A Reforma Eleitoral e as repercussões acerca do financiamento público de campanha

Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

Resumo: O presente estudo bibliográfico traz, à baila, discussões sobre algumas alterações propostas no projeto de reforma política, que tramita no Senado Federal, bem como, elenca as possíveis consequências que estas alterações podem causar no meio político brasileiro. O referido projeto de Reforma Eleitoral traz propostas acerca do financiamento público de campanha, lista fechada, fim da reeleição, divisão igualitária das vagas de candidaturas entre homens e mulheres. O presente trabalho discorre acerca das espécies de financiamento público, sua existência na legislação, os argumentos prós e contras referentes à sua implementação.

Palavras-chave: Direito Eleitoral. Reforma Eleitoral. Financiamento Público de Campanha. 

Sumário: 1. Introdução. 2. Financiamento Público de Campanha 2.1. Prestação de contas 2.2 Financiamento de Campanha no Brasil.. 3. As consequências da aplicação do instituto do financiamento público de campanha. 4. Ponderações finais. Referências bibliográficas.

1. INTRODUÇÃO

O presente estudo trata do financiamento público de campanha eleitoral, uma das principais inovações que tramitam em nosso Congresso sobre a reforma política. O estudo tem por objetivo acalorar a discussão desta alteração e suas possíveis consequências junto ao eleitor brasileiro.

O presente trabalho traz o principal enfoque ao tema do financiamento público de campanha, mas também abordará o tema da prestação de contas, e as consequências da aplicação do primeiro instituto.

2. FINANCIAMENTO PÚBLICO DE CAMPANHA

2.1. Prestação de contas

No meio político de nosso país, surgiram nos últimos anos diversos escândalos de corrupção. Candidatos que após serem eleitos se apropriam do dinheiro público e os revertem para satisfazerem seus interesses pessoais. Tal costume é antigo neste meio, remontando ao inicio da classe política no nosso País, conforme leciona o historiador Raymundo Faoro:

“A comunidade política conduz, comanda, supervisiona os negócios, como negócios privados seus, na origem, como negócios públicos depois, em linhas que se demarcam gradualmente. O súdito, a sociedade, se compreendem no âmbito de um aparelhamento a explorar a manipular, a tosquiar nos casos extremos.” (FAORO, 2001, pág. 869)

Neste meio sempre existiu a mistura entre o público e o privado. É como se a sociedade estivesse a serviços dos políticos e não o contrário. Dentro da seara eleitoral, sempre tivemos campanhas em que ocorreram abusos de poder: sejam eles políticos ou econômicos. Com o intuito de tornar estas disputas mais equitativas entre os contendores a legislação eleitoral sofreu diversas alterações, principalmente no controle dos gastos de campanha. De acordo com a Lei nº 9504, em seu artigo 28, podemos depreender que:

“Art. 28. A prestação de contas será feita:

I – no caso dos candidatos às eleições majoritárias, na forma disciplinada pela Justiça Eleitoral;

§ 1º As prestações de contas dos candidatos às eleições majoritárias serão feitas por intermédio do comitê financeiro, devendo ser acompanhadas dos extratos das contas bancárias referentes à movimentação dos recursos financeiros usados na campanha e da relação dos cheques recebidos, com a indicação dos respectivos números, valores e emitentes.”

Atualmente os candidatos têm que prestar contas das suas receitas e despesas junto aos cartórios eleitorais ou tribunais, dependendo da circunscrição do pleito que estiverem concorrendo. Nas peças devem ser indicadas as origens dos recursos, bem como, a execução destes, através dos gastos de campanha.  Como evolução da própria lei e com o intuito de tornar mais transparente as doações de campanha, foi introduzida no texto infraconstitucional a obrigatoriedade de divulgação de prestação de contas dos recursos na internet. Conforme disciplina o teor do artigo 28, parágrafo 4º, da Lei 9504, de 30 de setembro de 1997:

“4o Os partidos políticos, as coligações e os candidatos são obrigados, durante a campanha eleitoral, a divulgar, pela rede mundial de computadores (internet), nos dias 6 de agosto e 6 de setembro, relatório discriminando os recursos em dinheiro ou estimáveis em dinheiro que tenham recebido para financiamento da campanha eleitoral, e os gastos que realizarem, em sítio criado pela Justiça Eleitoral para esse fim, exigindo-se a indicação dos nomes dos doadores e os respectivos valores doados somente na prestação de contas final de que tratam os incisos III e IV do art. 29 desta Lei.”

A publicidade é fator relevante nas prestações de contas. Através dela é possível serem reveladas as impropriedades dos gastos das candidaturas.  Quando publicados os nomes dos doadores e os respectivos valores entregues por estes aos candidatos, poderão ser feitas verificações pelos interessados entre o valor declarado e o que efetivamente ocorreu.

O instituto da prestação de contas vem evoluindo em nossa legislação eleitoral. Hoje, um candidato poderá ser cassado, caso a sua prestação de contas seja desaprovada. Fator importante, ainda, é a responsabilização dos candidatos que passou a ser solidaria aos comitês financeiros.

Mesmo com o avanço na legislação que trata do controle das contas dos candidatos, ainda ocorrem graves incoerências no seu controle. Neste quadro de endurecimento das regras nas prestações de contas, saltam os projetos de reforma eleitoral no Congresso Nacional para o financiamento público de campanha.

2.2 O Financiamento de campanha no Brasil

Atualmente o assunto financiamento público de campanha tem povoado a imprensa nacional. Pode soar para o cidadão comum que esta forma de dotação de campanha é nova, porém, já se apresenta em nosso país há algum tempo, na sua forma direta e indireta.[1]

“No Brasil, formas de financiamento público para partidos políticos e campanhas eleitorais foram inicialmente adotadas em 1962. Naquele ano, Brasil passou a contar com financiamento público indireto, na forma do horário gratuito para propaganda eleitoral no rádio e na TV, mas o financiamento público direto – isto é, transferência de recursos financeiros do estado para partidos políticos e/ou candidatos- só viria a ser adotado em 1965, sob o regime militar. Desde então, o horário gratuito e o Fundo Partidário (Fundo Especial de Assistência aos Partidos Políticos), distribuído anualmente para os partidos políticos de acordo com determinados pré-requisitos, tiveram existência ininterrupta, embora com algumas importantes alterações.”

Na forma direta, é repassado aos partidos através do fundo partidário dinheiro obtido através do pagamento de multas junto a Justiça Eleitoral; na indireta, há a isenção de impostos para emissoras de rádio e televisão em troca do horário gratuito, que acaba não sendo tão gratuito. Salientado ainda, que há o financiamento privado, através de doações individuais de pessoas físicas e jurídicas às candidaturas. [2]

O financiamento público tem seus prós e contras. Tal assunto tem ocupado a imprensa e o Congresso Nacional, tendo como foco principal de discussão a tentativa de evitar o gasto indiscriminado nas campanhas, o caixa dois e a corrupção.

Tentando evitar tais práticas, tão reiteradas em nosso sistema, muitos entendem ser o financiamento público de campanha: a solução. Argumentam ser este, a melhor opção para coibir as práticas acima elencadas. Resta claro, que seria evitada a compensação, ou seja, aquele que financiou a campanha não cobraria benesses do gestor público quando este assumisse o cargo. Neste sentido, pontua o senador Humberto Costa[3]:

“O senador defendeu o financiamento público como forma de acabar com a corrupção. Sai mais barato para o estado brasileiro o financiamento público do que este modelo que está aí. Se alguém tiver o cuidado de olhar a relação de quem são os financiadores de campanha no Brasil, são empreiteiras, são prestadores de serviços, são bancos, são exatamente as empresas que, de alguma forma, guardam alguma relação de interesse com o público – afirmou o senador”.

O custeio das campanhas eleitorais, pelas empreiteiras e bancos, acaba gerando uma relação promíscua entre o público e o privado. Os candidatos, quando conseguem o objetivo de serem eleitos, acabam com uma dívida imensa com esses empresários. Ao assumirem seus mandatos, serão cobrados através de favores e benefícios na gestão. O custo público de financiar campanhas evitaria tal prática.

Em aparente discordância da implantação do financiamento, dois senadores discordaram veementemente dos outros membros da comissão, conforme podemos constatar em trecho extraído da Agência Senado[4]:

“… Apesar de ter votado pelo financiamento público, como forma de “baratear as campanhas”, o senador Wellington Dias (PT-PI) disse que não há regra de financiamento eleitoral que impeça a corrupção, opinião compartilhada pelo senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), que votou pela manutenção do sistema atual. O financiamento das atividades dos partidos políticos, isso nós já temos em larga escala hoje no Brasil, agora, financiar candidaturas com o dinheiro dos impostos, sou contra, e mais: isso não acaba com o financiamento ilegal, não acaba com a compra de lideranças, não acaba com a compra de votos, não acaba com o caixa dois, não acaba com o enriquecimento de políticos que fazem negócios com seus mandatos – argumentou Aloysio.”

Os senadores entendem que a aprovação desta nova forma de custeio de campanhas, não é garantia de que a corrupção será abolida de nossos pleitos. Com aprovação do projeto poderão ocorrer vários problemas entre eles podemos citar: aumento dos gastos públicos, dificuldades para fiscalização das contas dos candidatos, duplicidade de financiamento (o lícito e o ilícito).

Nosso País, apesar dos avanços, tem problemas crônicos nas áreas de saúde, educação e infraestrutura. Seria justo para nossa sociedade desviar dinheiro destes setores para financiar campanhas eleitorais? Aumentar os gastos públicos, em um momento em que o Brasil precisa investir nestas áreas, não é adequado.

Caso o financiamento de campanha seja aprovado, far-se-á necessário o fortalecimento da fiscalização das campanhas eleitorais. Esse fortalecimento passa pela criação de um órgão que possa analisar as contas de forma mais rígida, através de técnicos especializados na área contábil, bem como, com o fortalecimento da Justiça Eleitoral e de suas atribuições. Porém, a contrário senso, o Congresso quer limitar a competência da Justiça Eleitoral. Não será inteligente aprovar o financiamento e não ter um órgão com autonomia para avaliar as contas dos candidatos. Além do fortalecimento da Justiça Eleitoral, as contas devem ser submetidas a peritos especializados, a fim de que qualquer incongruência possa ser detectada de forma mais eficaz.

Salientando que, conforme citado acima, o sistema atual de financiamento já usa dinheiro público. Com a aprovação do novo projeto, será implementado um grande aumento no aporte de dinheiro público, exigindo um maior controle, seja pela Justiça Eleitoral, seja através do Tribunal de Contas, sob pena de ser criado um facilitador à corrupção eleitoral.

3. AS CONSEQUÊNCIAS DA APLICAÇÃO DO INSTITUTO DO FINANCIAMENTO PÚBLICO DE CAMPANHA

Entende-se que fortalecer os partidos pode gerar um salvo conduto para internamente eles fazerem o que bem quiserem, e este não é o melhor caminho, como preconizam alguns de nossos representantes. Ainda mais, se tudo isso for financiado com dinheiro público.

Um dos argumentos para se adotar o financiamento público de campanha é tornar o processo eleitoral isonômico, para que pessoas de todas as classes sociais possam ter acesso à possibilidade de serem representantes de nossa sociedade.

Porém, conclui-se que, caso seja aprovada a inclusão deste instituto, teremos o fortalecimento da aristocracia partidária e o enfraquecimento das políticas públicas como saúde, educação e moradia, pois, caso seja aprovado o instituto, recursos financeiros públicos certamente serão revertidos destas áreas para a implementação do financiamento público de campanhas eleitorais.

Neste contexto, mostra-se nocivo à sociedade e totalmente inviável a instituição do financiamento público de campanhas eleitorais.

4. PONDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se do presente estudo, que o financiamento público de campanha não deve ser aprovado, pois existem problemas mais imediatos nos quais o dinheiro público deve ser alocado, tais como nas áreas de saúde, educação, alimentação e moradia.

Caso seja implementado, o financiamento público de campanha deverá, como consequência, gerar um aumento na fiscalização dos gastos de campanha. Um órgão técnico especializado em análise de gastos da Justiça Eleitoral deverá ser incumbido pela avaliação das contas, já que nem juízes nem servidores comuns detêm o conhecimento técnico contábil para isso.

Como consequência natural e prudente, a Justiça Eleitoral deverá necessariamente ser fortalecida em seu papel fiscalizatório e regulador, como verdadeiro mecanismo de proteção da sociedade.

 

Referências bibliográficas
BULOS, Uadi Lammêgo . Curso de Direito de Constitucional. São Paulo: Editora Saraiva, 2008.
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais ,2006, p. 321
BOURDOUKAN, Adla Y. Financiamento público para partidos políticos e campanhas eleitorais no Brasil e seus efeitos sobre o sistema partidário: História e discussão. Disponível em :<http://lasa.international .pitt.edu/members /congresspapers /lasa2010 /files/4032.pdf>.  Acesso em 27 de junho de 2011.
BRASIL.. Lei 9504, publicada em 30 de setembro de 1997. Disponível em  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9504.htm. Acesso em 27 de junho de 2011.
FAORO, Raimundo . Os donos do poder. São Paulo: Editora Globo, 2001.

Notas:
[1] Artigo publicado por Adla Y. Bourdoukan, Financiamnento público para partidos políticos e campanhas eleitorais no Brasil e seus efeitos sobre so sistema partidário: história e discussão, pág. 01, endereço: http://lasa.international .pitt.edu/members /congresspapers /lasa2010 /files/4032.pdf. Acesso em 27 jun. de 2011.
[2] Ação direta de insconstitucionalidade nº 4650,  impetrada pela  OAB para torna inconstitucional os artigos, 24 e 81, da lei 9504/97.
[3] Comissão de reforma política do senado. Disponível em: http://www.senado.gov.br /notícias/ comissão-reforma-política-aprova-financiamento-público-das-campanhas-eleitorais-aspx.Acesso em 27 jun. 2011.
[4] Comissão de reforma política do senado. Disponível em: http://www.senado.gov.brA/notícias/ comissão-reforma-política-aprova-financiamento-público-das-campanhas-eleitorais-aspx.Acesso em 19 jun. 2011.


Informações Sobre o Autor

Edson Ricardo da Silva

Servidor público. Graduado em Direito pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (2009) e em Matemática pela Universidade Estadual do Ceará (2002). Especialista em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes (2010)


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!
Equipe Âmbito Jurídico

Recent Posts

Salário substituição e o artigo 450 da CLT

O salário substituição é um tema relevante no direito do trabalho, especialmente quando se trata…

5 horas ago

Diferença entre audiência de justificação e audiência de custódia

A audiência de justificação é um procedimento processual utilizado para permitir que uma parte demonstre,…

9 horas ago

Audiência de justificação

A audiência de justificação é um procedimento processual utilizado para permitir que uma parte demonstre,…

10 horas ago

Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV)

O trânsito brasileiro é um dos mais desafiadores do mundo, com altos índices de acidentes…

12 horas ago

Nova resolução do Contran sobre retrovisores

O Conselho Nacional de Trânsito (Contran) implementou uma nova resolução que regula as especificações dos…

12 horas ago

Exame obrigatório para renovação da CNH: novas regras para 2025

A partir de janeiro de 2025, uma importante mudança entrará em vigor para todos os…

12 horas ago