Resumo: Conquanto o Direito brasileiro tenha um sistema normativo bastante protetivo do consumidor, muitas vezes essa proteção não se efetiva, em razão da maneira pela qual as ações de indenização por dano relativo ao produto ou serviço vêm sendo julgadas. Por meio da análise do método de comparação de casos semelhantes, procuraremos tecer uma breve e despretensiosa crítica ao que se passa atualmente na jurisprudência.
Palavras-chave: indenização; dano ao consumidor; método de comparação de casos semelhantes; semelhanças; peculiaridades.
Sumário: Introdução; 1. Análise do método de comparação de casos semelhantes; 2. Crítica da jurisprudência pátria contemporânea; Conclusão; Referências bibliográficas.
Introdução
Não é preciso ser jurista para saber que são abundantes no Judiciário as ações de indenização ao consumidor por dano relativo ao produto ou serviço. E também não é preciso ser jurista para observar a maneira como essas ações são julgadas.
Na sociedade contemporânea, em que tudo acontece em alta velocidade, são múltiplas as situações que constrangem o consumidor, ao se utilizar de um produto ou serviço, havendo muitas vezes abalo moral e prejuízo material. Por vezes é a insistente cobrança, por telefonemas, SMS e até carta, de débitos já quitados; outras vezes, é a vergonha de ter o cartão de crédito recusado no caixa de uma loja, sem que haja qualquer razão para a recusa; outras vezes, ainda, são os transtornos de perder um compromisso em razão do atraso ou do cancelamento de um vôo.
E, nessa mesma sociedade em que tudo ocorre rápido demais, também o julgamento das ações por meio das quais o consumidor busca a reparação dos danos sofridos deve ser agílimo, ou ao menos é o que comumente se espera.
Nesse contexto, a utilização do método de comparação de casos semelhantes para decidir essas lides quase que se impõe. No entanto, a efetividade da atividade jurisdicional depende de que o método seja aplicado corretamente, o que, infelizmente, muitas vezes não é o que se observa.
1. O método de comparação de casos semelhantes
O que chamamos neste trabalho de “método de comparação de casos semelhantes” é o método de julgamento predominante na Common Law, em que se denomina “reasoning by example”.
Em apertada síntese, o método de comparação de casos semelhantes consiste no levantamento dos fatos descritos pelo autor e na busca de casos precedentes que envolvam fatos semelhantes. Posteriormente, comparam-se os fatos para descobrir se os casos podem ser considerados semelhantes ou não. Se houver semelhança, passa-se à extração da norma que foi aplicada ao caso precedente, para, então, aplicá-la ao caso sub judice.
“O padrão básico do raciocínio jurídico é o raciocínio por meio de exemplos. É o raciocínio de caso a caso. Trata-se de um processo de três etapas, descrito pela doutrina dos precedentes, em que uma proposição descritiva do primeiro caso transforma-se em uma norma, e, então, é aplicada à próxima situação semelhante. As etapas são as seguintes: identifica-se a semelhança entre os casos; abstrai-se a norma inerente ao primeiro caso; então, aplica-se o preceito ao segundo caso”.[1]
Dessa breve explanação já se percebe que o método de comparação de casos semelhantes não implica que os casos terão a mesma decisão, mas sim que aos fatos semelhantes serão aplicadas as mesmas normas.
Há sempre, ainda, que estudar o Direito comparado fazendo as devidas adaptações ao nosso sistema jurídico, sob pena de mal aplicar as ideias importadas. No sistema de Common Law, o método de comparação de casos semelhantes é utilizado para identificar o direito aplicável, que nasce do precedente; no nosso sistema, o método é usado para ratificar o direito aplicável, que decorre, em geral, da lei.
Ao aplicar o método de comparação de casos semelhantes, deve-se ter em mente que as analogias têm intensidades diversas, que variam de acordo com a relevância das semelhanças estabelecidas entre objetos diferentes. A conclusão a que se chega a partir de uma analogia depende, essencialmente, dos elementos comparados. Será fraca, se, independentemente do número de comparações, muitas ou todas forem irrelevantes; será forte, se as comparações feitas forem relevantes.
Imaginemos que Clóvis, aposentado, compra uma passagem aérea para viajar do Rio de Janeiro, onde reside, a São Paulo, onde irá visitar um amigo. Em razão de um problema elétrico na aeronave, o vôo sofre um atraso de seis horas. Clóvis ajuíza ação de indenização em face da companhia aérea para ser ressarcido do prejuízo moral que sofreu. O pedido é julgado procedente, considerando-se a responsabilidade civil objetiva da transportadora – fornecedora de serviço – e concluindo-se que o problema elétrico tem a natureza de fortuito interno, razão pela qual não rompe o nexo causal e, por conseguinte, não ilide a responsabilidade da companhia. Condena-se a ré ao pagamento de indenização arbitrada em R$3.000,00.
Tempos depois, Augusto, consultor jurídico, residente no Rio de Janeiro, compra uma passagem aérea para viajar a São Paulo, onde participará de uma reunião para fechar um importante contrato. O vôo de Augusto também sofre um atraso de seis horas em razão de um problema elétrico na aeronave, e ele perde a reunião. Para ser indenizado do dano moral sofrido, Augusto ajuíza ação em face da companhia aérea.
Veja-se que, nessa hipótese, os fatos são semelhantes: tanto Clóvis quanto Augusto compraram passagens para vôos que atrasaram seis horas, e ambos perderam encontros marcados. Por essa razão, devem ser aplicadas às respectivas ações as mesmas normas, as quais estatuem a responsabilidade civil objetiva da companhia aérea e que afastam a excludente de responsabilidade considerando que o problema elétrico da aeronave consiste em um fortuito interno, inábil para romper o nexo causal e ilidir o dever de indenizar. Todavia, não é razoável que ambas as ações tenham o mesmo desfecho: considerando-se as peculiaridades de cada caso, que os distanciam – daí serem ditos semelhantes e não iguais – conclui-se que o dano sofrido por Augusto foi maior que o experimentado por Clóvis, razão pela qual a indenização devida a Augusto não deverá ser fixada no mesmo montante arbitrado para Clóvis.
O papel altamente relevante do julgador, destarte, é o de determinar não apenas as semelhanças entre os casos, como também as peculiaridades que os extremam, para, então, aplicar o direito.
Outro exemplo. Caio, “bom pagador”, é confundido com outra pessoa pelo gerente de um banco, que, em voz alta, o chama de caloteiro.
Posteriormente, Miguel, pessoa de má reputação e conhecida má-fé, inclusive condenado por estelionato, é chamado de caloteiro pelo gerente de um banco ao tentar perpetrar uma fraude.
Em ambos os casos os fatos são parecidos: tanto Caio quanto Miguel foram chamados de caloteiros, em público, por um gerente de banco. Ocorre que Caio, em razão desse fato, sofreu um grave abalo moral, pois sempre fez questão se honrar seus compromissos e ter nome limpo na praça. Por sua vez, não se pode dizer que Miguel tenha sofrido dano psíquico ao ser chamado de caloteiro quando tentava obter uma vantagem indevida, inclusive porque era notoriamente desonesto e porque já havia até mesmo sido condenado por estelionato. Conquanto em ambos os casos a responsabilidade do banco, fornecedor de serviço, fosse objetiva, no primeiro ela se configura, pois há dano, e, no segundo, não, pois há, no máximo, mero aborrecimento. Em um, há dever de indenizar; no outro, não. Destarte, não cabe analogia entre eles.
2. Crítica da jurisprudência pátria contemporânea
Conquanto uma singela análise revele a aparente simplicidade do método de comparação de casos semelhantes, um estudo da jurisprudência contemporânea revela uma perigosa tendência de má utilização da técnica no julgamento de ações de indenização ao consumidor por fato do produto ou serviço.
Não se pode perder de vista que o que se julga são casos, e não temas, ainda que estes sejam subjacentes àqueles. Entretanto, o que tem acontecido é que, “definida a tese, todos os demais casos serão julgados com base no que foi pré-determinado; para isso, as especificidades destes novos casos também são desconsideradas para que se concentre apenas na ‘tese’ que lhes torna idênticos aos anteriores”[2]. A crítica que se faz é que a aproximação entre o Common Law e o Civil Law, como tem ocorrido no Brasil, dá-se de uma maneira despreocupada com uma teoria do precedente sólida e harmônica – porquanto o precedente não consiste em um comando inexorável que deve ser aplicado sem se levar em conta as especificidades de cada caso.
Vejamos, à guisa de ilustração, a hipótese do consumidor que tem seu nome inserido em cadastros de proteção ao crédito em razão de dívida não paga contraída em seu nome por falsário.
Encontram-se, na jurisprudência, as seguintes tendências: considerar que o fornecedor responde objetivamente pela negativação indevida e que o dano moral é in re ipsa; considerar que a atuação do terceiro, falsário, rompe o nexo causal, razão pela qual não há responsabilidade do fornecedor; considerar que há responsabilidade objetiva, mas que não há dano se o nome do consumidor já se encontrava negativado.
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATOS NÃO CELEBRADOS PELA AUTORA. FRAUDE. NEGLIGÊNCIA DOS RÉUS. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTROS DE DEVEDORES. DANO MORAL ‘IN RE IPSA’. INDENIZAÇÃO. FIXAÇÃO. MANUTENÇÃO DO ‘QUANTUM’. IMPROVIMENTO DO RECURSO. 1 – Tratando-se de ação declaratória de inexistência de relação jurídica e, por conseguinte, de débito apto a justificar a inserção em cadastro de inadimplentes, é ônus dos réus, pretensos credores, provar a existência de vínculo contratual, por tratar-se de prova negativa. 2 – A inscrição em cadastro de devedores de pessoa que sequer celebrou contrato configura ato ilícito apto a ensejar a condenação ao pagamento de indenização por danos morais. 3 – O dano moral, neste caso, existe ‘in re ipsa’, ou seja, para sua configuração basta a prova da ocorrência do fato ofensivo. 4 – O valor da indenização deve ser mantido, quando fixado dentro da razoabilidade.” (TJMG. Apelação Cível nº 1.0153.09.093271-3/001, 16ª Câmara Cível, relator: Des. José Marcos Vieira, data do julgamento: 10/12/2010)
“APELAÇÃO – RELAÇÃO DE CONSUMO – EMPRESA DE TELEFONIA – RESPONSABILIDADE CIVIL – CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO – EXCLUDENTE – DENUNCIAÇÃO DA LIDE FACULTATIVA – DENUNCIANTE VENCEDOR NA AÇÃO PRINCIPAL – HONORÁRIOS E CUSTAS – RESPONSABILIDADE. 1. Em contrato envolvendo relação de consumo, a culpa exclusiva de terceiro é causa excludente da responsabilidade civil da empresa de telefonia. 2. Nos casos em que a denunciação é facultativa, o denunciante à lide, mesmo tendo sido vencedor na ação principal, deve arcar com os honorários advocatícios devidos ao denunciado e com as custas processuais relativas à lide secundária. V.v.p. Há negligência da empresa contratante no contrato firmado por falsário, havendo, pois, obrigação de indenizar.” (TJMG. Apelação Cível nº 1.0024.04.200873-0/001, 15ª Câmara Cível, relator: Des. Maurílio Gabriel, data do julgamento: 29/6/2010)
“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – HABILITAÇÃO FRAUDULENTA DE LINHA TELEFÔNICA – RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA OPERADORA LOCAL E DA OPERADORA DE LONGA DISTÂNCIA – NEGATIVAÇÃO INDEVIDA – EXISTÊNCIA DE NEGATIVAÇÃO PRECEDENTE – INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 385 DO STJ – DANO MORAL INDEVIDO. A operadora de telefonia de longa distância e a operadora local respondem de forma objetiva e solidária pelos danos decorrentes da inscrição indevida nos cadastros de inadimplentes por dívida contraída por falsário. Restando comprovado que o autor não celebrou qualquer contrato com as empresas rés e nem possui qualquer débito para com estas, deve ser declarada a inexistência de relação jurídica entre as partes e de débito por parte daquele, assim como deve o seu nome ser excluído dos cadastros de maus pagadores, em função da dívida anunciada pelas requeridas, mas não havendo que se falar em dano moral em virtude da existência de prévia e legítima inscrição de seu nome nos cadastros de proteção ao crédito, conforme entendimento já pacificado na Súmula 385 do STJ.” (TJMG. Apelação Cível nº 1.0024.06.151121-8/002, 18ª Câmara Cível, relator: Des. Armando Maciel, data de julgamento: 8/2/2011)
Se, por um lado, sabe-se que o julgador é livre, no sistema brasileiro, não sendo vinculado às decisões precedentes, por outro espanta que, na aplicação do método da comparação de casos semelhantes, certas peculiaridades que deveriam ter grande peso na analogia sejam despercebidamente deixadas de lado. É natural e esperado que um tema como o da negativação indevida do nome do consumidor gere posicionamentos diferentes, mas espera-se que as divergências se fundem em fatos peculiares que diferenciam os casos concretos.
Analisemos três casos julgados pelo TJMG para, brevemente, ilustrar o que queremos dizer.
“Caso 1
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE AS PARTES – NEGATIVAÇÃO INDEVIDA – RESPONSABILIDADE DA EMPRESA RECONHECIDA – VALOR INDENIZATÓRIO RAZOÁVEL. Inexistindo relação jurídica entre as partes e não havendo débito por parte da apelada, já que a contratação com a apelante foi efetivada por terceiro e com o uso dos documentos furtados da apelada, indevida a inscrição do seu nome no cadastro de maus pagadores e configurado o dano moral suportado pela mesma, o qual é presumido e decorre da própria negativação injusta. A indenização deve ser fixada segundo critérios de razoabilidade e proporcionalidade e com observância das peculiaridades do caso. Adequado e pertinente o valor fixado pelo Magistrado a quo.” (TJMG. Apelação Cível n° 1.0145.08.467028-3/001, 18ª Câmara Cível, relator: Des. Arnaldo Maciel, data do julgamento: 29/9/2009)
“Caso 2
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – LEGITIMIDADE PASSIVA DA EMPRESA NEGATIVADORA – INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE AS PARTES – NEGATIVAÇÃO INDEVIDA – DANO MORAL CONFIGURADO – RESPONSABILIDADE RECONHECIDA – VALOR INDENIZATÓRIO – MAJORAÇÃO – CABIMENTO. Inexistindo relação jurídica entre as partes, já que o contrato foi celebrado com o uso de documentos fraudados, e não havendo débito por parte do 1º apelante, indevida a inscrição do seu nome no cadastro de maus pagadores e configurado o dano moral por ele suportado, o qual é presumido e decorre da própria negativação injusta. Como a 2ª apelante foi a responsável direta por proceder a negativação e possuindo esta responsabilidade objetiva, deve ser reconhecida a sua legitimidade para figurar no pólo passivo da demanda. A indenização deve ser fixada segundo critérios de razoabilidade e proporcionalidade e com observância das peculiaridades do caso. Cabível a majoração da indenização, porquanto arbitrada em valor módico e inapto a surtir os efeitos esperados, quais sejam, reparar os prejuízos suportados pelo consumidor e, principalmente, inibir novas e similares condutas por parte da empresa.” (TJMG. Apelação Cível n° 1.0024.04.373249-4/001, 18ª Câmara Cível, relator: Des. Arnaldo Maciel, data do julgamento: 2/2/2010)
“Caso 3
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE AS PARTES – NEGATIVAÇÃO INDEVIDA – DANO MORAL CONFIGURADO – RESPONSABILIDADE DO SOLICITANTE DA INSCRIÇÃO RECONHECIDA – VALOR INDENIZATÓRIO – FIXAÇÃO EM QUANTIA RAZOÁVEL. Inexistindo relação jurídica entre as partes, já que o contrato acostado ao processo foi celebrado com o uso de documentos fraudados, e não havendo débito por parte do consumidor apelante, indevida a inscrição do seu nome no cadastro de maus pagadores e configurado o dano moral por ele suportado, o qual é presumido e decorre da própria negativação injusta. Deve-se ainda reconhecer a responsabilidade da empresa que solicitou a inscrição ilegítima, por se tratar de responsabilidade objetiva, decorrente do risco da própria atividade que desenvolve. A indenização deve ser fixada em quantia razoável e proporcional, que se amolde às peculiaridades do caso e que atenda aos objetivos do instituto do dano moral, quais sejam, compensar a vítima pelos prejuízos suportados, punir o agente pela conduta já praticada e inibi-lo na adoção de novas condutas lesivas, mas que não seja capaz, por outro lado, de importar no enriquecimento sem causa do consumidor.” (TJMG. Apelação Cível n° 1.0145.10.015283-7/001, 18ª Câmara Cível, relator: Des. Arnaldo Maciel, data do julgamento: 16/11/2010)
O exame desses casos revela, já da leitura das ementas, como também dos acórdãos, que os julgamentos se utilizaram do método de comparação de casos semelhantes. Em conclusão, aos três se aplicaram as mesmas normas.
Ocorre que, entre o caso 2 e os casos 1 e 3, há uma peculiaridade – que passou despercebida –, a qual enfraquece a analogia ao ponto de torná-la inadequada: cuida-se do fato de que, no caso 2 – conforme consta do relatório do acórdão – o nome do consumidor já se encontrava negativado, o que, segundo se entende, deve interferir no quantum indenizatório arbitrado. Curiosamente, deve-se destacar que no corpo do voto do relator há transcrição de decisão do STJ exatamente nesse sentido[3]. No entanto, o fato não foi levado em conta, e a indenização, no caso 2, foi fixada em R$9.300,00 – aproximando-se bastante do montante arbitrado no caso 1.
Já entre os casos 1 e 3 há semelhanças, e, da leitura do acórdão, poucas distinções se percebem. A fundamentação do decisum, nos dois casos, é a mesma. No julgamento do caso 1, afirmou-se que:
“Já de início, imperioso notar que os documentos anexados às fls. 24/25 comprovaram que a apelada foi vítima de um furto em 07/10/2004, oportunidade em que foram levados os seus documentos pessoais, tais como CPF, carteira de identidade e talões de cheque, que certamente foram utilizados por terceiro para realizar a contratação fraudulenta com a apelante e contrair diversas dívidas, dentre as quais, aquelas que levaram esta última a inscrever o nome da apelada nos cadastros de maus pagadores.
Em que pese toda a argumentação levantada pela apelante quanto à licitude da sua conduta, ao argumento de que a apelada não teria comprovado que não teria sido a responsável pela contratação que ensejou a sua negativação, certo é que esta última demonstrou que foi vítima do já mencionado furto e tudo apontando para o fato de que apenas a partir deste evento é que passou ela a ter problemas com a negativação de seu nome, como se observa pelo documento de fls. 23.” (TJMG. Apelação Cível n° 1.0145.08.467028-3/001, 18ª Câmara Cível, relator: Des. Arnaldo Maciel, data do julgamento: 29/9/2009 – trecho do voto do relator)
E, no do caso 3, asseverou-se que:
“A despeito das alegações tecidas pela ora apelada em sede de contestação, de que teria sido o próprio apelante o responsável pela contratação e pela dívida que ensejou a negativação de seu nome, fato é que toda a documentação acostada ao feito, aliada às informações prestadas na inicial, deixou patente e inegável que o apelante foi vítima de fraude praticada por terceiro estelionatário, que falsificou a sua documentação e a utilizou para realizar negócios jurídicos diversos, sem adimpli-los, por óbvio, dentre os quais aquele celebrado com a ora apelada, mas jamais tendo o apelante estabelecido qualquer relação jurídica com esta última e, muito menos, possuindo qualquer débito para com ela, não pairando dúvidas, portanto, quanto à total irregularidade da inscrição em análise e à necessidade de seu cancelamento, como acertadamente decidiu o digno Juiz a quo.” (TJMG. Apelação Cível n° 1.0145.10.015283-7/001, 18ª Câmara Cível, relator: Des. Arnaldo Maciel, data do julgamento: 16/11/2010 – trecho do voto do relator)
Ante à analogia mais forte, dever-se-ia esperar um desfecho semelhante. Não obstante, a indenização no caso 1 foi fixada em R$7.000,00, enquanto, no caso 2, em apenas R$2.550,00 – conquanto o pedido inicial fosse de R$82.750,00 (!).
CONCLUSÃO
O que se pretendeu fazer brevemente neste trabalho foi chamar a atenção dos juristas para o fenômeno da aplicação do método da comparação de casos semelhantes no julgamento de ações de indenização ao consumidor por fato do produto e serviço no Brasil, vez que a utilização inadequada dessa ferramenta ameaça a eficiência da proteção do consumidor, a qual, em sede de direito material, tanto avançou em nosso país.
Ao mesmo tempo em que se reconhece ao julgador o livre convencimento, espera-se que, na fundamentação de uma decisão, com menção a julgados anteriores, a analogia seja forte a ponto de convencer o jurisdicionado de que seu caso realmente merecia ser decidido pela aplicação dos mesmos preceitos.
É extremamente frustrante, para dizer o mínimo, ver um caso sendo decidido sem que os fatos narrados ao magistrado sejam todos analisados; ver comparações sendo feitas, e normas aplicadas, sem que se atente para as peculiaridades que revelam divergentes casos que, de início, pensavam-se parecidos.
Coautor do Curso Didático de Direito Civil com Elpídio Donizetti. Professor titular de Direito Civil dos cursos de pós-graduação do IUNIB professor convidado de Direito Civil do curso de pós-graduação da Anhanguera e professor voluntário de Direito Civil da FD UFMG. Mestrando em Direito e Justiça na UFMG. Consultor jurídico e advogado.
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