Cumpre alertar primeiramente que o Novo CPC foi recentemente alterado em 05 de fevereiro de 2016, através da Lei 13.256/2016 que voltou a impor o duplo juízo de admissibilidade do recurso especial e o recurso extraordinário, mantendo para os demais recursos um único juízo de admissibilidade que é feito no juízo ad quem.
Outra relevante mudança fora a revogação do §10º do art. 1.035 que previa o prazo máximo de um ano para o julgamento do recurso a contar do reconhecimento da repercussão geral, quando cessaria em todo território nacional a suspensão dos processos, que retomarão seu curso normal.
Rodolfo Kronemberg Hartmann aponta como elogiável a norma e ainda se refere ao Enunciado 224 do FPPC que aduz in litteris: “A existência de repercussão geral terá de ser demonstrada de forma fundamentada, sendo dispensável sua alegação em preliminar ou em tópico específico”.
Os processos nos tribunais e os meios de impugnação das decisões judicias representam temas de maior relevância em todo sistema processual brasileiro, tais temas estão disciplinados no Livro III da Parte Geral do CPC/2015.
O direito processual civil pátrio desenvolveu longa trajetória evolutiva e finalmente elaborou um sistema de precedentes judiciais. É de bom aviltre definir o que seja precedente que é um pronunciamento judicial, proferido em um processo anterior que é empregado como base de formação de outra decisão judicial, prolatada em processo posterior.
Sempre que um órgão jurisdicional, ao proferir uma decisão, partir de outra decisão, já proferida em outro processo; empregando-a como base, a decisão anteriormente prolatada terá sido um precedente.
É bom apontar que a técnica de decidir[1] a partir de precedentes, usando-os como princípios argumentativos é, pois, uma das bases dos sistemas jurídicos anglo-saxônicos, sendo mais relacionada à tradição jurídica do common law[2].
O precedente é produto de atividade jurisdicional, de maneira que, exercida essa atividade, a produção de decisões com potencialidade de se tornar modelo de solução para o julgamento de casos futuros é inevitável. Em outros termos, o precedente é um fato. Assim, em qualquer lugar do mundo onde existir decisão jurisdicional, esse fato ocorrerá.
O que pode de fato variar segundo ordenamento jurídico é o grau de autoridade ou eficácia que se atribuiu aos precedentes judiciais. No sistema europeu-continental, ou seja, da família romano-germânica, por exemplo, os precedentes judiciais costumam ser dotados de eficácia persuasiva, enquanto que no sistema anglo-saxão, os precedentes judiciais costumam ser dotados de eficácia vinculante.
Não significa afirmar que o ordenamento jurídico brasileiro que é francamente de filiação romano-germânica, mais conhecido como civil law tenha migrado para o common law. Muito ao contrário, o que se tem no Brasil é a construção de um sistema de decisões judiciais com base em precedentes adaptado às características ao civil law.
Afinal, ao decidir com base em precedentes é uma forma de assegurar o respeito a uma série de princípios constitucionais formadores ao modelo constitucional de processo.
Há em verdade uma gradativa e progressiva aproximação doutrinária e positiva entre o sistema de civil law e o do common law. O sistema brasileiro de precedentes judiciais busca assegurar, precipuamente a isonomia e a segurança jurídica.
O direito pátrio conhece duas espécies de precedentes: os vinculantes e os não vinculantes (também chamados de persuasivos ou argumentativos).
Evidentemente que os vinculantes são os mais relevantes na construção do sistema e destinam-se a garantir casos iguais recebam as respostas jurídicas iguais (isonomia), o que confere maior previsibilidade às decisões judicias (segurança jurídica e a vedação da decisão surpresa).
Naturalmente há de se estabelecer a distinção existente entre a jurisprudência e precedente. Percebe-se que existe uma diferença quantitativa fundamental. Pois, a jurisprudência[3] é um conjunto de decisões judicias, proferidas pelos tribunais, sobre determinada matéria e num determinado sentido,
Ao passo que ao cogitar sobre precedente significa indicar uma decisão judicial proferida em determinado caso concreto que servirá de base para decisões futuras.
Mas, ressalte-se que ao nos referirmos à jurisprudência, indica-se ao um grande número de decisões judiciais que estabelecem uma linha constante a respeito à certa matéria, permitindo que se compreenda o modo com que os tribunais interpretam determinada norma jurídica.
É importante para o sistema brasileira a distinção pois sua preocupação é no sentido de haver maior uniformidade de decisões judiciais para as causas idênticas, notadamente quanto se tratar de demandas repetitivas. Por outro lado, a jurisprudência que serve de base para uniformização de entendimento a respeito de temas que se manifestam em causas diferentes.
Na área de Direito de Família não se pode cogitar em demandas repetitivas, pois cada caso concreto é um caso. Apesar disto, há temas comuns debatidos como a comunhão dos aquestos nos casamentos celebrados pelo regime de separação obrigatória de bens, ou ainda, nos processos onde se discute haver ou não a prisão civil do devedor de alimentos quando este efetua pagamento apenas parcial da dívida exequenda.
Em casos assim apresentados, é fundamental para haver a unidade do ordenamento jurídico que se verifique a existência de linhas decisórias constantes, a acenar com uma jurisprudência firma o que confere coerência das decisões judiciais a respeito da matéria julgada.
Ressalte-se que não terá a decisão judicial exarada como um precedente, mas a prolação de decisões deve respeitar a jurisprudência formada sobre esse ponto.
Há de se defender que a jurisprudência seja estável, íntegra e coerente, vide o art. 926 do CPC/2015[4]. Assim apesar do novo codex ter eliminado o incidente de uniformização de jurisprudência, o dispositivo recomenda que os Tribunais mantenham o conjunto de suas decisões de maneira estável, íntegra e coerente. Poderão os tribunais continuar a editar as súmulas correspondentes à sua jurisprudência vinculante, sempre observando as circunstâncias de fato dos precedentes que a justificaram.
A estabilidade jurisprudencial indica que as linhas de decisões são constantes e uniformes a respeito de certas matérias não podem ser simplesmente abandonadas ou alteradas de forma arbitrária ou discricionariamente.
Exige também que seus próprios precedentes sejam observados inclusive nos órgãos fracionários. Por essa razão que se exige a fundamentação adequada e específica. Ressalte-se que ainda é possível haver a modulação temporal dos efeitos dos precedentes em face da exigência de respeito ao interesse social e à segurança jurídica.
Modulação dos efeitos de uma decisão judicial é a adequação da produção de seus efeitos com relação ao aspecto temporal, visando assegurar a segurança das relações jurídicas existentes anteriormente ao decidido, evitando lacunas e caos, em atenção ao interesse social.
No Direito Comparado, verificamos que em Portugal[5] a Constituição daquele país prevê a possibilidade da modulação dos efeitos, no artigo 282, item 4: “(…) quando a segurança jurídica, razões de equidade ou interesse público de excepcional relevo, que deverá ser fundamentado, o exigirem, poderá o Tribunal Constitucional fixar os efeitos da inconstitucionalidade ou da ilegalidade com alcance mais restrito”.
Além disso, Luís Roberto Barroso acrescenta: “Na linha da jurisprudência do STF, a modulação temporal dos efeitos de decisão judicial pode ocorrer em quatro hipóteses: a) declaração de inconstitucionalidade em ação direta[1]; b) declaração incidental de inconstitucionalidade[2]; c) declaração de constitucionalidade em abstrato[3]; e d) mudança de jurisprudência. A hipótese dos autos é, sem dúvida, esta última: mudança de jurisprudência. Precedentes emblemáticos e recentes do emprego da modulação temporal em tais casos, como se sabe, foram a mudança de entendimento da Corte relativamente (i) à competência para ações acidentárias, que passou da Justiça Estadual para a Justiça do Trabalho[4]; e (ii) ao regime de fidelidade partidária[5]”.
Diante disso, face a flexibilidade conferida pelo Supremo Tribunal Federal à modulação dos efeitos da decisão, resta evidente que poderia o Tribunal Superior do Trabalho adotar a modulação dos efeitos da decisão na reforma que pretende fazer, sendo este o caminho plausível a ser adotado para compatibilizar as alterações de entendimento jurisprudencial que serão promovidas pelo Tribunal com o Princípio da segurança jurídica.
A mudança de entendimento jurisprudencial implica em nova interpretação e, ipso facto, a criação de nova norma jurídica in concreto, sendo aplicável aos casos concretos futuros.
Mas, é curial lembrar que nem sempre em todos os casos concretos haverá a modulação de efeitos dos precedentes, pois, caberá a cada tribunal quando se der a alteração jurisprudencial expressamente estabelecer se, haverá ou não a modulação temporal dos efeitos do novo entendimento jurisprudencial exarado.
José Rogério Cruz e Tucci, Fredie Didier Jr., Paulo Sarno Braga e Rafael de Oliveira (apud Patrícia Silva de Jesus) compreendem que o distinguishing possui duas acepções: o distinguish-método e o distinguish-resultado. Na primeira acepção, designa o método de comparação entre o caso concreto em análise e o caso concreto paradigma. Já na segunda acepção representa o resultado desse confronto, quando se depreende que os casos possuem algumas diferenças ou semelhanças, que podem culminar no afastamento ou na aplicação da ratio decidendi.
O distinguishing apresenta-se como processo mental indutivo e empírico do magistrado, baseado na análise das circunstâncias fáticas e a ratio decidendi do caso concreto a ser julgado e as circunstâncias fáticas e a ratio decidendi dos casos concretos julgados em momento precedente. Parte-se, desse modo, do particular para o geral.
Através do distinguishing pode o juiz concluir que os casos concretos (o paradigma e o em julgamento) são diferentes, poderá seguir um de dois caminhos, a saber: poderá dar à ratio decidendi uma interpretação restritiva, por entender que as peculiaridades do caso concreto impedem a total aplicação da mesma tese jurídica outrora firmada, caso em que julgará o procedente livremente, sem a vinculação ao precedente.
Poderá, ainda, estender ao caso concreto a mesma solução conferida aos casos concretos anteriores, por entender, que a despeito das peculiaridades concretas, aquela tese jurídica lhe é aplicável (quando amplia a aplicação do precedente jurisprudencial).
A técnica de confronto, interpretação e aplicação de precedente judicial aplica-se no Brasil e pode-se perceber, por exemplo, no julgamento da Ação cautelar nº 1.549 e da Reclamação Constitucional 1.132/RS.
A evolução jurisprudencial é muito importante quando se tratar sobre os requisitos de admissibilidade[6] dos recursos superiores. E, caso o novo entendimento seja mais restritivo, o que torna mais difícil o acesso àquela Corte, não se pode admitir que tal novo entendimento seja aplicável aos recursos anteriormente interpostos e nos quais o requisito tenha sido considerado preenchido pelo recorrente nos termos do que, na época da interposição recursal, era considerado adequado.
Percebe-se que aplicar retroativamente o novo entendimento jurisprudencial implicará certamente numa quebra de confiança legítima que o jurisdicionado deposita no judiciário, o que contraria a boa-fé objetiva que deve reger todo o sistema processual e contraria o direito fundamental à segurança jurídica.
Identificada a jurisprudência constante a respeito de algum tema, caberá ao tribunal editar um enunciado de súmula dominante. E tal súmula de jurisprudência dominante é um resumo de jurisprudência, sendo firmado por verbetes ou enunciados que indicam o modo pelo qual o tribunal decide determinadas matérias.
A Súmula 510 do STJ que afirma: “A liberação de veículo retido por transporte irregular de passageiros não está condicionada no pagamento de multas ou despesas”.
Observa-se que a súmula da jurisprudência dominante do tribunal não se deve indicar apenas o enunciado, mas, também as decisões em que a referida matéria fora enfrentada e decidida, o que permite o conhecimento das circunstâncias que levariam à formação daquele entendimento e os fundamentos que lhe servem de base e que são os precedentes onde se estabeleceu a fundamentação que justifica a conclusão.
Percebe-se que o enunciado da súmula, portanto, não é um precedente. Refere-se à um extrato de diversos pronunciamentos judiciais. E, tais decisões até podem basear-se em fundamentos distintos, mas em todas elas se identificou em todas a mesma conclusão.
Decidir com base em enunciado de súmula não é mesma coisa que decidir com apoio em precedente. Frise-se que o enunciado de súmula representa o extrato da jurisprudência dominante do tribunal.
Cada tribunal deve editar sua súmula de jurisprudência dominante e incluir verbetes que enunciem que indiquem suas linhas de jurisprudências constantes, com a expressa referência aos precedentes que lhe deram origem.
A aplicação desses enunciados, portanto, deve ser feita levando-se em conta os precedentes que o formara, ratificando a integridade e coerência, também os que se formaram depois da aprovação do Enunciado 166 do FPPC.
Devem os tribunais na organização de suas súmulas de jurisprudência, indicar não apenas os enunciados, mas igualmente os pronunciamentos anteriores que indicam a formação de uma linha jurisprudencial constante.
A elaboração da súmula ocorre conforme o Regime Interno (vide o art. 926, §1º do CPC/2015) que indicará o procedimento a ser observado para a alteração ou cancelamento de enunciado de súmulas. O que prevê a possibilidade de realização de audiências públicas e a participação do amicus curiae no sentido de ampliar-se o contraditório na rediscussão da tese jurídica firmada (o que reforça a legitimidade[7] jurisdicional).
Geralmente se refere ao overruling como a revogação de uma lei por outra, porque no overruling implica substituição de um precedente judicial por outro, mediante decisão do próprio órgão jurisdicional que estabeleceu os precedentes.
O overruling funda-se na ideia de que os precedentes estão excepcionalmente à modificação ou revogação quando estiverem presentes determinadas circunstâncias ou particularidades, cujo exame depende de valoração judicial.
Há uma mudança na valoração dessas circunstâncias relevantes no caso concreto, o julgador então resta autorizado a adotar entendimento diverso, mas que deve ser justificada através da devida e específica fundamentação.
A superação jurisprudencial é cabível quando: o precedente judicial se torna inexequível ou obsoleto; o precedente judicial deixa de corresponder aos padrões de congruências sociais ou consistências sistêmicas; surge uma nova concepção do direito; constata-se que o precedente judicial fora substancialmente errôneo u mal concebido desde o início, bastando um desses motivos para se fundamentar a dita revogação.
Diante dos retrocitados parâmetros, a superação do precedente judicial pode ser expressa (express overruling) ou tácita (implied overruling). Será expressa quando o tribunal passa adotar, expressamente uma nova orientação jurisprudencial, abandonando a anterior. Será tácita quando uma nova orientação é adotada em confronto com a posição jurisprudencial anterior, embora sem expressa substituição desta última.
A revogação retrospectiva pode ser pura ou clássica, o novo precedente se aplica aos fatos ocorrido antes e depois de sua publicação, incluindo aqueles que já foram objeto de sentença transitada em julgado e, também aos fatos do que o caso concreto que o gerou.
No overruling retrospectivo clássico, ocorre a eficácia retroativa parcial, e o novo precedente se aplica aos fatos ocorridos antes e depois de sua publicação, excluindo aqueles que já foram objeto de sentença transitada em julgado e também aos fatos do caso concreto que o gerou.
No prospective overruling, o precedente substituído poderá ser aplicado aos casos ocorridos antes da substituição. Ou seja, o novo precedente somente se aplica aos casos futuros. Refere-se a um instituto desenvolvido nos EUA[8].
Destarte, o precedente novo pode ser aplicado prospectivamente em diferentes momentos e circunstâncias. Pode ser aplicado aos fatos que ocorreram após a publicação do precedente, no bojo da demanda já ajuizada ou a ser ajuizada, aos fatos que ocorreram antes da publicação do precedente e, cuja demanda ainda não fora ajuizada e ainda não transitou em julgado.
É possível que se fixe em algum momento futuro para que o precedente judicial seja aplicado, é a aplicação prospectiva a termo, e que se restrinja os seus efeitos, excluindo determinada categoria de pessoas, que poderia ser prejudicada excessivamente com sua incidência.
Há muitos motivos que favorecem o chamado prospective overruling, a saber: 1. a ideia de que a revogação importa em estabelecimento de nova norma, que não pode ser aplicada de imediato; 2. a verificação que se faz necessário tempo para que haja a promoção da operação da norma; 3. o fato de que a revogação poderá produzir desigualdades, caso o novo precedente seja aplicado retroativamente; 4. o desestímulo para as partes buscarem a modificação do precedente, já que não serão atingidas em ratio decidendi, ao menos, no caso concreto em tramite; 5.a lesão ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e a coisa julgada ocasionada pela revogação retrospectiva.
A técnica do overruling é admitida no direito brasileiro conforme se vê do procedimento de revisão ou cancelamento de súmula vinculante na Lei 11. 471/2006 e dos Regimentos Internos do STF e no STJ. No julgamento de casos, os tribunais brasileiros indicam também a aplicação do overruling, conforme o julgamento dos Recursos Extraordinários 4.66343 e 3.88359.
Importante lembrar que o novo CPC recomenda a observância do contraditório para a formação do precedente judicial e, ainda que que deverá ser fundamentada de forma detalhada e devida.
É a publicidade dos precedentes judiciais que passarão a produzir seus efeitos que podem ser obrigatórios, impeditivos ou permissivos e, ainda, persuasivos.
Embora não expressamente mencionada o NCPC aponta que o obiter dictum pode gozar de eficácia persuasiva. Portanto, sendo apto a produzir os efeitos, o precedente poderá ter seu motivo determinante ou motivos determinantes aplicados no caso concreto presente.
A distinção foi normatizada como técnica de confronto, interpretação e aplicação do precedente judicial, a chamada distinguishing. Aplicada a distinção, o órgão vinculado ao precedente judicial poderá afastá-lo, de forma justificada.
Noutros termos, o precedente poderá não ser seguido, demonstrando o órgão julgador que se trata de situação particularizada por hipótese fática distinta ou questão jurídica não examinada no paradigma, a impor solução jurídica diversa.
Assim, o novo codex prevê a possibilidade de modificação do precedente judicial e da jurisprudência, o que é chamado de overruling, E a competência para a superação do precedente judicial é do órgão jurisdicional prolator do precedente judicial.
Será preferencialmente desse órgão, contudo, se se tratar de revisão do precedente formado em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas, ou em julgamento de recursos extraordinários e especiais repetitivos.
Delimitada a ratio decidendi conforme os termos do CPC/2015, resta saber se o referido diploma legal também se preocupou em delimitar a definição de obiter dictum e do tipo de efeito por este produzido.
O obiter dictum (obiter dicta, no plural), também chamado de dictum, são os argumentos jurídicos expostos apenas de passagem na motivação da decisão, que revelam: a) juízos normativos acessórios, provisórios e secundários; b) impressões ou qualquer elemento jurídico-hermenêutico que não tenham influência relevante para a decisão; c) opiniões jurídicas adicionais e paralelas, mencionadas incidentalmente pelo juiz, dispensáveis para a fundamentação e para a conclusão da decisão.
É dizer, obiter dictum é tudo aquilo que, retirado da fundamentação da decisão judicial, não alterará a norma jurídica individual.
Eugene Wambaugh aponta que obiter dictum são as observações introdutórias, os resumos das mais recentes decisões, as discussões sobre os casos concretos similares e todo tipo de matéria que visa elucidar a visão do Tribunal sobre o caso concreto em julgamento.
Para Arthur L. Goodhart apud Patrícia Silva de Jesus- sugere que a conclusão baseada num fato hipotético também é um obiter dictum. O fato hipotético é aquele cuja existência não foi determinada ou aceita pelo juiz.
Luiz Guilherme Marinoni, por sua vez, afirma que os pronunciamentos que dizem respeito a pedido não formulado e a causa de pedir não invocada são obiter dicta.
Por derradeiro, Pierluigi Chiassoni propõe o dictum pode exprimir alternativamente uma norma de conduta, a interpretação de um artigo de lei, uma argumentação ou fragmento de argumentação de direito, uma opinião ou definição a respeito de um instituto jurídico, que sejam acessórios e prescindíveis à norma jurídica individual.
Essa forma negativa de definir o obiter dictum, no entanto, mascara uma série de relações que podem ser estabelecidas entre ele e a ratio decidendi, que podem até mesmo levar à confusão desses elementos.
É forçoso ainda apontar a distinção entre a súmula vinculante e as demais súmulas dos tribunais. O artigo 103-A da CF/1988 informa que o STF seja de ofício ou provocação mediante 2/3 de seus membros, após reiteradas decisões sobre a matéria constitucional, aprovar súmula que a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta ou indireta, seja nas esferas municipal, estadual ou federal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida na forma da lei.
Terão por objeto a validade, a interpretação e eficácia de normas determinadas, acerca da qual haja controvérsia atual entre os órgãos do judiciário ou entre esses e a administração pública ou que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre a questão idêntica.
Os demais enunciados de súmula são chamados de súmula persuasiva[9] e não tem a mesma eficácia.
Por jurisprudência íntegra entende-se aquela que é construída considerando a história institucional das decisões sobre certa matéria. Deve-se considerar toda a evolução história registrada nas decisões proferidas anteriormente sobre o mesmo tema ou tese jurídica. Eis a ocasião então para proferir a famosa metáfora do “romance em cadeia” a que se referiu Ronald Dworkin.
A metáfora[10] do romance em cadeia é útil para denotar a exigência de que cada decisão judicial se integre um todo harmônico ligado ao sistema de direitos. A coerência é a chave da compreensão do direito como integridade para harmonizar passado, presente e futuro.
Deste modo, na reconstrução do direito em cada caso concreto com base nos precedentes, o juiz deve decidir os novos casos concretos de forma que sejam coerentes com todas as decisões anteriores.
A elegante metáfora utilizada por Dworkin dada ao procedimento adotado por um escritor de romance em cadeira que vem elaborar cada novo capítulo do livro de forma harmônica com os demais capítulos anteriores.
Pois deve ser assim também a produção da decisão judicial que deve sempre considerar as decisões anteriores sobre aquela mesma matéria sendo tratadas como capítulos anteriores de um “romance em cadeia”.
O dever de integridade e exigência de que os juízes e tribunais, ao decidir, devam considerar tudo que já fora decidido anteriormente sobre a mesma matéria, de maneira que os tribunais sejam obrigados a utilizar as técnicas de distinção e superação dos precedentes jurisprudenciais conforme o seu entendimento diante do caso concreto, promovendo, portanto, a interpretação contemporânea do ordenamento jurídico (vide Enunciado 457 do FPPC).
Deve ainda a jurisprudência ser coerente conforme prevê o caput do art. 926 do CPC/2015, ou seja, que os tribunais atentos aos seus precedentes, não os ignorem, utilizando-se do dever de autorreferência.
O direito como integridade, portanto, começa no presente e só se volta para o passado na medida em que seu enfoque contemporâneo desta forma o determine. Não pretende recuperar, mesmo para o direito atual, os ideais ou objetivos práticos dos políticos que primeiro o criaram.
Realmente se pretende justifica o que fizeram, em uma história geral digna de ser narrada. Mas, a história sempre traz consigo a afirmação complexa: a de que a prática atual pode ser organizada e justificada por princípios suficientemente atraentes para oferecer um futuro honrado.
O direito como integridade deplora o mecanismo do antigo ponto de vista e pueril de que "lei é lei", bem como o cinismo do novo realismo. Considera os referidos dois pontos de vista como enraizadas na mesma falsa dicotomia existente entre encontrar e inventar a lei.
Quando um juiz declara que um determinado princípio está imbuído no direito, sua opinião não reflete uma afirmação ingênua sobre os motivos dos políticos do passado, uma afirmação que um bom cínico poderia refutar facilmente, mas sim, uma proposta interpretativa: o princípio se ajusta a alguma parte complexa da prática jurídica e a justifica.
O dever de coerência e integridade[11] impede a produção de decisões judiciais que sejam construídas de forma discricionária ou arbitrária, a partir de posturas voluntaristas.
Registre-se, ainda, uma especial consideração pois nos sistemas judiciais relacionados com a common law, quem menciona que uma decisão judicial é precedente é o juiz do caso seguinte. Pois o ordenamento jurídico de tradição anglo-saxão, quando o tribunal julga uma causa e, ainda não sabe se aquela decisão será ou não um precedente.
Somente depois é que surge um segundo do caso concreto com circunstâncias análogas às do caso concreto anterior é quando o órgão julgador afirmará que aquela decisão é um precedente.
Já no direito processual brasileiro é diferente, a lei já estipula com antecedência quais as decisões judiciais são precedentes vinculantes. Desta forma, quando o tribunal via exercer o controle concentrado de constitucionalidade, vai decidir um incidente de assunção de competência, ou vai julgar casos repetitivos, já se sabe antecipadamente que a decisão ali proferida será um precedente vinculante.
O precedente brasileiro para ser reconhecidamente precedente vinculante, pois o é de propósito, ou como em tom irônico afirma Alexandre Freitas Câmara, são “vinculantes dolosos”. E, não só pela expressão da lei, mas também por conta das circunstâncias de que existem procedimentos especificamente voltados à criação desses precedentes vinculantes (o procedimento destinado ao julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade as ações declaratórias de constitucionalidade é regido pela Lei 9.869/1999); o procedimento para a edição de súmula vinculante foi reformulado Lei 11.417/2006; o procedimento do incidente de assunção de competência é regido pelo art. 947 do CPC/2015; o procedimento do IRDR regido pelos artigos 976 a 986 do CPC/2015, e, por fim, o procedimento destinado ao julgamento dos recursos especiais e extraordinários regulado pelos arts. 1.036 ao 1.041 do CPC/2015.
O ofício ou a petição deve ser instruído com os documentos necessários à demonstração do preenchimento dos pressupostos necessários à instauração do incidente.
A inadmissão do incidente de resolução de demandas repetitivas por ausência de qualquer de seus pressupostos de admissibilidade não impede que, uma vez presente o pressuposto antes considerado inexistente, seja o incidente novamente suscitado.
Para instruir o incidente, o relator poderá designar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas com experiência e conhecimento na matéria.
Concluídas as diligências, o relator solicitará dia para o julgamento do incidente.
No dia do julgamento, feita a exposição do objeto do incidente pelo relator, o presidente dará a palavra, sucessivamente, ao autor e ao réu do processo originário, e ao Ministério Público, pelo prazo de trinta minutos, para sustentar suas razões.
Considerando o número de inscritos, o órgão julgador poderá aumentar o prazo para sustentação oral. Em seguida, os demais interessados poderão manifestar-se no prazo de trinta minutos, divididos entre todos, sendo exigida inscrição com dois dias de antecedência. Havendo muitos interessados, o prazo poderá ser ampliado, a critério do órgão julgador.
Julgado o incidente, a decisão, que abrangerá a análise de todos os fundamentos suscitados concernentes à tese jurídica discutida, dele decorrente constitui precedente judicial vinculante.
É afirmar, a tese jurídica nele consubstanciada será aplicada a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo estado ou região.
A tese jurídica será aplicada, também, aos casos futuros que versem sobre idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de competência do respectivo tribunal, até que esse mesmo tribunal a revise.
O precedente formado em sede de incidente de resolução de demandas repetitivas poderá ser revisado, de ofício, pelo tribunal, ou por provocação dos legitimados a instaurá-lo, observando-se, no que couber.
Evidentemente esse novo incidente previsto pelo CPC/2015 não passou livre de críticas, há quem aponte que há o risco que o entendimento jurisprudencial venha a ser fixado de forma prematura, ensejando novos dissensos, num curto lapso temporal, tendo em vista o surgimento de novos argumentos não imaginados ou não trazidos à discussão na época do IRDR. E caso o incidente não seja instaurado, se a questão não estiver madura para julgamento e, uma vez instaurado, deve-se garantir pelo menos o amplo debate.
Outra crítica ao IRDR é quanto à possibilidade atribuída a uma única pessoa de requerer ao STF ou ao STJ (a depender da matéria em debate) a suspensão de processos individuais sobre a matéria objeto do IRDR aborta a diversidade e a possibilidade de se ampliar a discussão da causa. Dierle Nunes entende que o IRDR leva o Judiciário a decidir questões com parcos argumentos, antes mesmo da ocorrência do salutar dissenso argumentativo.
Porém, modestamente entendo que a proposta do CPC/2015 é mesmo propiciar o amplo debate anterior à formação do precedente judicial, permitindo a ampla participação das partes e de amicus curiae e dos demais interessados. E, mesmo quando fixado o precedente judicial, nada impede que, fundamentalmente, promova-se a superação do entendimento consubstanciado para que a nova tese passe a vigorar.
É patente que se majorou o número de precedentes vinculantes na sistemática processual brasileira com o CPC/2015. Porém, isso não dispensa que os juízes e tribunais de observarem o devido e pleno contraditório que é inerente ao processo cooperativo (o que permite que exista o debate sobre a aplicação ou não do precedente ao caso concreto), devendo proferir a decisão adequada e analítica, além de fundamentada.
De forma que seja capaz de demonstrar cabalmente os fundamentos determinantes daquele são mesmo aplicáveis ao novo caso concreto.
Desta maneira como também deve ser devidamente fundamentada a que deixa de aplicar o precedente conforme se identifica do teor do art. 489, §1º, IV do CPC/2015 e, ainda, o Enunciado 174 do FPPC.
Todo sistema fundado em precedente precisa para pleno funcionamento e compatível com a constante evolução do ordenamento jurídico reconhecer a possibilidade de distinções e superações dos precedentes jurisprudenciais.
A distinção ou distinguishing assera a incidência somente nos casos em que se repitam as circunstâncias que justificaram sua criação (vide Enunciado 306 do FPPC).
A superação ou overruling evita o engessamento jurisprudencial, admitindo a evolução do Direito e reconhecendo que os precedentes são criados a partir de certas circunstâncias fáticas ou jurídicas que precisam permanecer presentes para que possam continuar a serem aplicados.
Mesmo diante de outras alterações, como por exemplo, as alterações culturais, é o caso que aconteceu com o conceito de família na sociedade brasileira que evolui dos laços legítimos do casamento para os laços socioafetivos.
Desta forma, havendo justificados motivos o precedente perderá sua eficácia vinculante para os casos futuros, conforme aduz o Enunciado 322 do FPPC.
Percebe-se que a superação do precedente não acarreta a rescisão do julgamento apenas a tese superada não mais será aplicado no julgamento de casos futuros.
Não se confunde a eficácia vinculante para outros processos de um pronunciamento judicial com sua eficácia decisional para o caso concreto e que se opera entre partes (para o caso concreto).
Porém, há uma ressalva, pois, em caso excepcionalíssimo de um pronunciamento judicial que tenha eficácia de precedente sem julgar qualquer caso concreto.
É o caso do art. 976,§1º do CPC/2015 no IRDR que mesmo com a desistência da ação ou abandono da causa, não impedirá que o tribunal venha a fixar a tese, proferindo acórdão que terá eficácia de precedente vinculante; o mesmo ocorre com o recurso extraordinário cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida ou que já tenha afetado para julgamento de recursos repetitivos, caso em que o STF ou STJ não julgarão o caso concreto, mas ainda assim, fixarão a tese jurídica, limitando-se a fixar em abstrato o entendimento a ser posteriormente observado em decisões futuras.
O sistema de precedentes visa assegurar que existam decisões iguais para casos concretos iguais. O que vincula no precedente não pode ser apenas a parte dispositiva da decisão, e nem se o pedido fora julgado procedente ou improcedente, ou se o recurso fora provido ou não.
A eficácia vinculante prende-se aos fundamentos determinantes da decisão judicial. E são definidos em duas ocasiões no CPC/2015, primeiramente no art. 489, §1º, V, para exigir que na fundamentação da decisão que invoca precedente se justifique sua aplicação pela demonstração de que seus fundamentos se ajustam ao caso concreto em julgamento.
E, no art. 979, §2º, onde se estabelece que o cadastro a ser organizado pelo CNJ para registro dos incidentes de resolução e de demandas repetitivas instaurados nos tribunais indique os fundamentos determinantes das decisões que tenham sido proferidas.
Mas, infelizmente, nada há no texto normativo que permita afirmar com absoluta clareza o que seja exatamente, que se entende propriamente por fundamentos determinantes da decisão judicial.
Mas, a doutrina de Alexandre Freitas Câmara recomenda que se deve considerar como fundamentos determinantes de uma decisão aqueles fundamentos da decisão judicial colegiada que tenham sido expressamente acolhidos ou ao menos pela maioria dos integrantes da turma julgadora, conforme aduz o Enunciado 317 do FPPC.
Outros fundamentos que não contem com a expressa adesão pelo menos da maioria dos juízes integrantes do colegiado não serão considerados determinantes, e necessitam de passar pelo crivo do contraditório prévio e substancial, conforme o Enunciado 2 do FPPC.
Normalmente no estudo de precedentes chama-se de fundamento determinante da decisão de ratio decidendi e o fundamento não determinante de obter dictum. São, pois as rationes decidendi de um precedente que podem ter eficácia vinculante, não os obter dicta.
Segundo Pierluigi Chiassoni há inúmeras definições que podem ser atribuídas à ratio decidendi, conceituando-a de acordo com o tipo de objeto designado e quanto ao grau de especificação do objeto designado. Na primeira classificação, considera-se o conteúdo da decisão, enquanto que na segunda classificação, considera-se a opinião do juiz que proferiu o precedente, do juiz sucessivo e da doutrina jurídica.
Assim, a ratio decidendi pode significar: a norma jurídica geral que representa a regra, o critério, o princípio, a premissa normativa sobre a qual se funda a decisão do caso concreto (numa perspectiva normativa abstrata); a norma jurídica geral contextualizada, utilizada por um juiz para justificar a decisão de um caso concreto (perspectiva normativa concreta); o elemento de argumentação criado pelo juiz para motivar a decisão.
Já pela segunda classificação, a ratio decidendi pode ser: elemento da motivação que é necessário para a decisão do caso concreto; o princípio de direito que é suficiente para a decisão de um caso concreto; a argumentação necessária e suficiente para decidir um julgamento; norma (regra ou princípio) que constitui, alternativamente, condição não necessária, porém suficiente, de uma decisão; norma que o Tribunal tem efetivamente estabelecido ou seguido; norma que o Tribunal afirma expressamente ou acredita ter estabelecido ou seguindo; norma tratada explícita ou implícita como necessária para a decisão do caso concreto; norma que deve ser considerada pelo tribunal para que decida adequadamente a controvérsia; norma que, segundo um juiz sucessivo, deveria ter sido estabelecida pelo julgador anterior; norma que, segundo um juiz sucessivo, deve ser considerada como estabelecida pelo julgamento anterior.
Percebe-se que ao mesmo tempo que exaustivamente elenca as múltiplas acepções, as critica pois não são conceitos uniformes e determinados, além de expressarem contrariedade, se considerados conjuntamente.
Por essa razão, propõe que a ratio decidendi é enunciado formulado numa decisão, que à luz da estrutura lógica da fundamentação e segundo a opinião do juiz que a prolatou a decisão, não pode ser retirada da fundamentação de uma decisão, sem que prejudique a sua norma jurídica geral.
Em resumo, para Pierluigi Chiassoni, ratio decidendi é a norma jurídica geral de uma decisão judicial, entendida como precedente. São fundamentos jurídicos que aponta a opção hermenêutica ou a tese jurídica que sustentam a solução de determinado caso concreto, sem os quais a norma individual não teria sido formulada daquela maneira.
Enfim, a ratio decidendi é a norma jurídica geral de uma decisão judicial, entendida como precedente. A ratio decidendi tem dupla função, a saber, a função interna que é revelada na medida em que a norma jurídica geral, localizada na fundamentação da decisão, serve de fio condutor à norma jurídica individual, constante de seu dispositivo que rege determinado caso concreto.
E, a função externa que é extraída da potencialidade da norma jurídica geral se desprender do caso concreto específico para ser aplicada em outras situações concretas que se assemelham àquela em que foi originariamente formulada. É através de sua função externa que a ratio decidendi manifesta-se na forma de precedente judicial com aptidão para ser universalizado, razão pela qual tem a potencialidade de operar vinculação.
Note-se que a decisão judicial poderá conter mais de uma ratio decidendi. Principalmente quando o julgador aponta mais de uma razão de decidir como fundamento para norma jurídica individual ou quando a decisão emana de órgão colegiado no bojo da qual existem votos com fundamentos distintos que conduziram à mesma norma jurídica individual.
Por outro viés, existem decisões das quais é muito difícil ou quase impossível extrair a ratio decidendi. São as decisões desprovidas de razão de decidir por conter defeito na sua fundamentação.
Discute-se que o julgador não precisa indicar na decisão judicial qual é a ratio decidendi, e sim, o órgão responsável por sua aplicação que deverá identificá-la e interpretá-la, diante dos casos concretos em julgado.
Frise-se que a ratio decidendi não se confunda com nenhum dos elementos da decisão judicial, tal como relatório, fundamentação e dispositivo, mas é formulada exatamente a partir desses elementos, sendo que os fatos narrados no relatório, a moldura jurídica eleita pelo juiz na fundamentação e a norma jurídica individual indicada no dispositivo servem também na identifica da ratio decidendi.
No Brasil, a ratio decidendi é chamada de motivo ou fundamento determinante de uma decisão. Sendo a premissa sem a qual não se chegaria àquela decisão judicial específica. É o motivo ou são os motivos já que é possível existir mais de uma ratio que seja suficiente e imprescindível à decisão judicial que foi tomada.
Lembremos que o motivo determinante pode até gozar de eficácia transcendente da fundamentação, o que equivale a eficácia vinculante da norma jurídica geral do precedente judicial.
Porém, no direito pátrio, nem sempre a ratio decidendi é estruturada a partir dos fatos, conforme acontece frequentemente nos EUA e no Reino Unido. Há decisões que se destinam apenas a interpretar as questões relativas à lei federal (decisões proferidas em recurso especial) e à Constituição Federal brasileira (decisões proferidas em recurso extraordinário) e a oferecer as razões pelas quais determinada norma é inconstitucional ou constitucional (quando proferidas em controle de constitucionalidade). Adverte-se, ainda, que o próprio novo codex prevê expressamente a possível modulação de efeitos.
No sistema do common law não se exige a indicação da ratio pelo julgador. Mas, no ordenamento jurídico pátrio a ratio decidendi deve ser indicada na decisão que julga o incidente de decretação de inconstitucionalidade e o julgamento por amostragem de recursos extraordinários ou especiais repetitivos. Assim, uma vez delimitada a ratio ou o fundamento determinante e as suas peculiaridades no direito brasileiro, passa-se a análise do obiter dictum.
O obiter dictum apesar de ser elemento secundário do precedente judicial, prescindível para a norma jurídica individual, pode desempenhar três papéis. O primeiro papel é de auxílio, não essencial e prescindível, na construção da motivação e do raciocínio exposto na decisão. O segundo é de sinalização de futura orientação do Tribunal ou de diretriz para o julgamento que questões que venham a ser suscitadas no futuro. O terceiro é de instrumento que pode conduzir à superação de um precedente judicial.
Esse derradeiro papel desempenhado pelo obiter dictum decorre de sua eficácia persuasiva que varia conforme o tribunal de onde provêm, do respeito que goza o julgador na comunidade jurídica, da força dos argumentos usados e do grau de relação do dictum com a questão principal.
No direito pátrio, a função do obiter dictum é ampliada pois pode servir de instrumento para elaboração de recurso fundado em controvérsia. Desta forma, é no voto vencido num julgamento colegiado que servia para elaboração dos embargos infringentes que de certa maneira fora substituído pelo art. 942 do CPC/2015 pelo incidente de colegialidade qualificada.
Pode ainda ocorrer, porém, de algum integrante do colegiado concorde com a conclusão de voto anteriormente proferido, mas não com seus fundamentos (ou, pelo menos, não com todos os seus fundamentos).
Neste caso, se impõe ao prolator deste voto que expressamente informe quais fundamentos determinantes do voto anterior concorda e de quais discorda, expondo os motivos que justificam sua conclusão.
E, proferido este voto incumbirá aos que já tiverem proferido seus votos declarar se aderem ou não aos novos fundamentos. Só assim todos os fundamentos terão sido objeto de manifestação expressa de todos os votantes e, pois, só desta forma, se poderá apontar quais são os fundamentos expressamente acolhidos ao menos pela maioria dos integrantes do colegiado.
Em síntese, todos os conceitos fundamentais da teoria do precedente judicial foram incorporados pelo CPC/2015 e que também disciplinou a eficácia vinculante a determinadas decisões jurisdicionais do ordenamento jurídico pátrio, dando maior ênfase ao acesso à justiça, à segurança jurídica e, enfim, a efetiva tutela de direitos.
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