I – Introdução:
O presente artigo apresenta uma
abordagem multidisciplinar de um tema pouco explorado pelos autores
internacionalistas, apesar de os temas geopolíticos e segurança internacional
serem de inegável importância estratégica para a política externa brasileira. O presente texto foi o objeto de uma palestra proferida quando do X
Encontro Internacional de Direito da América Latina (EIDAS), mais precisamente
no dentro da programação do IX Encontro de Estudantes de Direito do Mercosul,
realizado em Florianópolis em setembro de 2001, três dias antes do ataque
terrorista às Torres Gêmeas nos Estados Unidos da América que levou uma miríade
de espectadores desavisados no mundo inteiro a voltar suas atenções para os
paradigmas da segurança internacional.
Oportuno é ressaltar que o estudo dos
problemas de segurança latino-americanos com a correlata e consequente abordagem dos instrumentos internacionais
aplicáveis merece um artigo próprio, e por isso não é constante desta pesquisa.
A produção brasileira dos temas
geopolíticos e estratégico-militares
A produção acadêmica no que tange aos
temas de segurança internacional sofreu juntamente com todo o conjunto das
matérias de política Internacional um aumento considerável de produção e de
qualidade de profissionais incorporado também às instituições que promovem os
estudos. Acentue-se uma tendência a um maior rigorismo metodológico da escola
brasileira como a fundamentação teórica e implementação de abordagens
analítico-interpretativas. As três principais comunidades que se ocupam das
Relações Internacionais no Brasil continuaram as mesmas apesar das acentuadas
mudanças políticas: os acadêmicos, os militares e os diplomatas.
No Brasil a produção em termos de uma
abordagem da segurança internacional ou geopolítica fica bem aquém se comparada
à escola econômica, ambiental, de direitos humanos, propriedade intelectual, etc… e o mesmo não ocorre na
produção interna de outros países. Em parte deve-se à inserção internacional
predominantemente pacifista do Brasil – mas de forma nenhuma neutra – , em parte à diluição do papel protagônico
dos militares no país, que detêm uma parcela significativa da pesquisa
nacional na área e, por fim à continuidade de uma política externa de segurança
efetuada majoritariamente pelo responsável da pasta da defesa nacional, sem uma
reflexão crítica concomitante.
A metodologia aplicada
Para desenvolver o presente artigo,
considerando a atualidade do tema e a escassez de bibliografia específica
disponível, foi necessário um conjunto de métodos para proceder
uma avaliação mais exata dos dados obtidos bem como garantir seu objetivo
teleológico: a compreensão objetiva por parte de seu apreciador. Entende-se portanto que um método único, ou mesmo a sistematização
hermética de algumas metodologias é uma fórmula superada das ciências sociais
do século XIX, principalmente após o advento da escola Kuhniana
que pacificou que diferentes argumentos e paradigmas não podem ser comparados
por empregarem diferentes conceitos e sistemas conceituais. Dada a gama de
fontes para a presente pesquisa como a história, sociologia, direito e
política; as razões de atração e vigor da abordagem passam a ser múltiplas, e
devem incluir uma coerência intelectual, e as influências e tendências do senso
comum das ciências sociais e a aplicabilidade dos dados à época pesquisada.1
Destarte, a metodologia a ser aplicada
possui caráter híbrido e há a necessidade de se analisar os dados mediante um
conjunto sistemático de métodos, porque há muitos termos que só podem ser
utilizados quando em conjunto com outros termos2. Como os objetos de estudo serão definidos, relacionados
e comparados, deverá se adotar uma proporcionalidade dos conceitos jurídicos
abordados.
II – o novo panorama da segurança
internacional
Inegavelmente a II Grande Guerra
determinou e abriu reais perspectivas para um novo panorama geográfico e
estratégico mundial que só viria a sofrer substanciais mudanças com a queda do
Muro de Berlim e o denominado fim da Guerra Fria. De 1939 a 1945, ocorreu o que o
embaixador Samuel Pinheiro Guimarães chamou de contestação interna à
liderança do sistema3, ou
seja, matizado por um desequilíbrio global de forças, o novo desenho geográfico-político mundial, a partir de um conceito de
países protagônicos vencidos e vencedores,
delineou as novas estruturas de poder mundial.
A Guerra Fria trouxe consigo o
problema da contenção do poder soviético. Formula-se toda uma
teoria elaborada pelos norte-americanos e com a qual o nosso país anui, de
que a principal função da contenção estratégica da União Soviética tinha de
caber, indubitavelmente, à grande potência militar que eram os EUA, sendo o
papel das potências militares de menor alcance, como obviamente era o caso
brasileiro, o de sustentar internamente a luta contra a subversão. 4 Dessarte, com a formação de
dois blocos distintos e hegemônicos, a Guerra Fria é funcional para a
manutenção da coesão do bloco e da hegemonia dos Estados dominantes dentro
dele. 5
Em termos de segurança internacional, o
contexto estratégico que permaneceu congelado durante a Guerra Fria fez com que
a quase totalidade dos conflitos que envolviam defesa
e segurança fossem interpretados sob a ótica da bipolaridade de poder. A
situação sofrerá uma mudança a partir de 1989, quando os conflitos voltam a ser
o que sempre deveriam ter sido; localizados e regionais (…) o elemento de
contenção representado pelo conflito Leste-Oeste deixa de existir,
provocando um maior número de conflitos periféricos. 6
Um sistema então vigente de segurança
coletiva caracteriza-se pelo monopólio centralizado da força no âmbito da ONU,
o que é colimado em seu próprio preâmbulo da Carta de formação: a força
armada não será usada a não ser no interesse comum. 7 A mesma Carta reserva
por sua vez o uso da força ao Conselho de Segurança, órgão Central das Nações
Unidas. Este é portanto o cerne de um sistema
pragmático de diplomacia preventiva que visa o estabelecimento da paz (peacemaking) e manutenção desta (peacekeeping).
Estamos historicamente portanto no século XX, com a formação dos primeiros
sistemas de regionalização do comércio internacional, com a formação dos
primeiros blocos que possuíram sua fase seminal já no século XIX; como o
movimento regionalista marcado pela tentativa de estabelecer uma união aduaneira
nos Estados Alemães separados, que naquela época (1813-1815) impunham direitos
aduaneiros em trinta e oito fronteiras. Importante registrar desta idéia que a
união econômica iria culminar em políticas comunitárias com transferência de
soberanias à unidade integrada. 8
Ademais, prevalecia quando da formação da CEE na
década de 50, uma idéia de segurança coletiva bastante pacifista, centralizada
na estrutura da ONU, após a então recente falência do sistema da Liga das
Nações e adstrito administrativamente ao Conselho de Segurança
Sob a égide de uma análise de uma
política estrutural internacional, o ponto de partida é o do monopólio
centralizado da força no que diz respeito à segurança coletiva mundial: a ONU.
Para a manutenção de uma Paz Perpétua como aludiu Kant9, a estrutura administrativa da ONU exige um consenso
entre os membros permanentes do Conselho de Segurança: este foi e é a
limitação inicial do instituto10.
Certo é que as Nações Unidas forneceram uma espécie de espaço público
internacional que permitiu e tem permitido até hoje, a reunião da comunidade
das nações em assembléia para a discussão de problemas que dizem respeito ao
futuro da coletividade. É claro que a metáfora democrática aparentemente não
resiste a uma análise rigorosa da realidade da política de poder, das
intervenções unilaterais e dos privilégios cristalizados no Conselho de
Segurança. Certamente hoje perseveram os objetivos da ONU formulados em
1945 mas, a realização prática é algo
completamente distinto, dada a realidade dos conflitos armados e do crescente
subdesenvolvimento sistêmico dos países periféricos, sendo a Segurança
Internacional um dos prontos de destaque na agenda das pretensas
reformulações emergenciais institucionais das Nações Unidas11. Neste sentido, a segurança internacional é hoje em dia a
área mais emergencial de reformulações institucionais, pois é o cerne de toda
estrutura político-institucional do pós-guerra.
Ocorre contudo,
que a partir dos três fenômenos que moldam hoje as Relações Internacionais: a
globalização, a fragmentação e a regionalização12; a noção de uma segurança coletiva universal que
sobrevive a mais de três quartos de século, não chegou a ser instaurada, nem
com base no Pacto da Liga das Nações nem para a aplicação do capítulo VII
da Carta da ONU.
13
Hodiernamente, em virtude da ampla e estruturada aceitação do
monopólio da força por parte da ONU, a comunidade internacional passa a
questionar-se sobre a legalidade de uma fragmentação e regionalização
dos mecanismos de segurança como a Organização do Tratado do Atlântico Norte,
principalmente após a intervenção militar em Kosovo14.
Considerando o fato historicamente
notório de que a estrutura cerne para todas as outras posteriores
Organizações Internacionais ( OMC, OMS, OIT, etc…) é a ONU, enquanto celula-mater,
estabelecida e fundada sobre os ideais de um sistema mundial de manutenção dos
litígios armados internacionais, pergunta-se como ficará toda a estrutura
institucional do pós-guerra a partir da coexistência de subgrupos de defesa
regional. Se hoje em dia o transnacionalismo e os
novos desafios à soberania nacional puseram fim ao chamado Sistema de Westfalia; é precoce o a fim dos ideais
originários de busca de paz internacional através de uma instituição
única de nações com ampla aceitação?
III – A fragmentação de um sistema de
segurança universal
Em um mundo globalizado e marcado pelo
papel protagônico da estruturas coletivas de caráter intergovernamental ou supranacional, prevalece e
perpetua-se em contrapartida a estrutura da OTAN com status de aliança
regional. É o assinalado por alguns teóricos das Relações Internacionais como o
retorno ao século passado, no qual os Estados mais fortes criavam a lei Internacional sendo os mais fracos simples rule-takers15. Assinala-se ainda a justificativa, na esclarecida visão
do Professor Charles Zorghibe, da Universidade de
Paris I, sobre Segurança Coletiva na Europa e na Ásia, que a manutenção
de uma aliança militar como a OTAN é também fruto da ausência de uma verdadeira
política européia de defesa e falta de coesão no âmbito da União Européia. 16
Em movimento contrário às aspirações de
uma política de segurança mundialmente unificada com escopo de manutenção de
paz, o mundo assistiu atônito às investidas militares da OTAN, mesmo após o
fenecimento do Pacto de Varsóvia e mais recentemente, no mesmo viés da
regionalização da defesa em contraponto às aspirações do pós-guerra, ao
estabelecimento efetivo de uma política externa comum relativa à
segurança no contexto da comunidade européia; a denominada “Common
Foreign & Security Policy” (CFSP), ou Política Externa e de Segurança
Comum (PESC).
A PESC representa uma aliança regional
com escopo de segurança regional e coletiva, muito embora dentro de
um contexto de políticas comuns e não de direito comunitário. Embora o Tratado
de Maasstricht tenha em 1993 estabelecido a PESC como
um instituto, foi posteriormente, com o Tratado de Amsterdão
de maio de 1999 que foi provido o conjunto de instrumentos concretos para uma
ação externa por parte da União Européia. A política comum inclui entre seus
objetivos a (a) salvaguarda dos valores e interesses fundamentais, bem como
integridade e independência da União Européia segundo os princípios da Carta
das Nações Unidas; (b) reforçar a segurança na UE de todas as maneiras; ©
preservar a paz e segurança internacional; (d) promover a cooperação
internacional; e (e) promover e consolidar a democracia, as regras do direito,
o respeito pelos direitos humanos e as liberdades fundamentais. (tradução livre
do autor a partir do texto oficial).
Resta claro, frente aos objetivos
supracitados, que a PESC aspira a uma continuidade da própria UE enquanto
cooperação regional internacional. Dados os problemas efetivos constantes
do território europeu como (a) os conflitos do leste trazidos pelos países
recém regressos do bloco comunista; (b) os problemas de terrorismo não
restritos ao movimento basco; © as conseqüências alarmantes da imigração em
massa, principalmente dos povos de origem islâmica; (d) os conflitos em Chipre
e; (e) o reavivamento de ideários extremistas como os
neonazistas. segundo uma visão analítico-crítica,
o sistema (PESC) parece ter ainda duas motivações concorrentes, obviamente não
apostas e previstas nos Tratados: (a) uma econômica, que é problema do
vultuoso orçamento militar para a defesa, dados os imensos gastos efetivados em
Kosovo e (b) uma fortemente política; que reforça
claramente uma independência política da UE em relação aos EUA e o próprio
resguardo da independência democrática européia. Pode-se aditar ainda a
razoável estratégia de pensar em uma maior e ampla independência do
Conselho de Segurança, órgão cerne da ONU no caso de “conflitos
regionalizados”. Neste contexto, é notório que a estrutura bicéfala do Conselho
de Segurança, é o manancial de grandes divergências na práxis da manutenção da
paz: de uma estrutura com escopo dinamizador, na
realidade é bem aceitável que predominou mesmo após a Guerra Fria uma situação
de congelamento. 17
III – O sistema de segurança europeu : desafios e instrumentos:
Após a assinatura do Tratado de Roma, a
construção Européia focalizou suas ações conjuntas nos aspectos econômicos, que
veio a se concretizar em um estágio intermediário de Mercado Comum. Por quase
quarenta anos a expressão Política Externa Comum não tomou
lugar nos Tratados. A mudança substancial surgiu com o Tratado de Maastricht, onde pela primeira vez os Estados Membros
incorporaram o termo Política Externa Comum, o considerado segundo
pilar, tendo em vista ainda um terceiro pilar relativo a
Cooperação Policial e Judiciária em Matéria Penal (CPJP) 18. A partir da vigência deste Tratado,
a União Européia começou a ser ouvida em nível internacional como uma opinião
uniforme em relação aos conflitos armados internacionais. A previsão de um
instituto de Políticas Comuns de Segurança foi efetivamente revisada pelo
Tratado de Amsterdão que passou a vigorar a partir de
1o. de maio de 1999. Os artigos 11 ao 28 do Tratado da
União Européia são devotados exclusivamente à PESC .
De fato, o Tratado de Amsterdão abriu novas perspectivas para as políticas integratórias européias, situando no segundo pilar a
Política Externa e de Segurança Comum, com alterações que visam uma
implementação efetiva dos novos instrumentos de segurança enquanto colaboração
Estatal como o fato de o Secretário Geral do Conselho passar a ser o alto
representante para a PESC (TUE, art. 26); o que também aumenta o poder a
Comissão no cenário internacional fora dos limites europeus. Desta forma, o
aprofundamento do conhecimento dos instrumentos do PESC significa compreender o
novo direcionamento do pensamento europeu mais recente em relação aos
verdadeiros desafios da cooperação regional e o verdadeiro escopo destas novas tratativas que segundo F. Dehousse
são uma verdadeira révolution copernicienne dans l’histoire de líntegration
européenne19.
A Política Externa Comum e de Segurança
não são contudo implementadas do mesmo modo que as
políticas comunitárias como agricultura, meio-ambiente, transporte e políticas
de pesquisa. A estruturação de poderes entre o Conselho, o Parlamento e a
Comissão é consideravelmente diferente do aplicado às políticas comunitárias,
como por exemplo, o fato de a Comissão possuir uma relação mais direta
com a PESC, mas sem o direito exclusivo de estabelecer políticas ou submeter
iniciativas.
Os instrumentos da PESC são conforme de
depreende do Tratado de Amsterdão: (a) posições
comuns;(b) ações conjuntas, e; (c) decisões e
conclusão de Acordos Internacionais. As referidas estratégias passam a ser melhor entendidas frente às metas pragmaticamente
delimitadas no anexo do Tratado sob a nomeclatura de
uma Política Única, que envolvem cuidado sobre áreas de conflito ou passíveis
de conflitos futuros e cuidando sobre as situações com potenciais repercussões
ou crises políticas.
O estudo do direito comunitário europeu
e da vivência prática das questões jurídicas torna-se interessante neste
sentido: muito além de uma cooperação regional econômica, há o vívido
interesse na cooperação regional em favor das áreas menos favorecidas,
com a clara colaboração política em zonas de possíveis conflitos militares com
o escopo final de uma união política total. 20 No caso do estudo mais profundo da estratégia da UE, apesar do
ideário de paz e de desarmamento no âmbito das Organizações Internacionais e
das relações inter-estatais, a implantação de uma
política objetiva de segurança implica em inúmeros outros aspectos subjacentes à uma uma análise superficial
como: economia orçamentária militar, desenvolvimento e cooperação tecnológica,
energética e integridade territorial assegurada.
Considerando o fenômeno da integração
regional sul-americana, sob a perspectiva dos interesses estratégicos
latino-americanos e o próprio modelo integracionista teoreticamente assimilado (europeu); não se pode deixar de
considerar as propostas (políticas e estratégias explícitas, implícitas e
possíveis) e práxis do MERCOSUL extremamente comprometidas. O Mercosul
necessita nas palavras de Marcos Costa Lima aprofundar a integração,
principalmente pela coordenação de políticas macroeconômicas, aprofundamento da
discussão sobre insuficiência institucional, cooperação tecnológica e
expansão da cooperação nos setores onde há menor resistência como justiça
educação e meio ambiente. 21
IV – Os desafios de uma política de
segurança regional frente ao desenvolvimento de um espaço integrado e
democrático latino americano:
O primeiro aspecto a ser analisado é o
fato de o MERCOSUL, ter a União Européia como modelo institucional, muito
embora nossos Tratados e instrumentos políticos localizem o processo de
integração latino-americano no patamar intergovernamental.
É fato portanto, concorde e pacífico na academia, que
a União Européia é o modelo mais bem acabado de políticas governamentais de
cooperação e integração, não sendo contudo o único modelo.
O belicoso tema de o MERCOSUL ser ou
não uma aplicação do modelo da UE é esclarecido por Luis Olavo Batista: “…
o MERCOSUL foge aos modelos conhecidos como o da CEE, o do Grupo Andino e
outros (…) para um atendimento melhor das realidades regionais”. 22 Pode-se portanto, admitir
a inspiração no modelo europeu e ademais um modelamento
principalmente a partir da BENELUX23,
sendo que as fases de união econômica e monetária que não foram cogitadas no
Tratado de Assunção necessitariam hoje de instituições ainda não adotadas. 24
A partir do modelo europeu, há aspectos
a serem estudados para o aperfeiçoamento da integração latino-americana (ou
mais acertadamente da cooperação intergovernamental),
especificadamente no Mercosul. Os desafios de segurança e defesa
latino-americana são inúmeros: (a) a questão da vulnerabilidade e vigilância
amazônica onde já há linhas e cooperação25;
(b) o narcotráfico com a associação altamente perigosa com a marginalidade
urbana como a instalada nas favelas do Rio e zonas marginais de São Paulo26, ( c) a presença de pelo menos
três grupos terroristas exclusivamente latinos; (d) a intervenção como o
deflagrado Plano Colômbia27; (e)
a tentativa de avanço tecnológico na área nuclear conforme o programa
desenvolvido pela Marinha Brasileira e a presença de outros ilícitos
internacionais como a prostituição infantil28,
o tráfico de plantas medicinais, o contrabando nas zonas fronteiriças, o
indefeso indígena em áreas de importância estratégica, a atuação da máfia
chinesa29, etc…
Os desafios latinos em relação à
segurança no âmbito do Mercosul não são teoréticos,
visto que a PESC no âmbito da EU é um instituto de Direito Internacional e não
de Direito Comunitário, não procedendo o argumento que
nosso estágio seminal de integração regional enquanto Mercado Comum é
insuficiente para um aprimoramento na área de segurança regional. Ademais,
claramente, como na propositura européia, a cooperação em termos de segurança,
associa-se diretamente com a cooperação e investimento tecnológico,
desenvolvimento energético, garantia de proteção ambiental e credibilidade das
instituições democráticas.
Desta forma, o estudo acadêmico dos
mecanismos adotados pela hoje União Européia tornam-se fundamentais para o
desenvolvimento de uma política governamental integracionista
por parte dos governos do MERCOSUL como em uma uma
acepção análoga foram decisivas as colaborações acadêmicas para o
direcionamento legalista para a reformulação do Sistema de Solução de
controvérsias da OMC30. Inobstante
a abordagem doutrinária e estratégica quase exclusivamente econômica do
MERCOSUL em seu contexto regional e internacional, alguns autores acentuam a
premência de discussões mais políticas sobre segurança como Jacques Ginesta sob o título: Evaluación
de los esquemas de concertación
e integración latino-americana31, conforme o avanço europeu translúcido e instrumentalizado no Tratado de Amsterdão.
O pensamento de aprofundamento do
Mercosul na realidade é uma das matizes de um
movimento mais generalizado que possuía em seu bojo até mesmo a idéia de uma
“recriação” do bloco platino. Existem portanto
problemas de fragilização do Mercosul, mas em outra
escala valorativa; estes estão presentes também na UE, sendo o Tratado de Amsterdão entendido por alguns teóricos como a
consagração de um mecanismo dinamizador e regulador
de cooperações reforçadas, permitindo a alguns EM avançarem em detrimento de
outros.(…) Na verdade, tal mecanismo significa a aceitação de uma construção
diferenciada da Europa32. Dessarte, ao mesmo tempo que o
conjunto de perspectivas para a institucionalização do MERCOSUL deve ser
aprofundado, a experiência do modelo europeu é fundamental para o delineamento
de estratégias e previsão de fracassos, ainda mais sob a perspectiva adiada de
formação da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), com conseqüências
aplicáveis a cada um dos pontos delineados, a partir de um contexto
internacional de segurança e manutenção/apoio à Pax
Americana.
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Notas
1 idem. pg. 88
2 Kaplan, 1975, 67.
3 Guimarães,2000, pg. 65.
4 Jaguaribe, 1993, pg.
125.
5 Halliday, 1999, pg.
190.
6 Seintenfus, 1994, 132.
7 Mercadante, 1998, 142.
8 Maria de Oliveira, 2000, pg. 316
9 Kant refere-se no primeiro parágrafo
de sua obre “Paz Perpétua” à uma inscrição satírica na
tabuleta de um hospedeiro holandez, em que estava
pintado um cemitério para os homens em geral , ou especialmente para os Chefes
de Estado. na realidade o autor previu uma liga do
tipo especial, denominada Liga de Paz ( foedus pacificum) que distinguiria-se de
um Tratado de Paz (Pactum Pacis)
que visa somente por fim à uma determinada guerra. ( Kant,
1989, pg. 41)
10 Mercadante, 1998, 139.
11 “Na área da paz e da segurança,
tem-se observado um consenso crescente no âmbito da ONU, quanto à necessidade
de se colocar em prática novas estratégias de prevenção de conflitos. O
objetivo de se manter a paz e a segurança se manifesta atualmente na forma
de um desafio novo, o de atuar de forma consistente sobre as causas
estruturais e imediatas dos conflitos. (…) Se no passado a política externa
brasileira buscava a autonomia pela distância dos processos dominados
pela lógica bipolar, hoje procuramos a autonomia pela participação ativa
em todos os tabuleiros em que se desdobram as relações
internacionais.” Fonseca Jr., Gelson e Belli, Benoni. “Novos Desafios das Nações Unidas: prevenção de
Conflitos e agenda social” in revista Política Externa vol. 10, nr. 01. pg. 59 ss
12 Seintenfus, 1994, 129.
13 Mercadante, 1998, 140.
14 “…from a strictly legal perspective, the NATO
military intervention in Kosovo violated the United Nations Charter in
article 53 [ “The Security Council shall, where appropriate, utilize such
regional arrangements or agencies for enforcement action under its authority.
But no enforcement actions shall be taken under regional arrangements or by
regional agencies without the autorization of the
Security Council…] ( Wilets,
2000, 645)
15 Hurrel & Woods, 1999.
16 “A falta de coesão dos europeus é
devida aos três principais atores: Paris estava fora da Organização Militar
Integrada e não podia exigir reformas da estrutura da OTAN. Bonn,
mobilizada pelos problemas da reunificaçào, preferiu
manter a mesma estrutura militar. E Londres, comportou-se como associado
europeu ideal para Washington.” (Carta Internacional, 1999, pg. 8)
17 Por estrutura Bicéfala entende-se a tentativa de equilibrar o peso das grandes
potências (membros permanentes com poder de veto) contra o direito ou princípio
da maioria. É a franca dissonância com o artigo 2o. da própria Carta das Nações
Unidas, que prescreve a igualdade entre os Estados, princípio fundamental do
Direito Internacional (Seintenfus e Ventura, 1999,
105).
18 Palma,2000,
118.
19 idem, 2000, pg. 122
20 Maria de Oliveira, 2000, 319
21 Lima, 2000, pg. 173
22 Baptista,1998,
40.
23 idem.
24 idem. pg. 53
25 Pode-se assinalar
uma típica política comum em torno de interesses regionais neste ponto.
“Assinado em 1978 e vigente desde 1980, subscrevem o Tratado de Cooperação
Amazônica a Bolívia, o Brasil, a Colômbia, a Guiana, o Peru, o Suriname e a
Venezuela. Note-se que este Tratadofoi negociado e
entra em vigor precedendo, de certa forma a onda ambientalista, na medida em
que tenta tornar a compatível o desenvolvimento socio-econômico
e a conservação do meio ambiente.” (Seintenfus, 1994,
170)
26 Jaguaribe, 1993, 130
27 Mais de 40% do território colombiano está sob controle de grupos guerrilheiros (dos quais são as
forças armadas Revolucionárias da Colômbia, as FARC, chefiadas por Manuel “Tirofijo” Marulanda e integradas
por 15.000 soldados, e o exército da Libertação Nacional, o ELN, chefiada por
Nicolas Rodrigues, com 6000 soldados). O Plano Colômbia foi anunciado pelo
vice-ministro da Defesa dos EUA, James Bodner,
durante a Conferência de Defesa dasAméricas,
realizada em Manaus, nos dias 18 e 19 de outubro e visa à repressão da
guerrilha entendida como o braço armado do narcotráfico. ( Revista
“Caros Amigos, novembro 2000, pg. 10)
28 Seintenfus,
1994, 187
29 Em recente reportagem, em cadeia
nacional, datada de 08/10/2001, o poder judiciário brasileiro expressou sua
fragilidade frente à atuação da máfia em meio à colônia chinesa, principalmente
na jurisdição paulista. A maior dificuldade encontrada é a variabilidade de
dialetos utilizados pela organização criminosa.
30 Barral, 2000,102.
31 Ginesta,1999, 62. Com precisão
e agudeza de raciocínio adverte:
“En lo referente a la concertación política, que resultó bastante inefectiva si
nos atenemos a la labor del SELA, al consenso de
Cartagena sobre la corresponsabilidad de la deuda externa Y de modestos
resultados en otros múltiples aspectos, tiene en su haber el logro de haber
cimentado la idea de la democracia, la reivindicación de un espacio de decisión
autónomo latinoamericano y la concreción de una zona de paz regional y libre de
armas nucleares, sólo turbada por algunos episodios aislados, como la reciente
y vergonoza uerra
fronteriza entre Ecuador y Peru, lo que ha hecho
funcionar a la región como una comunidad de seguridad, en el sentido que
le adjudica Karl Deutsch a
la expressión.”
32 Palma, 2000, pg. 3-4
Advogado em Brasília/DF
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