Resumo: O artigo analisa os aspectos previstos no art. 12 do anteprojeto do novo CPC. Trata-se das normas aplicáveis a jurisdição civil e a possibilidade de aplicação das disposições previstas em tratados e convenções internacionais em que o Brasil é signatário.
Palavras-chave: Jurisdição civil. Tratados e convenções internacionais. Anteprojeto do novo Código de Processo Civil.
Abstract: The article analyzes the factors in the art. 12 of the draft of the new CPC. These are the rules applicable to civil court and the possibility of applying the provisions contained in international treaties and conventions to which Brazil is a signatory.
Keywords: Civil jurisdiction. International treaties and conventions. Draft of the new Code of Civil Procedure.
Sumário: Introdução. 2. Tratados e Convenções Internacionais. 3. Considerações Finais. Referências.
1. Introdução
O artigo 12 do anteprojeto do novo Código de Processo Civil dispõe:
“Art. 12. A jurisdição civil será regida unicamente pelas normas processuais brasileiras, ressalvadas as disposições específicas previstas em tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário.”
O anteprojeto dispõe a respeito de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário. Inexiste dúvida que referido artigo reforça a necessidade de a Justiça brasileira cumprir os tratados internacionais dos quais o país tenha firmado.
2. Tratados e Convenções Internacionais
É importante, trazer algumas considerações a respeito da atual forma de incorporação destes pelo ordenamento jurídico brasileiro, bem como a respeito de eventuais confrontos entre tratados e normas internas.
Os tratados, convenções, protocolos e acordos internacionais[1] constituem importantes fontes de direito, em especial, a respeito da definição da competência internacional, desde que, devidamente, homologados pelo direito brasileiro.
Em decorrência dos diferentes ordenamentos jurídicos existentes no mundo, muitos Estados buscam uma harmonização de sua legislação, através da assinatura de Convenções Internacionais que, pelo processo de ratificação, integrarão o direito interno de cada Estado – membro.
Ensina Celso D. de Albuquerque Mello:
“Os tratados são considerados atualmente a fonte mais importante do DI, não só devido à sua multiplicidade mas também porque geralmente as matérias mais importantes são regulamentadas por eles. Por outro lado, o tratado é hoje considerado a fonte do DI mais democrática, porque há participação direta dos Estados na sua elaboração. Os tratados só podem ser definidos pelo seu aspecto formal, porque todos os assuntos podem ser regulamentados por normas convencionais internacionais.”[2]
O artigo 84, inciso VIII, da Constituição Federal atribui, privativamente, ao Presidente da República o poder de celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional.
Já o art. 49, I, da Constituição Federal, confere competência exclusiva ao Congresso Nacional para resolver sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.
Cumpre destacar que os Tratados, Convenções, Acordos e Protocolos para terem eficácia, no direito brasileiro, necessitam a observância de diferentes atos.
A incorporação de tratado internacional pela ordem brasileira passa por pode diferentes procedimentos sendo que após a assinatura pelo Presidente da República (ou através de delegação ao Ministério das Relações Exteriores[3]) é enviado ao Congresso Nacional, a fim de aprovação ou rejeição do tratado pelo Poder Legislativo, com a elaboração de Decreto Legislativo. Uma vez apreciado e deliberado depende de promulgação pelo Presidente do Senado Federal e, posterior ratificação do Presidente da República[4].
Enquanto não cumpridos os requisitos, o tratado não tem eficácia no direito brasileiro[5], posto que o sistema constitucional brasileiro não consagra o princípio do efeito direito, nem o postulado da aplicabilidade imediata dos tratados ou convenções internacionais, logo enquanto não se concluir o ciclo de sua transposição, para o direito interno, os tratados internacionais e os acordos de integração, além de não poderem ser invocados, desde logo, pelos particulares, no que se refere aos direitos e obrigações neles fundados (princípio do efeito direto), também não poderão ser aplicados, imediatamente, no âmbito doméstico do Estado brasileiro (postulado da aplicabilidade imediata).
Para produzir efeitos na ordem interna, deve ocorrer a promulgação do Decreto do Poder Executivo pelo Presidente. Em julgamento a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, o Ministro Celso de Mello destacou que a edição desse ato presidencial acarreta três efeitos: a) promulgação do tratado; b) publicação oficial de seu texto; c) executoriedade do ato internacional que passa então a “vincular e obrigar no plano no plano do direito positivo interno”, tal como uma lei ordinária[6].
Quando há conflito entre tratado e norma de direito interno, se o Estado não dispuser a esse respeito, como é o caso do Brasil[7], existe apenas um tratamento paritário, tomando-se, como paradigma, as leis nacionais e diplomas de grau equivalente[8].
Não obstante, uma vez vigente internamente, é quase unânime o entendimento doutrinário e jurisprudencial de que o tratado equipara-se à lei federal.
Neste sentido, ensina Luiz Olavo Baptista:
“Com efeito, se a norma de direito internacional foi introduzida no direito interno para nele operar como se fora lei, não haveria porque dar-lhe hierarquia superior. A hierarquia é a mesma, exceto no caso, muito especial, das leis complementares”.[9]
Os tratados e convenções internacionais estão no mesmo plano das leis em geral, sendo fontes legislativas da norma processual[10].
Em que pese não ser pacífico esse entendimento, pois há alguns doutrinadores que defendem a primazia da norma internacional sobre as leis internas, esse vem sendo o entendimento do STF[11].
Destaque-se que, por longo tempo, a jurisprudência do STF, afirmou a primazia do Direito Internacional sobre o Direito Interno, adotando, portanto, uma orientação monista[12].
Contudo, em julgamento de Recurso Extraordinário n.º 80.004 ficou assentada, por maioria, a tese de que, ante a realidade do conflito entre tratado e lei posterior, esta, porque expressão última da vontade do legislador republicano deve ter sua prevalência garantida pela Justiça, sem embargo das conseqüências do descumprimento do tratado no plano internacional.
Desde então, a doutrina majoritária entendeu que, de acordo com a decisão do referido recurso extraordinário, o Brasil passou a adotar uma espécie de monismo, a qual chamou de monismo moderado[13].
O Supremo Tribunal Federal manteve esse posicionamento, classificando o sistema constitucional brasileiro como dualista moderado, pois, apesar de não exigir a edição de lei para o efeito de incorporação do ato internacional ao direito interno, reafirma categoricamente a necessidade de promulgação do tratado através de decreto do Presidente da República para que tenha início tal vigência.
Pode-se dizer que as decisões mantêm vigentes as matérias contempladas nos Tratados e Convenções se não previstas na lei interna posterior.
Contudo, de acordo com a jurisprudência e a doutrina, não é pacífica a questão da validade de Tratado, se editada lei interna posterior a respeito da matéria[14].
3. Considerações finais
Diante disso, considerando os tratados e convenções, pelo nosso ordenamento pátrio, na mesma hierarquia das leis ordinárias, a melhor orientação, em que pese posicionamento diverso, é ocorrer derrogação da lei interna ou do tratado ratificado pelo Brasil anterior quando a norma posterior tratar da matéria.
Essa parece a alternativa mais adequada enquanto não houver critérios específicos por parte do legislador, definindo a hierarquia de cada um.
Como o artigo 12 do Novo Código de Processo Civil fala apenas em signatário pode-se estar diante de uma situação diversa da supra mencionada, diferenciando-se o rito exigido para incorporação no ordenamento jurídico brasileiro.
Se essa realmente for a vontade dos autores do anteprojeto do Novo Código de Processo Civil representará um avanço e uma agilidade na medida em que, não existirá mais a dependência de envio ao Congresso Nacional e posterior ratificação pelo Presidente da República, bastando apenas a assinatura pelo mesmo ou seu representante.
Um dos fatores de descrédito na ordem internacional é o longo tempo entre a assinatura e incorporação pelo ordenamento interno[15].
Contudo, ainda que seja mantido o procedimento de incorporação, o artigo em comento representa um avanço as relações internacionais porque casos de disputa internacional como guarda de crianças, seqüestro de menores e alimentos obedecerão ao disposto no Tratado ou Convenção internacional[16].
Outro aspecto que merece reflexão sobre o conteúdo do artigo do anteprojeto diz respeito a expressão tratado e convenção internacional. Será que os autores do anteprojeto buscam limitar apenas aos tratados e convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, ou, também, incluir as demais formas de modalidades de atos internacionais como acordos e protocolos?
Se a intenção é a valorização dos atos internacionais que regulamente os processos que envolvam a matéria naqueles regulamentada a leitura do artigo não deve ser restritiva, sim realizada da forma mais ampla possível.
Mestre em Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica do RS, professora do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA), Advogada
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