Ações afirmativas e direito como integridade: um estudo acerca das discriminações lícitas e ilícitas realizadas pelo Estado

Resumo: A presente obra tem por intuito, demonstrar a postura do Estado e da sociedade no que tange a problemática envolvendo a Discriminação, passando por uma analise das duas vertentes que a Discriminação nos aponta, o seu aspecto ilícito, e, o seu aspecto lícito; pontuando a relação conjunta que existe entre a Discriminação na sua forma legítima e, a atuação das Ações Afirmativas em um Estado Democrático de Direito, tal como se mostra o Estado Brasileiro, passando evidentemente, por uma apreciação histórica dos fatos abordados. Tendo por um dos principais objetivos, visualizar a melhor forma de atuação dessas que são de fato, mecanismos de inclusão social, para que seja viável a uma sociedade contemporânea, atingir o reconhecimento e igualdade daqueles grupos considerados minorias sociais, os quais seriam os principais beneficiados com a promoção dessas Ações Afirmativas, que pautam por uma isonomia social, através da aplicação prática da máxima constitucional “tratar desigualmente os desiguais na medida da sua desigualdade”.

Palavras-chave: Igualdade. Discriminação Lícita. Ações Afirmativas. Estado Democrático de Direito.

Sumário: 1 introdução. 2. Percurso do reconhecimento. 2.1. Modernidade. 2.1.1. Estado Liberal. 2.1.2. Estado Social. 2.1.3. Estado Democrático de Direito. 3. Igualdade entre liberais e comunitários. 3.1. Ronald Dworkin. 3.1.2. A Comunidade Liberal. 3.2. O Comunitarismos de Charles Taylor. 4. Ações afirmativas entre discriminação lícita e ilícita. 4.1. Discriminação Lícita. 4.2. Discriminação Ilícita. 4.3. Ações Afirmativas ou Políticas Assistenciais? 5. Ações afirmativas são adequadas a um estado democrático de direito? 6. Conclusão. Referências.

1 INTRODUÇÃO

No decorrer deste trabalho iremos apreciar alguns assuntos que, de algum modo, guardam relação com o que­ chamamos de Discriminação Lícita, e, ganharam forma e peso em meio a essas discussões jurídicas.

 Alguns pontos serão bem marcados, como a definição do seria discriminação, tornando possível, a partir desse ponto trabalharmos na diferenciação entre os institutos da discriminação lícita e discriminação ilícita, de suma importância para a compreensão de todos os pontos abordados ao longo deste trabalho acadêmico.

Vale destacar que, não é suficiente a mera definição dos temas, tendo em mente um bom acabamento, questões próprias do Direito Constitucional devem, obrigatoriamente, serem revistas, tais como, os princípios que fundamentam esse fragmento da doutrina jurídica, com por exemplo, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, Princípio da Igualdade, dentre outros, teorias que marcam esse estudo como a máxima constitucional, “tratar desigualmente os desiguais na medida da sua desigualdade”; conforme pode ser visto, no decorrer dessa breve explanação, os pontos até aqui demonstrados, tratam-se basicamente, de fatos relativos a direitos e garantias fundamentais, na forma como exposto ao longo do Título II, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, especialmente, no que está compreendido ao longo do artigo 5º, todos esses, relacionados ao modelo de Estado o qual vivenciamos atualmente, qual seja, o Estado Democrático de Direito.

Evidentemente que para chegarmos a esse resultado, a priori, devemos nos ater à evolução histórica do Direito em si, mas, sobretudo, a evolução histórica que irá culminar no objeto foco desse estudo, a discriminação em sua forma legítima, com destaque para a forma como esse instituto era visto, e, como se aplicava nos diferentes contextos de Estado, seja ele, Social, Liberal, Democrático de Direito, sob a perspectiva de diferentes autores.

Já caminhando para o final, tendemos a apontar, conforme mencionado anteriormente, acerca do que diferem de fato, a discriminação lícita da ilícita, buscando compreender, se essa vertente constitucional é de todo válida para a sociedade atual, que prima por uma democracia verdadeira na sua essência, preceitos de igualdade; ademais, resta saber se uma sociedade inserida dentro de um Estado Democrático de Direito, estaria de fato, colocando em prática as ações afirmativas (substrato dessa forma de discriminação – legítima) ou, se estaria, tão somente, promovendo políticas de caráter assistencialista.

Da análise histórica aos grandes expoentes do âmbito jurídico, até chegarmos a uma formação contemporânea, a qual nos brinda com novos temas, pensados a partir daquilo que anteriormente começou-se a esboçar, iriam dar embasamento legal e doutrinário, para este, que é um assunto relativamente recente no contexto jurídico, as ações afirmativas, se levarmos em consideração outros institutos jurídicos, os quais transitam por esse cenário a décadas.

Basicamente, o presente trabalho de conclusão de curso teve por objetivo central, demonstrar como se firmou ao longo dos anos essa busca por Reconhecimento e Igualdade, conforme pretende-se apontar no decorrer da apresentação deste.

2. Percurso do Reconhecimento

Como bem se sabe, a igualdade é um dos pilares estruturantes do Estado Democrático de Direito tal qual conhecemos, Rodrigues (2010, p. 27) acredita ser a igualdade, imprescindível à democracia de todos nos procedimentos discursivos de criação autônoma e lícita do Direito.

A igualdade é decorrente de uma constante evolução ao longo dos anos e das diversas sociedades que existiram e se estruturam em razão desse princípio. Significa dizer que, as sociedades evoluíram, devendo se adaptar as diversas mudanças que evidentemente ocorreram, sem, entretanto, deixarem de observar esse princípio que, desde o início faz-se presente no âmbito social.

Habermas (2003, p.116) por meio do pensamento de Puchta vem nos expor que, “o direito é o reconhecimento da liberdade que advém da igual medida aos homens como sujeitos que detêm o poder da vontade”; ou seja, o que se pretende com esse discurso é apontar que direitos subjetivos, serviriam como uma espécie de proteção às ações de cada indivíduo, uma vez que são direitos negativos, que se pode interpretar a partir do que temos como sendo função da Constituição, quando a classificamos em razão da sua função, mais especificamente, no que se tem por Constituição Garantia, qual seja, aquela que, enunciando os direitos da pessoa limita o exercício abusivo do poder, conferindo dessa maneira, uma garantia aos indivíduos, membros daquela sociedade.

Questões relacionadas aos direitos humanos e ao chamado Princípio da Soberania nos servem como um dos principais marcos do direito moderno, no instante em que passa a ocorrer uma diferenciação das questões éticas e morais. Habermas (2003, p.133) aponta que,

“as tradições políticas surgidas nos Estados Unidos e caracterizadas como ‘liberais’ e ‘republicanas’ interpretam os direitos humanos como expressão de uma autodeterminação moral e a soberania do povo como expressão de auto-realização ética. Nessa perspectiva, os direitos humanos e a soberania do povo não aparecem como elementos complementares, e sim, concorrentes”. (sic)

É importante destacar que as constituições de um Estado Democrático de Direito, priorizam aqueles direitos que a população tem necessidade de reconhecer, para caso queiram, possam regular legitimamente seu convívio com os meios de direito positivo.

No âmbito de um Estado Democrático de Direito, no que diz respeito a luta por reconhecimento, em relação ao texto constitucional, mais especificamente, em relação a interpretação e imposição das reivindicações inerentes ao processo de luta por direitos legítimos, consideramos que estão implicados agentes coletivos que se defendem contra a desconsideração de sua dignidade (HABERMAS, 2002, p.230).

Habermas (2002, p. 230), é claro ao destacar que,

“… a luta social contra a opressão de grupos que se viram privados de chances iguais de vida no meio social, concretizou-se sob a forma da luta pela universalização socioestatal dos direitos dos cidadãos, empreendida tão logo o reformismo socioliberal viu capaz de agir…”

Indo mais adiante, aponta ainda que

“Em um primeiro momento, no entanto, as coisas parecem ser diferentes quando se trata de reivindicar reconhecimento para identidades coletivas ou igualdades de direitos para formas de vida culturais. Feministas, minorias em sociedades multiculturais, povos que anseiam por independência nacional ou regiões colonizadas no passado e que hoje reclamam igualdade no cenário internacional, todos esses agentes sociais lutam hoje em favor de reivindicações como as que acabei de mencionar”.

Habermas (2002, p. 231), parafraseando Amy Gutmann no que compete ao reconhecimento, mostra que, o reconhecimento público pleno demanda duas formas de respeito, a primeira guarda relação direta com o que se chama de identidade inconfundível de cada indivíduo; ou seja, independe de qualquer padrão de diferenciação como raça, sexo, etnia, dentre outros, a segunda vertente aponta o respeito pelas formas de ação, práticas e interpretações características do mundo que gozam de prestigio junto aos integrantes de grupos desfavorecidos socialmente, ou, que de alguma forma, tenham algum tipo de vínculo com esses indivíduos; essa seria o que se conhece como política do reconhecimento de Charles Taylor, o qual parte da premissa de que o asseguramento de identidades coletivas passa a concorrer com o direito a liberdades subjetivas em igual paridade.

Habermas (2002, p. 233) faz ainda o levantamento a seguir, senão vejamos:

“Uma política deve compensar as desvantagens do universalismo uniformizante que a outra ocasiona. Taylor esmiuça essa oposição (…) segundo os conceitos do bem e justo, advindos da teoria moral. Liberais da grandeza de Rawls e Dworkin propugnam por uma ordem jurídica eticamente neutra que deve assegurar chances iguais a todos, de modo que cada um possa orientar-se por uma concepção própria do que seja bom. Em face disso, comunitaristas como Taylor e Walzer contestam que haja neutralidade ética no direito e permitem-se portanto, esperar também do Estado de Direito a fomentação ativa de determinadas concepções de bem viver, caso isso se faça necessário”.

Levando em consideração tudo que já foi demonstrado até esse ponto, podemos considerar que Taylor nos apresenta um modelo alternativo, o qual, a depender do caso, consente haver garantias de status restritivas aos direitos fundamentais, por exemplo, quando irá culminar na permanência de formas de vida culturais, sendo, portanto, uma política que consequentemente gerará integrantes desses grupos, desde que dedicadas às próximas gerações as quais irão, de certo modo, continuar com essas formas de convivência, para uma melhor compreensão, é válido destacar o parecer de Habermas acerca dessa questão que gira em torno do reconhecimento, in verbis:

“Quando tomarmos a sério essa concatenação interna entre o Estado de direito e a democracia, porém, ficará claro que o sistema dos direitos não fecha os olhos nem para as condições de vida sociais desiguais, nem muito menos para as diferenças culturais. A ‘acromatopia’ do enfoque seletivo de leitura desaparece desde que atribuamos aos portadores de direitos subjetivos uma identidade concebida de maneira intersubjetiva. Pessoas, inclusive pessoas do direito, só são individualizadas por meio da coletivização em sociedade. Sob essa premissa, uma teoria dos direitos entendida de maneira correta vem exigir exatamente a política de reconhecimento que preserva a integridade do indivíduo, inclusive nos contextos vitais que conformam sua identidade. Para isso não é preciso um modelo oposto que corrija o viés individualista do sistema de direitos sob outros pontos de vista normativos; é preciso apenas que ocorra a realização coerente desse viés. E sem os movimentos sociais e sem lutas políticas, vale dizer, tal realização teria poucas chances de acontecer” (HABERMAS, 2002, p.235).

No que tange aos debates sobre o feminismo, poderíamos entender que

“a política liberal tencionou desacoplar conquista de status e identidade de gênero, bem como garantir às mulheres uma igualdade de chances na concorrência por postos de trabalho, prestígio social, nível de educação formal, poder político etc. A igualdade formal parcialmente alcançada, no entanto, só faz evidenciar a desigualdade de tratamento factual a que as mulheres estavam submetidas. A política socioestatal, sobretudo no âmbito do direito social, trabalhista e de família, reagiu a isso com regulamentações especiais, relativas a gravidez ou maternidade, ou então a encargos sociais em casos de divórcio (…) De um ponto de vista jurídico, uma razão estrutural para essa discriminação criada por via reflexiva consiste nas classificações sobregeneralizantes que se aplicam a situações lesantes e pessoas lesadas. Pois as classificações ‘erradas’ levam a intervenções no modo de vida em questão, que o ‘normalizam’ e que permitem converter as almejadas compensações de perdas em novas discriminações, ou seja, permitem converter garantia de liberdade em privação de liberdade. Em áreas do direito feminista, o paternalismo socioestatal assume um sentido literal, já que o poder legislativo e a jurisdição se orientam conforme modelos tradicionais de interpretação, o que só corrobora estereótipos sobre a identidade de gêneros ora vigentes”.

Destarte, resta claro que, ao se buscar a efetivação de direitos por meio de um sistema democrático, algumas coisas devem, necessariamente, serem observadas como, por exemplo, questões da diferença dentro de um contexto social geral.

Para Walzer (2003, p.16), há um regime de igualdade simples, o qual define como um caminho para se entender a igualdade através de processos de conversão, até estender-se a todos os bens sociais, dentro do qual, vê-se que tudo é possível de ser vendido, tendo em vista que, todos os membros dessa sociedade têm as mesmas prerrogativas econômicas, o mesmo poder de compra; contudo, esse sistema de igualdade não é muito duradouro, a julgar que posteriormente a todo esse processo, alguns resquícios de desigualdade, poderão, por ventura, se manifestarem; a única maneira de se evitar essa possível desigualdade, seria por meio de “lei monetária”, tais com as leis agrárias passadas, as quais pudessem promover, periodicamente, um retorno a seu status quo. Dessa forma, resta claro que,

“…só um Estado centralizado e ativista teria força suficiente para impor esse retorno; e não está claro se as autoridades do Estado seriam mesmo capazes ou estariam dispostas a fazê-lo. Seja como for, a condição original é instável de outra maneira. Não é só o monopólio que reaparecerá, mas o predomínio também reaparecerá”.

Esse sistema de igualdade simples é um dever do Estado, o qual tem por obrigação, segundo descreve Walzer (2003, p.17), “eliminar ou restringir monopólios incipientes e reprimir novas formas de predomínio. Porém, o próprio poder do Estado se torna, então, objeto central das lutas competitivas”, diante disso, Walzer (2003, p. 18) sustenta que,

“Uma maneira de limitar o poder político é distribuí-lo de forma abrangente (…) O maior risco do governo democrático é que venha a ser fraco para enfrentar o ressurgimento dos monopólios nas sociedades em geral, a força social dos plutocratas, burocratas, tecnocratas, meritocratas, etc. na teoria, o poder político é bem predominante na democracia , e é conversível da maneira que os cidadãos escolherem. Na prática, porém, romper o monopólio do poder neutraliza seu predomínio. O poder político não pode ser amplamente compartilhado sendo submetido à força de todos os outros bens que os cidadãos já têm ou pretendem ter. por conseguinte, a democracia é, conforme Marx reconheceu, essencialmente um sistema espetacular que reflete a distribuição prevalecente e emergente dos bens sociais….”

O ato de reconhecimento, em linhas gerais, sob a perspectiva de uma sociedade fundada no feudalismo, surge, a priori, com o reconhecimento em razão dos títulos de tratamento que eram concedidos àqueles indivíduos, gerando, consequentemente, uma diferenciação decorrente do titulo que lhe era concedido dentro daquela ordem social; o qual sempre vinha acompanhado de gestos, ou, outras vezes, reconhecido pelas próprias vestimentas que lhe eram características.

Walzer (2003, p. 342), vem nos apresentar alguns pontos relevantes no que tange a essa questão do reconhecimento, in verbis:

“… Quando conhecemos os títulos de todos, conhecemos a ordem social, sabemos a quem devemos nos curvar ou quem deve curvar-se a nós, estamos preparados para todos os tipos de encontros (…) Os títulos são reconhecimentos instantâneos. Quando há um título para cada um todos são reconhecidos; não há ninguém invisível. É isso que Tocqueville quer dizer quando afirma que nas sociedades aristocratas ninguém pode esperar nem temer não ser visto. A situação social de ninguém é tão baixa que não lhe permita um palco próprio, e ninguém pode, em razão da própria obscuridade, evitar elogios ou reprovações”. (GRIFOS NOSSOS)

O autor faz ainda uma crítica, ao que chama de luta por reconhecimento, da qual, transcreve-se o seguinte,

“Porém, embora a luta por reconhecimento seja sempre restrita aos prejulgadores sociais, não é totalmente determinada por eles. Quem está às margens dos postos; com medo de censuras, insiste duplamente no uso de títulos; para essas pessoas, o titulo tem valor independente, que defendem como se merecessem (…) As disputas das distinções são mais acirradas quanto mais substancia pareçam ter. Hobbes interpretava as contendas dos aristocratas contemporâneos, e mais especificamente o duelo, como uma das formas arquetípicas da guerra de todos contra todos. Os homens arriscavam a vida pela honra, embora as questões pelas quais brigassem fossem de pouca importância subjetiva – “ninharias, como uma palavra, um sorisso, uma divergência de opinião, e qualquer outro sinal de desprezo” (WALZER, 2003, p 344).

Fazendo uma comparação entre as formas existentes para tratamento de homens e mulheres, tem-se evidente a exclusão em relação às mulheres, as quais eram tratadas exclusivamente em razão da posição a qual ocupação no contexto familiar, restringindo-se então, a serem chamadas de senhoras ou senhoritas, tendo pouca ou nenhuma relevância a sua colocação dentro do círculo social, situação bem diferente daquela vivenciada pelos homens, os quais já estavam habituados a uma sociedade contornada por eles, mas mais variadas formas de tratamento, e, consequentemente, reconhecimento; o que só foi permissível as mulheres a ascensão ao titulo de “Ms.”, para o qual até então não se conhece uma palavra similar, atitude esta, considerada por muitos, como sendo uma forma tempestuosa na busca pelo reconhecimento.

Walzer (2003, p. 351) sustenta que,

“… não há como descobrir antecipadamente quais as qualidades, habilidades e talentos serão valorizados ou quem os possuirá. E mesmo que pudéssemos identificar e recolher essas coisas, e depois distribuí-las em partes iguais, deixariam instantaneamente (em razão da igualdade) de atrair admiração. Se, porém, na luta pelo reconhecimento não pode haver igualdades de resultados, pode haver – venho escrevendo como se houvesse – igualdade de oportunidades. Essa é uma promessa da sociedade de misters (senhores) (…) O status (a posição na corrida) domina o reconhecimento. Isso é bem diferente do predomínio do posto na hierarquia, mas ainda não é avaliação livre de cada pessoa por cada pessoa. A avaliação livre exigiria a desagregação dos bens sociais, a autonomia relativa da honra. Não é fácil dizer com exatidão o que a autonomia poderia significar nesse caso, pois a honra não tem vínculos tão íntimos com outros tipos de bens (…) A avaliação livre também geraria, creio um sistema muito mais descentralizado de reconhecimentos, de modo que a classificação geral presumida por Hobbes teria sua importância diminuída ou até deixaria de ser discernível….” (GRIFOS NOSSOS)

Walzer (2003, p. 354) acredita que em uma sociedade de misters, o principal requisito na luta pelo reconhecimento fosse, talvez, o respeito, gerando dessa forma um reconhecimento simples de formas mais complexas de reconhecimento como isto ou aquilo, em outras palavras, significa dizer que, temos de reconhecer que todas as peças que encontramos são, pelo menos, recebedoras em potencial de honra e admiração, concorrentes ou mesmo ameaças.

2.1. Modernidade

A modernidade foi um período marcado por inúmeras mudanças no meio social, as quais contribuíram em larga escala para a formação de novos conceitos do que seriam os marcos de liberdade e igualdade.

Em se tratando do período Moderno, há uma prevalência de valores privados em relação ao público no cenário social, logo, o individual tinha grande relevância nesse período, algo totalmente diferente do que se tinha durante a Antiguidade e a Idade Média.

A Modernidade, para alguns autores como Eder Bomfim Rodrigues é lembrada por alguns eventos históricos de suma importância, tais como, a Reforma Protestante, que veio demonstrar a igualdade de todos os indivíduos frente à Deus e o reaparecimento do comércio, influenciado pelos burgueses.

Segundo Rodrigues (2010, p.43),

“a modernidade também foi marcada pelas ideias contratualistas de Hobbes (2003) e Rousseau (1999), além do jusnaturalismo de Locke (1999) e de Montesquieu (1996), todas fundamentais na configuração do princípio da igualdade”.

Convém notar que, quando alguns membros da coletividade detém um maior conhecimento em relação aos demais, nesse momento, já se faz presente características que irão a sua medida, contribuir para que a desigualdade se mostre presente nesse cenário.

Rodrigues (2010), explica que para fins de análise de questões relativas à desigualdade, observá-la sob dois aspectos, sendo eles, natural/física e moral/política.

2.1.1. Estado Liberal

Tendo em vista que o período marcado pela Modernidade não foi capaz de barrar ações de desigualdade e injustiça presentes na sociedade, a julgar ser um momento de transição entre o feudalismo e o capitalismo, a igualdade democrática tão visada não se fez presente como se objetivava, surgindo assim, um novo ideal de estado, o Estado Liberal (RODRIGUES, 2010, p. 50).

O que se observa no Estado Liberal, é a titularização do poder político na sociedade. Carvalho (2009, p. 88), ainda destaca que,

“a lei é o limite da ação do poder, expressão da vontade geral. O princípio da separação de Poderes é também inerente à concepção de Estado Constitucional, como limitador do poder político que deixa de ser absoluto. No plano econômico, o Estado se caracteriza pelo absenteísmo, é capitalista e burguês: não há interferência do poder político no domínio econômico, pois o Estado é apenas árbitro do livre jogo econômico, onde se garante a propriedade privada e se valoriza a liberdade, que se torna absoluta.”

2.1.2. Estado Social

No período em que se compreende o pós-guerra, entre 1914-1918, ocorreu a transição do Estado Liberal para o Estado Social, tendo por principal motivação, nas próprias palavras de Carvalho (2009, p. 89), “superar a contradição entre a igualdade política e a desigualdade social”.

O que se almejava nessa fase era uma maior intervenção estatal no âmbito social e econômico, seguindo o raciocínio apresentado por Carvalho (2009, p. 89), compreende-se que

“o Estado social de direito não deixa, todavia de ser uma fase do Estado Constitucional, ou do Estado de Direito, pois há nele o respeito aos direitos fundamentais do homem, a preservação do princípio da separação de Poderes e o reconhecimento de que o poder político pertence a todo o povo. Não se confunde, assim, com o Estado socialista, este, sim, baseado na coletividade dos meios de produção e, no domínio político, na chamada ditadura do proletariado e numa concepção transpersonalista dos direitos fundamentais, bem como no regime de partido único, apresentando-se, então, como Estado totalitário”. (GRIFOS NOSSOS)

O Estado Totalitário, originado durante a Segunda Guerra Mundial, viu surgir uma das maiores correntes opressoras às minorias, qual se vivenciou grandes demonstrações de desigualdade social.

Ainda no Estado Social de Direito, ao final da Segunda Guerra, tem origem as Nações Unidas, em resposta as severas violações aos Direitos Humanos.

Mesmo com a internacionalização dos Direitos Humanos, o advento do Estado Social e a igualdade material decorrente deste, a política do Welfare State difundida em várias partes do mundo, não foi essa a realidade vivenciada pelo Estado Brasileiro, que ainda enfrentou um considerável período ditatorial.

2.1.3. Estado Democrático de Direito

A princípio, antes de entramos em detalhe sobre as questões inerentes ao Estado Democrático de Direito, vale observarmos o texto presente no artigo 1º da Magna Carta (2012, p. 7), in verbis: “art. 1º – A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito…” (GRIFOS NOSSOS)

Estado o qual estrutura-se em fundamentos e objetivos concretos, como por exemplo, a igualdade, a liberdade, combinados com o ideal de democracia. Ideal o qual sempre deve ser lembrado como sendo mais do que uma forma de governo, mas, sobretudo, como um regime político, forma de vida e processo. Carvalho (2009, p. 661).

Em um Estado Democrático, valores relacionados à dignidade da pessoa humana têm um maior reconhecimento, proporcionando à sociedade, a certeza de justiça e segurança por intermédio da legislação; todavia, a esse mesmo Estado, será conferido esse “título”, se fazendo democraticamente legitimo de acordo com a seu conteúdo, bem como, de acordo com a sua formação.

Em decorrência disso, é que Carvalho (2009, p. 664) aponta que

“o Estado de Direito só é de direito se for democrático. O Estado de Direito é aquele que só pode ser visto à luz do princípio democrático, que legitima o domínio público e o exercício de poder. A seu turno, o Estado Democrático de Direito também só pode ser entendido na perspectiva do Estado de Direito. Assim, como só existe um Estado de Direito Democrático, também só existe um Estado Democrático de Direito cujos elementos se articulam.”

Quando se encontra no texto legal a expressão Estado Democrático de Direito, deve-se interpretar no sentido de que, o Estado de Direito só existe a partir do momento em que se encontra democraticamente legitimado, na mesma ceara entende-se o Estado Democrático quando este se encontra pautado no direito.

Nesta vertente, Carvalho (2009, p. 668), acredita que, institutos como a soberania popular, a dignidade da pessoa humana, expressão da manifestação da vontade popular, tal como presentes nos direitos fundamentais é que figurariam como sendo os pilares de um Estado Democrático de Direito.

No mesmo sentido, Rodrigues (2010, p. 59) nos apresenta o Estado Democrático de Direito, como sendo uma mudança de grande relevância para o cenário jurídico, no qual, à igualdade é conferida grande destaque, ganhando nova roupagem, incluindo os membros da sociedade de forma legítima aos processos democráticos, conferindo a cada cidadão, plena autonomia política, os quais passam a serem vistos como coautores dos processos políticos.

Em síntese significa dizer que, o cidadão é ao mesmo tempo, autor e participe das discussões políticas.

Galuppo (2002, p. 204) aponta em seu texto que, levando em consideração direito, moral e política, combinado à relevância que carrega o direito dentro de um contexto democrático, seria plenamente viável traçar padrões os quais apontaria direitos humanos minimamente necessários à formação de uma sociedade democrática; bem como, outras garantias que irão de encontro à liberdade de cada indivíduo, o qual consiga se visualizar como participe das relações inerentes àquela sociedade, o que para Habermas seria um Sistema de Direitos, em outras palavras o que se quer demonstrar é

um conjunto de princípios jurídicos que garante a legitimidade de um ordenamento jurídico estatal contemporâneo, uma vez que estabelece as “condições sob as quais as formas de comunicação necessárias para a gênese autonomamente política do direito podem ser juridicamente institucionalizadas”.

Logo, o que se compreende acerca do Sistema de Direitos, é que este nada mais seria do que uma decorrência dos pressupostos pragmáticos da comunicação, que o individuo aceita a partir do momento em que tem início uma discussão, e, dos processos históricos políticos que têm como principal objeto conhecer e, consequentemente, revelar a identidade de um grupo.

Para que uma sociedade de fato seja democrática, deve passar um processo, processo esse, que deve ter início ainda no momento de elaboração de seu texto constitucional, o qual não pode deixar de levar em consideração, a existência de direitos tanto individuais quanto coletivos, tal como predispõe a Teoria Discursiva do Direito; o que irá conferir ao individuo, reconhecimento jurídico frente à sociedade, a partir da prática do discurso jurídico. Diante disso, Galuppo (2002, p. 205) expõe que

“um ordenamento só é legitimo se garantir mecanismos de igual participação na produção do próprio direito, de forma que os destinatários se percebam, simultaneamente, como seus próprios autores. Esse é o sentido essencial da autonomia que caracteriza a regulação jurídica moderna: o direito que criamos é legítimo porque visa regular nossa própria vida, ou, dito de outra forma, o direito que regula nossa própria vida é legítimo porque criado por nós”.

O Sistema de Direitos para ser bem compreendido no contexto de um Estado Democrático de Direito, deve partir de uma análise dos direitos materiais apresentados pelo Estado Social, surgindo assim, uma reinterpretação desses dados, combinados é claro, a um novo olhar acerca do que seriam os direitos individuais e sociais.

O foco do Sistema de Direitos é incluir os membros daquela sociedade nos discursos jurídicos, uma garantia, um substrato da legitimidade do Estado Democrático de Direito, que é essencialmente, um Estado pluralista, revela a importância da Igualdade para o paradigma procedimental do direito e da política presente na Ética do Discurso e da Teoria Discursiva do Direito (GALUPPO, 2002, p. 206).

Quando se pensa em igualdade dentro de um Estado Democrático de Direito, certos aspectos devem, necessariamente, ser bem esclarecidos, é o que GALUPPO (2002, p. 207-208) vem demonstrando ao longo da leitura de sua obra, da qual se pode extrair o seguinte entendimento,

“Se a igualdade é, formal e materialmente, condição para participação no discurso, devo esclarecer antes de qual igualdade se trata aqui. Para o direito moderno, como já vimos, a igualdade tem de ser concebida como igualdade aritmética, pois qualquer outra forma de igualdade implicaria reconhecer maior ou menor importância às pessoas que, no entanto, o Estado Democrático de Direito tem de conceber como detentoras da mesma possibilidade de intervir nos discursos jurídicos, o que seria impossível se fossem concebidas como geometricamente (des)iguais. Consequentemente, a igualdade tem de ser concebida com um procedimento de inclusão formal e material nos discursos de justificação e aplicação das normas, e o direito só pode ser tido como legitimo se garantir essa igualdade nos discursos que realiza.”

Assim, a principal vertente de uma sociedade moderna, consiste no fato de que a todo e qualquer individuo deve ser conferido a possibilidade de ser inserir em suas decisões, com o mesmo nível de intervenção.

3. Igualdade entre liberais E comunitáriOS

3.1. Ronald Dworkin

No início de sua obra, Dworkin (2005, p. 3), nos apresenta a igualdade como sendo um “ideal político popular”, o que o autor busca como essa definição é demonstrar que em determinados contextos a linha de desigualdade entre os indivíduos de um dado ciclo social, pode vir a se tornar mais tênue; aqui, não se vislumbra a definição da igualdade a partir do prefixo “igual-”, da forma como a população de modo geral está por assim dizer acostumada, qual seja, a uma definição literal, mas sim, uma definição da variadas vertentes que o termo “igualdade” pode apresentar, de uma maneira mais abstrata.

Neste ponto em especifico, vale resaltar, a distribuição do poder político na esfera de certa comunidade, levando em consideração, questões temporais, suas peculiaridades, o que deve estar presente nessa sociedade para que esta possa estar em consonância com o ideal político popular.

A priori, como já era de se imaginar, esta sociedade deve estar pautada na democracia, observando cuidadosamente todos os requisitos ditos imprescindíveis para um governo de fato democrático.

Dworkin (2005, p. 255) apresenta duas correntes para a democracia, sendo elas: dependente e separada. A primeira corrente esta associada à ideia de que, “a melhor forma de democracia é a que tiver mais probabilidade de produzir as decisões substantivas que tratem todos os membros da comunidade com igual consideração”; em contrapartida, a segunda corrente defende que, “julguemos a equidade ou caráter democrático de determinado processo apenas, só perguntando se ele distribui poder político de maneira igualitária, e não quais resultados ele promete produzir”.

Acerca desta corrente denominada separada, pode-se compreender que, a democracia vem a ser uma distribuição isonômica do poder em relação às decisões de cunho político; por outro lado, a corrente dependente, vislumbra a democracia como sendo um conjunto de dispositivos para a produção de resultados do tipo certo. Nas palavras do próprio autor, “a comunidade que aceita o principio igualitário abstrato terá como finalidade as decisões distributivas que tratem as pessoas como iguais, segundo a melhor interpretação dessa ideia”.

Para um melhor entendimento do que vem a ser igualdade, independentemente da corrente adotada, o poder político deve ser analisado sobre duas vertentes, uma vertical e a outra, horizontal. Sob o ponto de vista vertical, o poder individual do cidadão, deve ser comparado ao de cada autoridade; ao passo que, do aspecto horizontal, o poder de cada cidadão ou grupo com o poder de cada autoridade.

Outra diferença importante a ser feita no tocante a igualdade, diz respeito à interpretação da igualdade de poder, que pode ser entendida como igualdade de impacto, de acordo com a qual, determinado individual inserido o cenário político tem o poder de fazer sozinho, questões determinantes, que outro indivíduo não teria; por outro lado, a igualdade de influência esta relacionada àqueles casos em que o individuo poderia atuar sozinho em questões consideradas determinantes, todavia, induz/manipula outras pessoas, para que estas passem a ter o mesmo ponto de vista que este, no momento de votar ou escolher um posicionamento.

3.1.2. A Comunidade Liberal

A partir do momento em que se estudam questões diretamente relacionadas à igualdade, alguns pontos devem ser cuidadosamente analisados, tais como, a sociedade e o tempo em que se encontra inserida a sociedade foco desse estudo, pois aspectos como esses são de grande relevância, a julgar que, ao longo do tempo as prioridades podem vir a se diversificar, de acordo com as características daquela sociedade, naquele momento específico.

Nesse momento, o nosso foco é a Sociedade Liberal. O paradigma liberal encontra alguns contratempos, no que concerne a tolerância liberal, dos quais destacam-se:

– “a teoria democrática, relacionando a comunidade com a maioria;

– o argumento paternalista, segundo o qual, uma comunidade política, cada indivíduo é responsável para com o outro em se tratando do bem-estar;

– o interesse próprio;

– o argumento de integração, ou seja, a tolerância liberal está ligada à uma dependência ilegítima entre a vida do indivíduo dentro da comunidade, e, a vida da comunidade em sua totalidade” (DWORKIN, 2005, p. 292).

De acordo com Dworkin (2005, p. 293), “alguns liberais acham que a tolerância liberal pode ser totalmente justificada pelo princípio do dano de John Stuart Mill, segundo o qual, para evitar que faça mal a outros, e não a si mesmo”.

Seguindo a linha apresentada pelos argumentos comunitários, o que se extrai é que, as pessoas dependem dos recursos – materiais e intelectuais – disponibilizados pela sociedade na qual se encontram para que dessa maneira seja possível formar sua própria identidade.

Retomando a discussão sobre os argumentos contrários à tolerância liberal, passamos a analise desses aspectos, o primeiro ponto contrario faz referências à forma como questões associadas ao contexto ético da sociedade democrática devem ser decididas, em consonância com a vontade expressa da maioria, fato este, o qual deve ser observado e respeitado pelos políticos, no mesmo sentido, deve-se levar esse fator em consideração em situações, nas quais houver conflitos; posto que, não cabe à minoria decidir pela maioria.

Em um segundo momento, o que se observa consiste no fato de que, para que uma sociedade alcance de fatos, conceitos políticos, esta deve pautar-se no interesse e bem-estar de cada cidadão, visando dessa forma, o que se tem por bem-estar coletivo, o que se chama de bem-estar volitivo, por meio do qual o individuo atinge o seu objetivo, realizando as sua vontades, o qual se difere do bem-estar crítico, sendo este último, o bem-estar alcançado, quando o indivíduo tem ou alcança exatamente aquilo o que deveria ter, para que sua vida não seja de toda ruim.

Partindo desses pressupostos, compreende-se que o argumento comunitário apela mais ao paternalismo crítico do que ao volitivo, fato este que pode ser melhor entendido, se analisarmos duas vertentes; a primeira cumulativa afirma que os componentes e o endosso são elementos separados do valor. Se a vida de alguém tem os componentes de boa vida, então tem valor crítico. Se essa pessoa endossa esses componentes seu valor aumenta. Porém, caso não endosse, o valor dos componentes permanece. A tese constitutiva, por outro lado, afirma que nenhum componente contribui para o valor da vida sem endosso (DWORKIN, 2005, p. 301); em razão disso, seria a segunda corrente mais aceita.

Há ainda um terceiro argumento: a tolerância faz com que aquelas comunidades consideradas menos capazes, possam servir as mais diversas necessidades sociais de seus membros, a título de exemplificação, cita-se a liberalização das leis contra o homossexualismo (DWORKIN, 2005, p. 303, apud, DEVELIN, 1965, p. 9-15).

Vale resaltar que, os indivíduos que compõem determinada sociedade têm uma dependência para com esta de modo muito intenso, que vem a ultrapassar questões como a economia e a segurança, fatores em comum como o idioma e a cultura contribuem para a formação da personalidade desse indivíduo, situação esta que dá origem a uma relação “comunidade-indivíduo”; logo, cabe a essa sociedade ser o mais plural possível, para que assim, consiga atender e acolher os diferentes tipos que a compõem, uma vez que, trata-se de uma sociedade heterogênea, a qual deva proporcionar a cada cidadão, uma forma de se identificar com o meio no qual se encontra.

Ainda seguindo a linha dos argumentos comunitários; há um quarto argumento a ser pontuado, qual seja, comunidade e indivíduo se integram no liberalismo, gerando dessa maneira, uma relação de dependência, conforme já apontado anteriormente, com aquilo que se chama de aspecto de bondade de toda a comunidade. Para os liberais, tolerar ou não o homossexualismo por força da lei, implica em questionar se às pessoas seria conferido o direito de impor ao outro a sua própria vontade; em contrapartida, o republicanismo cívico compreendem-na como uma pergunta acerca da vida normal da comunidade, da qual depende o valor essencial da vida de seus próprios membros, deve ser saudável ou degenerada (DWORKIN, 2005, p. 310).

São estes pontos conflitantes, pois de um lado há aquele indivíduo preocupado com determinado aspecto do bem-estar coletivo, enquanto outro se preocupa com “o todo”, abarcando o bem-estar social e ao mesmo tempos, o bem-estar pessoal. O que de mais importante se extrai desse posicionamento, é que, a preocupação deve estar voltada para o bem-estar social geral, e, não somente, determinado aspecto deste.

Faz-se importante frisar o seguinte questionamento: o que vem a ser exatamente o fenômeno da integração?

O que o fenômeno da integração busca demonstrar é que, a partir do instante em que o cidadão preocupa-se com o seu próprio bem-estar já seria o suficiente para que este indivíduo se preocupe com a vida moral do meio no qual se encontra; em suma significa dizer que, para o cidadão “A” em nada interfere o que o indivíduo “B” faça ou não, e vice versa, o que realmente importa, é preocupar se suas próprias ações irão de encontro com aquilo em que se pauta a vida moral social, sendo suficiente o respeito ao posicionamento, as escolhas do outro, estando diretamente relacionado a questões da ética, as quais veem compor o ambiente social.

Quando se fala em igualdade liberal, de imediato remete- se ao fato de que, igualdade, liberdade e comunidade seriam aspectos complementares de um mesmo ideal político; assim, tais aspectos, componentes do ideal liberal de igualdade, em hipótese alguma, poderiam ser analisados em separado.

Sob o ponto de vista liberal, ao se falar em liberdade, o que deve pesar é, fazer aquilo que se deseja, sem, no entanto, deixar de observar, e, sobretudo, respeitar os direitos do próximo, em outras palavras o que se tem é uma comunidade totalmente estruturada no respeito ao direito do outro.

Nas palavras de Dworkin (2005, p. 332), “o liberalismo confere demasiada atenção ao direito, isto é, aos princípios da justiça, e pouca atenção ao bem, isto é, à qualidade e ao valor da vida que as pessoas levam”. A essa compreensão são contrapostas três críticas, uma dos românticos, uma dos marxistas e por fim, uma dos conservadores, essa ordem o que se vê é o seguinte:

– “segundo os românticos, o liberalismo é insensível à importância da libertação do indivíduo da moralidade mesquinha;

– o liberalismo vem menosprezar o caráter alienado e empobrecido da vida nas democracias capitalistas liberais;

– para estes, uma conduta liberal deixa de entender que a vida só pode ser satisfatória quando está relacionada as normas e costumes que definem a sua comunidade.”

Uma coisa essas três críticas concordam no que concerne a vertente liberal, este “suga a poesia da vida”.

Partindo dessas premissas, a conclusão a qual se chega é que

“o liberalismo pode e deve ser neutro em alguns níveis relativamente concretos da ética. Mas não pode e não deve ser neutro os níveis mais abstratos que nos deixam intrigados, não com relação a como viver pormenorizadamente, todavia com relação ao caráter, à força e à postura da própria questão de como viver” (DWORKIN, 2005, p. 333).

Em resumo acerca de todo o exposto até o momento, pode-se fechar a análise feita em relação à igualdade, em duas situações distintas, uma na qual o indivíduo depende dos recursos apresentados pela sociedade para se considerar de fato, parte integrante desse meio, e outra, que visa demonstrar que o indivíduo integra a sociedade, quando vive em observância aos critérios de bem-estar pessoal e coletivo.

3.2. O Comunitarismos de Charles Taylor

Para Taylor (2000) há o que se chama de necessidade ou exigência de reconhecimento no contexto político contemporâneo, defendendo questões relacionadas àqueles grupos vistos como minorias sociais.

  Essa “exigência de reconhecimento” está, diretamente associada à identidade do individuo, que carrega consigo características que, nas palavras de Taylor (2000, p. 241), figuram como definitórias fundamentais como seres humanos, in verbis:

“A tese é de que nossa identidade é moldada em parte pelo reconhecimento ou por sua ausência, freqüentemente pelo reconhecimento errôneo por parte dos outros, de modo que uma pessoa ou grupo de pessoas pode sofrer reais danos, uma real distorção, se as pessoas ou sociedades ao redor deles lhes devolverem um quadro de si mesmas redutor, desmerecedor ou desprezível. O não-reconhecimento ou reconhecimento errôneo podem causa danos, podem ser uma forma de opressão, aprisionando alguém numa modalidade de ser falsa, distorcida e redutora”. (sic)

Há que se destacar que, nesse contexto, predomina o que se tem como sendo autodescriminação, ou seja, o negro trás consigo a ideia de serem menos capacitados que os brancos, as mulheres uma relação de submissão em relação aos homens, isso, nada mais é, do que um ranço histórico da sociedade brasileira, ou, em outras palavras, um reconhecimento errôneo, todavia, esse anseio por reconhecimento, é, de certo modo, recente no Estado brasileiro.

É importante mencionar que a terminologia “dignidade”, tal qual aplicada atualmente em uma sociedade democrática, vem a ser uma espécie de substituição, do que tempos atrás (leia-se, durante o período monárquico), via-se como honra.

O que a democracia pretende, dentre outras coisas, é uma máxima aproximação entre os indivíduos que compõem essa sociedade, evitando, sempre que possível, o uso de pronomes de tratamento, ou mesmo os próprios sobrenomes, uma vez que essa forma diferenciada dá espaço para a existência de uma linha discriminatória muito grande.

Taylor (2000) ainda destaca todo esse processo de mudanças que envolvem o reconhecimento de identidade que no âmbito da sociedade hierárquica, tinha relação direta com a posição que aquele indivíduo ocupava dentro da sociedade, segundo Taylor (2000, p. 244)

“O ideal da autenticidade assume caráter crucial graças ao desenvolvimento pós-Rousseau que associo ao nome de Herder – mais uma vez, antes como seu primeiro articulador do que como seu originador. Herder apresentou a ideia de que cada um de nós tem um modo original de ser humano: cada pessoa tem sua própria “medida”. Essa ideia mergulhou profundamente na consciência moderna. Ela é uma nova idéia. Antes do final do século XVIII, ninguém pensava que as diferenças entre os seres humanos tivessem esse tipo de significação moral. Há um certo modo de ser humano que é meu modo. Sou chamado a levar minha vida assim, e não imitado a vida de outrem. Mas essa noção dá uma nova relevância ao ser fiel a mim mesmo. Se não o for, perderei o sentido da minha vida, ficarei privado do que é ser humano para mim”. (sic)

  É nítida a relação de proximidade existente entre reconhecimento e identidade, logo, impende destacar o posicionamento de Taylor (2000,p. 246)

“Tornamo-nos agentes humanos plenos, capazes de nos compreender a nós mesmos e, por conseguinte, de definir nossa identidade, mediante a aquisição de ricas linguagens humanas de expressão. Para meus propósitos aqui, desejo tomar a linguagem no sentido amplo, cobrindo não só as palavras que falamos mas também outros modos de expressão por meios dos quais nos definimos, incluindo as “linguagens” da arte, do gestos, do amor, etc. mas aprendemos com esses modos de expressão por meio de intercâmbios com outras pessoas. As pessoas não adquirem as linguagens de que precisam para se autodefinirem por si mesmas, em vez disso, somos apresentados a essas linguagens por meio de interação com outras pessoas que têm importância para nós – aquilo que G. H. Mead denominava “outros significados”. A gênese do espírito humano é, nesse sentido, não monológica, não algo que cada pessoa realiza por si mesma, mas dialógica”. (sic)

  No tocante a identidade, é válido apontar que esta, encontra-se em crescente construção, de acordo com os diálogos diários, o que trazemos para as nossas vidas, os sentimentos, o modo como nos expressamos, nos relacionamos, tudo, em igual medida, contribui para a construção da identidade de determinado individuo, em determinada sociedade, de acordo com o período histórico que se vivencia, podendo permanecer dentro desse contexto durante gerações, mesmo quando esse indivíduo não estiver mais presente; assim, parafraseando Taylor (2000, p. 248), torna-se mais simplória a compreensão acerca da construção da identidade, conforme se vê adiante:

“Assim sendo, minha descoberta de minha identidade não implica uma produção minha de minha própria identidade no isolamento; significa que eu a negocio por meio do diálogo, parte aberto, parte interno, com o outro. Eis por que o desenvolvimento de um ideal de identidade gerada interiormente dá uma nova importância ao reconhecimento. Minha própria identidade depende crucialmente de minha relações dialógicas com os outros.”

  Segundo Taylor (2000, p. 248-249)

“Não surpreende podermos encontrar algumas das idéias seminais sobre a dignidade dos cidadãos e o reconhecimento universal, ainda que não nesses termos específicos, em Rousseau, um dos pontos de origem do discurso moderno da autenticidade. Rousseau é um acerbo crítico da honra hierárquica, das preferências. (…) a importância do reconhecimento é agora universalmente reconhecida de uma ou outra forma; no plano íntimo, todos sabem que a identidade pode ser formada ou mal formada no curso de nosso contato com outros significativos. No plano social, temos uma política continua de igual reconhecimento. Ambos os planos foram moldados pelo ideal crescente de autenticidade, e o reconhecimento desempenha um papel essencial na cultura que surgiu ao redor desse ideal”. (sic)

  Com a passagem de tempo e a mudança de terminologias, de honra à dignidade, a grande questão que envolve o assunto, paira sobre o fato de evitar-se a divisão da sociedade em classes, outro ponto que passou por mudanças, diz respeito ao que se chama de “política da diferença”, de acordo com Taylor (2000, p. 250-251),

“Há, naturalmente, uma base universalista também para isso, o que compensa a sobreposição e a confusão entre as duas. Todos devem ter reconhecida sua identidade peculiar. Mas reconhecimento aqui significa algo mais. Com a política da dignidade igual, aquilo que é estabelecido pretende ser universalmente o mesmo, uma cesta idêntica de direitos e imunidades; com a política da diferença, pedem-nos para reconhecer a identidade peculiar desse indivíduo ou grupo, aquilo que o distingue de todas as outras pessoas. A idéia é de que é precisamente esse elemento distintivo que foi ignorado, distorcido, assimilado a uma identidade dominante ou majoritária. E essa assimilação é o pecado capital contra o ideal da autenticidade”. (sic)

E é exatamente essa discriminação ilegítima que irá culminar nessa divisão social, dando origem, principalmente, a cidadanias de segunda classe, o que de certo modo, volta ao ponto abordado a pouco, de que, a posição social do indivíduo implicaria no seu reconhecimento dentro dessa comunidade, isso, exemplifica de maneira eficaz a política da diferença, o que é diverso da política da dignidade universal, que, por sua vez, elenca que todos são, em igual medida dignos de respeito, independentemente de estar esse indivíduo, inserido na primeira ou na segunda classe daquele ciclo social.

Relativamente a diferença existente entre a política da igualdade e política da diferença Taylor (2000, p. 254) é enfático ao apurar que

“O liberalismo da dignidade igual parece ter de supor a existência de alguns princípios universais infensos às diferenças. Ainda que não tenhamos definido esses princípios, o projeto de defini-los permanece vivo e essencial. Diferentes teorias podem ser avançadas e contestadas – e certo numero delas tem sido proposto em nossos dias – , mas o pressuposto partilhado de todas é de que uma está certa. A acusação lançada pelas modalidades mais radicais de política da diferença é de que os liberalismos cegos são eles mesmos reflexos de culturas particulares. E o pensamento preocupante é de que essa tendenciosidade possa não ser apenas uma fraqueza das teorias até agora propostas, de que a própria idéia de tal liberalismo possa ser uma espécie de contradição pragmática, um particularismo mascarado de universal”. (sic)

As discussões relativas à igualdade, e, consequentemente, reconhecimento, ganha fôlego a partir do pensamento expoente de Rousseau, que mostra contrário a condição de “liberdade-na-igualdade”, derivada da situação hierárquica que carrega junto a si, certa dependência em relação ao outro, em grande parte, essa dependência vincula-se tão somente à autoestima, necessidade de que o outro o reconheça, segundo Taylor (2000, 255)

“Ao que parece, para Rousseau, isso é impossível, dado que ele associa a dependência do outro à necessidade da boa opinião alheia, que por sua vez é compreendida no âmbito da concepção tradicional da honra, isto é, como intrinsecamente vinculada com preferências. A estima que buscamos nessa condição é intrinsecamente diferencial. É um bem posicional.”

Tendo em vista o exposto até este ponto, pode-se entender que o reconhecimento frente à sociedade tinha um peso muito grande, era tido como algo que fazia bem ao indivíduo, que enxergava no reconhecimento positivo, quase que uma necessidade crucial, de suma importância para a sua vida, algo que se equipararia a igualdade, mais especificamente a um ideal de igualdade, o que só era alcançado por meio dessa aceitação social; a julgar que todos, sem distinção, necessitam dessa “aprovação”, o que poderia ser considerado como sendo um “padrão de igualdade”.

E diante de fatos como esses, Taylor (2000, p. 257) aponta que

“O argumento não expresso por Rousseau parece o seguinte: uma reciprocidade perfeitamente equilibrada retira de nossa dependência da opinião o que nela há de negativo, tornando-a compatível com a liberdade. A completa reciprocidade, ao lado da unidade de propósito que a torna possível, assegura que, ao seguir a opinião, eu de modo algum me veja retirado de mim mesmo. Ainda estou “obedecendo a mim mesmo” como membro desse projeto comum ou vontade geral. Cuidar da estima nesse contexto é compatível com a liberdade e com a unidade social, dado que se trata de uma sociedade em que todos os virtuosos terão a mesma estima e pelas mesmas razões (corretas)”.

De posse desse discurso, Taylor (2000, p. 259) atinge a seguinte percepção, in verbis:

“Em Rousseau, três coisas parecem inseparáveis: a liberdade (o não-domínio), a ausência de papéis diferenciados e um propósito comum dotado de firme coesão. Todos temos de ser dependentes da vontade geral a fim de evitar que surjam formas bilaterais de dependência. Essa tem sido a fórmula para as mais terríveis formas de tirania homogeneizante, tendo inicio com os jacobinos e estendendo-se aos regimes totalitários do nosso século. Mas mesmo onde o terceiro elemento da trindade é descartado, o alinhamento da liberdade igual à ausência de diferenciação permaneceu como uma modalidade tentadora de pensamento. Onde quer que reine esse alinhamento, seja em formas de pensamento feminista ou na política liberal, é muito pequena a margem do reconhecimento da diferença”. (sic)

Segundo nos propõe Taylor (2000, p. 260), dentro do contexto liberal, pode acontecer de apenas uma única forma de reconhecimento ser aceita dentro dessa ou daquela sociedade, a depender de quais sejam os padrões, os ideais, os costumes daquela comunidade, isto posto, deve ser levado em consideração que, dentro do próprio contexto de liberalismo, podem estar inseridas duas relações distintas, no que tange ao reconhecimento e aplicação dos direitos individuais e coletivos.

Mesmo em uma sociedade atenta ao cumprimento de direitos coletivos e individuais, podem acontecer, questões discriminatórias, uma vez que nem todos os indivíduos irão pertencer a um mesmo grupo, que, a depender da situação, pode vir a ser amparado por direitos coletivos que não englobem os demais grupos, tal como ocorre nas sociedades contemporâneas, as quais compreendem em seu meio os mais variados tipos, dentre os quais podemos enxergar grupos de minorias que irão recebe tratamento legal diferenciado, o que nas palavras de Taylor (2000) seriam “dispositivos antidiscriminatórios” na perspectiva de um sistema liberal, o que Cruz define em sua obra, conforme demonstrado, ser uma forma legítima de discriminação.

No que concerne ao ponto de vista liberal, de acordo com Taylor (2000, p. 263)

“(…) a dignidade humana consiste amplamente em autonomia, isto é, a capacidade de cada pessoa de determinar por si uma concepção da boa vida. A dignidade é associada menos a alguma compreensão particular de boa vida, de modo que o afastamento desta depusesse contra a própria dignidade de cada um, do que ao poder de considerar e esposar por si mesmo uma ou outra visão. Não estaremos respeitando esse poder igualmente em todos os sujeitos, afirma-se, se elevarmos o resultado das deliberações de outras pessoas como oficialmente acima das outras. Uma sociedade liberal tem de permanecer neutra com relação à boa vida e restringir-se a assegurar que, qualquer que seja sua visão das coisas, os cidadãos lidem em lealdade uns com os outros e o Estado lide igualitariamente com todos”.

Taylor (2000, p. 266-267) descreve sucintamente a respeito do posicionamento do liberalismo frente à sociedade, do qual extrai-se o que segue:

“(…) O liberalismo não é um terreno de possível encontro para todas as culturas; ele é a expressão política de uma gama de culturas, sendo sobremodo incompatível com outras gamas. Alem disso, como o sabem muitos muçulmanos, o liberalismo ocidental não é tanto expressão da perspectiva secular pós-religiosa, que costuma ser popular entre intelectuais e liberais, quanto um desenvolvimento mais orgânico do cristianismo – ao menos visto da perspectiva alternativa di islamismo. A divisão Igreja/Estado remonta aos primeiros momentos da civilização cristã. As primeiras formas dessa separação diferiam muito das nossas, mas nelas se assentaram as bases para os desenvolvimentos modernos. O próprio termo secular era originalmente parte do vocabulário cristão. Tudo isso para dizer que o liberalismo não pode nem deve alegar que tem completa neutralidade cultural. O liberalismo também é um credo em luta (…). Haverá variações quando se tratar da aplicação da pauta de direitos, mas não onde o assunto for incitar o assassinato. Não se deve ver isso como uma contradição”.

Considerando todo o abordado ao longo deste tópico, pode-se considerar que um sistema liberal, prima dentre outras coisas, por uma sociedade mais igualitária, ou seja, por meio de uma política de dignidade igual, em outras palavras significa dizer, o que tempos depois se tornaria discriminação em sua forma lícita.

4. Ações Afirmativas entre Discriminação Lícita e Ilícita

Uma coisa há que ficar bem claro quando se inicia os estudos acerca do instituto da discriminação, seja pelo seu caráter lícito, seja pelo seu caráter ilícito, a discriminação em linhas gerais manifesta-se a priori no que tange a questões biológicas, inerente ao homem e a mulher.

O aspecto biológico por si só, é capaz de trazer a tona, outras formas de discriminação; sobretudo, pelo ponto de vista social, que vem agregar peso ao aspecto retro mencionado.

É natural e plenamente aceitável da sociedade que tal discriminação ocorra em um primeiro momento, de forma mais visual, onde de imediato já se torna possível fazer uma diferenciação.

A questão biológica tem um valor imensurável quando se trata de discriminação lícita, a julgar que essa diferenciação, em momento algum será questionada, tendo em vista ser algo da própria natureza humana.

Quando se tem o termo discriminação de imediato vem à mente conotações negativas, associando-se a minorias, a questões de não observância dos direitos inerentes àquela situação e/ou àquele indivíduo; entretanto, não se pode fechar o entendimento tão somente nesse aspecto, há que se levar em consideração sim, questões de minorias, mas abrindo espaço para entender que em determinados momentos alguns grupos específicos precisaram ficar em destaque para alcançar a tão falada isonomia, através da premissa constitucional pela qual se entende que, deve-se tratar desigualmente os desiguais na medida de sua desigualdade.

Encontra-se arraigado no imaginário brasileiro, um estigma negativo em torno da terminologia discriminação, entretanto há que se levar em consideração, para atingir um patamar de isonomia social deve-se romper com esse paradigma e visualizar a conotação positiva em praticar alguns atos que denotem certa discriminação; nesses casos, não se tem discriminação em seu sentido primário, conforme se tem no Dicionário (2009, p. 239):

“Discriminação – 1. Ato ou efeito de discriminar. 2. Tratamento preconceituoso dado a certas categorias sociais, raciais, etc. 3.Eliminação de todos os sinais que entram num circuito, exceto daqueles que tem uma determinada característica de fase, de frequência ou de amplitude”.

Aqui, parte-se para uma interpretação mais hermenêutica, onde se vislumbra uma interpretação em detrimento do contexto social, vislumbrando a tão desejada isonomia social.

Para que essa igualdade se concretize, faz-se imprescindível certas escolhas, e quando se fala em escolhas, logo, pensa-se em exclusão, da exclusão a discriminação, discriminação a qual enseja única e exclusivamente o bem-estar coletivo, por intermédio do Principio da Desigualdade, diante do qual observa-se a premissa “tratar desigualmente os desiguais na medida da sua desigualdade”, atingindo nesse instante toda a eficácia pretendida ao conferir espaço as discriminações licitas.

Entretanto, para que toda essa ideia fique bem compreendida deve-se partir antes de qualquer coisa, de uma abordagem histórica, visualizando todas as suas transformações até chegarmos ao que conhecemos contemporaneamente, para tanto, passo a analisar as palavras do Professor Álvaro Ricardo de Souza Cruz, em sua obra O Direito à Diferença, as ações afirmativas como mecanismo de inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e pessoas portadoras de deficiências.

Segundo CRUZ, o momento de arranque para que toda essa discussão envolvendo o princípio da igualdade, decorre do paradigma liberal, momento em que a ideia de igualdade, estava relacionada a uma concepção geométrica da igualdade o que posteriormente se converte para uma visão aritmética da igualdade, oportunidade em que todos almejavam destaque/direitos frente a sociedade em que viviam; momento em que o coletivo passa a ter destaque dentro da sociedade, havendo uma inversão social, a partir do momento em que os direitos divinizatórios dos monarcas e os imperativos de sobrevivência dão lugar aos direitos humanos.

Como bem se sabe, a Igreja tinha grande influência no ambiente social, muitas vezes, ditando as regras de convivência que julgava “ideal” para aquela situação, e a sociedade em um instinto de revolta, passa a lutar em detrimentos de seus direitos individuais, alcançando dessa forma, a igualdade aritmética, de fundamental importância para que atualmente nos fosse possível toda essa discussão.

Partindo da visão de Cruz (2009, p. 15) pode-se aferir o seguinte;

“distinguir ou separar é necessário e indispensável para a garantia do próprio principio da isonomia, isto é, para que a noção de igualdade atenda as exigências do princípio da dignidade humana (com argumentos racionais de convencimento) do Direito.”

Na mesma obra, Cruz (2009), faz ainda referencia ao Ministro Joaquim B. Barbosa Gomes, que em sua obra Ação afirmativa e princípio constitucional da igualdade: o direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA., aponta o que se entende como sendo discriminação legítima, quando discorre o seguinte entendimento: “situações em que a discriminação se reveste do caráter de inevitabilidade, seja em razão das exigências especificas do tipo de atividade, que exclui por princípio e com boa dose de razoabilidade certas categorias de pessoas, seja em função de características pessoais das pessoas envolvidas”.

Levando em consideração as exposições feitas até o presente momento, podemos de certa forma, chegar a um entendimento de que a igualdade está na diferença, à diferença é jurídica e não física; pois, a partir do instante em que se reconhece juridicamente uma conduta como diferente, assegura-se o direito à diversidade, equiparando-se desse modo os direitos inerentes a cada indivíduo.

4.1. Discriminação Lícita

A priori, é inerente a todo e qualquer indivíduo, emoldurar a discriminação tão somente no que tange ao seu aspecto de negação, de exclusão, daquilo que não se adéqua a determinados conceitos que aquele indivíduo julga ser o correto, o aceitável; nas suas mais variadas conotações, sejam elas de raça, sexo, idade, religião, deficiências; a fim de deixar “bem definidos” os grupos que compõem essa sociedade, infringido dessa forma, preceitos constitucionais já mencionados.

Partindo de todo o apresentado até então, a distinção é de suma importância, inclusive, para que se façam cumprir o Princípio da Isonomia, com a ressalva é claro, de se ater aos institutos do Direito.

Para que seja possível falar em discriminação lícita, alguns requisitos devem ser respeitados, tais como:

“- não atingir os princípios da generalidade e abstração da norma jurídica;

– que haja naquele meio situações, coisas ou pessoas diferentes, ou, pelo menos, passíveis de diferenciação;

– que haja uma relação lógica entre os fatores diferenciais e os critérios adotados para essa distinção;

– que tal distinção obedeça os preceitos estabelecidos pela Constituição Federal.”

O que se espera com esse posicionamento, nada mais é do que uma imparcialidade quanto a forma de julgamento; todavia, essa imparcialidade deve ser alcançada por meio do Princípio da Adequabilidade, e não do Princípio da Universalização, de acordo com os fatos apresentados no caso concreto.

A discriminação legitima segundo demonstra CRUZ (2009, p. 21), pode ser percebida de acordo com o que se chama business necessity

“situações em que a discriminação se reveste do caráter de inevitabilidade, seja em razão das exigências especiais do tipo de atividade, que exclui por princípio e com boa dose de razoabilidade certas categorias de pessoas, seja em função das características pessoais das pessoas envolvidas”.

A discriminação legítima, evidentemente, gera uma preferência em favor de alguém ou de algum grupo especifico, e, consequentemente, pode ocorrer de modo excludente; assim sendo, às normas constitucionais, as quais implicam distinção de gênero, conferido alguma forma de beneficio, por exemplo, à mulher durante o seu período de licença maternidade e tempo de contribuição para fins de aposentadoria diferenciado em relação ao homem, à essas normas, confere-se o caráter de legitimidade.

Citando Cruz (2009, p. 25),

“o respeito à diferença só pode ser fruto de um esforço continuo, uma vez que a maioria, não reconhecendo como cidadão o integrante de outro grupo, geralmente rejeita-o. É uma tendência etnocêntrica, que se registra pelos antropólogos em todos os grupamentos humanos. Logo, uma discriminação legítima pode facilmente se desvirtuar, pela imposição às coletividades minoritárias de condutas violentadoras de sua cultura e tradição.”

4.2. Discriminação Ilícita

A discriminação ilícita ou ilegítima deriva de uma ação ou omissão, visando lesar o direito de terceiros, partindo de critérios inapropriados como raça, sexo, idade, crença religiosa, dentre outros.

A discriminação ilegítima decorre de um “pré-conceito”, de um julgamento prévio, já interiorizado pela sociedade, diante do senso comum, imposto pelas tradições daquele povo; figura como se fosse uma espécie de estereótipo, do tipo, todos aqueles que têm tatuagens e piercings são usuários.

Essa forma de discriminação, que nitidamente aponta para a violação dos direitos fundamentais inerentes à todos os indivíduos, apresenta-e sob dois prismas:

“- discriminação direta ou intencional, nesse tipo de discriminação, o animus discriminatório, o dolo, é facilmente identificável, uma vez que a conduta é premeditada;

– discriminação de fato, pode tanto ocorrer no âmbito publico quanto privado, aqui o discriminador, o sujeito ativo da ação, atua sem ao menos saber da ilicitude que seu ato está gerando, como ocorre no caso das piadas politicamente incorretas, seria assim, visto como uma discriminação indireta. Essa vertente da discriminação pode ser apresentada ainda, na forma do que se denomina política de neutralidade e indiferença para com as vítimas da discriminação, de modo que estas não consigam um tratamento diferenciado em decorrência de suas características próprias”.

A Suprema Corte Americana, segundo Cruz (2009), tem adotado alguns modos de interpretação quanto à forma que julga adequada para interromper essa crescente discriminação, dentre as quais se destacam:

– teoria dos motivos mistos, essa é uma teoria a qual se confere grande importância, tendo em vista que a ação discriminatória ocorre de forma muito sutil, acobertada por outras condutas de caráter legítimo que culminaram nesta. Segundo Cruz (2009, p. 34),

“por meio dela, a Corte distingue situações nas quais a motivação da conduta é única e direta daqueles nas quais outros fatores teriam atuado concorrentemente para a ocorrência da conduta discriminatória, dificultando, portanto, o trabalho da defesa de práticas ilegítimas;”

– teoria do impacto desproporcional, com essa teoria o que e objetiva é um maior controle constitucional, para que tanto as políticas governamentais quanto as políticas empresariais, estejam em consonância com o Princípio da Isonomia Formal.

Todavia, o judiciário brasileiro não adotou essas teorias, adaptando ao ordenamento jurídico brasileiro, apenas as formas de determinar discriminação direta, intencional e com motivação exclusiva, para que dessa forma, possa o sujeito passivo ser ressarcido pelo dano que lhe foi causado. Raras exceções, o judiciário entende que possa ocorrer a discriminação na sua forma presumida.

De acordo com o que Cruz (2009, p. 36) nos apresenta em sua obra,

“o Legislativo nacional se preocupa quase que exclusivamente com legislações repressivas e o Judiciário assume postura nitidamente conservadora, ou seja, refratária a posições de vanguarda na defesa dos direitos fundamentais das minorias. Por sua vez, o Executivo, no Governo Lula, passou a desenvolver uma ‘agressiva’ postura em favor das ações afirmativas, em uma notável mudança de perspectiva.”

O que vem colaborar para a afirmativa de que tais discursos têm ganhado peso no Estado Brasileiro.

4.3. Ações Afirmativas ou Políticas Assistenciais?

É incontestável que toda sociedade democrática é assolada pela discriminação na sua forma ilícita; entretanto, essas sociedades têm por obrigação, afastar esse caráter negativo do seu meio social.

Seguindo a corrente do marxismo clássico, a questão econômica é a que figuraria como ponto de partida para a discriminação; assim, não haveria que se falar em políticas públicas e/ou privadas de cunho assistencial. Entretanto, não é só o fator econômico que pesa no tocante às praticas discriminatórias, outros fatores têm as suas parcelas de responsabilidade, como, os elementos de conotação cultural, antropológicos e psicológicos.

E é exatamente em razão disso, que as ações afirmativas funcionam como um step, para reorganizar as sociedades, projetando nessas sociedades, maneiras de se adequarem a todos os grupos que, por ventura, venham a fazer parte dessas, barrando assim, a prática discriminatória ilícita; pois, ao ignorar a inserção das ações afirmativas no contexto social, seria o mesmo que negar as conquistas alcançadas até então.

Cruz (2009, p. 155) é enfático em sua obra ao pontuar que,

“a discriminação e o preconceito são vistos como heranças culturais e passam de uma geração à outra, fazendo com que as ações afirmativas se tornem uma compensação pelos prejuízos sucessivos que a coletividade, alvo da indenização, veio a sofrer”.

Cruz (2009) conceitua a teoria compensatória das ações afirmativas sob a visão de Jules Coleman, na sua obra Moral theories of torts:their scope and limits. Part II. Law and Philosophy (Teorias morais da responsabilidade civil: sua abrangência e limites. Parte II. Direito e Filosofia), 1983.

Por consequente, sob tais teorias, recaíram algumas críticas no que concerne à indenização nos casos de responsabilidade civil por atos ilícitos, pois, para os críticos, somente aquele que de fato praticou ato ilícito discriminatório deve ser sancionado, tirando desse modo, a responsabilidade da sociedade como um todo, da forma como preconizam as teorias compensatórias.

Logo, o que se que demonstrar com tudo isso é que, as ações afirmativas não podem, e, não devem, ser compreendidas tão somente como uma forma de compensar o outro pelo dano que lhe foi causado.

Cruz (2009, p. 158) adota o posicionamento de Habermas, ao pontuar que

“rejeitadas as teorias compensatórias e (re)distributivistas (utilitarismo), fixamos finalmente posição favorável à tese conforme a qual as ações afirmativas se legitimam com base nos princípios do pluralismo jurídico e da dignidade humana, estruturados no paradigma de Estado Democrático de Direito” (GRIFOS NOSSOS)

Importante notar em relação à dignidade da pessoa humana, como bem menciona Carvalho (2009, p. 672),

“não é só um reconhecimento do valor do homem em sua dimensão de liberdade, com também de que o próprio Estado se constrói com base nesse princípio. O termo dignidade designa o respeito que merece qualquer pessoa… a dignidade, como qualidade intrínseca da pessoa humana (em todo o homem e em toda a mulher se acham presentes todas as faculdades da humanidade), é irrenunciável e inalienável, e constitui elemento que qualifica o ser humano como tal e dele não pode ser destacado. Ela existe, não apenas onde é reconhecida pelo Direito e na medida que este a reconhece, por se constituir dado prévio, preexistente e anterior a toda experiência especulada.”

Em síntese, significa dizer que, por meio da dignidade é que se faz conhecer no contexto sócio-jurídico os direitos da pessoa humana.

Neste sentido, o que se observa no tocante às ações afirmativas, é que estas servem como “ponto de apoio” para aqueles que de certo modo veem seus direitos fundamentais esquecidos perante a sociedade, buscando com isso, dar forma a máxima constitucional, quando se fala em tratar desigualmente os desiguais ma medida da sua desigualdade. Vale frisar que, para que isso se concretize, primeiramente, necessário se faz reconhecer o problema, como CRUZ (2009, p. 159) bem pontuou ao lembrar Jürgen Habermas e Charles Taylor, pois irá demandar convencer a maioria da população acerca da real eficácia das ações afirmativas, que torna a sociedade o mais plural possível, desvencilhando-se da forma ilegítima de discriminação, do que conhecê-las como, mero “favor político”.

As ações afirmativas funcionam como um conjunto de estratégias, iniciativas ou políticas publicas, as quais visam “favorecer” aqueles que se encontram em situações de desvantagem para com a sociedade, em razão da prática discriminatória ilegítima, tendo por principal objetivo, eliminar esse desequilíbrio social (CARVALHO, 2009, p. 797).

Como inúmeras outras questões que surgem no cenário brasileiro, a discussão que gira em torno das ações afirmativas teve início nos Estados Unidos, ainda na década de 60, ocasião em que eclodiram reivindicações democráticas internas, por meio das quais objetivavam dentre outras coisas estender a todos a igualdade de oportunidades, já que nesse mesmo momento, as leis segregacionistas até então vigentes no país começaram a serem eliminadas, combinado ao início do movimento negro; ou seja, as ações afirmativas surgem no contexto norte americano com o intuito de reclamar perante o Estado uma maior atenção no que dizia respeito às condições vivenciadas pela população negra, bem como, garantir leis antissegregacionistas.

Evidentemente que, com o passar dos anos, as diferentes sociedades e etnias que se apresentam, faz com que o publico alvo dessas ações afirmativas vá se modificando, vale ressaltar que dentre todas as sociedades, todos os grupos de minorias, a forma mais abrangente dessa política, consiste no já conhecido sistema de cotas.

Em suma, ao se falar em ações afirmativas, se pode afirmar que tais ações seriam reparatórias/compensatórias e/ou preventivas, as quais viriam a corrigir certas situações de discriminação suportadas por esses grupos, sejam mulheres, negros, deficientes…

Especificamente no Brasil, as ações afirmativas têm um forte apelo social, sobretudo contra a pobreza, seja por mecanismos assistenciais ou redistributivos, por meio dos conceitos fixados politicamente do que viria a ser igualdade, o que ganhou força a partir do movimento de redemocratização do país, quando o poder público passou a ser mais exigido pelos movimentos sociais em questões as quais envolvam raça, gênero, etnia e a adoção de medidas especificas para sua solução, ou seja, as ações afirmativas; para isso, olhar para o passado tem grande relevância para melhor compreendermos o que acontece no momento atual.

  Um primeiro esboço do que seriam as ações afirmativas, na forma como conhecemos hoje no Estado Brasileiro, surge no ano de 1968, ano em que o Ministério do Trabalho e o Tribunal Superior do Trabalho, estabeleceram que as empresas deveriam reservar um percentual de suas vagas para a contratação de funcionários negros, como uma forma de barrar a discriminação racial no ambiente profissional. Apenas em 1980 é que foi elaborado o primeiro projeto de lei nesse sentido, o projeto de lei nº 1332/83, o qual também não foi aprovado, mas só em 1995 é que de fato surgem as primeiras políticas de cota no âmbito político, reservando 30% (trinta por cento) das vagas para candidatas do sexo feminino.

Na esfera do legislativo brasileiro, encontram-se muitas políticas de ações afirmativas, sobretudo, no que diz respeito ao egresso no ensino superior, para tanto, alguns critérios são levados em consideração, no instante em que se faz a definição dos grupos beneficiados por essas políticas afirmativas, tais como, raciais/étnicas ou sociais, ou ambos.

Segundo Moehlecke (2002, p. 208-209),

“a definição dos grupos e de sua abrangência são aspectos importantes na formulação de leis e políticas e, dependendo do nível de aplicação – se nacional, estadual ou municipal -, necessitam incorporar diferenças regionais. Dentre as justificativas que legitimam os projetos encontramos referência à importância atribuída à educação, vista como um instrumento de ascensão social e de desenvolvimento do país; a exposição de dados estatísticos que mostram o insignificante acesso da população pobre e negra no ensino superior brasileiro e a incompatibilidade dessa situação de desigualdade ou exclusão dos negros e índios e implicam uma divida do Poder Publico para com esses setores”.

Diante de todos esses fatos, somente em 2001 é que tiveram início as ações afirmativas no Estado Brasileiro para a população negra, através do sistema de cotas. Ainda nesse sentido Moehlecke (2002, p. 209) nos apresenta a ideia de que: “a avaliação do rumo de políticas tão recentes no Brasil, como a das ações afirmativas, tem necessariamente um caráter temporário e limitações provenientes do contexto político, social e econômico”.

Quando se fala em ações afirmativas, algumas questões surgem de imediato, como por exemplo, essas ações funcionam como uma forma de assegurar direitos fundamentais ou figuraria como um mero privilégio? Ao se falar que as ações afirmativas seriam privilégios concedidos a determinados grupos, poderia se falar que a esta seria imputada um caráter inconstitucional; por outro lado, quando se apresentam as ações afirmativas como garantias de direitos, estas estariam em total sintonia com preceitos constitucionais, uma vez que teriam por objetivo rever uma situação discriminatória, não seria uma forma de discriminação ilícita, pelo fato de buscar uma igualdade social de fato.

Vale frisar, que

“o que está em disputa nessas posições são diferentes interpretações da Constituição e postura distintas em termos normativos com relação à noções de igualdade e justiça. O princípio da igualdade perante a lei está presente nas constituições brasileiras desde o Império, passando por algumas transformações ao longo desse período; afinal, parte da população brasileira, escravizada, não era por ela contemplada em 1824” (MOEHLECKE, 2002, p. 210).

No que concerne às ações afirmativas no contexto de nossa atual Constituição, sob esse aspecto o que se pode pontual conforme expõe Moehlecke (2002, p. 211), entende-se que

“as posições jurídicas que sustentam a constitucionalidade de políticas como as ações afirmativas,no Brasil, adotam uma perspectiva diversa, principalmente porque identificam mudanças significativas envolvendo normas de igualdade a partir da Constituição de 1988”.

A autora ainda nos apresenta o seguinte,

“de acordo com Guimarães (1999), ações afirmativas não dispensam, mas exigem, uma política mais ampla de igualdade de oportunidades implementadas conjuntamente, já que as ações afirmativas são políticas restritas e limitadas, um exceção utilizadas apenas naqueles locais em que o acesso de um grupo é comprovadamente inadequado”. (MOEHLECKE, 2002, p. 213)

Um aspecto de grande relevância levantado pela autora (MOEHLECKE, 2002, p. 214), está diretamente relacionado ao debate entre o uso de políticas redistributivas (de caráter social) ou de políticas contrarias à discriminação (de caráter racial), ou uma combinação de ambas, pelo que, se mostra o seguinte:

“no Brasil, ainda é forte a ideia de que uma política direcionada à população pobre necessariamente também beneficiaria os negros, por exemplo, já que estariam em maioria nessa camada. Aqueles que discordam dessa posição argumentam que ela esquece a especificidade do problema racial, já que a exclusão social não seria a mesma coisa que discriminação racial.”

Para que seja plenamente possível afirmarmos que a sociedade na qual nos encontramos é uma sociedade livre e igual, dependeríamos do fato de que todo e qualquer indivíduo dentro desse circulo social necessariamente fossem livres e iguais, a partir do momento em que um único indivíduo não for tratado dessa maneira, não mais haveria que se falar nesse modelo de sociedade (SCHNEIDER, 2013, p. 12). Para tanto, essa sociedade deve apresentar ao longo de seu ordenamento jurídico, normas jurídicas devidamente hierarquizadas no tocante aos direitos humanos.

Nesse ponto, analisamos o posicionamento de Schneider (2013, p. 13-14) acerca da compreensão do que viriam a ser as ações afirmativas, senão vejamos:

“Diante disso entendemos que as ações afirmativas podem ser conceituadas como políticas, de caráter temporário ou definitivo, concedidas tanto pelo poder publico como pela iniciativa privada, de forma compulsória ou voluntaria, direcionadas para uma determinada parcela da população excluída socialmente, em função de sua origem, raça, cor, gênero, condição física ou mental, idade, etnia, opção sexual, religião ou condição econômico social, os quais objetivam corrigir ou, ao menos minimizar as distorções ocorridas no passado e propiciar a igualdade de tratamento e de oportunidades no presente.”

No mesmo sentido, Schneider (2013, p. 15), visa apontar quais seriam os grandes objetivos das ações afirmativas em um Estado Democrático de Direito, assim, vê-se o que segue:

“O objetivo principal da implementação das ações afirmativas está, sem dúvida, em garantir a consecução do princípio de igualdade de oportunidades entre determinados grupos ou indivíduos excluídos socialmente. Essa igualdade de chamas, na forma da exclusão social, viria a propiciar o combate às distorções econômicas e sociais verificadas ao longo do tempo, de direito è educação, ao emprego e ao salário”.

Partindo dessa análise, sob o ponto de vista de John Rawls, sobretudo, no tocante ao ideal de justiça por ele compreendido, resta claro dessa maneira que a todos sem distinção, devem ser proporcionados uma igual medida às liberdades básicas, bem como, considerar desigualdade econômicas e sociais no sentido de serem estas, ao seu modo, vantajosas para o coletivo dentro daquilo visto como razoável para aquela sociedade, além de estarem vinculados, a posições e cargos abertos a todos.

 A discriminação em sua forma legitima tem um caráter um tanto quanto compensatório, em relação àqueles que foram atacados por algum traço de discriminação ilegítima, com um único escopo, restaurar o ideal de igualdade que premeia essa sociedade, o que deve ser visto como uma responsabilidade imputada ao Estado; que, se, realizadas com o auxilio de terceiros, a esses poderiam perfeitamente ser aplicada a chamada sanção premial, em suma significa dizer que seria uma espécie de incentivo concedido a esse terceiro, em razão de cumprirem e/ou superarem as expectativas estabelecidas nos preceitos normativos.

Sob esses argumentos, poderíamos apontar o seguinte posicionamento:

“O mundo atualmente, ou melhor, a civilização planetária, sofre mudanças extremamente rápidas. O Estado se adapta e se modifica, mas não perde essa finalidade, que é o bem-estar social. Especificamente a Constituição Brasileira, impõe ao Estado, deveres que proporcionam as condições e instrumentos para se atingir o progresso. Inúmeros dispositivos da Carta Magna declaram o Brasil um Estado Democrático de Direito. Eis a ‘fórmula política’ brasileira, que se apresenta como um programa de ação a ser partilhado por todo integrante da comunidade política, e, por isso responsável a um só tempo por sua mobilidade e estabilidade. Na verdade, isso é uma maneira para se construir uma sociedade livre, igual, justa, independente, solidária e que promova o desenvolvimento nacional como bem explicita os primeiros artigos constitucionais”. (2003, p. 19)

Um Estado Assistencialista na sua essência, visa uma proteção social, principalmente, em decorrência dos processos macroeconômicos, combinado à crise econômica que eclodiu na década de 70, o Estado Assistencialista surge na sociedade brasileira nos anos 1990, impulsionado pela política neoliberal.

Porto (2013, p. 2-3) vem demonstrar o que seria esse estado assistencialista, in verbis:

“Dessa forma, estando efetivamente inscrito nessa conjuntura caracterizada por profundas mudanças recessivas, parte-se do entendimento de que a constituição do Estado Assistencialista no Brasil possui como substrato central as políticas de ajuste neoliberal, amplamente implementadas no decorrer das décadas de 80 e 90, tendo como principais agenciadores a burguesia nacional em suas vinculações com as instituições de Bretton Woods. Nesses termos, o Estado Assistencialista pode ser considerado, uma acepção preliminar, como modo de regulação social integrante do modelo de acumulação flexível e neoliberal em vigor, de forma abrangente, no contexto dos países latino-americanos”.

A autora vai ainda mais além (Porto, 2013, p. 3) a partir do momento em que aponta o Estado Assistencialista como um propósito constitucional, o qual sirva com step para a promoção da inclusão social daqueles que são considerados mais vulneráveis, por intermédio de programas, projetos, benefícios e serviços de cunho assistencial, tal como apresentado, a priori, na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS). A título de complementação, mais uma vez, parafraseando a autora em questão, no seguinte aspecto,

“… o Estado Assistencialista vem operando de forma ativa na dinâmica da sociedade brasileira, a partir dos anos 90, consistindo numa modalidade restrita de intervenção estatal na provisão social – na medida em que transfere essa responsabilidade para o âmbito privado e/ou filantrópico -, tendo por fundamento as políticas de ajuste neoliberal. Quanto ao seu ideário, este se assenta na inclusão marginal dos segmentos sociais vulnerabilizados pela condição de pauperização, apresentando-se por intermédio do processo de precarização das políticas sociais públicas em suas dimensões focalizadas, descentralizadas e privatizada”.(PORTO, 2013, p. 4)

Essa política constitucional é algo recente na história jurídica brasileira, oriunda das constantes mutações sociais, tornando-se quase impossível atender de modo razoável a todos dentro deste contexto social.

Partindo da análise das informações explanadas ao longo deste capitulo, tendo por escopo sintetizar, e, ate mesmo, otimizar a compreensão acerca desses dois institutos, alguns elementos tidos como imprescindíveis para o que se propõe, apresentamos a tabela a seguir:

5. Ações afirmativas são adequadas a um Estado Democrático de Direito?

Conforme apontamos em momento anterior, a “história” das ações afirmativas tem origem no cenário norte americano, no intervalo entre as décadas de 50 e 70, forçando uma reestruturação tanto do Estado quanto da sociedade, passando pela auforia do primeiro negro americano Anthony Johnson no ano de 1647, ate o triunfo de Barack Obama na presidência dos Estados Unidos, muito embora, vale frisar que ainda hoje a condição de vida dos negros em solo americano, é, em muitos locais, precária; logo, figuram as ações afirmativas nesse ambiente, como uma linha muito tênue entre algo que seja conveniente ou não.

Entretanto, no Brasil a situação é um tanto divergente daquela vivenciada nos Estados Unidos, é nesse sentido que Cruz (2009, p.185) expressa que,

“Por aqui, não encontramos um núcleo de normas antidiscriminatórias ou afirmativas em favor das minorias, tal com se vê nos Estados Unidos. No entanto não podemos nos desanimar. O advento da Constituição de 1988 trouxe inegavelmente novos “ventos” para a Sociedade Brasileira, que começa a articular discussões sobre esse tema”

Indo um pouco mais alem, Cruz (2009, p 185) complementa:

“Restou claro, a partir do exame da experiência norte-americana, que as políticas afirmativas não se confundem exclusivamente com implementação de quotas. Não há dúvidas de que elas são um aspecto nodal na questão. Contudo, podemos enquadrar como afirmativas quaisquer posturas estatais e privadas favoráveis à integração sócio-econômica das minorias, garantindo, ao mesmo tempo, a identidade sociocultural dos grupos minoritários”

Como bem se sabe, o Brasil é um país pluralista na sua essência, desde o inicio da sua formação; em razão disso, algumas questões devem, cuidadosamente, ser analisadas, a partir do momento em que se objetiva frear essa onda de discriminação que a muito transita pela sociedade brasileira, para isso, as minorias devem ser cuidadas, para que se reverta o quadro, partindo da máxima, tratar desigualmente os desiguais na medida da sua desigualdade, abordando mulheres, homossexuais, negros, pessoas portadoras de deficiência.

No que tange às mulheres, a sua integração no meio social, decorre basicamente das suas reivindicações, sobretudo, no que guarda relação com as conquistas inerentes ao mercado de trabalho, o que repercutiu em outras conquistas, combinado ao crescente numero de famílias monoparentais, chefiadas pelas mulheres, percorrendo pelos ganhos políticos, como o direito ao voto, aprovação de leis protetivas pelo legislativo, tal como a Lei 11.340/2006, a tão comentada Lei Maria da Penha, dentre tantas outras. Cargos nunca antes ocupados por mulheres, como a cargo de Ministra do Supremo Tribunal Federal por Ellen Grace Nortfleet, e, posteriormente, Carmem Lúcia Antunes Silva (2009, p. 186-190).

Merecem destaque as conquistas auferidas pelos homossexuais ao longo dos anos; especialmente, a Lei 1.151/1995, garantindo a união civil entre os casais homoafetivos, que, até então, não considerava essa união como forma de família, tal como determinado pela Carta Magna m seu artigo 226, § 3º (2009, p. 191), o que só foi possível em maio de 2011, quando os ministros do STF, conferiram reconhecimento legal a união estável de homossexuais, assegurando a estes, todos os direitos previstos anteriormente meramente para os casais heterossexuais, contrariando todas as decisões até então conhecidas nos tribunais brasileiros, sendo essa união até esse ponto, reconhecida apenas como uma sociedade de fato.

Fazendo uma análise histórica da sociedade brasileira, que em determinado período, passa a ser composta por grande parte de negros, oriundos do tráfico negreiro, por volta de 1831, para trabalharem na condição de escravos, para os chamados “senhores de escravos”, nas mais diversas funções, os quais, posteriormente, ao obterem a liberdade seja por meio das Cartas de Auforia, da Lei 2.040 datada de 27 de maio de 1871 a chamada Lei do Ventre Livre, da Lei 3. 270, aprovada em 28 de setembro de 1885, vulgo Lei do Sexagenário, ou, pela Lei 3.353 de 13 de maio de 1.888, também conhecida por Lei Áurea, passaram a viver na sociedade brasileira, refazendo suas trajetórias; toda via, muito ainda deveria ser feito, pois, a diferença de tratamento era gritante, em razão daquele resquício de escravidão, condições minimamente dignas de vida, de trabalho, estudo e tantas outras, fazem com que o Brasil, mesmo signatário de políticas contrárias às formas de discriminação racial, ainda assim, precisa fazer muito pelas medidas afirmativas em favor dos negros.

Ante o exposto, se torna mais claro a observação feita pelo professor Álvaro Ricardo de Souza Cruz em sua obra O Direito à Diferença (2009, p. 206)

“Nesse sentido, no campo penal, as normas repressivas nas Leis nº 7.716/89 e 9.459/97 permanecem quase em desuso. No aspecto laboral, permanecem, ainda, as exigências de ‘boa aparência’ pelo mercado de trabalho. Mantém-se, também, a violência policial, fato denunciado recentemente pela Ouvidoria de Polícia do Estado de São Paulo. O estudo revelou que as vítima s de homicídios praticados por policiais, especialmente por tiros pelas costas ou na cabeça, são desproporcionalmente maiores quando se trata de pretos e pardos. Contudo, os riscos e problemas de implementação das ações afirmativas devem ser encarados de forma aberta e discursiva. Desse modo, é inegável o avanço e a proliferação de tais ações nos últimos anos”

Complementando ainda que:

“Com relação ao negro, os últimos anos constituíram uma verdadeira ‘revolução’ em termos de políticas afirmativas, o que não significa dizer que todas as medidas devam ser saudadas por sua racionalidade e constitucionalidade” (CRUZ, 2009, p. 212)

Dentre todas as minorias destacadas ao longo desse capitulo. As pessoas portadoras de deficiência, nas mais variadas formas e/ou limitações sejam elas física, intelectual… , contam com um número mais expressivo de ações afirmativas em seu favor, o que não impede que os Estados não a reconheçam; sendo inseridos nos mais variados segmentos, educação, saúde, trabalho, habitação, acessibilidade (CRUZ, 2009, P. 214), possibilitando a sua inserção no contexto social, de modo a barrar posturas discriminatórias.

Ações afirmativas, conforme demonstrado em outros momentos, funcionam como uma forma legitima de discriminação, tendo um único objetivo, promover a integração daqueles indivíduos e/ou grupos historicamente discriminados naquela sociedade, por meio de um tratamento diferenciado, o que, por sua vez, não guarda nenhuma relação com a forma de discriminação ilegítima, a qual parte diretamente de “pré-conceitos”, estruturados nos estereótipos característicos daqueles indivíduos e/ou grupos.

Portanto, ações afirmativas, em linhas gerais, são de fato, aplicáveis a sociedade brasileira, fundada em um Estado Democrático de Direito, uma vez que estas figuram como um modelo de garantia a princípios constitucionais fixados em nosso ordenamento jurídico, como a dignidade da pessoa humana, o pluralismo, e, o próprio princípio da igualdade, o que não se funde com as teorias compensatórias, pois estas, por sua vez, são insuficientes no paradigma do Estado Democrático de Direito, questões essas, de suma importância para que de fato, a coletividade brasileira conheça da democracia.

6. CONCLUSÃO

Conforme observado ao longo deste trabalho, foi possível conhecer acerca das questões inerentes ao instituto da discriminação; sobretudo, a discriminação sob o seu aspecto legítimo, associando a Discriminação Lícita ao Estado Democrático de Direito, mais especificamente, no que diz respeito ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.

Torna-se viável compreender o quão necessário se faz a inserção de Ações Afirmativas no Estado Brasileiro, com o intuito de reverter a praticas constante e cada vez mais crescente de discriminações ilícitas mesmo em uma sociedade que se estrutura em um modelo de Estado Democrático de Direito, fazendo com que a sociedade brasileira se torne o mais isonômica possível.

Ao entender acerca de uma melhor aplicabilidade e o que seriam essas chamadas Ações Afirmativas, chega-se ao entendimento de que o Estado Brasileiro está voltando cada vez mais para adotar posicionamentos como esses, saindo do campo das políticas de caráter assistencialistas, o que poderia ser visto como o ponto inicial para o surgimento das Ações Afirmativas que veem se desenvolvendo e a cada dia ganhando novo fôlego e novos seguidores.

Transitando pelas diversas formas de Estado (Liberal, Social, Democrático de Direito) que contribuíram para a formação e evolução das sociedades, vemos que a busca por reconhecimento e igualdade sempre se fez presente, é claro, em consonância com o período vivenciado, as situações apresentadas, de tal modo, é aceitável pontuarmos que esse debate trás junto a si uma demanda de valor histórico, tendo em conta o lapso temporal que se formou em relação a essa matéria. O que vem corroborar para que fosse possível alegar que a busca por igualdade e reconhecimento não é um tema de fato recente no cenário brasileiro, o que é novo é o modo como os indivíduos têm enxergado esse assunto, e, buscando uma forma para que essa vertente de fato de consolide e o Brasil seja uma comunidade isonômica em sua realidade e não apenas um objetivo a ser alcançado, acredito ser este o pilar que estrutura a elaboração do trabalho que se apresenta, a julgar toda a questão social e a evolução história que envolve o assunto.

É nesse sentido que se fala que, muito embora seja essa (reconhecimento e igualdade) uma questão que já demonta tempo, concomitantemente a esse ponto, nota-se ser também um assunto discutido por doutrinadores jurídicos, os quais adotam posicionamentos diversos; entretanto, essa abordagem se faz presente na leitura de todos esses expoentes jurídicos, o que nos leva crer que, independentemente do pensamento adotado, ideias relativas à igualdade, preceitos fundamentais, que impliquem em reconhecimento (leia-se respeito e dignidade frente à sociedade) sempre serão defendidos.

Logo, o que se absorve a partir dos posicionamentos demonstrados nesse estudo, volta-se para ideias que circundam as cadeiras dos Direito desde o início da graduação e se mostram sempre presentes, a preocupação em relação à dignidade da pessoa humana, a observância de princípios constitucionais, a letra do texto constitucional em si, pontos estes, que regem toda a estrutura do nosso ordenamento jurídico, que mais uma vez, em concordância com o que já foi mencionado inúmeras vezes no discorrer desse trabalho, a necessidade de se construir de fato uma sociedade democrática.

Diante desses fatos, resta claro que uma sociedade que se mostre inserida em um Estado Democrático de Direito, deve promover mecanismos de reconhecimento e igualdade daqueles grupos vistos como minorias sociais, e o faz de modo eficaz quando se prontifica a estabelecer no seu contexto social Ações Afirmativas do modo como apresentado neste trabalho.

 

Referências
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DWORKIN, Ronald. A virtude soberana: a teoria e a pratica da igualdade. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
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PORTO, Maria Célia da Silva. Estado Assistencialista e “questão social” no Brasil. Disponível em: http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinppII/pagina_PGPP/Trabalhos2/Maria_Célia_d_Silva_Porto.pdf. Acesso em: 15/08/2013.
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Informações Sobre o Autor

Thaís de Fátima Oliveira Moreira

Bacharela em Direito pelo Centro Universitário de Sete Lagoas 2013. Especialista em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais 2016


Equipe Âmbito Jurídico

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