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A participação popular: possibilidade de fortalecimento do controle social nas conferências de assistência social dos Campos Gerais

Resumo: O presente artigo tem por objetivo refletir sobre o processo de participação social da população nas discussões da política pública de assistência social nas instâncias de controle social, sinalizando a participação nas Conferências Municipais de Assistência Social. Para isso, partimos das reflexões históricas relativas a democratização cidadã, a política de assistência social, o controle social e a participação social. Procuramos destacar a importância da participação social e do controle social no Sistema Único de Assistência Social, a partir de autores que discutem a temática e das legislações em vigor. As Conferências realizadas no ano de dois mil e quinze nos municípios dos Campos Gerais serviram como parâmetro de reflexão para este trabalho.

Palavras-chave: Política de Assistência Social; Participação social; Controle social; Conferências.

Abstract: The present paper has for foundation to reflect about the social participation process of population in the discussions of public politic of social assistance in the instances of social control, indicating the participation in the Municipal Conferences of Social Assistance. For this, started from the historical reflections relate to the citizen democratization, the policy of social assistance, the social control and the social participation. Aimed to contrast the importance of the social participation, and the social control in the Unique System of Social Assistance, starting from authors that discuss the theme and the applicable laws. The Conferences held in the year two thousand and fifteen in the municipalities of Campos Gerais served as parameter of reflection to this paper.

Keywords: Policy of Social Assistance; Social Participation; Social Control; Conferences.

Sumário: Introdução. 1.Construção histórica de Cidadania e Participação Social. 2.A Política Nacional de Assistência Social e o Controle Social. 3.Conselhos de Políticas públicas. 4.Conferências de Assistência Social. 5.A Participação Social nas Conferências de Assistência Social. Conclusão

Introdução

Decorridos vinte e sete (27) anos de promulgação da Constituição Federal de 1988, vinte e dois (22) anos da regulamentação da Lei 8.742, de 07 de dezembro de 1993 – Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS e dez (10) anos de implantação do SUAS – Sistema Único de Assistência Social, faz-se necessário realizar uma análise sobre os caminhos do controle social no âmbito do SUAS.

Iniciamos esta análise a partir do processo de construção histórica democrática, de cidadania, reconhecendo o fortalecimento do Estado e da sociedade civil, fundamentalmente pela via dos espaços de diálogos entre os sujeitos sociais governamentais e não governamentais.

Desta forma entendemos a necessidade da publicização das práticas sociais que envolvem para além dos interesses individuais, que representam interesses coletivos no ambiente público, assim as Conferências vem para fortalecer a participação social popular e dar visibilidade pública as ações construídas em conjunto com a esfera governamental.

1. Construção histórica de Cidadania e Participação Social

As conquistas obtidas pelas lutas sociais para efetivação da democracia e da cidadania ocorridas na década de 1980 resultaram na Constituição Federal de 1988, instrumento de efetivação e garantia de direitos, que no seu artigo primeiro, parágrafo único, estabelece que todo poder emana do povo, que exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, que neste momento abre a perspectiva para a articulação entre a democracia representativa e a participativa, “possibilitando a democratização do Estado e legitimando a criação, pelas leis que regulamentaram as políticas públicas, de órgãos deliberativos institucionalizados, com participação da sociedade civil, como as conferências e os conselhos” (OLIVEIRA e OLIVEIRA, 2011).

No sentido de realizar um de seus princípios fundamentais – a cidadania, a Constituição Cidadã trouxe em sua concepção a assistência social como direito e não mais como ações de benemerência das Instituições e do Estado. Ou seja, a partir deste marco legal a assistência social passa a ser elemento fundamental na luta pela realização dos objetivos de justiça e igualdade social.

A partir da década de 1990, iniciam os primeiros indicativos de consolidação da democracia através da regulamentação dos artigos constitucionais, dentre os quais podemos destacar os art. 203 e 204 da Assistência Social. Materializando esse processo, em 1993 o Presidente Itamar Franco aprovou a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), que estabelece uma nova concepção para a Assistência Social, com o status de política social, incluída no tripé da Seguridade Social. Então a assistência social passa a ser reconhecida como um direito de cidadania, para todos que necessitarem, sem contribuição prévia e de responsabilidade pública.

2. A Política Nacional de Assistência Social e o Controle Social

A Politica Nacional de Assistência Social[1] – PNAS instituiu o SUAS, reiterou a diretriz da LOAS no que se refere à participação da população na formulação e no controle das ações, tendo como um dos eixos estruturantes do sistema o controle social, enquanto “novas bases para a relação entre o Estado e Sociedade Civil”. (PNAS, 2004)

COLIN faz referência ao processo de aprimoramento da LOAS que representa a constituição do SUAS em todo o território nacional, “cumprindo no tempo histórico dessa política as exigências para a realização dos objetivos e resultados esperados que devem consagrar direitos de cidadania e inclusão social (PNAS, 2004 p.23).

O Controle Social tem sua concepção decorrente da Constituição Federal de 1988, como meio de efetivação da participação popular no processo de gestão político administrativa-financeira e técnico-operativa, democrático e descentralizado.

O termo controle social pode ser entendido como controle da sociedade civil sobre as ações do Estado, com a perspectiva de garantir a participação dos setores organizados da sociedade na formulação, gestão e controle das políticas públicas, ou mesmo na definição de recursos para que estas atendam aos interesses da coletividade (CORREIA, 2004). Entendemos que é o exercício de democratização da gestão pública, que permite à sociedade organizada intervir nas políticas públicas, interagindo com o Estado para a definição de prioridades e na elaboração dos planos de ação dos municípios, estados e ou do governo federal.

Neste sentido RAICHELLIS afirma que

“a visão de controle social inscrita na Constituição Federal vai enfatizar a participação dos setores organizados da sociedade civil, especialmente dos trabalhadores e dos segmentos populares, na elaboração e implementação das políticas públicas, propondo novas relações ente o movimento social e a esfera da política institucional. (2011, p. 22)”.

E SILVA reitera que “a concepção de controle social requer ainda um maior esclarecimento para poder superar limitações que impedem um exercício democrático” (SILVA et al., 2009, p.263).

“O controle social ocorre com a participação da população na gestão da política social, compreendendo além das funções de fiscalizar e avaliar os Planos de Assistência Social, as funções de controlar e acompanhar o financiamento e a gestão dos fundos de Assistência Social (Pereira e Dal Prá, 2012)”.

3. Conselhos de Políticas públicas

Os conselhos destacam-se como espaço privilegiado de participação da sociedade no exercício do controle social sobre as políticas públicas, exercem um conjunto de ações de natureza sócio-política e técnico-operativa, objetivando exercer influências sobre as ações governamentais. Nesse contexto, é oportuno elencar, de acordo com CAMPOS (2009), três dimensões distintas e indissociáveis desse processo complexo:

“a) a dimensão política, que refere-se à mobilização da sociedade para influenciar a agenda governamental e indicar prioridades;

b) a dimensão técnica que corresponde ao trabalho da sociedade de fiscalizar a gestão de recursos e a apreciação das ações governamentais, inclusive sobre o grau de efetividade dessa última na vida dos destinatários; e

c) a dimensão ética que diz sobre a construção de novos valores e de novas referências, fundadas nos ideais de solidariedade, da soberania e da justiça social”.

Segundo TATAGIBA (2002) os conselhos de políticas públicas, dentre os quais ele situa os Conselhos de Assistência Social:

“São em geral, previstos em legislação nacional, tendo ou não caráter obrigatório, e são considerados parte integrante do sistema nacional, com atribuições legalmente estabelecidas no plano da formulação e implementação das políticas na respectiva área governamental, compondo as práticas de planejamento e fiscalização das ações. […]Neste grupo situam-se os conselhos de saúde, de Assistência social, de educação[….] […]Dizem respeito à dimensão da cidadania, da universalização de direitos sociais e a garantia ao exercício desses direitos (TATAGIBA, 2002, p 49)”.

Para RAICHELLIS (2011) os conselhos são espaços de exercício do controle social, mas também precisam ser controlados pela sociedade civil organizada, precisam ser ativados pela ação dos movimentos populares e organizações sociais e políticas que devem estar representados.

O Controle Social, no âmbito dos conselhos de assistência social, é o exercício democrático de acompanhamento e a avaliação da implementação e execução do SUAS, cujo objetivo é zelar pela ampliação e qualidade da rede de serviços socioassistenciais para a universalização de atendimento a todos os destinatários da Política de Assistência Social e os gastos das verbas públicas.

4. Conferências de Assistência Social

Outra forma de controle social são as conferências, definidas pelo Ministério do Desenvolvimento Social – MDS como sendo

“espaços de caráter deliberativo em que é debatida e avaliada a Política de Assistência Social. Também são propostas novas diretrizes, no sentido de consolidar e ampliar os direitos socioassistenciais dos seus usuários. Os debates são coletivos com participação social mais representativa, assegurando momentos para discussão e avaliação das ações governamentais e também para a eleição de prioridades políticas que representam os usuários, trabalhadores e as entidades de assistência social. (MDS)”

As Conferências são espaços amplos e democráticos de discussão e articulação coletiva entorno de propostas e estratégias de organização. Sua principal característica é reunir governo e sociedade civil para debater e decidir as prioridades nas Políticas Públicas para os próximos anos. Elas são realizadas em âmbito municipal, estadual e federal, periodicamente, fazem parte de um processo amplo de diálogo e democratização da gestão pública e suas resoluções têm caráter vinculatório, devendo ser transformadas em ações do Executivo.

A I Conferência Nacional de Assistência Social aconteceu em 1995, precedida pelas municipais e estaduais, desde então estamos trilhando um caminho de construção do direito ao acesso e participação nos benefícios e serviços socioassistenciais, pela população brasileira, na perspectiva pública e de cobertura universal em todo o país. (CNAS, 2015).

5. A Participação Social nas Conferências de Assistência Social

Diante da relevância que o controle social possui para a promoção efetiva da cidadania e para a garantia dos direitos, o presente trabalho faz uma reflexão sobre a participação social nas Conferências Municipais de Assistência Social dos Campos Gerais.

Como base de reflexão optamos pelo quantitativo de participantes nas Conferências Municipais de Assistência Social.

A tabela abaixo nos mostra o número de participantes, por segmento, nas conferências realizadas em 2015, nos dezoito (18) municípios dos Campos Gerais.

Podemos observar uma significativa participação de usuários do SUAS, do total dos 1.069 participantes, 360 são usuários. Se considerarmos o número de habitantes dos municípios em questão, percebemos que a adesão da população usuária é limitada, tornando-se um desafio para a política de assistência social e o conselho da política pública a participação efetiva deste segmento nas Conferências.

A consolidação da participação dos usuários nos conselhos de Assistência Social é um dos objetivos do SUAS e de acordo com a Resolução CNAS Nº 11, de 23 de setembro de 2015:

“Art. 5° A participação dos usuários na Política Pública de Assistência Social e no SUAS se dará por meio de diferentes organizações coletivas, que visam a promover a mobilização e a organização de usuários de modo a influenciar as instâncias de deliberação do SUAS, e que possibilitam a sua efetiva participação nas instâncias deliberativas do SUAS – os conselhos e as conferências”.

Conclusão

De acordo com o SUAS, é necessário que os conselhos tenham capacidade de estimular a participação da população nos espaço de deliberação, fiscalização e controle das políticas públicas. Entendemos que a capacidade de mobilização dos conselheiros para o exercício do controle social está, em parte, atrelada ao acesso às informações técnicas, compreendendo desde suas atribuições até os aspectos financeiros da Política de Assistência Social.

Mesmo percebendo a necessidade de avanço de participação nas instancias de controle social, devemos considerar que houve um número significativo de participantes usuários da política de assistência social nas Conferências Municipais dos Campos Gerais, visto que a participação popular nas instâncias deliberativas, é algo recente.

Nesta perspectiva é extremamente importante criar estratégias de mobilização dos diversos atores coletivos envolvidos com a política de assistência social, na garantia de efetivar a participação de usuários por meio da ocupação dos espaços de deliberação e controle da referida política, idealizando novos avanços e desafios.

Dentre os desafios que ainda encontramos no exercício do controle social no SUAS destacamos: a) fortalecer os espaços de diálogo, b) publicizar as ações dos equipamentos públicos e c) estimular a participação nas instâncias de controle social.

 

Referências
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988.
______. Lei Orgânica de Assistência Social – lei nº 8.742 de 7 de dezembro de 1993.
______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – Política Nacional de Assistência Social. Brasília, 2004.
______. Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome – Sistema Único de Assistência Social. Brasília, 2005.
______. Conselho Nacional de Assistência Social – Resolução CNAS Nº 11, de 23 de set. 2015.
______. Conselho Nacional de Assistência Social. Contextualização do Tema da X Conferência Nacional de Assistência Social – 2015 – disponível em http://www.sedhast.ms.gov.br/wpcontent/uploads/sites/21/2015/01/Contextualiza%C3%A7%C3%A3o-do-texto-para-a-X-CNAS.pdf, acesso em 06 de set. 2015.
CORREIA, M. V. DA C. A Relação Estado/Sociedade e o controle social: fundamentos para o debate. Serviço Social & Sociedade, v. XXV, n. 77, p. 148 – 176, 2004.
COSTA, M. N. de V. Transferência de Renda e Política de Assistência Social: perspectiva de construção de autonomia na gestão social. Curitiba, 2005
OLIVEIRA, C. R. de e OLIVEIRA, R. C. de. Direitos Sociais na Constituição Cidadã: um balanço de 21 anos. Revista Social e Sociedade. São Paulo, n. 105, p. 7, jan./mar. de 2011.
PEREIRA, Daniela Cristina e DAL PRÁ, Keli Regina – Controle Social e Assistência Social: aspectos da realidade dos conselhos municipais do Estado de Santa Catarina – Sociedade em Debate, Pelotas, 18(2): 93-105, jul.-dez./2012
RAICHELLIS, Raquel – O Controle Social Democrático na Gestão e Orçamento Público 20 Anos Depois – Seminário Nacional O Controle Social e a Consolidação do Estado Democrático de Direito Conselho Federal de Serviço Social – CFESS (organizador) Brasília, 2011.
SILVA, V. R. DA et al. Controle social no Sistema Único de Assistência Social: propostas, concepções e desafios. Textos & Contextos (Porto Alegre), v. 7, n. 2, p. 250–265, 2009.
TATAGIBA, L. Os Conselhos Gestores e a Democratização das Políticas Públicas no Brasil. IN: DAGNINO, E. (org) Sociedade Civil e Espaços Públicos no Brasil. São Paulo: Paz e Terra. (2002)

Nota:
[1] PNAS – aprovada em 2004, esse documento apresenta as diretrizes para efetivação da assistência social como direito de cidadania e responsabilidade do Estado.

Informações Sobre os Autores

Eliane Fatima Voitena

Assistente Social graduada pela UEPG Consultora da Emancipar Assessoria e Consultoria especialista em Práticas Interdisciplinares Junto a Família 2007 e Políticas Públicas para a Infância e a Juventude 2011 pela UEPG

Maysa Nuermberg de Vasconcellos Costa

Assistente Social graduada pela PUC-PR Consultora da Emancipar Assessoria e Consultoria membro do Conselho Fiscal do CRESS/PR Gestão 2014-2017 membro do Conselho Municipal de Direitos da Pessoa Idosa e do Conselho de Políticas Públicas sobre Drogas de Ponta Grossa-PR


Equipe Âmbito Jurídico

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