Na existência de controvérsias entre Estados, não sendo a via pacifica suficiente para solucioná-las, e as nações não conseguindo entrar em um acordo, apela-se para as guerras. A Guerra pode ser definida como a contenda armada entre Estados, onde cada parte visa proteger seus interesses nacionais[1]. Existe aí a intenção nítida de submeter a outra parte as suas aspirações e interesses. Isso ocorre exatamente por não haver um poder cogente capaz de obrigar as partes a aceitarem as soluções propostas pelos meios jurídicos, pacíficos e diplomáticos de solucionar conflitos, já que os Estados são soberanos e como tal tem o poder incontrastável de dizer o Direito.
Dizia, Alberico Gentili: “Na guerra não se faz outra coisa senão lutar, e é luta feita com as armas…( 2005 p. 61)
Sabe-se que a guerra existe desde os primórdios, já que não haviam regras que regulassem os conflitos de interesses entre “Estados”, ocorria a prevalência da “lei do mais forte”.
A história da humanidade tem uma série de conflitos armados, que foram aceitos pela comunidade internacional sendo considerados justos e lícitos. Mesmo quando não o eram. [2]
Lembrando em uma época quando se acreditava que a guerra era a solução para todos os problemas internacionais, aconteceu a Primeira Grande Guerra, que tinha como justificativa acabar com todas as outras provenientes de assuntos diversos, ocorre que além de não resolver nenhum dos problemas que a causaram, deixou-nos uma herança de horrores e sofrimentos. Logo ocorreu a Segunda Guerra Mundial, que por seu caráter desumano, deixou marcas profundas na comunidade internacional.
“Jus in bello” e “ Jus ad bellum”
É adequada uma abordagem sumária e didática de duas expressões utilizadas dentro do tema. O Jus in bello e Jus ad bellum.
Segundo Francisco Rezek (2005)
Jus in belllo é um nome latino que refere-se ao direito da guerra, ao conjunto de normas, primeiro costumeiras, depois convencionais que floresceram no domínio das gentes quando a guerra era uma opção lícita para resolver conflitos entre Estados.
Jus ad bellum, o direito à guerra, ou seja, o direito de fazer a guerra quando esta parecesse justa.(p.368)
A terminologia ora examinada ainda permeia a linguagem corrente, pois se refere às hipóteses em que a necessidade admite a guerra, que culminam na legítima defesa real contra uma agressão armada, como também na luta pela autodeterminação de um povo contra a dominação colonial.[3]
De acordo com o Jus in bello, as regras costumeiras passaram a regular as condutas de proteção das vítimas advindas da guerra, dando ênfase as que protegiam os feridos e os enfermos, que não deveriam ser tratados como prisioneiros, e sim, após o devido tratamento, serem devolvidos a seus exércitos, ressalta-se, ainda, que a população civil, hospitais, médicos, enfermeiros e capelães estavam isentos de aprisionamento, consignando no dever moral de serem poupados dos ataques inimigos.
O Direito da Guerra é um conjunto de normas internacionais, que se originaram em convenções ou em costumes, destinados a serem aplicados em conflitos armados, internacionais ou internos, que limitam, por razões humanitárias, o direito das partes em conflito de escolher livremente os métodos e os meios utilizados no combate e que protegem as pessoas e os bens afetados.[4]
Evolução histórica da guerra
A Guerra, nas suas origens, caracterizava-se pela aplicação da “lei do mais forte”, já que não existiam ordenamentos que regulassem as relações entre os Estados. As populações vencidas eram escravizadas e sujeitas às vontades dos vencedores.
Com o decorrer do tempo, observou-se a necessidade de os beligerantes preservarem a dignidade humana, surdindo os acordos entre os chefes militares, que eram no sentido de amenizar os efeitos decorrentes da guerra. Pretendia-se proteger as vítimas. Foi a partir deste momento que o Direito Internacional começou a versar sobre a paz, ditando normas que regulariam condutas nos conflitos armados, demonstrando a necessidade de solucionarem-se as divergências internacionais de modo pacífico. Porém, até aqui, tudo o que se tinha eram acordos tácitos, que não traziam nenhuma obrigatoriedade. Por isso mesmo, ficava a critério subjetivo, obedecer ou não aos acordos, chamados cartéis e capitulações. [5]
Com o nascer das religiões, cresceu o número de conflitos armados, que visavam a cada qual, impor aos desiguais o seu pensamento religioso, fundamentavam assim a guerra no sagrado e justificavam-na como uma vontade divina, que era realizada inconscientemente pela coletividade[6].
Apesar de aceita a guerra, pretendia-se que fosse o menos cruel possível, pretendia-se a humanização dos recursos utilizados na guerra.
Dizia Santo Agostinho, ( apud Alberico Gentilli, 2005)…Se o inimigo que combate deve morrer, que tal seja por necessidade, e não por tua vontade… O vencido ou o capturado têm direito à compaixão.
Na Idade Média, o entendimento prevalente é de que o status da guerra é natural, visto que os príncipes sempre intitulavam seus litígios e conflitos como “justos”. Guerra justa seria aquela empreendida pelo Estado na tutela de seus interesses. Bastava que o príncipe quisesse guerrear, ele tinha total legitimidade e aceitação popular para tal[7].
Marco Aurélio, imperador de Roma, já dizia ( apud Alberico Gentilli, 2005)… Não há juiz na Terra para o príncipe e este não seria assim considerado se houvesse outro acima dele.
Em meados do século XIX, os velhos acordos de comandantes, foram normatizados, e assim instituiu-se o primeiro corpo de normas que regulamentou a proteção das vítimas de guerra. Pelo Jus in bello, a guerra tinha reguladas através de regras costumeiras as condutas quanto a se proteger os feridos e enfermos, que deviam ser considerados como se pertencentes do próprio exército, os médicos, enfermeiros e capelães, que em momento algum poderiam ser aprisionados, os hospitais passaram a ser imunes aos ataques, para tal passaram a ser identificados por sinais externos, os prisioneiros de guerra, deveriam ter suas vidas poupadas e no momento devido ser devolvidos aos seus, a população civil quando pacífica, deveria ser poupada. Não se pretendia impedir as guerras, e sim atenuar ou evitar os sofrimentos delas decorrentes. Ainda não se cogitava a licitude ou não da guerra.
As quatro Convenções de Genebra foram aprovadas em 1949:
A primeira convenção trouxe a proteção de militares feridos ou doentes no campo de batalha, a segunda convenção garantia a proteção de militares feridos ou doentes no mar, a terceira a proteção de prisioneiros de guerra, já a quarta trouxe a proteção de civis em tempos de guerra.
Foram estabelecidas também, normas humanitárias mínimas, consubstanciadas em cada Convenção, no caso de conflitos armados ocorridos no interior de um país
Os Protocolos adicionais de 1977 estenderam esta proteção a toda e qualquer pessoa afetada por um conflito armado. Naquele ano, foram aprovados o Protocolo I para ser aplicado em todos os conflitos armados internacionais e o Protocolo II para os conflitos armados não internacionais de grande intensidade. Esses acordos complementam o que consta nas Convenções. As Convenções de Genebra e os protocolos que as complementaram têm por base o respeito pelo Homem e pela sua dignidade. Versavam sobre a melhoria da sorte dos feridos e enfermos dos exércitos em campanha, dos feridos, dos enfermos e dos náufragos das forças armadas no mar e, relativas ao tratamento dos prisioneiros de guerra, e à proteção dos civis em tempo de guerra, e ainda, sobre a proteção das vítimas dos conflitos armados internacionais e dos internos. [8]
As primeiras codificações nasceram, portanto a fim de legislar os comportamentos aceitos na guerra. Inicialmente em 1856, após a guerra da Criméia e, posteriormente, na Declaração de São Petersburgo de 1868, na de Bruxelas de 1874 e na Convenção de Genebra de 1864, todas versando sobre os direitos humanos, sendo esta última de vital importância para o tema proposto, pois, torna positivados os preceitos humanitários costumeiros do Jus in bello. Em 1899 e em 1907, são produzidas as convenções da Haia que trazem evoluções como a proibição do lançamento de bombas por balões, a do uso de gases asfixiantes, o aspecto ritualístico da prévia declaração de guerra, todos estes, já extintos, pois, somente eram cabíveis em considerando a guerra como lícita. Dentre as contribuições para o Direito da guerra, dadas por Haia, algumas sobrevivem ao tempo, agrupando-se em três princípios básicos, proteção aos não combatentes; a limitação dos alvos atacáveis aos objetivos militares; proibição do uso de armas ou métodos demasiadamente cruéis[9].
Até configurar-se, no direito atual, como ilícito, o direito da guerra evoluiu paulatinamente. Em 1919, no Pacto da Sociedade das Nações, a guerra foi determinada como recurso a ser preterido ante os demais. No Pacto Briand-Kellog, de 1928, passa a ser condenada e, finalmente, em 1945, a Carta das Nações Unidas proíbe-a expressamente ao estatuir: “Os membros da Organização, em suas relações internacionais, abster-se-ão de recorrer à ameaça ou ao uso da força contra a integridade territorial ou a independência política de qualquer Estado, ou de qualquer outra forma incompatível com os propósitos das Nações Unidas”. Desta forma, a Carta da ONU não apenas rege a ilicitude da guerra, como de qualquer outro uso de força ou de ameaça de tal atitude, excetuando quando utilizada sob a justificativa do direito natural de legítima defesa, individual ou coletiva[10].
No direito internacional moderno, o direito de guerra é regido pelos princípios da necessidade e da humanidade. O primeiro estatui quanto à origem da agressão, que deve ser a última opção, e sempre, ato de defesa, enquanto, o segundo, preocupa-se com os princípios humanitários a serem invocados na ocorrência da guerra, evitando, assim, um retrocesso maior no aspecto da humanização de tal prática. [11]
Guerra justa
Na antiguidade tinha se como guerra justa, lícita, aquelas movidas por um soberano, considerando, ainda, os fins para os quais ela era travada.
Portanto, ficava a critério do soberano, providenciar um motivo que justificasse a guerra. Motivos haviam muitos, era só encaixá-los no fato real, que poderia se iniciar um conflito armado com total licitude.
As mais constantes eram as guerras travadas pela fé, pensava-se que o próprio Deus as ordenara. [12]
Justas também eram as guerras movidas por necessidade, quando não havia outro meio de manter a vida se não guerreando. [13]
Quando havia a utilidade, a guerra era perfeitamente aceita, isso ocorria, quanto as guerras movidas pela vingança, acreditava-se que quem não de vingava de agressão atraía outras sobre si. [14]
Santo Agostinho pregava (apud Alberico Gentilli, 2005) “Costuma-se dizer que são justas as guerras que visam vingar as injúrias, isto é, aquelas que são movidas contra um povo ou um estado que os injustiçou. E mesmo aquelas movidas para restituição daquilo que foi tirado injustamente do povo.”
A guerra movida por causas naturais também era justa; era aquela feita quando o soberano queria adquirir aquilo que ele entendia ser propiciado pela natureza, e impedido de desfrutá-la pelos homens. Isso ocorria quando a parte era impedida de trocar mercadorias, pois estava impedida pela outra parte de entrar no porto. [15]
Outros motivos que justificavam as guerras eram as causas humanas, quando o soberano entendia que teve seus direitos violados, e a fim de solucionar a questão sugeria uma arbitragem, porém a outra parte não aceitava. [16]
Como foi visto, durante muito tempo a guerra era lícita, haviam vários motivos que a justificavam, sendo assim tudo o que era visto de forma errônea poderia ensejar uma batalha armada envolvendo as nações.
Com o Jus in bello, nasceram os primeiros direitos garantidos, na época de guerra. Que em um segundo momento foram legislados. Mas daí a chegar em um momento em que a guerra não seria mais licita demorou.
Até que o Pacto da Sociedade das Nações, em 1919, colocou a guerra como opção secundária, deste modo, primeiros as nações envolvidas em um litígio, teriam que tentar soluciona-lo de modo pacifico, não tendo êxito, recorreriam a guerra. [17]
Já em 1928, pelo Pacto de Paris, mais conhecido como Pacto Briand-Kellog, os países pactuantes a condenam e a ela renunciam. É importante ressaltar que quase todos os países da época ratificaram este tratado, e este fato ocorreu antes da ocorrência da Segunda Guerra Mundial.
Pacto Briand-Kellog:
Artigo I: As Altas Partes contratantes declaram solenemente, em nome dos respectivos povos, que condenam o recurso à, guerra para a solução das controvérsias internacionais, e á ela renunciam como instrumento de política nacional nas suas mútuas relações.
“Artigo II : As Alta Partes contratantes reconhecem que o ajuste ou a solução de todas as controvérsias ou conflitos qualquer natureza ou origem, que se suscitem entre elas: nunca deverá ser procurado senão por meios pacíficos.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, veio a proibição formal e extensiva do direito à guerra. A carta de São Francisco estabelece a abolição de se recorrer a guerra, como meio licito de solução de conflitos. Em tese, morreria aqui o direito à guerra. [18]
Carta das Nações Unidas, art. 2º, § 4º:
Todos os Membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a independência política de qualquer Estado, ou qualquer outra ação incompatível com os Propósitos das Nações Unidas.
Neste momento da história, a guerra tornou-se um ilícito internacional. As nações perceberam que a melhor forma de se negociar um litígio não era através do combate armado, reconheceram outros meios de solucioná-lo.
Foi então, que surgiu a expressão jurídica “da guerra justa”. Guerra Justa é a guerra legal, aquela que é conforme as disposições legislativas.
O direito de um Estado fazer a guerra pressupõe a existência de normas das quais possa derivar aquele direito.Os critérios de justiça na guerra não são um fundamento legal para o uso da força, pois esta não se justifica.
O emprego de uma força armada na defesa externa de um país, precisa considerar os acordos internacionais assinados pelo seu governo, que visam proteger os Direitos Humanos, de modo a manter um controle sobre o comportamento de seu pessoal militar, conforme os princípios de Direito Humanitário.
A Carta das Nações Unidas em seus artigos, explicitamente, recusa a ameaça ou o uso da força contra a independência política ou a integridade territorial de qualquer Estado, enquanto permite o uso da força em legítima defesa. O conceito de injustiça está agregado ao de agressão e de justiça com autodefesa.
O uso da força armada não constitui agressão, e sim o uso da força de maneira que viola os direitos estabelecidos por uma ordem jurídica ou moral, constituindo-se não só um mero fato, mas um erro. O uso da força para responder a esta violação é justificado, porque é um meio de conter e punir um erro.
A paz de acordo com a visão jurídica, nada mais é que um pacto ou acordo para não lutar. A paz é rompida somente quando a força é usada em violação a esse acordo.
A agressão é um ataque contra determinado Estado e um crime contra a própria sociedade internacional, enquanto que a resistência à agressão é um ato de aplicação da lei internacional e de autodefesa.
As partes têm seus devidos direitos e a guerra é um meio de punir a violação de direitos e assegurar a harmonia entre as partes, de acordo com a noção de guerra justa. A concepção jurídica da guerra, como instrumento da lei, caracteriza-se quando essa é utilizada como um ato de justiça, empreendido em defesa da lei ou para a punição de atos criminosos.
Neste caso, encaramos a guerra como uma conseqüência inevitável de um sistema internacional composto por múltiplos estados.
A guerra para ser considerada justa deve ter condições de existência.[19]
A Causa da guerra deve ser justa, a guerra aparece sob certo aspecto contrário à natureza humana, já que somos feitos para conviver em companhia, porém a convivência em sociedade traz também a discórdia em alguns momentos, quando ocorre a violação por partes de um dos direitos humanos de outrem a guerra se justifica, exatamente para reconduzir a obediência dos direitos inerente do homem. [20]
A mola propulsora de um conflito armado deve ser um fim justo, não podendo estar incluído o desejo por si só de causar dano, a vingança, a dominação de um povo e a imposição de uma crença.
A Intenção da guerra deve ser o estabelecimento da paz; sendo assim ela pode se fundamentar tendo como objetivo o alcance da paz, para o qual não menos que a justiça parece o destino humano conquistar. Esta justificativa se explica pela finalidade, que tem como último resultado o bem.
Ao ser iniciada uma guerra ela precisa ser proporcional aos ataques sofridos ou ao meio a que se destina.
Deve-se em todo momento considerar as regras estabelecidas ao longo da história e legisladas nas Convenções de Genebra, sobre os direitos de guerra. A força deve ser utilizada da forma mais limitada possível, a fim de proteger a população civil envolvida e evitar grandes degradações.
Vimos recentemente, uma guerra ser declarada no Oriente Médio, por parte de Israel contra o Líbano.
Ao ter dois soldados capturados por um grupo terrorista xiita, o Hezbollah, que tem seu quartel-general no Líbano, Israel declarou guerra contra o Estado Libanês. No momento, relevando a legitimidade ou não de tal ato, considerando apenas a desproporcionalidade dos ataques cometidos por Israel, que em seus ataques aéreos, marítimos e terrestres matou centenas de pessoas e destruiu prédios, praças, escolas e até hospitais. O Líbano apesar de estar sofrendo a retaliação de Israel não cometeu atos que justifiquem a guerra.
O que vimos ocorrer é uma enorme desproporcionalidade, onde Israel utilizou-se de força excessiva contra o Líbano, acarretando um grande número de mortes de civis e destruição em massa, utilizando-se de meios pouco justos ultrapassando o fim a que se destina.
Como vimos, existem meios de solução de conflitos internacionais onde não é necessário apelar diretamente para o conflito armado. O uso da força deve ser o último recurso utilizado, somente se apelando para ela, caso sejam esgotadas todas as outras medidas pacificas para tal.
Uma guerra só pode ser declarada de um Estado soberano para outro igualmente soberano. Portanto somente Autoridade e liderança competentes; podem dar inicio a uma guerra.
Voltando ao conflito entre Israel e o Líbano, considerando agora a legitimidade do conflito. Uma guerra injusta, já que Israel foi confrontado por um grupo terrorista, e em momento algum, o Líbano cometeu atos de guerra ou mesmo a declarou contra o Estado de Israel. Ocorre que o Hesbollah não é um Estado soberano e por mais que ele tenha suas raízes históricas e regionais fincadas no estado Libanês, não é legal a declaração de uma guerra internacional, baseada em atos cometidos por um grupo civil terrorista.
O Estado em litígio deve assumir uma posição defensiva ao invés de ofensiva, ou seja, proteger seu território e população de ataques armados, atos de guerra cometidos contra ele, evitando empregar a força contra o outro Estado. Isto inclui não invadir o território alheio e cometer atos de guerra contra ele.
Pelo caráter degradante que a guerra assume, só faz sentido concretizá-la se houver alta probabilidade de se atingir os fins á que ela se destina. É necessário considerar a morte de inocentes, a destruição de uma sociedade e mesmo dos militares envolvidos.
Ao contrário do que se vê nas constantes guerras do Oriente Médio e da África, a utilização de soldados alistados e criança, deve ser descartada.
Freqüentemente, nos conflitos internos destes Estados, nas chamadas guerras santas, são recrutadas crianças como soldados. Elas são treinadas para matar. Trazem desde cedo um traço marcante de ódio e vingança para com seus inimigos, sendo muitas vezes até mais cruéis que os militares, já que elas têm um passado de dor e sofrimento, onde muitas perderam familiares, amigos e conhecidos. Na guerra entre judeus e palestinos, 467 crianças foram mortas entre 1987 e 2001.
Existem atualmente duas hipóteses de guerra justa, a legitima defesa contra uma agressão armada sofrida e a luta pela autodeterminação de um povo contra a dominação colonial. [21]
Legítima defesa contra a agressão armada sofrida
A legítima defesa é aquela existente em face de uma agressão injusta e atual, de forma que o emprego da violência é o único recurso possível.
Atualmente a guerra é um ato de legítima defesa, já não é mais um ato de soberania do Estado, exercido segundo as conveniências das partes.
O direito de legítima defesa é entendido como um direito que surge no caso de um ataque armado de um Estado contra outro Estado, enquanto o Conselho de Segurança não reage ou no caso de ausência de reação por parte deste órgão. Este recurso deve ser exercido dentro de condições restritivas: impossibilidade de reagir por outros meios, uso proporcional da força, no respeito pelo direito humanitário e apenas para afastar o ataque armado e enquanto durar a agressão ou até o Conselho de Segurança tomar as medidas necessárias.
O direito internacional contemporâneo, cuja pedra basilar é a Carta das Nações Unidas, concluída em São Francisco em 26 de Junho de 1945 proíbe o uso ou a ameaça do uso da força. O artigo 2º/4 da Carta estipula que os membros da Organização se deverão abster nas suas relações internacionais de recorrer à ameaça ou ao uso da força. A Legitima defesa só pode ser empregada perante prévia agressão armada de outro estado, devidamente provada e jamais de modo preventivo, artigo 51 da Carta das Nações Unidas. E é de exclusivo poder do Conselho de Segurança decidir sobre o uso da força coletiva contra outro Estado, artigos 24 e 25.
É bem verdade que não é isto o que ocorre no cenário internacional.
Recordando o ocorrido no fatídico 11 de setembro de 2001, quando o grupo islâmico Al-Qaeda cometeu uma série de ataques terroristas contra os Estados Unidos, e deixou um saldo de mortes próximo a 3000 pessoas. O então presidente George W. Bush prometeu a derrotada do “eixo do mal”, expressão usada para denominar os terroristas, Parece evidente que nesse caso não se tratou inicialmente de uma guerra propriamente dita, mas sim de vingança e demonstração de poder e soberania, em resposta a um ataque terrorista extremamente grave praticado por uma organização não-estatal contra o Estado americano
O governo dos Estados Unidos, alegando precisar proteger a população mundial de futuros ataques, resolveu travar uma batalha contra o Iraque, país segundo ele possuidor de arsenal bélico suficiente para ameaçar toda a nação. Sua justificativa foi a legitima defesa preventiva[22], que seria aceita se de fato houvesse provas de precisão.
Neste caso o uso da força armada e militar foi colocada como primeira opção, sendo desconsiderado o parecer da ONU e todos os regulamentos internacionais que colocam a guerra como a útima das opções dentro dos meios de solução de conflitos. Voltou-se a era em que a vontade do “princípe” soberano era suficiente para declarar uma guerra de carater internacional.[23]
Alguns autores, como Luciano Martins, defendem que a guerra declarada por Bush em 2002 pouco teve a ver com os atentados de 11 de Setembro de 2001. Os atentados serviram de molas propulsoras para que os Estados Unidos da América pudessem demonstrar sua soberania perante o mundo. O que houve foi um exercício de poder e ascensão dos Estados Unidos perante o restante do mundo. Pois neste episódio nenhum país em todo o território global foi capaz de conter os seus atos. Nem mesmo a ONU, teve força para conter a ação unilateral da superpotência americana em seus propósitos para compor uma nova ordem mundial sob sua hegemonia. Houve uma grande “fogueira” onde a Carta das Nações Unidas foi queimada com louvor pelo Estado americano, ao demonstrar a sua força e ascensão perante o mundo. E como não poderia deixar de ser, a subordinação mundial para com eles.
Os Estados Unidos anunciou que não respeitaria as convenções de Genebra sobre o tratamento de prisioneiros, sendo assim cometeu graves violações às convenções de Genebra sobre a guerra. Zonas civis nas cidades foram bombardeadas e houve uma grande desproporcionalidade nos ataques de um Estado para o outro. Houve uma violação a todo o sistema da Carta da ONU.[24]
Estes fatos suscitaram sérias dúvidas à luz do direito internacional, que não conseguiu se impor perante a soberania de um Estado e mais ainda de uma nação que impôs sua vontade, mesmo contrária ao mundo. Expõe a debilidade do organismo diante de conjunturas de grande divisão de posições entre estados membros[25]
No caso dos ataques terroristas de 11 de Setembro, não houve qualquer resolução das Nações Unidas que autorizasse o uso da força em sua resposta.
O Conselho de Segurança adotou duas resoluções, a 1368/2001, em 12 de Setembro e a 1373/2001, em 28 de Setembro, onde condenava os ataques terroristas nos Estados Unidos e os considerava como ameaças à paz e segurança internacionais, o que foi confirmado na Resolução 1377/2001 onde declarou que atos de terrorismo internacional constituem uma das mais sérias ameaças à paz e segurança internacionais no século XXI.
Na primeira resolução, o Conselho de Segurança expressa a sua disponibilidade para tomar todas as medidas necessárias para responder aos ataques terroristas de 11 de Setembro e para combater todas as formas de terrorismo, de acordo com as suas responsabilidades ao abrigo da Carta das Nações Unidas. Mas tal não foi seguido de qualquer autorização do uso da força na segunda resolução. Nesta apenas se refere a necessidade de combater por todos os meios, de acordo com a Carta das Nações Unidas, as ameaças à paz e segurança internacionais causadas por atos terroristas. A Resolução 1377 vem reafirmar que uma abordagem global e sustentada, envolvendo a participação e colaboração ativa de todos os membros das Nações Unidas e de acordo com a Carta da Organização e com o direito internacional é essencial para combater o terrorismo internacional.
Outro fato que considerou a guerra travada pelos Estados Unidos contra o Iraque ilegal, foi o fato de não ter sido este a atacar o Estado americano e sim um grupo terrorista, não configurando assim um ataque de Estado soberano para Estado soberano, bem parecido com o que aconteceu recentemente entre Israel e o Líbano.
Houve outros casos que como estes não foram precedidos de uma autorização expressa do Conselho de Segurança para se utilizar a força, suscitando assim a dúvida sobre a sua legitimidade, como o caso de Kosovo, onde houve a utilização da força pela NATO em 1999 contra a ex-Iugoslávia, embora nesse caso pudesse existir um forte argumento em favor da intervenção humanitária, sendo certo também que o Conselho de Segurança se encontraria paralisado face ao provável veto da Rússia e/ou da China.
Importa dizer que a Legítima defesa preventiva não é uma figura jurídica internacional, pois assim como já foi dito, um Estado só pode reagir com agressão armada se tiver sido vítima de uma agressão armada. Ele não pode imaginar que será agredido e agredir primeiro, pois assim estará ensejando a legítima defesa da outra parte que sofreu o ataque primeiro. Tornado assim a guerra justa para o outro Estado, mas não para ele.
Luta pela autodeterminação de um povo contra a dominação colonial
A luta pela liberdade e contra a dominação estrangeira é um fator concreto e foi realizada diversas vezes na história. Vários povos lutaram e ainda lutam para se tornarem livres e independentes de pressões estrangeiras.
O direito à autodeterminação e à independência é uma legítima Resistência; e isso é previsto e autorizado pelo artigo 51 da Carta das Nações Unidas, referente à autodefesa.
A Resistência muitas vezes violenta é o resultado de uma ocupação militar desumana que inflige arbitrariamente castigos cotidianos; que nega a possibilidade da própria existência dos meios de subsistência, e que destrói sistematicamente toda a perspectiva de futuro do povo a ser dominado.
Existem casos históricos que perduram no tempo, como o constante conflito entre a Palestina e Israel.
Outro caso foi a luta armada de libertação moçambicana desencadeada para pôr fim à dominação colonial portuguesa em 25 de Setembro de 1964. O povo moçambicano foi invadido e ocupado por um país estrangeiro, privado de todos os seus direitos políticos, submetido à exploração do seu trabalho e das suas riquezas pêlos monopólios capitalistas, privado da sua personalidade, da sua história e da sua cultura.
Portanto, a resistência a autodeterminação de um povo é legal, obedecendo sempre os princípios a serem adotados em conflitos armados, como a proporcionalidade, e o respeito aos direitos humanos.
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