natureza.
A partir do século XVIII, a sociedade compreende o poder público como inimigo da liberdade individual, em virtude disso, acredita na necessidade de intervenção mínima do Estado nas relações econômicas, para que pudesse exercer o direito natural de decidir os seus interesses e progredir economicamente.
Essa ideologia do liberalismo, também foi fruto da ascensão da classe burguesa, que visava impedir a interferência do poder público na atividade econômica, de modo que, este foi transformado em Estado mínimo, e mesmo enfraquecido, que praticamente se limitava a exercer a proteção contra ameaças externas e a superficial observância da ordem social.
Inicialmente, o Estado liberal correspondeu aos anseios daquela sociedade, conforme Dallari destaca:
“O Estado liberal, com um mínimo de interferência na vida social, trouxe, de início, alguns inegáveis benefícios: houve um progresso econômico acentuado, criando-se as condições para a revolução industrial; o indivíduo foi valorizado, despertando-se a consciência para a importância da liberdade humana”[4].
Com o surgimento da Revolução Industrial, que representa um marco histórico do sistema capitalista, houve um progresso econômico fundamentado no princípio da livre concorrência, que proporcionou um desenvolvimento significativo para os países, principalmente para os do continente europeu.
Contudo, economia e tecnologia se desenvolveram mediante o uso desenfreado dos recursos naturais do planeta, o que fez surgir os primeiros impactos ambientais, como ocorria com as máquinas industriais que precisavam de energia para o funcionamento, e cuja fumaça decorrente da queima de combustíveis, lançava gás carbônico na atmosfera.
A situação se agravou com o advento da Segunda Guerra Mundial, em que a energia nuclear foi responsável por danos ambientais gravíssimos, como os provocados pelo lixo atômico que contamina o meio ambiente e prejudica a saúde do homem, em virtude da elevada radiação do material.
Assim, podemos considerar que a preocupação com o meio ambiente passou a ser manifestada a partir de 1962, com a publicação da obra “Silent spring” (Primavera silenciosa) por Rachel Carson, que condenava o uso do inseticida DDT (diclorodifeniltricloruetano), em razão dos danos que o produto poderia causar à saúde humana. O livro despertou uma visão crítica diante do avanço tecnológico que crescia na década de 60, o que fez os Países refletirem sobre os impactos ambientais, conforme Jacobi explica:
“Rachel Carson mostrou como o DDT penetrava na cadeia alimentar e acumulava-se nos tecidos gordurosos dos animais, inclusive do homem (chegou a ser detectada a presença de DDT até no leite humano!), com o risco de causar câncer e dano genético. A grande polêmica movida pelo instigante e provocativo livro é que não só ele expunha os perigos do DDT, mas questionava de forma eloqüente a confiança cega da humanidade no progresso tecnológico”[5].
Posteriormente, surgiu o Clube de Roma em 1968, composto por cientistas, economistas, políticos, dentre outros pesquisadores, que estudavam o crescimento econômico e populacional diante da escassez dos recursos naturais. Assim, publicaram em 1972, o relatório denominado “Limites do crescimento”.
Tal relatório se dedicou à análise da industrialização excessiva, ou seja, da atividade econômica que utiliza exageradamente os recursos naturais renováveis e os não renováveis, do sistema de “economia de escala”, em que quanto mais se produz, menor é o custo do produto, bem como da degradação ambiental, em razão da exploração do meio ambiente e do lançamento de rejeitos industriais.
Diante dessas análises, concluíram que a solução para a estabilidade econômica e para a proteção ambiental, seria o “crescimento zero”. Essa medida levantada pelo Clube de Roma indicava a necessidade de limitar a produção industrial e a população, no sentido de interromper o desenvolvimento de todos os países, do contrário, o planeta Terra não suportaria mais que cem anos.
Insta acentuar que a idéia do “crescimento zero” levantada pelos pesquisadores do Clube de Roma, apresenta alguns pontos relacionados à teoria de Thomas Malthus, que associava o bem-estar ao crescimento populacional do planeta. O teórico afirmava que sem o controle de natalidade, o homem atravessaria dificuldades como a miséria e a fome, em razão da falta de produção de alimentos.
O relatório “Limites do crescimento” foi apresentado e discutido em 1972, na Conferência da Organização das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, ocorrida em Estocolmo, que contrariando a idéia do “crescimento zero”, enfatizou o desenvolvimento econômico e social como fatores indispensáveis para melhorar a qualidade de vida do homem.
A referida declaração estabeleceu no princípio 1, o direito fundamental do homem à liberdade, à igualdade e ao desfrute de um meio que lhe confira vida digna e bem-estar[6]. A partir de então, o meio ambiente é aceito como condição para que haja dignidade da pessoa humana.
Há de se destacar a importância que esta declaração confere aos recursos do meio ambiente, no sentido de que as gerações presente e futura, possam ser beneficiadas com eles, bem como na preocupação com a capacidade limite de suporte dos recursos naturais renováveis e não renováveis, mencionados nos princípios 3 e 5.
Os recursos naturais renováveis são aqueles em que há presença de vida (bióticos), como a fauna e a flora, cuja observância à capacidade limite de suporte, permite que eles completem o seu ciclo biológico para que possam subsistir. Por sua vez, os recursos naturais não renováveis, como a água, o petróleo e o carvão mineral, são abióticos, e a respectiva capacidade limite de suporte depende da redução do consumo, do reuso e da reciclagem para que possam ser consumidos pelas futuras gerações.
Em 1986, a Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas se reuniu e proclamou a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, consolidando mais duas formas de desenvolvimento capazes de garantir o bem-estar populacional, quais sejam, o cultural e o político.
Segundo Laraia[7], “a cultura determina o comportamento do homem e justifica as suas realizações”. Assim, o desenvolvimento cultural permite que o homem possa manifestar os comportamentos das gerações anteriores, bem como a possibilidade de participar e inserir novas expressões culturais.
O desenvolvimento político está associado à democracia, permitindo ao homem a liberdade de manifestar a sua opinião. É o que ocorre na participação popular em audiências públicas, regidas pela Resolução nº 09/1987 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA)[8], que de acordo com o art. 1º, são exigidas para atividades econômicas que dependem de Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EPIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), a fim de que seja exposto à coletividade todas as informações necessárias a respeito do empreendimento que requereu licenciamento ambiental pelo poder público.
A referida declaração dispõe no artigo 1º que o “desenvolvimento é um direito humano inalienável”[9], o que o eleva à categoria de direito fundamental, porquanto a inalienabilidade corresponde a uma característica desse direito.
Assim, até 1986 o mundo conhecia apenas quatro formas de desenvolvimento: O econômico, o social, o cultural e o político. Este cenário foi transformado em 1987, com a publicação do Relatório “Our Future Common” (Nosso Futuro Comum), pela Comissão Mundial da Organização das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, presidida por Gro Harlem Brundtland, que apresentou a sustentabilidade ambiental como modelo de desenvolvimento capaz de garantir o bem-estar social.
Segundo Milaré, o relatório define que desenvolvimento sustentável é aquele que visa “atender as necessidades e aspirações do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem suas próprias necessidades”[10]. A proposta da sustentabilidade ambiental surge a partir do momento em que o homem atentou que não podia sobreviver e exercer a atividade econômica sem a utilização de recursos naturais. Conforme Juliana Gerent[11] explica, “A atividade econômica vincula-se ao meio ambiente, tanto que, sem este não há aquela”.
O desenvolvimento sustentável tem por objetivo associar o crescimento econômico, tecnológico e social, com a proteção ambiental, a fim de proporcionar melhor qualidade de vida humana e equidade social. Portanto, atribui importância ao uso racional dos bens naturais, de forma que seja evitado o esgotamento, para que as futuras gerações também possam utilizá-los e serem beneficiadas.
A sustentabilidade ambiental está fundamentada em uma teoria tridimensional que comporta o equilíbrio entre as necessidades sociais, os interesses econômicos e a proteção ambiental, de modo que, se uma dessas condições predominar ou se submeter às outras, não há desenvolvimento sustentável.
Assim, surgiu o ecocentrismo, em que as preocupações do homem se direcionam para o meio ambiente, enquanto um bem que precisa ser protegido, para garantia da própria sobrevivência. Desse modo, ao final da década de 80, os países conhecem a nova proposta de desenvolvimento, que fundamentado nesta visão ecocêntrica, apresenta a sustentabilidade ambiental como a solução para os problemas sociais, econômicos e ambientais.
2. O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
A primeira Constituição Federal brasileira que dedicou um capítulo para o meio ambiente foi a de 1988, consagrando-o como um direito fundamental do homem, consoante estabelece o art. 225[12]:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade, o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
Nesse sentido, os direitos fundamentais podem ser de 1ª dimensão, referentes aos direitos civis e políticos; de 2ª dimensão que corresponde aos direitos sociais e econômicos e de 3ª dimensão que são os direitos de solidariedade, englobando, por exemplo, o meio ambiente ecologicamente equilibrado e uma saudável qualidade de vida. Cabe destacar que, parte da doutrina tem apontado a existência de direitos fundamentais de 4ª dimensão, que estariam relacionados à democracia, à informação e ao pluralismo[13].
O meio ambiente é um bem difuso, pois pertence à coletividade e segundo o art. 3º, I da Lei nº 6.938/81, tida como a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, corresponde ao “conjunto de interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”[14]. Portanto, a tutela constitucional do meio ambiente, permite que se proceda ao uso sustentável dos recursos ambientais, principalmente por se tratarem de bem de uso coletivo, cuja proteção interessa a toda sociedade.
A constituição federal garante não apenas o direito ao meio ambiente, sendo necessário que este esteja ecologicamente equilibrado, porque é nesta condição que ele é capaz de proporcionar bem-estar e uma sadia qualidade de vida. O bem-estar corresponde à base da ordem social determinada no art. 193 e seguintes da CF, trata-se de um bem jurídico indeterminável, na medida em que cada indivíduo tem a própria concepção e experiência desse instituto.
Além disso, ele é capaz de proporcionar uma vida saudável, pois de acordo com a Carta Constituição da Organização Mundial de Saúde de 1946, a saúde “é um estado completo de bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou enfermidade”[15].
Cabe destacar que, a Lei nº 8.080/90[16], Lei do Sistema Único de Saúde, estabelece que a saúde é um direito fundamental do homem (art.1º), e está condicionada a fatores como o meio ambiente (art.3º). Portanto, não restam dúvidas de que uma vida saudável depende de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Conforme afirma Milaré[17] “o meio ambiente é reputado essencial à sadia qualidade de vida. Em outras palavras, sem respeito a ele, não se pode falar em qualidade de vida”.
Nesse contexto, o meio ambiente implica inclusive em um dos fundamentos da República Federativa do Brasil que é a dignidade da pessoa humana, tal como determinado no art.1º, III da CF, pois se o ser humano tem o direito à uma vida digna e saudável, e se indiscutivelmente a saúde e o bem-estar dependem de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, essas condições precisam ser garantidas ao homem, a fim de seja garantida sua dignidade.
Desse modo, um meio ambiente saudável também é fator que garante o direito à vida, na medida em que contribui para a sobrevivência e a satisfação das necessidades do ser humano. Diante disso, Milaré acredita que:
“O reconhecimento do direito a um meio ambiente sadio configura-se, na verdade, como extensão do direito à vida, quer sob o enfoque da própria existência física e saúde dos seres humanos, quer quanto ao aspecto da dignidade dessa existência – a qualidade de vida -, que faz com que valha a pena viver”[18].
Com a finalidade de proteção ambiental, a constituição federal determina que a responsabilidade de tutelar o meio ambiente, compete ao poder público e à coletividade. Portanto, a administração pública não pode ser omissa com relação à proteção ambiental, que deve ser uma de suas prioridades, de outra parte, a sociedade deve colaborar com a conservação do meio ambiente, por ser um bem de uso comum, cujas vantagens de um ambiente saudável e as consequências dos danos ambientais atingem a por todos.
Há de se observar que na parte final do art. 225, está disposta a preocupação em defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações, o que traduz a idéia do desenvolvimento sustentável, objetivando o uso dos recursos naturais de modo que as próximas gerações também possam servir-se deles.
Diante disso, a Constituição Federal tutela o meio ambiente nos moldes do princípio do desenvolvimento sustentável, conforme Fiorillo destaca:
“O princípio do desenvolvimento sustentável tem por conteúdo a manutenção das bases vitais da produção e reprodução do homem e de suas atividades, garantindo igualmente uma relação satisfatória entre os homens e destes com o meio ambiente, para que as futuras gerações também tenham oportunidade de desfrutar os mesmos recursos que temos hoje à nossa disposição”[19].
Com o intuito de garantir a sustentabilidade ambiental, a Carta Magna também inclui a defesa do meio ambiente, como um dos princípios gerais da atividade econômica, de acordo com o disposto no seu art. 170, VI. Observa-se que este dispositivo prevê tratamento diferenciado para o empreendimento, conforme o impacto ambiental produzido pela respectiva atividade econômica. Assim, ao passo em que determina a promoção de desenvolvimento econômico, com a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa, também exige empreendimentos que estejam em conformidade às normas de defesa do ambiente.
Sem a observância da proteção ambiental, a atividade econômica é ilegítima. Milaré afirma que “o meio ambiente, como fator diretamente implicado no bem-estar da coletividade, deve ser protegido dos excessos quantitativos e qualitativos da produção econômica que afetam a sustentabilidade” [20].
Nesse sentido, a Constituição Federal estabelece dois direitos fundamentais: o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o direito ao desenvolvimento econômico e à livre iniciativa. Esse conflito de interesses pode ser solucionado com a aplicação do princípio do desenvolvimento sustentável, que visa conciliar o crescimento da econômico e social com a proteção ambiental. Diante disso, o Supremo Tribunal Federal entende que:
“A questão do desenvolvimento nacional (CF, art. 3º, II) e a necessidade de preservação da integridade do meio ambiente (CF, art. 225): O princípio do desenvolvimento sustentável como fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia. O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações”[21]. [Grifos do autor].
Portanto, não basta que a Constituição Federal estabeleça que o meio ambiente seja um bem difuso, que precisa ser defendido e preservado pelo poder público e pela coletividade, sendo necessário que o desenvolvimento efetivamente almeje a superação de problemas sociais e a alteração do consumo não sustentado, tendo em vista a escassez dos recursos ambientais.
3. DECLARAÇÃO DO RIO DE JANEIRO SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO
Em 1992, a Organização das Nações Unidas em uma Conferência no Rio de Janeiro, formulou a Declaração sobre Meio ambiente e Desenvolvimento, usualmente conhecida por “Eco 92”[22].
Essa declaração destaca o desenvolvimento sustentável como a possibilidade de equilibrar crescimento econômico e tecnológico com a proteção do meio ambiente. Manifesta ainda, a preocupação diante do uso de recursos naturais pelos Estados, de modo que estes reduzam o consumo não sustentado, e evitem danos ambientais, que possam ultrapassar o limite da própria jurisdição. A Conferência também criou a agenda XXI, direcionada para a consecução do desenvolvimento sustentável, através de políticas públicas de erradicação da pobreza e de garantia da conservação dos recursos naturais.
Com o intuito de garantir o desenvolvimento sustentável, a declaração comentada também institui certos princípios relacionados à proteção do meio ambiente, como o da participação popular – princípio 10, da responsabilização jurídica ambiental – princípio 13, da precaução – princípio 15 e do poluidor-pagador – princípio 16.
Esses princípios declarativos estão dispostos na Constituição da República em seu art. 225 e parágrafos, e, por serem princípios constitucionais, tem aplicação imediata no que se refere à defesa e proteção do meio ambiente.
Nesse sentido, a referida declaração incentiva a promoção do desenvolvimento sustentável, reconhecendo a proteção ambiental como parte integrante do processo de desenvolvimento, objetivando o equilíbrio entre crescimento econômico, social e meio ambiente.
4. A APLICABILIDADE DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DIANTE DOS DANOS AMBIENTAIS
A legislação ambiental brasileira não conceitua dano ambiental[23], embora a Lei nº 6.938/81, (lei da Política Nacional do Meio Ambiente), disponha em seu art.3º, II e III a definição de degradação e poluição, estes são exemplos de prejuízos ambientais.
De acordo com o art. 3º, II da Lei 6.938/81[24], a degradação corresponde “a alteração adversa das características do meio ambiente”, enquanto o art. 3º, III da mesma lei define o que vem a ser poluição:
“Art.3º. Para os efeitos previstos nesta lei, entende-se por:
III – Poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades econômicas e sociais;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos”[25].
Nesse sentido, a poluição advém da degradação ambiental capaz de prejudicar a qualidade de vida. Segundo Milaré, “o legislador vincula de modo indissociável, poluição e degradação, ao salientar expressamente que a poluição resultada da degradação, que se tipifica pelo resultado danoso, independentemente da inobservância de regras ou padrões específicos”[26].
Observado que degradação e poluição são formas de danos ambientais, cabe destacar o conceito desse termo no entendimento de Leite:
“Dano ambiental significa em uma primeira acepção, uma alteração indesejável ao conjunto de elementos chamado meio ambiente, como, por exemplo, a poluição atmosférica; seria, assim, a lesão ao direito fundamental que todos têm de gozar e aproveitar o meio ambiente apropriado. Contudo, em sua segunda conceituação, dano ambiental engloba os efeitos que esta modificação gera na saúde das pessoas e seus interesses”[27].
Portanto, o dano ambiental pode ser compreendido como a alteração do meio ambiente que ocasiona o desequilíbrio ecológico e prejudica a qualidade de vida. Isso pode ser observado, quando uma empresa de atividade petrolífera, lança rejeitos químicos sobre o mar, como ocorreu em 20 de abril deste ano, com o vazamento de milhões de litros de petróleo nas águas do Golfo do México[28], em que o meio ambiente e o ser humano sofrem com danos ambientais inesperados, como a mortandade do ecossistema marinho, a queda na atividade econômica de pesca e de turismo na região.
Esse é apenas um dos exemplos que comprova que para o meio ambiente e para o homem, é melhor evitar o dano ambiental ao invés de deixar que ele ocorra para depois tentar recuperá-lo, por isso, são realizados estudos ambientais para avaliar os riscos que a atividade econômica pode ocasionar sobre o meio ambiente, conforme prevê no art. 1º, III da Resolução nº 237/1997 do Conselho Nacional do Meio Ambiente[29].
Outro exemplo pode ser destacado quando analisamos os danos ambientais na região amazônica, como o desmatamento da floresta que corresponde a um dos principais exemplos de prejuízo ao meio ambiente. Isso porque ocasiona impactos ambientais gravíssimos. De acordo com Álvaro Mirra[30] “considera-se impacto ambiental a alteração drástica e de natureza negativa da qualidade ambiental”.
Assim, o desmatamento provoca a redução da biodiversidade da floresta, altera as condições climáticas da região, e emite de gás carbônico, que é um dos principais agentes causadores do efeito estufa, o que contribui para o aquecimento global.
Diante dos problemas ambientais crescentes no Estado do Amazonas, como a seca de alguns rios no ano de 2005, fez com que o governo estadual atuasse em políticas públicas para a defesa do meio ambiente, dentre as quais, destaca-se a edição da Lei nº 3.135 de 05 de junho de 2007, que regula a Política Estadual sobre Mudanças Climáticas, Conservação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas[31].
A referida lei estabelece no art. 3º, o desenvolvimento sustentável como uma das diretrizes estaduais do Amazonas, relacionadas à proteção ambiental, ao dispor[32]:
“Art. 3.° A Política Estadual sobre Mudanças Climáticas, Conservação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas tem como diretrizes:
I – promover e estabelecer instrumentos de incentivos para a execução de atividades e projetos que visem à redução das emissões originárias do desmatamento e das emissões líquidas de gases de efeito estufa, incrementando as ações de conservação ambiental e de desenvolvimento sustentável do Estado do Amazonas.”
A lei também instituiu no art. 5º, II[33] o programa “Bolsa Floresta”, que corresponde a um auxílio financeiro para famílias e associações comunitárias presentes nas unidades de conservação estadual, que ajudem a proteger a floresta dos desmatamentos.
“Art. 5º. Para a implementação da Política Estadual de que trata esta lei, ficam criados os seguintes Programas:
II – Programa Bolsa Floresta, com o objetivo de instituir o pagamento por serviços e produtos ambientais às comunidades tradicionais pelo uso sustentável dos recursos naturais, conservação, proteção ambiental e incentivo às políticas voluntárias de redução de desmatamento;”
Esse programa incentiva a proteção ambiental, vez que sem o desmatamento, é possível evitar as alterações climáticas, manter a biodiversidade e reduzir a emissão de gases responsáveis pelo efeito estufa.
Contudo, ainda que o desmatamento seja um dos danos ambientais mais frequentes na Amazônia, cabe destacar que neste ano, foi constatada uma redução significativa nos índices da devastação, conforme Zanatta[34] indica:
“Em junho deste ano a devastação da Amazônia bateu em 244 km2, resultado 58% inferior ao registrado no mesmo mês de 2009 – área quase igual ao município de Curitiba. Os maiores desmatamentos foram identificados no Pará (161 km2) Mato Grosso (36,5 km2) e Amazonas (24 km2)”.
Como visto, o desmatamento na região Amazônica diminuiu de forma considerável, contudo, o Estado do Pará ainda enfrenta este problema ambiental com resultados elevados, que prejudicam a efetivação de um desenvolvimento sustentável.
Não podemos esperar que esse quadro melhore se não houver a contribuição do poder público e da sociedade na proteção ambiental e a presença de um poder de polícia mais efetivo dos orgãos ambientais, que determine a responsabilização cível, penal e administrativa para o proprietário do imóvel utilizado sem a observância dos limites dos recursos naturais.
Portanto, frequentemente os interesses econômicos e as necessidades sociais tem prevalecido diante da proteção do meio ambiente, o que prejudica a concretização de um desenvolvimento sustentável. Assim, se o homem não defender e preservar o meio ambiente, para que as futuras gerações possam usufruir dos seus recursos, está descartando a possibilidade da sustentabilidade ambiental, e de condições de uma vida digna para os seus descendentes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como analisado ao longo deste artigo, a preocupação com o meio ambiente tornou-se mais efetiva a partir da década de 1960, culminando com a proposta do desenvolvimento sustentável em 1987, por intermédio do Relatório Nosso futuro Comum. Tais debates internacionais sugeriram um novo paradigma humano de relacionamento com o meio ambiente, definido como Ecocentrismo, no qual a ação humana passa a estar inserida, de forma sistêmica, nas diversas relações ecológicas que se estabelecem em diversos ecossistemas. No âmbito jurídico, a atenção do homem se direciona para a proteção do meio ambiente, que precisa ser ponderadamente protegido, para garantia do bem-estar social, de um desenvolvimento qualitativamente integral e de uma sadia qualidade de vida em todas suas formas.
A teoria de um desenvolvimento sustentável propõe a necessidade de equilíbrio entre o crescimento econômico, necessidades sociais e a proteção ambiental. Esta forma de progresso civilizatório, recepcionada na presente Constituição da República brasileira, não se restringe apenas à defesa do meio ambiente pelo poder público e pela coletividade, mas também à solução de problemas sociais, culturais, políticos, assim como a alteração de um consumo não sustentado, em face do esgotamento dos recursos naturais.
A promoção do desenvolvimento sustentável foi internacionalmente ratificada na Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada na cidade do Rio de Janeiro, em 1992, mediante a instituição de princípios declarativos relacionados à defesa do meio ambiente e à redução de um consumo não sustentado.
Nesse sentido, se destacou no capítulo 4, o desmatamento como exemplo de dano ambiental na região Amazônica, comprovando que os interesses econômicos ainda prevalecem diante da conservação da floresta. Sendo demonstrado que o Estado do Pará convive com resultados elevados da devastação, o que prejudica a efetivação de um desenvolvimento sustentável nesse Estado e, por extensão, no Brasil.
Ainda, a metodologia exigente de um Desenvolvimento Sustentável – percepção sistêmica, capacidade limite de suporte, políticas públicas e participação comunitária – faz necessário reforçar a conscientização ambiental no sentido de promoção de uma educação voltada para a perpetuação de uma equilibrada relação sócio-econômica e ambiental. Essa educação ambiental faz exigir maior participação social no trato das questões difusas, seja através de formação de comunidades voltadas à proteção ambiental, de presença da coletividade em decisões públicas e até mesmo em aderir a organizações não governamentais (ONGs).
Sinteticamente, a permanência do ser humano sobre a face do planeta Terra mediante uma estável sucessão de futuras gerações, exige a inserção humana nos ciclos ecológicos, para a produção de bem-estar, justiça social e sadia qualidade de vida, voltada a um factível meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Advogada e Professora da Universidade Federal do Pará. Doutoranda em Ciências Jurídicas pela Pontificia Universidad Católica Argentina. Especialista em Direito Ambiental pela Universidade da Amazônia e em Direito Constitucional pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus. Bacharel em Direito pela Faculdade de Belém
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