A prestação de alimentos nos casos de união estável homossexual

Sumário: 1. Introdução. 2. União estável. 3. União estável homossexual. 4. Dos alimentos. 4.1. Princípios da obrigação alimentar. 4.2. Fontes da obrigação alimentar. 5. A prestação de alimentos nos casos de união estável homossexual. 6. Conclusão. Bibliografia


1 – INTRODUÇÃO:


O presente artigo objetiva demonstrar o posicionamento da atual jurisprudência brasileira acerca da união estável e a prestação de alimentos nos casos dos casais homossexuais.


Este trabalho possui a finalidade de discutir o assunto, apresentando material para estudo e reflexão sobre a necessidade de uma legislação específica para o tema abordado, para que todos os operadores de direito e a sociedade como um todo reflitam sobre essa realidade e necessidade hodierna.


A pesquisa foi realizada em estudos, artigos, livros e principalmente na jurisprudência pátria uma vez que, o tema é relativamente recente e não possui uma corrente ou doutrina aceita pela maioria dos tribunais.


2 – UNIÃO ESTÁVEL


A maioria dos doutrinadores define a união estável de modo restrito e preconceituoso restringindo em seus estudos aos casais constituídos de homens e mulheres, não se adequando as realidades atuais, deixando de lado as uniões estáveis homoafetivas, como demonstra o posicionamento do professor Álvaro Villaça[1] que esclarece União Estável como a convivência não adulterina nem incestuosa, duradoura, pública e contínua, de um homem e de uma mulher, sem vínculo matrimonial, convivendo como se casados fossem, sob o mesmo teto ou não, constituindo, assim, sua família de fato.


Do mesmo modo, o mestre Jorge Shiguemitsu Fujita[2] conceitua a união estável como sendo a união entre pessoas de sexo diferente, que, sem haverem celebrado casamento, vivem como se casadas fossem, de forma contínua e duradoura.


A Constituição Federal de 1988 trata da família em seu artigo 226 e mais especificadamente sobre a união estável no § 3º, conforme in verbis:


Art 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do estado. (…)


§3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”


O Novo Código Civil, não difere do posicionamento da Constituição Federal e não faz menção à união estável homossexual, tratando somente sobre uniões de homens e mulheres e em especial os casos de concubinato, vejamos:


Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.” (…)


Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.


Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.”


Ipsis literis, a jurisprudência pátria majoritária segue esse raciocínio positivado na Constituição Federal e no Código Civil, do qual é de suma importância a presença de um relacionamento entre homem e mulher, conforme abaixo;


“RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS DEMONSTRADOS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. I – O reconhecimento da união estável, protegida constitucionalmente como entidade familiar (art. 226, §3º), está sujeito à presença dos requisitos elencados no art. 1.723 do Código Civil, quais sejam, diversidade de sexo, convivência more uxorio pública, contínua e duradoura, objetivo de constituição de família. II – Comprovados os requisitos exigíveis, por prova documental e oral, é de se julgar procedente a ação.” (TJMG – Apelação Civil 1.0024.06.195718-9/001 – 8ª C. Cível – Rel.: Des. BITENCOURT MARCONDES – J. 17/09/2009). Grifo nosso


“UNIÃO ESTÁVEL – RECONHECIMENTO – REQUISITOS INDISPENSÁVEIS – INTENÇÃO DE VIDA EM COMUM COM OBJETIVO DE CONSTITUIÇÃO FAMILIAR – NÃO COMPROVAÇÃO – EXISTÊNCIA DE MERO NAMORO – IMPROCEDÊNCIA. – Para configuração da união estável é necessário que a convivência entre o homem e a mulher seja pública, que estes sejam tidos no meio em que vivem como um casal, além de ser a relação duradoura e, ainda, exige o elemento subjetivo, que é a intenção de viverem como marido e mulher, com o objetivo de constituição de uma família. Inexistindo esses elementos, improcedente se mostra o pedido de reconhecimento de união estável.” (TJMG – Apelação Civil: 1.0479.05.087208-0/002 – 1ª C. Cível – Rel. Vanessa Verdolim Hudson Andrade – J. 31/03/09). Grifo nosso.


Conforme se pode verificar na jurisprudência elencada, a maioria dos julgados demonstra que a diversidade de sexo é requisito para o reconhecimento da união estável. No mesmo sentido, a ilustre Desembargadora Vanessa Verdolim Hudson Andrade ao julgar a Apelação Civil supra citada, faz menção da necessidade da convivência entre o homem e mulher, ou mesmo a intenção de viverem como marido e mulher, com o objetivo de constituição de uma família, ou seja, a ilustre desembargadora se ateve à Lex já existente, criando uma espécie de requisito fundamental do qual os casais homossexuais não podem usufruir.


Portanto, o posicionamento majoritário pátrio, entende que a união estável deve ocorrer com casais heterossexuais, não deixando claro ou nem mesmo fazendo referências aos casais homossexuais, havendo uma lacuna na legislação a ser preenchida pelos magistrados encorajados a encararem esse tema e julgarem favoráveis as respectivas ações e tornarem em realidade positivada o tema, criando assim uma fonte do direito.


3. UNIÃO ESTÁVEL HOMOSSEXUAL


De acordo com a ilustre doutrinadora e desembargadora Maria Berenice Dias em seu estudo “União Estável Homossexual”, se duas pessoas passam a ter vida em comum, cumprindo os deveres de assistência mútua, em um verdadeiro convívio estável caracterizado pelo amor e respeito mútuo, com o objetivo de construir um lar, inquestionável que tal vínculo, independentemente do sexo de seus participantes, gera direitos e obrigações que não podem ficar à margem da lei.[3]


O conceito de união estável da ilustre doutrinadora é bem mais amplo e preenche qualquer lacuna que a lei brasileira possa ter com relação aos novos padrões de famílias existentes em nossa sociedade, não se limitando ao conceito já ultrapassado de união estável entre homens e mulheres, e sim entre pessoas que se respeitam e se amam com o intuito de construir uma família.


Essa nova corrente doutrinária veio vagarosamente sendo aceita primeiramente nos tribunais e mais recentemente alguns juízes de primeira instância tem aceitado esse “novo” conceito de união estável em suas decisões.


O ilustre magistrado e lecionador Wlademir Paes de Lira apresenta em sua sentença, o posicionamento das correntes pátrias sobre a união estável, onde alguns entendem tratar-se simplesmente de uma união civil de fato, com conseqüências exclusivamente patrimoniais, na medida em que o direito ao patrimônio é diretamente proporcional à comprovação da contribuição para a construção do mesmo, aplicando-se a súmula 380, do STF. Outros entendem caracterizar-se uma união afetiva, assemelhada à família, porém sem a proteção do Estado, por falta de previsão constitucional. Alguns entendem tratar-se de uma entidade familiar a cujo disciplinamento aplicam-se as regras da união estável. E uma última corrente entende caracterizar-se entidade familiar específica, constitucionalmente protegida[4].


Não obstante o ilustre doutrinador aduz:


“Encontro-me entre os que vêem na união homossexual entidade familiar específica, abrigada constitucionalmente, cujo regramento infraconstitucional ainda não existe, havendo necessidade de buscar instrumentos de aplicação do Direito para efetivar as conseqüências jurídicas de tais relações, dentre os quais a analogia, haja vista a necessidade de aplicação imediata dos direitos relacionados com tais relações, por estarem alicerçados na dignidade da pessoa humana e nos direitos fundamentais.”


A Constituição Federal em seu artigo 1º, inciso III traz como fundamento a dignidade da pessoa humana, tendo esta, como um dos objetivos fundamentais promover o bem de todos sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, IV), e é consubstanciada nos direitos fundamentais de liberdade, igualdade e proibição de discriminação em função da orientação sexual, se moldando pois, a dignidade da pessoa humana, de Direitos Fundamentais e sociais, cuja efetivação deixa de ser uma possibilidade e passa a ser uma inafastável necessidade, dentro da visão constitucional moderna.


A jurisprudência brasileira vem aceitando o conceito de união estável homossexual por analogia, conforme se verifica in verbis:


“EMENTA: DIREITO DE FAMÍLIA – AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO HOMOAFETIVA – ART. 226, §3º DA CF/88 – UNIÃO ESTÁVEL – ANALOGIA – OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO – VERIFICAÇÃO. – Inexistindo na legislação lei específica sobre a união homoafetiva e seus efeitos civis, não há que se falar em análise isolada e restritiva do art. 226, §3º da CF/88, devendo-se utilizar, por analogia, o conceito de união estável disposto no art. 1.723 do Código Civil/2002, a ser aplicado em consonância com os princípios constitucionais da igualdade (art. 5º, caput, e inc. I da Carta Magna) e da dignidade humana (art. 1º, inc. III, c/c art. 5º, inc. X, todos da CF/88).” (TJMG – Apelação Cível 1.0024.09.484555-9/001 – 8ª C. Cível – Rel. Elias Camilo – J. 12/02/10).


Neste mesmo sentido:


“AÇÃO ORDINÁRIA – UNIÃO HOMOAFETIVA – ANALOGIA COM A UNIÃO ESTÁVEL PROTEGIDA PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – PRINCÍPIO DA IGUALDADE (NÃO-DISCRIMINAÇÃO) E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – RECONHECIMENTO DA RELAÇÃO DE DEPENDÊNCIA DE UM PARCEIRO EM RELAÇÃO AO OUTRO, PARA TODOS OS FINS DE DIREITO – REQUISITOS PREENCHIDOS – PEDIDO PROCEDENTE. – À união homoafetiva, que preenche os requisitos da união estável entre casais heterossexuais, deve ser conferido o caráter de entidade familiar, impondo-se reconhecer os direitos decorrentes desse vínculo, sob pena de ofensa aos princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. – O art. 226, da Constituição Federal não pode ser analisado isoladamente, restritivamente, devendo observar-se os princípios constitucionais da igualdade e da dignidade da pessoa humana. Referido dispositivo, ao declarar a proteção do Estado à união estável entre o homem e a mulher, não pretendeu excluir dessa proteção a união homoafetiva, até porque, à época em que entrou em vigor a atual Carta Política, há quase 20 anos, não teve o legislador essa preocupação, o que cede espaço para a aplicação analógica da norma a situações atuais, antes não pensadas. – A lacuna existente na legislação não pode servir como obstáculo para o reconhecimento de um direito.” (TJMG – Apelação Cível 1.0024.06.930324-6/001 – 7ª C. Cível – Rel. Heloisa Combat – J. 22/05/07).


“DIREITO DE FAMÍLIA – UNIÃO HOMOAFETIVA – DIGINIDADE DA PESSOA HUMANA – FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA – JUÍZO ESPECIALIZADO. 1 – A união homoafetiva deve ser processada no juízo especializado, por ter conceito equiparado, por analogia, ao de união estável previsto no ordenamento. 2 – Recurso provido.” (TJMG – Apelação Cível 1.0024.09.704207-1/001 – Rel. Edgard Penna Amorim – J. 22/07/10).


Conforme se verificou nos julgados acima, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, considerado um dos mais conservadores do Brasil no campo familiar, vem metodicamente modificando suas sentenças, aceitando essa nova terminologia doutrinária no aspecto da união estável, se adequando e demonstrando a real necessidade de um ordenamento inclusivo para os casais homossexuais brasileiros.


4. DOS ALIMENTOS


Alimentos no contexto jurídico não se restringem apenas ao ato de se alimentar ou algo referente apenas à ingestão de alimentos, o significado de alimentos é algo bem mais extenso e amplo que engloba outros recursos indispensáveis para o sustento e sobrevivência daqueles que o necessitam, tais como habitação, vestuário, assistência médica e, caso seja menor o alimentando, auxílio para sua educação e instrução.


O novo Código Civil de 2002 trata “Dos Alimentos” nos artigos 1.694 até 1.710 situado no Livro IV, vejamos os mais pertinentes ao tema:


Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação. (grifo nosso). (…)


Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento.”


Conforme verificado no artigo 1.694, os companheiros também possuem o direito de pedir um ao outro os alimentos de que necessitam para viver, ou seja, o Código Civil não criou obstáculos para que os companheiros homossexuais usufruam desse benefício.


4.1 Princípios da Obrigação Alimentar


Por se tratar de um encargo público, as leis que disciplinam a matéria são de ordem pública, ou seja, irrenunciável entre as partes. Portanto, não se pode renunciar ao benefício de exigir alimentos (Artigo 1.707 Código Civil), ademais as partes não podem acordar que o valor devido jamais será alterado, pois não é válido estabelecer condição contrária ao disposto em lei.


Os princípios da obrigação alimentar são divididos em sete importantes ferramentas para o entendimento de tal instituto.


4.1.1 Princípio da Reciprocidade


O princípio da reciprocidade está positivado no artigo 1.696 do Código Civil, onde dispõe que o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.


A Lex mencionada deixa claro a posição do legislador ao redigir o artigo em tela, onde a parte mais vulnerável na relação de parentesco, primeiramente os familiares de primeiro grau (pais e filhos; filhos e pais), e na impossibilidade desses os de graus sucessivos (avós e netos; netos e avós), ou seja, tanto ascendentes e descendeste tem a obrigação de reciprocidade na prestação de alimentos.


4.1.2 Princípio da Preferência


O instituto do princípio da preferência encontra-se conceituado no artigo 1.697 do Código Civil onde aduz que na falta de ascendente cabe a obrigação aos descendentes e, faltando estes, aos irmãos, germanos como unilaterais.


O Código Civil no artigo 1.697 criou um limite na obrigação de prestação de alimentos para familiares na linha colateral, onde apenas parentes de segundo grau, ou seja, os irmãos arcam com a obrigatoriedade alimentícia, excluindo assim os tios e sobrinhos do alimentando.


O princípio em comento é uma alternativa ao insucesso na pretensão de alimentos pelos ascendentes e descendentes, mas insta-se salientar que na falta dos familiares de primeiro grau e na ausência dos familiares de segundo grau na linha colateral, extingue-se a obrigação alimentar decorrente do parentesco.


4.1.3 Princípio da Complementaridade


O princípio em tela tem seu conceito demonstrado no artigo 1.698 do Código Civil onde este expõe que se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.


Este princípio demonstra a possibilidade da solidariedade na prestação de alimentos por mais de um familiar, ou seja, poderão ser chamados a lide outros parentes de grau imediato para concorrer no cumprimento da dívida alimentar.


4.1.4 Princípio da Mutabilidade


De acordo com o artigo 1.699 do Código Civil, se fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo.


O princípio da mutabilidade também conhecido como da variabilidade da prestação, é um instituto positivado com a intenção de demonstrar que apesar da decisão judicial sobre alimentos fazer coisa julgada formal, ela não faz coisa julgada material, ou seja, ela pode ser modificada a qualquer tempo, por exemplo, quando ocorrer variação financeira daquele que arca com o peso da prestação de alimentos ou mesmo de quem a recebe.


 O remédio para a resolução desse impasse é a ação revisional de pensão, onde aquele que se sentir prejudicado, deve demonstrar que o quantum da pensão alimentícia já não supre as necessidades do alimentando, ou mesmo, no caso de mudança na situação financeira do alimentante, este poderá requerer a redução ou mesmo a extinção da pensão alimentícia.


Desse modo, entende-se que a revisão é da essência da obrigação alimentar.


4.1.5 Princípio da Transmissibilidade


O princípio em questão está positivado no artigo 1.700 do Código Civil onde apresenta que a obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor, na forma do artigo 1.694.


Os alimentos poderão ser cobrados do espólio, ou de cada herdeiro, mas respeitando sempre o limite das forças do montante, respondendo cada herdeiro proporcionalmente à cota que lhe couber na herança.


4.1.6 Princípio da Alternatividade


O princípio da alternatividade está conceituado no artigo 1.701 do Código Civil, onde dispõe que a pessoa obrigada a suprir alimentos poderá pensionar o alimentando, ou dar-lhe hospedagem e sustento, sem prejuízo do dever de prestar o necessário à sua educação, quando menor.


O parágrafo único vem a complementar o conceito exposto no artigo supra citado aduzindo que compete ao juiz, se as circunstâncias o exigirem, fixar a forma do cumprimento da prestação.


O benefício alimentício pode ser pago em dinheiro ou na forma de moradia e alimentação, vestuário, entre outros, não deixando de lado o dever na prestação necessária na educação do alimentando. Lembrando que primeiramente quem possui a faculdade em optar na escolha da metodologia empregada na prestação dos alimentos é o devedor, mas em algumas situações poderá o juiz competente fixar de qual modo tal benefício deverá ser pago.


4.1.7 Princípio da Irrenunciabilidade


O presente princípio da irrenunciabilidade que possui seu preceito no artigo 1.707 do Código Civil ressalta que pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.


As partes interessadas não podem pactuar a renúncia aos alimentos, mas podem não exercer o direito de ação, ou seja, apesar de possuírem o direito de pleitear a prestação de alimentos, não as requer judicialmente.


4.2 Fontes da Obrigação Alimentar


A obrigação alimentar pode ser provida de quatro fontes, conforme poderemos ver mais abaixo.


4.2.1 Vontade das Partes


Esta fonte de obrigação alimentar é bem rara, podendo se materializar nos casos de separação consensual, onde o marido ou a esposa convenciona a obrigação alimentar (pensão alimentícia) a ser paga ao outro cônjuge.


Não obstante, pode ocorrer a derivação em disposição testamentária, conforme enunciado do artigo 1.920 do Código Civil:


“Art. 1920. O legado de alimentos abrange o sustento, a cura, o vestuário e a casa, enquanto o legatário viver, além da educação, se ele for menor.”


4.2.2 Parentesco


A Constituição Federal brasileira tratou no artigo 229 sobre a obrigação de prestação de alimentos dos pais para com os filhos menores e dos filhos maiores para com os pais idosos em circunstâncias tipificadas na lei, vejamos:


“Art 229 CF Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.”


O Código Civil brasileiro em seu artigo 1.694 tratou de forma clara e objetiva sobre a relação de parentesco e quais seriam os familiares incumbidos a prestarem a obrigação alimentícia, conforme se verifica abaixo:


“Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.” grifo nosso


 4.2.3 Casamento e União Estável


O casamento e a união estável são duas das principais fontes da concessão do benefício da prestação alimentícia. Com o advento do princípio constitucional que equipara a união estável ao casamento no aspecto de fruição dos benefícios estatais e legais, como no caso dos alimentos, muitas das atuais famílias brasileiras que não se casam em cartórios, podem exercer o direito alimentar quando se dissolvem as uniões estáveis, ou seja, os companheiros também podem requerer uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver, ex iure o artigo 1.694 do Código Civil:


“Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.” grifo nosso


4.2.4 Ato Ilícito


Esta modalidade de prestação alimentícia ocorre quando o causador do prejuízo, possui a obrigação de reparar o dano mediante pagamento na forma de indenização monetária, sendo a prestação alimentícia decorrente da responsabilidade civil, é o que expõe o disposto no artigo 948, inciso II do Código Civil, in verbis:


Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações: (…)


II – Na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima.”


5. – A Prestação de alimentos nos casos de união Estável Homossexual


Apesar de muitos doutrinadores brasileiros entenderem que a união estável de homossexuais não produz os mesmos efeitos da já reconhecida união estável entre heterossexuais já positivada na Constituição Federal e no Código Civil, uma corrente doutrinária e principalmente a jurisprudência vem modificando este conceito de família já ultrapassada de nosso ordenamento jurídico.


O tema ainda é abordado com muita cautela pelos tribunais brasileiros, por se tratar de um assunto delicado e principalmente polêmico, mas é de grande valia a luta travada por alguns renomados juristas brasileiros, que buscam ampliar este conceito de união estável limitada apenas a homens e mulheres, e por isto atualmente muitos tribunais já reconhecem a união estável homossexual.


Há algum tempo, os juízes de primeiro grau das varas de família, se esquivavam de julgar as ações de união estável homoafetiva, negando os pedidos referentes ao tema e deixando essas ações e decisões para os doutos julgadores de instâncias superiores resolverem o impasse. Esta realidade vem mudando, hoje já possuímos jurisprudência de magistrados de primeiro grau, entendendo que a união estável homoafetiva esta analogamente tipificada na lei, e a improcedência nos pedidos na justiça, contrariariam o preceito legal da dignidade da pessoa humana, a liberdade sexual e a especial proteção da família pelo Estado.


O juiz Wladimir Paes de Lira, titular da 26ª Vara de Família de Maceió, sentenciou a primeira ação referente ao tema em 2004, desde então já julgou procedente quatro outras ações referentes a mesma lide, tendo a sua última decisão datada de 10 de março de 2011, sempre seguindo a mesma didática no proferimento das mesmas, que a união de um casal homossexual se trata de uma entidade familiar específica, protegida constitucionalmente[5].


De acordo com a ilustre doutrinadora e desembargadora Maria Berenice Dias, está na hora de o e Estado – que se quer democrático e que consagra como princípio maior o respeito à dignidade da pessoa humana – deixar de sonegar o timbre jurídico – a juridicidade – a tantos cidadãos que têm direito individual à liberdade, direito social a uma proteção positiva do Estado e, sobretudo, direito humana à felicidade.[6]


O entendimento jurisprudencial mineiro vem entendendo que a união estável homossexual pode ser analogamente comparada à união estável entre heterossexuais, conforme jurisprudências já elencadas neste estudo.


É de grande enriquecimento intelectual a leitura da jurisprudência abaixo elencada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que demonstra boa parte do racíocio empregado neste estudo, in situ abaixo:


“UNIÃO ESTÁVEL. UNIÃO HOMOSSEXUAL. RECONHECIMENTO. REQUISITOS. CASAL DO MESMO SEXO. RELAÇÃO HOMOAFETIVA. UNIÃO HOMOSSEXUAL. RECONHECIMENTO. POSSIBILIDADE JURIDICA DO PEDIDO. LEGITIMO INTERESSE. INTERESSE E LEGITIMIDADE. ANALOGIA À UNIÃO ESTÁVEL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PROTEÇÃO. UNIÃO HOMOSSEXUAL. RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. PARTILHA DE BENS. A união homossexual no caso concreto. Uma vez presentes os pressupostos constitutivos da união estável (art. 1.723 do CC), é de rigor o reconhecimento da união estável homossexual, em face dos princípios constitucionais vigentes, centrados na valorização do ser humano. Via de conseqüência, as repercussões jurídicas, verificadas na união homossexual, tal como a partilha dos bens, em face do princípio da isonomia, são as mesmas que decorrem da união heterossexual. União homossexual: lacuna do Direito. O ordenamento jurídico brasileiro não disciplina expressamente a respeito da relação afetiva estável entre pessoas do mesmo sexo. Da mesma forma, a lei brasileira não proíbe a relação entre duas pessoas do mesmo sexo. Logo, está-se diante de lacuna do direito. Na colmatação da lacuna, cumpre recorrer à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito, em cumprimento ao art. 126 do CPC e art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil. Na busca da melhor analogia, o instituto jurídico, não é a sociedade de fato. A melhor analogia, no caso, é a com a união estável. O par homossexual não se une por razões econômicas. Tanto nos companheiros heterossexuais como no par homossexual se encontra, como dado fundamental da união, uma relação que se funda no amor, sendo ambas relações de índole emotiva, sentimental e afetiva. Na aplicação dos princípios gerais do direito a uniões homossexuais se vê protegida, pelo primado da dignidade da pessoa humana e do direito de cada um exercer com plenitude aquilo que é próprio de sua condição. Somente dessa forma se cumprirá à risca, o comando constitucional da não discriminação por sexo. A análise dos costumes não pode discrepar do projeto de uma sociedade que se pretende democrática, pluralista e que repudia a intolerância e o preconceito. Pouco importa se a relação é hetero ou homossexual. Importa que a troca ou o compartilhamento de afeto, de sentimento, de carinho e de ternura entre duas pessoas humanas são valores sociais positivos e merecem proteção jurídica. Reconhecimento de que a união de pessoas do mesmo sexo gera as mesmas conseqüências previstas na união estável. Negar esse direito às pessoas por causa da condição e orientação homossexual é limitar em dignidade as pessoas que são. Embargos Infringentes Acolhidos, Por Maioria.” (Embargos Infringentes Nº 70039338587, Quarto Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 12/11/2010).


A união estável homossexual conforme verificado na jurisprudência pátria e em doutrinas isoladas vem recebendo sua “aceitação” jurídica na forma de sentenças e acórdãos oriundas das lides levadas ao conhecimento do poder judiciário.


6 – Considerações Finais


O tema abordado no presente estudo é relativamente recente no aspecto jurídico, mas de grande importância para a sociedade como um todo, pois uma parte desta mesma sociedade clama por sua igualdade em respeito e direitos.


Ao aprofundarmos no tema, conseguimos perceber a importância e dever dos legisladores brasileiros em criar uma legislação específica ou mesmo inclusiva para o tema apresentado, pois não devemos excluir uma parcela da sociedade, que vem a bastante tempo cumprindo com seus deveres de cidadãos brasileiros e que merecem no mínimo o respeito do poder legislativo em atender suas reivindicações.


Compreendemos que apesar de haver uma lacuna na lei referente ao tema, podemos estender o conceito de união estável que hoje existe tipificado em nosso ordenamento jurídico entre homens e mulheres, para a união estável entre pessoas, mesmo que sendo do mesmo sexo, com o intuito de constituir uma família.


Sendo assim, entendemos que a união estável homossexual é juridicamente aceita, e existindo esta analogia com a união estável entre heterossexuais, também serão devidos os alimentos à aquele companheiro que em momento oportuno necessita de apoio financeiro para seu sustento.


 


Bibliografia

Liberdade sexual e direitos humanos – 27/12/2001 | Autor: Maria Berenice Dias Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=24

Azevedo, Álvaro Villaça – União Estável, artigo publicado na Revista do Advogado n° 58, AASP, São Paulo, março/2000.

Fujita, Jorge Shiguemitsu – Curso de Direito Civil Direito de Família, São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000.

UNIÃO ESTÁVEL HOMOSSEXUAL MARIA BERENICE DIAS INSTITUl.ÇÃO TOLEDO DE ENSINO

Maria Berenice Dias, no artigo Liberdade

Sexual e Direitos Humanos, publicado nos anais do III Congresso de Direito de Família,

coordenado por Rodrigo da Cunha Pereira, Belo Horizionte: IBDFAm – Del Rey, 2002.


Notas

[1] Azevedo, Álvaro Villaça – União Estável, artigo publicado na Revista do Advogado n° 58, AASP, São Paulo, março/2000.

[2] Fujita, Jorge Shiguemitsu – Curso de Direito Civil Direito de Família, São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000.

[3] Dias, Maria Berenice – Artigo “União Estável Homossexual” – pp 58.

[4] Lira, Wlademir Paes – Juiz da 26ª Vara da Família de Maceió, Sentença Processo nº 008163875. 2010.8.02.001 – J. 10/03/11.

[5] Lira, Wlademir Paes – Juiz da 26ª Vara da Família de Maceió, Sentença Processo nº 008163875. 2010.8.02.001 – J. 10/03/11.

[6] Dias, Maria Berenice – Liberdade Sexual e Direitos Humanos, III Congresso de Direito de Família, Belo Horizonte, IBDFAM – Del Rey, 2002 pp. 88.

Informações Sobre os Autores

Luiz Gustavo Caratti de Oliveira

Bacharel em Direito pela Universidade Salgado de Oliveira. Pós graduado em Direito Civil e Direito Processual Civil com ênfase em Direito do Consumidor pela UCB. Advogado inscrito na OAB/MG desde o ano de 2008. Professor de Direito nos cursos de Direito Administração e Ciências Contábeis da Faculdade de Sinop – FASIP. Professor Supervisor de Estágio da Faculdade de Sinop – FASIP

Marília Gabriela Silva Dani

graduada em Direito pela Universidade Salgado de Oliveira de Juiz de Fora/MG, Advogada militantena comarca de Juiz de Fora/MG


Equipe Âmbito Jurídico

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