A responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica no cenário do estado democrático de direito

Resumo: O presente estudo visa analisar a responsabilidade penal da pessoa jurídica quando autora de crime ambiental a luz da Constituição Federal, uma vez que a crescente industrialização – fruto inclusive da globalização – gera cada vez mais degradação ambiental. Nesse viés, o desenvolvimento e a proteção ao meio ambiente devem caminhar em harmonia, servindo a disposição constitucional da responsabilização penal, a par da cível e administrativa, como mecanismos de controle para tanto. Porém, dado o caráter pragmático da referida disposição contida no art. 225, § 3º, da Constituição Federal, foi somente com a Lei Federal 9.605 de 1998 que se conferiu efetividade a referida responsabilização. Assim, a Lei Federal retro mencionada dispõem sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Dessa forma, a presente pesquisa analisa a responsabilidade penal da pessoa jurídica, seja ela de direito público ou privado, bem como as espécies de penalidade aplicadas a espécie, verificando por fim o posicionamento dos Tribunais Superiores no tocante à necessidade ou não da dupla imputação para a imposição de penalidades a pessoa jurídica, trazendo à baila a discussão quanto à importância da responsabilidade penal em matéria ambiental na atualidade.

Palavras-chave: Constituição Federal. Lei Federal 9.605 de 1998. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica.

Abstract: The present study aims at analyzing the criminal responsibility of the legal entity when authoring an environmental crime in the light of the Federal Constitution, since the growing industrialization – fruit of globalization – also generates more and more environmental degradation. In this bias, the guarantee to the development and protection to the environment must move in harmony, serving the constitutional provision of the criminal responsibility, along with the civil and administrative, like mechanisms of control for so much. However, given the pragmatic nature of this provision contained in art. 225, § 3, of the Federal Constitution, it was only with Federal Law 9,605 of 1998 that the said responsibility became effective. Thus, the aforementioned Federal Law, provides for penal and administrative sanctions derived from conducts and activities harmful to the environment. Thus, the present study analyzes the criminal responsibility of the legal entity, be it of public or private law, as well as the species of penalty applied to the species, verifying at last the position of the Superior Courts regarding the necessity or not of the double imputation for The imposition of penalties on the legal entity, bringing to the discussion the importance of criminal responsibility in environmental matters today.

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Keywords: Federal Constitution. Federal Law 9.605 of 1998. Criminal Liability of the Legal Entity.

Sumário: Introdução. 1. Objetivo. 2. Metodologia. 3. A Constitucionalização da Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. 4. Atividades Lesivas ao Meio Ambiente e as Sanções Penais. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

O meio ambiente entendido como a interação dos vários elementos naturais, artificiais e culturais que viabilizam o desenvolvimento equilibrado da vida em todos os seus aspectos, recebeu nova proteção jurídica com a promulgação da Constituição Federal de 1988. (LENZA, 2011, p. 1087)

Dentre as várias inovações elencadas em nossa Carta Magna se destaca a introdução da responsabilidade penal da pessoa jurídica quando autora de crime ambiental – art. 225, §3, da CF – responsabilidade esta regulamentada após dez anos pela Lei Federal nº 9.605 de 1998.

Importante destacar que na seara das normas constitucionais, juntamente com o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado também recebe proteção o direito ao desenvolvimento, servindo a sustentabilidade como mecanismo conciliador entre referidos valores. (LENZA, 2011, p. 1090)

Nesse contexto a noção de que desenvolvimento e meio ambiente são opostos não se sustenta, uma vez que um é fonte de recursos para o outro, sendo a harmonia entre ambos indispensável para a manutenção do sistema como um todo. (LENZA, 2011, p. 1090)

Dessa forma ao passo que as políticas ambientais não devem em princípio criar óbices ao desenvolvimento, este deve pautar suas ações considerando as questões ambientais dentro de seu processo de expansão/exploração.

Assim a Constituição Federal ao introduzir a responsabilidade penal da pessoa jurídica por danos ambientais em nosso ordenamento, elencou o direito ao “meio ambiente a bem jurídico-penal autônomo”, sujeitando aqueles que causem dano ambiental a responsabilidade penal, bem como, civil e administrativa, contribuindo assim com o exercício do desenvolvimento de forma equilibrada.

1. OBJETIVO

Esclarecer a importância da responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica, tendo em vista que nossa Carta Magna elenca como direito fundamental um meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem como demonstrar a sua contribuição no cenário do desenvolvimento social e político brasileiro.

2. METODOLOGIA

O estudo em questão possui uma abordagem qualitativa, de cunho descritivo, com revisão bibliográfica, ou seja, é a pesquisa “desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos” (GIL, 2002) e documental. Para tanto, buscou-se verificar, a partir da leitura crítica da própria legislação federal e estadual; artigos científicos (que envolvam o tema estudado); normas técnicas, entre outros, os principais pontos da Lei 9.605 de 1998 que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, averiguando sua a aplicabilidade e importância no estabelecimento diretrizes no âmbito empresarial/econômico, pois ao estabelecer limites a pessoa jurídica diante do cometimento de crimes ambientais transforma a realidade social, promovendo, ainda que pelo anseio de uma punição estatal severa, a preservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Foram usados como indicadores para nortear a análise qualitativa à discussão primeiramente do uso do direito penal como instrumento de repressão e prevenção no combate à degradação ambiental, as espécies de penalidade aplicadas, bem como foi analisada a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal no tocante a necessidade ou não da dupla imputação para que ocorra a responsabilização da pessoa jurídica, e por fim, foi observada a aplicação no direito pátrio da teoria do disregard of legal entity. Desta forma o artigo utilizou o procedimento de pesquisa bibliográfica e documental.

3. A constitucionalização da RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL DA PESSOA JURÍDiCA

O surgimento da responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica no estado democrático de direito decorre principalmente da crescente industrialização – fruto inclusive da era globalizada em que nos inserimos – e do impacto ambiental decorrente desse crescimento.

A preservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado remonta ao constituinte originário, o qual previu nos artigos 173, § 5º e 225, §3º que:

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. (…) § 5º A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e reserva preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (…) § 3º As condutas e atividade s consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (BRASIL, 1988)”

Ocorre que, tendo vista que a Carta Magna consiste em um mandado constitucional de criminalização, ou seja, impõe um patamar mínimo de criminalização visando à proteção de bens e valores constitucionais, buscando a defesa ativa do indivíduo e da sociedade, porém sem criar crimes ou cominar penas, o legislador infraconstitucional criou a Lei 9.605 de 1998, a qual dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, conferindo efetividade à norma constitucional. (BRASIL, 1998)

4. Atividades lesivas ao meio ambiente e as sanções penais

As atividades lesivas ao meio ambiente, bem como as respectivas sanções penais são disciplinadas pela Lei 9.605 de 1998, conforme supracitado.

Nesse contexto, o direito penal surge como instrumento de repressão e prevenção no combate à degradação ambiental, embora com aplicação subsidiária frente os demais ramos do direito. Seguindo essa linha ensina Viviane que: “no Brasil, o legislador enfocou a responsabilidade criminal da pessoa jurídica em relação aos delitos que lesam o meio ambiente, haja vista a grande periculosidade que eles representam à saúde e à vida humana, sobretudo porque a Constituição da República Federativa anunciou que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (VIVIANE, 2009, p. 58)”.

O direito penal, assim, tem como função primordial a proteção de bens jurídicos elencados como fundamentais, destacando-se entre eles o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo que sua aplicação apenas se justifica quando os demais meios jurídicos não bastam a proteção eficiente do referido bem.

Segundo Duarte tanto a pessoa jurídica de direito privado quanto à de direito público podem ser responsabilizadas penalmente pela prática de infrações contra o meio ambiente. Frisa referido autor, porém, que no tocante a pessoa jurídica de direito público existem dois posicionamentos distintos: aqueles que entendem que a Constituição Federal, assim como a Lei de Crimes Ambientais não fez qualquer restrição, mencionando de forma genérica apenas o termo pessoa jurídica, abrangendo tanto a responsabilização penal da pessoa jurídica privada quanto da pública; e a os que defendem a impossibilidade de tal punição, uma vez que os entes públicos apenas podem perseguir fins lícitos, logo quem prática ato desviado é o administrador público, devendo somente ele responder pelo ato criminoso. (DUARTE, 2012)

No tocante ao reconhecimento da responsabilidade penal da pessoa jurídica por crime ambiental se destacam na jurisprudência dos tribunais superiores duas correntes: inicialmente o Superior Tribunal de Justiça reconhecia a possibilidade da referida responsabilidade por meio da aplicação da teoria da dupla imputação, a qual implica na necessidade de punição em conjunto da pessoa jurídica e da pessoa física (STJ, REsp 889528-SC). A atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal – culminando na reforma da posição do Superior Tribunal de Justiça – se deu em sentido contrário, afirmando que a responsabilidade da pessoa jurídica independe da pessoa física (IGLECIAS, 2014, p. 202). Nesse sentido, consta no informativo 714 do Supremo Tribunal Federal que:

“É admissível à condenação de pessoa jurídica pela prática de crime ambiental, ainda que absolvidas as pessoas físicas ocupantes de cargo de presidência ou de direção do órgão responsável pela prática criminosa. Com base nesse entendimento, a 1ª Turma, por maioria, conheceu, em parte, de recurso extraordinário e, nessa parte, deu-lhe provimento para cassar o acórdão recorrido. Neste, a imputação aos dirigentes responsáveis pelas condutas incriminadas (Lei 9.605/98, art. 54) teria sido excluída e, por isso, trancada a ação penal relativamente à pessoa jurídica. Em preliminar, a Turma, por maioria, decidiu não apreciar a prescrição da ação penal, porquanto ausentes elementos para sua aferição. Pontuou-se que o presente recurso originara-se de mandado de segurança impetrado para trancar ação penal em face de responsabilização, por crime ambiental, de pessoa jurídica. Enfatizou-se que a problemática da prescrição não estaria em debate, e apenas fora aventada em razão da demora no julgamento. Assinalou-se que caberia ao magistrado, nos autos da ação penal, pronunciar-se sobre essa questão. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Luiz Fux, que reconheciam a prescrição. O Min. Marco Aurélio considerava a data do recebimento da denúncia como fator interruptivo da prescrição. Destacava que não poderia interpretar a norma de modo a prejudicar aquele a quem visaria beneficiar. Consignava que a lei não exigiria a publicação da denúncia, apenas o seu recebimento e, quer considerada a data de seu recebimento ou de sua devolução ao cartório, a prescrição já teria incidido. (…) No mérito, anotou-se que a tese do STJ, no sentido de que a persecução penal dos entes morais somente se poderia ocorrer se houvesse, concomitantemente, a descrição e imputação de uma ação humana individual, sem o que não seria admissível a responsabilização da pessoa jurídica, afrontaria o art. 225, § 3º, da CF. Sublinhou-se que, ao se condicionar a imputabilidade da pessoa jurídica à da pessoa humana, estar-se-ia quase que a subordinar a responsabilização jurídico-criminal do ente moral à efetiva condenação da pessoa física. Ressaltou-se que, ainda que se concluísse que o legislador ordinário não estabelecera por completo os critérios de imputação da pessoa jurídica por crimes ambientais, não haveria como pretender transpor o paradigma de imputação das pessoas físicas aos entes coletivos. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Luiz Fux, que negavam provimento ao extraordinário. Afirmavam que o art. 225, § 3º, da CF não teria criado a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Para o Min. Luiz Fux, a mencionada regra constitucional, ao afirmar que os ilícitos ambientais sujeitariam “os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas”, teria apenas imposto sanções administrativas às pessoas jurídicas. Discorria, ainda, que o art. 5º, XLV, da CF teria trazido o princípio da pessoalidade da pena, o que vedaria qualquer exegese a implicar a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Por fim, reputava que a pena visaria à ressocialização, o que tornaria impossível o seu alcance em relação às pessoas jurídicas. RE 548181/PR, rel. Min. Rosa Weber, 6.8.2013.(RE-548181)”.

Corroborando ensinam Freitas e Freitas que:

“(…) a denúncia poderá ser dirigida apenas contra a pessoa jurídica, caso não se descubra a autoria das pessoas naturais, e poderá, também, ser direcionada contra todos. Foi exatamente para isto que elas, as pessoas jurídicas, passaram a ser responsabilizadas. Na maioria absoluta dos casos, não se descobria a autoria do delito. Com isto, a punição findava por ser na pessoa de um empregado, de regra o último elo da hierarquia da corporação. E quanto mais poderosa a pessoa jurídica, mais difícil se tornava identificar os causadores reais do dano. No caso de multinacionais, a dificuldade torna-se maior, e o agente, por vezes, nem reside no Brasil. Pois bem, agora o Ministério Púbico poderá imputar o crime às pessoas naturais e à pessoa jurídica, juntos ou separadamente. A opção dependerá do caso concreto (FREITAS e FREITAS, 2006, p. 70).”

Assim, percebe-se que o entendimento dos tribunais superiores caminha no sentido da preservação e proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, chamando à responsabilidade devida as pessoas jurídicas.

Nesse diapasão o entendimento que vem prevalecendo na doutrina pátria em matéria de responsabilização ambiental, seja da pessoa física ou da jurídica, consiste na possibilidade de serem aplicadas cumulativa ou alternativamente sanções penais, administrativas ou cíveis. (IGLECIAS, 2014, p. 203)

A responsabilidade penal consiste em sanção pelo cometimento de delito ambiental; já a responsabilidade administrativa decorre do cometimento de uma infração administrativa (descumprimento de norma com sanção aplicada por autoridade administrativa); enquanto que a responsabilização cível compreende a obrigação de reparar o dano causado ao meio ambiente. (IGLECIAS, 2014, p. 203)

Os delitos ambientais são abordados em especial pela Lei 9.605/1998, a qual trata das sanções penais e administrativas decorrentes de atos lesivos ao meio ambiente. A título de exemplo também versam sobre o tema os seguintes sistemas: código penal (ex. art. 250), lei de contravenções penais (ex. art. 31), lei das atividades nucleares (ex. art. 23, da Lei nº 6.453/1977) e a lei da biossegurança (ex. art. 29). (IGLECIAS, 2014, p. 195)

Ao analisarmos mais atentamente a Lei nº 9.605/1998 constatamos primeiramente, que ela se dirige tanto a pessoas físicas quanto jurídicas autoras de crime ambiental, sendo que as sanções cominadas na grande maioria não ultrapassam á quatro anos, bem como que apenas encontramos pena superior a referido patamar no art. 35 (pesca mediante o uso de explosivo – pena: reclusão de um a cinco anos), no art. 40 (causar dano as unidades de conservação – pena: reclusão de um a cinco anos) e art. 54, § 2º (poluição qualificada – pena: reclusão de um a cinco anos). A prática forense por sua vez demonstra também que no Brasil não se aplica o máximo da pena, o que leva a conclusão de que as penas de prisão somente ocorreriam quando houvesse reincidência.  (IGLECIAS apud MACHADO, 2014, p. 198)

Cumpre frisar, que a reincidência impede a utilização das penas restritivas de direito, mesmo ela não estando elencada no art. 7 da referida lei, uma vez que o Código Penal tem aplicação subsidiária (art. 79, da Lei nº 9.605/1998) (IGLECIAS, 2014, p. 198)

No tocante a responsabilidade penal da pessoa física, ela poderá receber como sanção pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos. De acordo com a Lei 9.605 de 1998, as penas restritivas de direito por sua vez, são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando o crime for culposo ou for aplicada pena privativa de liberdade inferior a quatro anos e as circunstâncias judiciais forem favoráveis (culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação e prevenção do crime). (BRASIL, 1998, art.7)

Dispõe o art. 8 da referida lei, que as penas restritivas de direitos aplicadas à pessoa física são: prestação de serviços à comunidade, interdição temporária de direitos, suspensão parcial ou total de atividade, prestação pecuniária e o recolhimento domiciliar. A prestação de serviços a comunidade consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuita junto a parques, jardins públicos ou unidades de conservação e no caso de dano a coisa particular, pública ou tombada, sua restauração se possível; a interdição temporária de direitos se refere a proibição de o contratado contratar com o Poder Público, receber incentivos fiscais ou quais outros benefícios, bem como de participar de licitações pelo prazo de cinco anos, no caso de crimes dolosos e de três anos se o crime for culposo; a suspensão da atividade ocorre quando estas não estiverem seguindo as prescrições legais; a reparação pecuniária consiste em pagamento a vítima ou a entidade pública ou privada com fim social, conforme determinação judicial e o recolhimento domiciliar, consiste na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado que deverá sem vigilância, trabalhar, frequentar curso ou exercer atividade autorizada, permanecendo recolhido no domicílio nos dias e horários em que nas esteja nas referidas atividades. (BRASIL, 1998, art.8 ao art.13)

Com relação à responsabilização penal da pessoa jurídica, importante tecer alguns comentários, primeiramente, temos que ela apenas é possível porque a Constituição Federal de 1988, no art. 225, §3, trouxe essa possibilidade, afirmando que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”, segundo porque dez anos após essa previsão, foi editada a Lei 9.605 de 1998, a qual além de dispor sobre os tipos legais também inseriu as respectivas sanções tanto para a pessoa física quanto a pessoa jurídica quanto autora de crime ambiental. (PICON, 2015)

As sanções para a pessoa jurídica em razão do cometimento de crime ambiental estão disciplinas do art. 21 ao art. 24 da Lei 9.605 de 1998, consistindo na pena de multa, restritiva de direitos e prestação de serviços à comunidade. As penas restritivas de direita consistem na suspensão parcial ou total das atividades, na interdição temporária do estabelecimento, obra ou atividade e não proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações; a prestação de serviços à comunidade por sua vez se refere ao  custeio de programas e de projetos ambientais, a execução de obras de recuperação de áreas degradadas; a manutenção de espaços públicos e a contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas. (Brasil, 1998, art. 21 a art. 23)

Nesse sentido, decidiu o Supremo Tribunal Federal:

“Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Direito Penal. 3. Prescrição. Alegação de aplicação às pessoas jurídicas do lapso previsto no inciso I do art. 114 do CP (prescrição da pena de multa). 4. Incidência das súmulas 282 e 356. 5. Ofensa indireta ao texto constitucional. 5. Súmula 279. 6. Não configurada a ocorrência de prescrição em relação ao crime imputado. 7. Nos crimes ambientais, às pessoas jurídicas aplicam-se as sanções penais isolada, cumulativa ou alternativamente, somente as penas de multa, restritivas de direitos e prestação de serviços à comunidade (art. 21 da Lei 9.605/98). No caso, os parâmetros de aferição de prazos prescricionais são disciplinados pelo Código Penal. Nos termos do art. 109, caput e parágrafo único, do Código Penal, antes de transitar em julgado a sentença final, aplica-se, às penas restritivas de direito, o mesmo prazo previsto para as privativas de liberdade, regulada pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime. O crime do art. 54, § 1º, da Lei 9.605/98 – o qual estabelece pena de detenção de seis meses a um ano, e multa – prescreve em 4 anos (CP, art. 109, V). Não ocorrência do prazo de 4 anos entre a data dos fatos e o recebimento da denúncia. Prescrição não caracterizada. Não se afasta o lapso prescricional de 2 anos, se a pena cominada à pessoa jurídica for, isoladamente, de multa (inciso I, art. 114, do CP). 8. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 9. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 944034 AgR, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 30/09/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-223 DIVULG 19-10-2016 PUBLIC 20-10-2016) (Grifamos)”

Importante destacar ainda, que a pessoa jurídica constituída ou utilizada preponderantemente para permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime ambiental terá decretada sua liquidação forçada, sendo o seu patrimônio considerado instrumento do crime e por consequência perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional. (Brasil, 1998, art. 24)

Feita estas considerações, observamos que a lei em questão se dirige a qualquer pessoa que concorra para a prática dos crimes previstos em seu bojo, na medida de sua culpabilidade, logicamente, bem como ao diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la. E ainda que a responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato. (Brasil, 1998, art. 2 e art. 3)

Em matéria de proteção ambiental a Lei nº 9.605/1998 ainda foi mais longe, determinando expressamente em seu artigo 4º sobre a chamada teoria do disregard of legal entity, a qual consiste na desconsideração da personalidade jurídica quando ela se revelar como impedimento para que se opere o ressarcimento de prejuízos causados ao meio ambiente. (IGLECIAS, 2014, p. 202/204)  

Isto posto, dentre as muitas inovações trazidas pela Lei 9.605 de 1998, destacam-se as seguintes: como regra geral o não encarceramento de pessoas físicas autoras de crime ambiental, a possibilidade de responsabilização da pessoa jurídica e um realce a atuação da Administração, na medida em que é ela a responsável por dar autorizações, permissões e licenças ambientais. (IGLECIAS, 2014, p.198)

CONCLUSÃO

Ao analisar a situação do desenvolvimento de forma sustentável frente à industrialização crescente observa-se o interesse cada vez mais patente em se discutir assuntos relacionados à responsabilidade penal da pessoa jurídica, seja ela pública ou privada quando cometa crime ambiental. Nesse contexto, a Lei 9.605 de 1998 veio justamente para dar plena efetividade ao art. 225 da Constituição Federal – norma pragmática – reunindo leis esparsas, embora não todas, servindo como meio de prevenção e repressão a práticas lesivas ao meio ambiente. (IGLECIAS, 2014, p. 197). Dessa forma, constatamos que no Estado Democrático de Direito a responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica quando autora de crime ambiental vai além do cunho preventivo e retributivo citado anteriormente, compreendendo indiretamente a função de conciliar o desenvolvimento econômico com o desenvolvimento sustentável, sendo este último assim considerado aquele capaz de suprir as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade de atender as necessidades das futuras gerações, partindo da premissa de que intrínseco ao crescimento econômico deve estar à preservação do meio ambiente. (WWF, 2016)

Em suma, a Constituição Federal de 1988 foi o marco da responsabilização penal ambiental da pessoa jurídica, a qual, porém apenas foi efetivada com a Lei 9.605 de 1998, servindo como meio de transformar a realidade social, promovendo, ainda que pelo anseio de uma punição estatal severa, a preservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

 

Referências
BRASIL. Constituição Federal, de 05 de outubro de 1988. Diário Oficial da União da República Federativa do Brasil, Brasília, DF.
BRASIL. Lei nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998.
Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Diário Oficial da União República Federativa do Brasil, Brasília, DF.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ARE 944034 AgR. Relator: Ministro Gilmar Mendes  . Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28CRIME+AMBIENTAL%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/hdam39j>. Acesso em: 24 de abr de 2017.
DUARTE JR, Ricardo. Novas reflexões acerca da responsabilidade penal da pessoa jurídica de direito público por danos ambientais. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 106, nov 2012. Disponível em: <https://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php/Ricardo%20Antonio?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=12455>. Acesso em: 8 abr 2017.
FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza.  8. ed. São Paulo: RT, 2006, 70 p.
GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002. 44 p.
GOMES, Luiz Flávio. É possível falar-se em responsabilidade penal da pessoa jurídica de direito público nos crimes ambientais?. Disponível em: http://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/121926128/e-possivel-falar-se-em responsabilidade-penal-da-pessoa-juridica-de-direito-publico-nos-crimes-ambientais. Acesso em: 6 de abr de 2017.
INGLECIAS, Patricia. Direito ambiental. São Paulo: RT, 2014. 195, 197, 198, 202, 203 e 204 p.
LENZA, PEDRO. Direito constitucional esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2011. 1087 e 1090 p.
PICON, Rodrigo. As peculiaridades da Lei 9.605/98 (crimes ambientais). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4445, 2 set. 2015. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/42218>. Acesso em: 8 abr 2017
VIVIANI, Rodrigo Andrade. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: Aspectos Controvertidos no Direito Brasileiro. Curitiba: Juruá, 2008. 58 p.
WWF, World Wildlife Fund. O que é desenvolvimento sustentável. Disponível em: http://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/questoes_ambientais/desenvolvimento_sustentavel/. Acessado em 13 de setembro de 2015.

Informações Sobre o Autor

Paula Miria Santa Catarina

Bacharel em Direito Faculdade Mater Dei Pato Branco/PR. Especialista em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná. Assessora Jurídica da Câmara Municipal de Campo Erê/SC


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Equipe Âmbito Jurídico

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