A questão da Justiça Militar

Resumo: Esse artigo procurou demonstrar que a justiça militar não compactua com os princípios que regem a constituição federal, que a sua extinção é algo a ser implementada, tendo em vista os gastos exorbitantes e o fluxo mínimo de ações, além de sua atuação arcaica, entre outras coisas. Corroborando tal artigo, informações dadas pela mídia brasileira e expoentes de um direito crítico social compõem esse trabalho. [1]

Palavras-chave: justiça militar. Extinção. Conselho nacional de justiça. Princípios. Constituição Federal.  

Resumen: En este artículo se trató de demostrar que  el sistema de  la justicia militar no  aprueba los principios que rigen la constitución federal, que su desaparición es algo que deberá realizarse  debido a los costos exorbitantes y el flujo mínimo de acciones, además existe su maneira arcaica  de actuar, entre otras cosas. Corroboran este artículo y ló componen, la información dada por los medios de comunicación brasileños y lós exponentes críticos de un derecho social.

Palavras-clave: justicia militar. Extincion. Consejo Nacional de Justicia. Principios. Constitucion Federal.

Sumário: Introdução. I.Breve história da justiça militar. II. Da atribuição e composição da justiça militar. III. Da reforma da justiça militar estadual pela E.C. 45. Conclusão. Referências Bibliográficas

INTRODUÇÃO

Muito se questiona a respeito da justiça militar nos dias de hoje, alguns dizem que é algo arcaico, um resquício da ditadura, outros, despertam os olhares na celeridade processual da justiça militar, algo que se deve ser observado em todos os outros ramos.

Por assim dizer, esse artigo busca mostrar que a justiça militar é extremamente antiquada, não condiz com o novo ordenamento jurídico brasileiro. Alem de ter um orçamento exorbitante para manter uma estrutura com pouquíssima atuação, com gastos quase equivalentes aos das outras justiças.

Notoriamente há um hiato em sua atuação e os seus gastos exorbitantes.

Por fim, se propõe a extinção da justiça militar passando as vezes para a justiça estadual nos casos da justiça militar estadual.

Recentemente, a justiça militar estadual tem sido alvo de várias reportagens sobre possíveis extinções dos tribunais específicos nos estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo.

A justiça militar em outros estados é exercida pela justiça estadual, pois a constituição federal opciona a criação da justiça militar nos casos do efetivo militar ser acima de vinte mil componentes.

 Os estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo, como mencionado acima, por terem o efetivo militar acima de vinte mil a constituição cidadã trouxe uma opção no artigo 125, parágrafo terceiro, de criação dessas justiças nesses casos:

A lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar estadual, constituída, em primeiro grau, pelos juízes de direito e pelos conselhos de justiça e, em segundo grau, pelo próprio tribunal de justiça, ou por tribunal de justiça militar nos estados em que o efetivo militar seja superior a vinte mil integrantes.

Segundo consta, o Conselho Nacional de Justiça constituiu, por meio de uma portaria, o Grupo de Trabalho responsável pela elaboração do diagnóstico da Justiça Militar nos âmbitos federal e estadual. Esse grupo terá o prazo de 90 dias para apresentar relatório final com as propostas que serão encaminhadas ao Congresso Nacional e às Assembléias Legislativas dos três estados mencionados.

O presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, ministro Joaquim Barbosa, afirmou que a Justiça Militar estadual não tem “necessidade” de existir.[2]

Ele deu a declaração durante o julgamento pelo CNJ de um procedimento disciplinar contra magistrado do Tribunal de Justiça Militar de Minas Gerais que teria deixado prescrever processos por lentidão nos julgamentos.

“Uma justiça que poderia muito bem ser absorvida pela justiça comum, porque não há qualquer necessidade de sua existência”, afirmou Joaquim Barbosa, quando os conselheiros debatiam se a demora na análise dos processos militares se devia à falta de estrutura do tribunal.

A equiparação das práticas das polícias militares com as das Forças Armadas é inócua, já que possuem objetivos institucionais distintos, é cada vez mais flagrante a irracionalidade da submissão das polícias militares aos regulamentos do Exército. A iniciativa do Ministro Joaquim pode gerar bons frutos, que nada tem a ver com impunidade ou tolerância com desvios, mas com a eficiência administrativa de certas estruturas e regulamentos que pouco resultam em ganhos sociais e institucionais

Dentre outras críticas, relaciona-se o fato do alto custo dos tribunais militares e do superior tribunal militar, por exemplo: o TJMMG consome R$ 30 milhôes por ano de recursos públicos para manter a estrutura com sete desembargadores e seis juízes que julgam em torno de 300 processos. Já em São Paulo, o custo estadual é de R$ 40 milhões por ano e no Rio Grande do Sul, R$ 30 milhos anuais.

Já o Superior Tribunal Militar (STM) consome R$ 322 milhões de recursos públicos com 15 ministros e 962 servidores. A corte julga em torno de 600 processos por ano.[3]

Ademais, em maio de 2012 o Conselho de direitos humanos da ONU recomendou ao Brasil o fim da policia militar, acusada de assassinatos e afim de combater os grupos formados por policiais militares chamados de “esquadrões da morte”.

A recomendação que pede o fim da Polícia Militar foi feita pela Dinamarca, que pede “medidas mais eficazes para reduzir as execuções extrajudiciais”. A Coréia do Sul falou diretamente em “esquadrões da morte” e a Austrália sugeriu a expansão das Unidades de Policia Pacificadora (UPP) criadas no Rio de Janeiro.

O relatório destaca a importância de o Brasil garantir que todos os crimes cometidos por agentes da ordem sejam investigados de maneira independente e que seja combatida a impunidade dos crimes cometidos contra juízes e ativistas de direito humanos.

I. BREVE HISTÓRIA DA JUSTIÇA MILITAR[4]

Segundo trabalho de Univaldo Correa: “a Justiça Militar teve origem dentro da própria organização castrense, ab initio estabeleciam algumas regras de conduta para os militares com a previsão de severos castigos àqueles que as não cumpriam”.

O autor continua dizendo que “no Brasil colônia, recebeu de Portugal a sua cultura jurídica, a qual, por sua vez, é conseqüência do aproveitamento que os primeiros portugueses fizeram do direito romano, principalmente a partir da tradução do CORPUS JURIS CIVILIS, somando-se a esse conjunto as normas advindas da experiência jurídica dos lusitanos.”

Os portugueses, aos poucos, foram dando configuração às suas leis com as ordenações, primeiro as afonsinas, depois as manuelinas, e por último as filipinas.

Acrescenta que “as ordenações filipinas foram aquelas que mais tempo vigoraram  no Brasil, pelo tempo em que foram válidas, alem de atuarem nos tempos em que as terras brasileiras tomavam um rumo e um destino próprios. Sendo assim, a justiça militar sofreu, no começo, influencia do direito português”.

Traz que “a discussão principal nunca girou em torno da existência da justiça militar, tanto que ela foi a primeira a ser organizada no Brasil, e sempre foi aceita pela maioria dos juristas pátrios. O que se queria dessa justiça era que a sua competência não fosse aumentada, alcançando, por exemplo, o militar na qualidade de cidadão, e o civil, este em qualquer situação”.

Menciona ainda que “a justiça militar federal foi definida como órgão de Poder Judiciário pela Constituição de 1934, já as justiças militares estaduais vieram com a constituição de 1946. A história da justiça castrense revela que elas sempre foram consideradas importantes para as forças militares, pois com ela dava-se maior sustentação à disciplina militar, base fundamental dessas forças”.

O autor identificou que, “com o passar dos tempos a  justiça militar como membro do Poder Judiciário passou a ter vida própria, não se subordinando nem aos comandos militares e nem a qualquer autoridade administrativa”.

Com essa ligação a justiça militar no Brasil encontrou melhores condições no plano normativo para finalmente fazer a sua prestação jurisdicional sem que nem aparentemente se possa ligá-la ou pensá-la subordinada, que não à Lei, às provas dos Autos e à livre convicção de seus Juízes – Militares e Togados.

Por fim, o autor ainda aduz que “com a passagem da justiça militar para o Poder Judiciário vê-se que, agora, ela é afirmada em sua plenitude como órgão de distribuição de Justiça, e até invertem-se os caminhos dos Juízes que lá trabalham. Antes, eram os civis que saíam do seu meio e iam até a justiça castrense para lá serem Juízes; agora, são os próprios militares que têm que ir à justiça militar para lá funcionarem como Juízes, ou, em outras palavras, militares na justiça militar passam a ser a exceção, o que antes era a regra geral. Os civis – Juízes togados, Promotores de Justiça, Advogados, funcionários do cartório – passam a trabalhar nessa área, tomadas até então pelos militares”.

Criada, de início, dentro das forças militares, a justiça militar dá um grande salto, e, no mundo civil, segue as mesma normas e regras, cumpre os mesmos procedimentos – com pequenas nuances – da chamada justiça especial.

Nota-se que, obviamente, desde os primórdios das ordenações portuguesas, que a justiça militar atua em um ordenamento jurídico próprio, autônomo, dentro do ordenamento jurídico brasileiro.

O autor do presente capitulo, questiona ao final “seriam os militares uma classe distinta na sociedade,  com normas especiais, julgados por juízes militares e juízes togados?”

Por todo o exposto, vislumbra-se que a justiça militar existe há alguns séculos, de Roma antiga ao Brasil moderno. Criada por um povo guerreiro e conquistador como os romanos e utilizada nos dias de hoje por um estado pacifico, que tem como um dos fundamentos[5] a dignidade da pessoa humana, como princípios[6] que regem a Republica Federativa nas relações internacionais e analogicamente expondo, a defesa da paz e a solução pacifica de conflitos.

II. DA ATRIBUIÇÃO E COMPOSIÇÃO DA JUSTIÇA MILITAR[7]

Os crimes militares situam-se no campo da exceção. As normas em que previstos são exaustivas. Jungidos ao principio constitucional da reserva legal – inciso XXXIX do artigo 5 da carta de 1988 – hão de estar tipificados em dispositivo próprio, a merecer interpretação restrita.[8]

A justiça militar faz parte da organização do poder judiciário e na seção VII artigos 122 a 124 da Constituição Federal traz a sua composição e atribuição:

“Artigo 122: São órgãos da justiça militar:

I – Superior Tribunal Militar;

II – Os tribunais e juízes militares instituídos por Lei.”

Não é compativel com a atual constituicao a composição, por um capitão e por dois oficiais de menor posto dos conselhos de justiça nos corpos, formadores e estabelecimentos militares. A legislação ordinária anterior, portanto, não foi derrogada, nesse ponto, pela constituição em vigor.[9]

A Constituição Federal distingue a justiça militar federal da união (art. 124) e a estadual, também especializada (art. 125, parágrafos 3, 4[10] e 5)

A justiça militar da união, com competência exclusivamente penal, incube processar e julgar os crimes militares definidos em lei. A justiça militar federal é composta pelos Conselhos de Justiça Militar e pelo Superior Tribunal Militar, órgão de jurisdição superior, alem do exercício de competência originária nos termos de seu regimento interno e da lei de organização judiciária militar.

Segundo o artigo 1 da lei n 8.457/92, que organiza a justiça militar da Uniao e regula o funcionamento de seus serviços auxiliares, são órgãos da justiça militar da União o STM, a auditoria de correição, os conselhos de justiça, os juízes auditores e os juízes auditores substitutos.

A composição da justiça militar no âmbito do STM vem preconizada pelo dispositivo 123 da Constituição Federal, assim disposta:

“Artigo 123 – O Superior Tribunal Militar compor-se-á de quinze ministros vitalícios, nomeados pelo presidente da republica, depois de aprovada a indicação pelo senado Federal, sendo três dentre oficiais-generais da Marinha, quatro dentre oficiais-generais do Exército, três dentre oficiais-generais da Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais elevado da carreira, e cinco dentre civis.

Parágrafo único: os ministros civis serão escolhidos pelo presidente da república dentre brasileiros maiores de trinca e cinco anos, sendo:

I) três dentre advogados de notório saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional.

II) dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e membros do ministério público da justiça militar.”

O art. 123. da Constituição Federal dá ensejo a que se admita, como efetiva atividade profissional, o exercício da advocacia tal como previsto no art. 71 do estatuto da Ordem dos Advogados, não cabendo restringi-la à advocacia forense. Por outro lado, a efetiva atividade profissional, de que cuida a Constituição, não pode ser concebida como exercício do qual não seja permitido o afastamento eventual do advogado, ainda que para investir-se em cargo ou função pública temporários.[11]

A dualidade de composição prevista no art. 123 da CF – militares oficiais generais da ativa no posto mais elevado e civis – é conducente a ter-se como inconstitucional a indicação de oficial de reserva para ocupar vaga destinada a civil, sendo irrelevante o fato de o escolhido manter dupla qualificação – militar reformado na patente de coronel e advogado[12]

A primeira instância da Justiça Militar da União é composta pelos conselhos de justiça que funcionam nas sedes das auditorias militares. Inexiste, no âmbito da justiça militar da União, Tribunal de justiça intermediário entre os conselhos de justiça e o STM.

A competência da justiça militar federal vem disposta no artigo 124:

“Artigo 124 – a justiça militar federal compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei.

Parágrafo único: a lei disporá sobre a organização, o funcionamento e a competência, da justiça militar”.

Compete a justiça militar julgar ação penal ação penal por delito contra a honra cometido por militar da reserva em dano de militar na ativa, dentro de unidade militar.[13]

Da mesma forma, o Supremo Tribunal Federal dispõe que compete à justiça militar processar e julgar capelão militar denunciado pela suposta prática do crime de apropriação indébita de valores recolhidos de fiéis e não repassados à cúria militar. Com base nisso, a turma desproveu recurso ordinário em habeas corpus no qual requerido o trancamento de ação penal por falta de justa causa. A impetração reiterava a alegação de atipicidade da conduta, porquanto o paciente teria se apropriado de quantias pertencentes à igreja, que não dizem respeito à administração militar. Assentou-se que o tipo penal em causa não exigiria que a coisa alheia móvel fosse de propriedade da administração publica. [14]

A jurisprudencia do STF firmou entendimento no sentido de que, por nao estar inserido no CPM, o crime de abuso de autoridade seria da competencia da justiça comum, e os crimes de lesão corporal e de violação de domicilio, por estarem estabelecidos nos arts. 209 e 226 do CPM, seriam da competencia da justiça castrense.[15]

A competência em razão da matéria é definida pela lei de organização judiciária, salvo do tribunal do juri. Criação da vara de auditoria militar a ser provida por juiz de direito, que durante o exercicio da função fica com a denominação de auditor militar estadual, sendo-lhe facultado voltar a exercer o cargo primitivo. A lei estadual pode conferir ao juiz, enquanto no desempenho das funções próprias da vara de auditoria militar, outras atribuições, como a de cumprir cartas precatórias da justiça penal comum.[16]

Alem disso, a justiça militar não comporta a inclusão, na sua estrutura, de um júri, para o fim de julgar os crimes dolosos contra a vida.[17]

Já a justiça militar estadual, traz o conselho de justiça e os juízes de direito do juízo militar (juízes auditores), nas hipóteses constitucionais (já mencionadas) o tribunal de justiça militar (São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul) ou o exercício do segundo grau de jurisdição pelo próprio Tribunal de Justiça local.

Das decisões do tribunal de justiça militar ou tribunal de justiça cabem recurso para o Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal, dependendo do conteúdo do acórdão. Dessa feita, os recursos das decisões do TJM ou TJ para o STM são inviáveis, já que o STM se restringe as causas da justiça militar da União, como órgão recursal.

Importante observar que a justiça militar estadual não julga civis mas apenas policial militar e bombeiro militar[18], diferente da justiça militar da união que julga alem dos militares integrantes das forças armadas, e em certos casos, o civil se pratica crime contra o patrimônio sob a administração disciplinar, ad exemplum, ou até contra militar em situação de atividade ou assemelhado, etc.

A competência da justiça militar estadual[19] é a de julgar os militares dos estados, nos crimes militares definidos em lei, e as ações judiciais contra os atos disciplinares militares, resalvada a competência do júri quando a vitima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação dos praças.[20]

Cabe ao conselho de justiça, sob a presidência do juiz de direito processar e julgar os demais crimes militares.

Há o conselho de justiça permanente que processa e julga as praças (soldados, cabos, sargentos e subtenentes) da policia militar nos crimes militares definidos em lei, enquanto o conselho de justiça especial processa e julga os oficiais (aspirantes a oficial, tenentes, capitães, majores, coronéis) da polícia militar nos delitos previstos na legislação militar.

A justiça militar estadual não dispõe de competência  penal para processar e julgar civis que tenha sido denunciado pela prática de crime contra a Polícia Militar Estadual. Qualquer tentativa de submeter os réus civis a procedimentos penais-persecutórios instaurados perante órgãos da justiça militar estadual representa, no contexto de nosso sistema jurídico, clara violação ao principio constitucional do juiz natural. A CF, ao definir a competência penal da justiça militar dos estados membros, delimitou o âmbito de incidência do seu exercício, impondo, para efeito de sua configuração, o concurso necessário de dois requisitos: um, de ordem objetiva (a pratica de crime militar definido em lei) e outro, de índole subjetiva (a qualificação do agente como policial militar ou como bombeiro militar). A competência constitucional da justiça militar estadual, portanto, sendo de direito estrito, estende-se, tão somente, aos integrantes da policia militar ou dos corpos de bombeiros militares que hajam cometido delito de natureza militar.[21]

III.DA REFORMA DA JUSTIÇA MILITAR ESTADUAL PELA EC 45/2004

Profundas e significativas mudanças no poder judiciário advieram com a emenda constitucional 45 de 2004, em especial uma mudança significativa na justiça militar.

Basicamente, três pontos são relevante: a transferência, no âmbito constitucional, da competência de julgamento dos crimes militares dolosos contra a vida de civis para o Tribunal do Juri; a criação do juízo singular, pelo juiz de direito, de crimes militares, exceto os dolosos contra a vida, perpetrados contra civis; e a ampliação da competência das justiças militares estaduais para apreciar ações decorrentes de atos disciplinares.

A emenda constitucional 45, ao incluir o paragrafo 5 ao artigo 125 da CF, atribuiu competencia aos juizes singulares para o julgamento de crimes militares improprios.[22]

Entre as mudanças trazidas pela Emenda Constitucional 45 refere-se a questão da justiça militar julgar ato disciplinar. Segundo Paulo Tadeu Rodrigues Rosa, ato disciplinar é o ato administrativo por meio do qual a administração publica militar impõe uma sanção ao militar infrator, que foi acusado da prática de uma transgressão disciplinar, contravenção disciplinar, ou no código de ética e disciplina.[23]

O juízo militar, quando recebeu a incumbência pela emenda constitucional 45 de julgar ato administrativos de natureza punitivo-disciplinar passou a ter jurisdição civil, competência até então adstrita às vara da fazenda.

Outra mudança trazida pela EC 45 refere-se ao “juiz togado” agora juiz de direito que presidirá os Conselhos de Justiça em substituição ao oficial superior da corporação que antes o presidia, compete ainda, julgar de forma solidária, os crimes militares com vitimas civis.

Sendo assim, o juízo criminal militar que até então era representado por um colegiado formado pelo juiz auditor e outros quatro oficiais da corporação, os conselhos de justiça (permanente e especial) e julgava todo delito militar, passou a julgar delitos que agente e vitima tenham qualidade de militar na ativa (crimes militares próprios), bem como aqueles delitos que o agente ativo poderá ser qualquer um do povo e devido a certas circunstancias em torno da ação tornaram-se competência da justiça militar. Ressalta-se que as regras observadas nesse ultimo caso dizem respeito ao Código de Processo Penal comum.

Pela formação completamente diferente da Justiça Militar, a Emenda 45/2004, que criou o Conselho Nacional de Justiça, não incluiu membros desta Corte especial na composição do órgão externo, apesar de ter contemplado todos os órgãos do Judiciário. Entende-se com esta posição um primeiro passo para a extinção da Justiça Militar.

CONCLUSÃO

As criticas realizadas à justiça militar não são de hoje, vem desde a entrada da nova ordem jurídica de 1988. Alguns doutrinadores acreditam que a justiça militar, mesmo disposta na constituição federal de 1988 é inconstitucional, pois afronta princípios que regem a constituição.

Interessante notar que a justiça militar é única que tem poderes para decretar pena de morte em tempo de guerra. Flagrante retrocesso dos direito humanos e incompatível com a sociedade brasileira de hoje.

Extinguir as justiças militares dos Estados é um imperativo imediato. Trata-se, portanto, de um anacronismo inaceitável e injustificável. Serve apenas, na melhor das hipóteses, para desperdício de dinheiro público e sustentação de privilégios, tanto econômicos quanto dirigidos à impunidades de criminoso.

Houve um grande avanço, no sentido de mostrar a inutilidade da denominada justiça castrense, quando do episódio de Eldorado dos Carajás (PA), ocasião em que a Polícia Militar matou 19 sem-terra. Surgiu a Lei n.º 9.299/96, que alterou o artigo 9.º, parágrafo único, do Código Penal Militar, transferindo à justiça comum dos Estados a competência para julgar os crimes dolosos contra a vida quando praticados por militares contra civil. A inutilidade das justiças militares estaduais é tanta que, com o assassinato do advogado Davi Sebba, por policiais militares, deu origem a dois inquéritos, um na Polícia Militar, outro na Civil. Ao final de quase um ano e muito desperdício de dinheiro público, o da PM restou inútil.

Procurou demonstrar nesse trabalho que é flagrante a incompatibilidade entre o estado democrático de direito e a existência da justiça militar como um dos órgãos do poder judiciário, já que fere o principio da igualdade e estabelece tratamento privilegiado para um grupo de pessoas, somente porque exercem a profissão militar.

Há pelo menos 20 anos, a Associação Juízes para a democracia briga pela extinção da justiça militar, não apenas redimensionar a justiça, como também abolir foros privilegiados e evitar desigualdade com as outras esferas. Não apenas pelo pouco movimento das justiças militares federais e estaduais mas também para que especialmente as policias militares deixem de ser órgãos reprodutores de violência.

A associação alega que o foro privilegiado é uma herança de um regime inaceitável, banido pela sociedade brasileira e consequentemente a justiça castrense que prega tais valores não deve subsistir.

A alegação de que a instituição da justiça militar não visa a pessoa do militar mas sim a função que ele exerce é de todo incongruente. Se fosse assim, os crimes cometidos por psicólogos ou de outras profissões deveriam ser julgados segundo a suas justiças (justiça dos psicólogos).

O julgamento dos militares, na forma da lei, representa um exercício corporativista, já que inexigível que o membro de uma corporação consiga perceber a realidade, em suas múltiplas facetas, pois não pode apagar de sua personalidade todos os vínculos que possui em relação à corporação. Para a associação, o julgamento dos militares por seus colegas compromete a imparcialidade da decisão, caráter essencial da jurisdição.

A Justiça supõe o julgamento de iguais por iguais e, como salientou Dyrceu Aguiar Dias Cintra Júnior in “Judiciário e Reforma”[24], “pretendem conciliar conceitos inconciliáveis: o ideal de Justiça – baseado na igualdade e democracia— e a hierarquia militar — que por definição só pode se basear na antidemocracia da diferença entre o que manda e o que obedece —, de cujo topo sai parte dos juízes”.

A proposta dada pela associação de sujeitar o julgamento de delitos à justiça comum pode contribuir para a formar uma nova política com bases novas e sem reproduzir violência. A banalização da violência exercida pelos militares gera um sentimento de impunidade, como se pode notar nos fatos recentes da historia do Brasil.

A estrutura da instituição castrense, fundamentada na hierarquia e disciplina, em nada seria prejudicada com a extinção da Justiça Militar, já que as faltas administrativas serão apuradas no âmbito interno da corporação e, neste campo, o conhecimento da profissão militar possibilita a melhor apreciação dos fatos.

Porém, as faltas que caracterizam delito devem ser julgadas com imparcialidade, de forma que os aspectos administrativos — de natureza disciplinar — não se sobreponham às questões judiciais. Deve-se garantir ao faltoso a igualdade e o julgamento por juiz imparcial.

Com a extinção proposta, a Justiça seria redimensionada, os privilégios findariam e as garantias constitucionais seriam resguardadas.

Ademais, o orçamento dispendioso destinado à justiça castrense, em contrapartida o reduzido numero de processos em tramitação, desequilibra o binômio custo beneficio.

Em opinião contrária à extinção da justiça militar,  José Renato Nalini, sustenta que: “a justiça militar dispõe de orçamento reduzido e funciona de maneira muito eficiente. Por sinal que o senso de hierarquia e disciplina que caracterizam a policia militar, com que se convive de maneira próxima na justiça bandeirante, é algo admirável e que deveria inspirar outros estamentos do funcionalismo civil. Esse aspecto serve a desaconselhar qualquer alteração tópica no atual sistema”.[25]

Segundo Jorge Luis de Oliveira da Silva[26]:“a justiça militar no Brasil vem prestando, ao longo do tempo, relevantes serviços a sociedade. Por obvio, assim como toda e qualquer Instituição Publica, deve acompanhar a evolução da sociedade, adequando-se aos novos tempos. Neste sentido, não se descarta a modificação na composição do STM e dos Tribunais de Justiça militares, o fomento de um novo modelo de investigação policial militar e a necessidade imperiosa da modificação da abordagem do direito nos cursos de formação de oficiais, em especial nos relacionados às forças armadas. Que a justiça militar no Brasil seja continuamente aperfeiçoada mas sempre preservada, pois cumpre efetivamente seu papel no cenário jurídico e democrático brasileiro.

Citando novamente a dissertação realizada por Univaldo Correa[27], em A justiça militar e a constituição de 1988 – uma visão critica, o autor discorre que: “No caso da JUSTIÇA MILITAR ocorreu uma forte ligação entre ela e esse regime militar, senão porque ambos eram militares, mas, e de forma especial, em razão de julgamentos de CRIMES POLÍTICOS que lhe foram impostos. Esse fato ainda hoje pesa contra a JUSTIÇA CASTRENSE, mesmo que no novo texto constitucional tal competência não mais esteja prevista, e até, desde 1934 para a Justiça Militar Federal ou 1946 para as Justiças Militares Estaduais integrem o PODER JUDICIÁRIO, como efetivamente um de seus órgãos, sem qualquer ligação e/ou dependência das FORÇAS MILITARES, às quais antes pertenciam”.

Por tudo isso, busca-se mostrar que uma possível extinção da justiça militar, amoldar-se-ia aos princípios que regem a sociedade brasileira. No fundo, a justiça militar é um resquício de um estado ditatorial  que vigorou durante algumas décadas no Brasil e que, visivelmente, inspirou a menção de alguns artigos  compostos na carta cidadã, dando continuidade a uma justiça de modos e princípios obsoletos até para a época.

 

Referências
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito Constitucional. 19 edição.São Paulo. Editora Saraiva. p. 157.
Constituição Federal de 1988
A Constituição Federal e o Supremo. 3 ed. Brasilia: Secretaria de documentação, 2010.
CANOTILHO, José Gomes. Constituição da República Portuguesa anotada, 2 edição. Coimbra Ed., p. 73. 1984
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 15 edição. 2011. Editora Saraiva.
MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional – Tomo I. 6.ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1997. p. 86.
NALINI, Jose Renato. A rebelião da toga. Editora Millenium. 2 edicao. 2008. Pag40.
Revista direito militar – ano XII n 76 –mar/abril. 2009 –AMAJME, 2009
TAVARES, André Ramos. LENZA, Pedro. In Reforma do Poder judiciário. Pietro Alarcon (coord) p. 383
Revistas e Jornais
O Estado de S. Paulo in 12.11.1994, as Justiças Militares
Revista direito militar – ano XII n 76 –mar/abril. 2009 –AMAJME, 2009
Site
[1] A decisão de trabalhar com esse tema veio quando o CNJ decidiu montar uma comissão para averiguar a situação da justiça militar.
[4] Capitulo baseado na dissertação de Univaldo Correa – submetida à Universidade Federal de Santa Catarina.
[5] Inciso III do artigo 1 da Constituicao federal
[6] Incisos VI e VII do artigo 4 da Constituição Federal
[7] Capitulo realizado com  base em Lenza, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 15 edição. 2011. Editora Saraiva.
[8] HC 72.022 – Relator Ministro Neri da Silveira
[9] HC 67.931, Relator Ministro Moreira Alves
[10] A constituição federal só outorga competência à justiça militar estadual para processar e julgar policiais militares quando se tratar de crime militar definido em lei. HC 71.926 – Relator Ministro Moreira Alves.
[11] MS 20.930, Relator Ministro Carlos Madeira
[12] MS 23.138, Relator Ministro Marco Aurélio
[13] HC 93.292, Relator Ministro Cesar Pelluso
[14]RHC 96.814, Relator Ministro Eros Grau
[15] HC 92. 912 – Relatora Ministra Cármem Lúcia
[16] ADI 1.218, Relator Ministro Mauricio Correa
[17] RE 122.706 – Relator Ministro Sepulveda Pertence
[18] Artigo 125, parágrafos 3, 4 e 5 da Constituição Federal
[19] O art. 125 parágrafo 4 da Constituição Federal não impede a perda da graduação de militar mediante procedimento administrativo – Súmula 673
[20] Artigo 125, parágrafo 4
[21] HC 70. 604 – Relator Ministro Celso de Mello
[22] HC 93.076 Ministro Relator Celso de Mello
[23] Reforma do poder judiciário e justiça militar, in Andre Ramos Tavares, Pedro Lenza, Pietro Alarcon (coord) reforma do judiciario, p. 383
[24] publicado no “O Estado de S. Paulo”de 12.11.1994, as Justiças Militares
[25] NALINI, Jose Renato. A rebelião da toga. Editora Millenium. 2 edicao. 2008. Pag40.
[26] Revista direito militar – ano XII n 76 –mar/abril. 2009 –AMAJME, 2009
[27] A justiça militar e a constituição federal de 1988 – uma visão critica – Orientador: Prof. Dr. Cesar Luiz Pasold – Dissertação submetida à Universidade Federal de Santa Catarina para obtenção do grau de mestre em direito

Informações Sobre o Autor

Thalita Borin Nóbrega

Mestraem direito constitucional pelo Instituto Toledo de Ensino ITE pós graduada em direito penal e processo penal pela Faculdade Damásio de Ensino cursando pós graduação em criminologia e políticas publicas, Advogada


Equipe Âmbito Jurídico

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