Sem dúvida, as invalidades processuais correspondem a um dos mais difíceis e polêmicos temas de toda ciência processual. Todo o fenômeno jurídico deve ser examinado em três planos distintos já abordados pelo insigne Pontes de Miranda.
O primeiro plano o da existência se refere aos fatos jurídicos enquanto que o plano de eficácia se refere às situações jurídicas, aos efeitos jurídicos, dentro os quais o mais importante é a relação jurídica.
O plano da validade é o dos atos jurídicos (negócios jurídicos e atos jurídicos stricto sensu) cujo suporte fático é a vontade. Existem os fatos jurídicos que não conhecem o plano de validade, é o caso de fatos ilícitos, dos atos-fatos (não se cogita sobre a invalidade de uma pintura) e fatos jurídicos naturais (tais como a morte).
A validade do ato se refere à eficiência com que o seu suporte fático foi preenchido. Se houver o devido preenchimento da hipótese de incidência (previsão do fato em enunciado normativo) de maneira deficiente, surgirá defeito capaz de nulificar o ato.
A distinção entre a nulidade e anulabilidade passa por vários critérios, mas nem sempre o legislador é fiel à doutrina. Cumpre observar que: a) ambas as hipóteses de invalidação dos atos jurídicos, com regimes jurídicos distintos (legitimidade para arguir[1], forma de arguição, prazo, sanabilidade do defeito, retroatividade da decretação de invalidade e, etc.); b) não obstante as distinções, a invalidação é sempre uma decisão constitutiva negativa.
Enfim, não há efeitos jurídicos nulos, pois estes efeitos existem ou não. Aliás, já afirmava Pontes de Miranda: “Não há relação jurídica nula nem direito nulo, nem pretensão nula, nem ação nula, como não há relação jurídica anulável, nem direito anulável e nem pretensão anulável, nem ação anulável. Nulo ou anulável ou rescindível é o ato jurídico, inclusive o ato jurídico processual, como a sentença”. (In: MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao CPC, 3ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 1998, t.6, p.141).
O ato jurídico inválido existe. Ato inexistente não tem defeito. Nem todo defeito implica em invalidação, pois a lei pode autorizar a conversão do ato jurídico defeituoso em outro ato jurídico (art. 170 do C.C.) vide a teoria da aparência pode ainda considerar irrelevante o vício, ou ainda, apesar da falha, aproveitar o ato deficiente. Afinal, a invalidação é a consequência mais drástica que pode advir da prática de um ato jurídico defeituoso.
A validade do ato deve ser vista à luz de sua formação. O ato jurídico pode nascer defeituoso. A invalidade é sempre congênita, de sorte que o defeito pode estar no próprio ato (cláusula abusiva de um contrato de consumo ou cláusula leonina ou absolutamente potestativa), ou ser anterior a este (coação, dolo, erro e etc.), mas nunca pode ser posterior. Se o ato jurídico é válido, os fatos que lhe sejam supervenientes afetarão a sua existência ou a sua eficácia, mas não a sua validade.
A resolução e a revogação, por exemplo, são causas de extinção do ato jurídico por fato superveniente à sua formação. É evidente que o ato inválido existe e, portanto, pode produzir efeitos. Assim, os atos nulos podem produzir efeitos até a sua desconstituição (é o caso do casamento nulo) e também das invalidades processuais.
Todo ato inválido precisa ser desfeito e não importa o seu grau de invalidade. A invalidação é vista como a ultima ratio, ou seja, quando não for possível ignorar o defeito, aproveitando o ato praticado, ou aceitando o ato como se fosse outro (fungibilidade) ou, enfim, determinando sua correção[2].
O juiz irá avaliar se o defeito é irrelevante, se não é possível o aproveitamento do ato como se fosse outro, ou se não é possível corrigir o defeito, somente então o ato deve ser invalidado. A verdade é que o órgão julgador sente profundo mal-estar quando tiver de invalidar algum ato processual.
Não há invalidade processual de pleno direito. Portanto, toda invalidade processual precisa ser decretada. Pois parte-se que todo ato processual é válido prima facie. Não há razão para criar tipologias das invalidades. A invalidade é uma sanção e, não há diferença se é aplicada de ofício ou por provocação. Só uma categoria é digna de nota: a invalidade processual.
Há diversas causas de invalidade processual e o regime jurídico de invalidação de atos ou procedimentos processuais nem sempre é o mesmo. Há defeitos processuais que não geram qualquer invalidade. São mínimos e chamados por alguns doutrinadores de meras irregularidades.
É o exemplo: o advogado que realiza sustentação oral sem utilizar as vestes talares, regimentalmente exigidas; quando o escrivão cientifica ter juntada uma sentença, quando em verdade, se refere à decisão interlocutória; o desrespeito às exigências de numeração e rubrica das folhas dos autos (art. 207 do CPC).
Há defeitos processuais que geram invalidades que não podem ser decretadas de ofício. São raros esses defeitos, e são estabelecidos com o objetivo de resguardar interesse particular. Normalmente, há previsão legal nesse sentido.
Nesse caso, a invalidade somente pode ser requerida pelo interessado, o silêncio no primeiro momento processual que lhe caiba se manifestar, implicará em preclusão[3]. É o caso de não alegação de convenção de arbitragem.
Como é o caso de invalidade de ato de cônjuge praticado sem consentimento do outro (art. 1.650 do Código Civil). A regra do art. 278 do CPC/2015 que é relevante e ligada a proteção de boa-fé. Impede que a parte guarde a alegação de invalidade, para que em momento futuro, venha denunciá-la, tornando o processo instável. O tema foi bem tratado pelo STJ, terceira turma, REsp 1.372.802/RJ, Min. Paulo de Tarso Sanserino, publicado do DJe 17/03/2014).
Assim se “até mesmo a falta de citação pode ficar sanada pela posterior citação no processo de execução, a fortiori, a ausência de mera intimação fica sanada pela intimação realizada em momento posterior”. Já a estratégia de permanecer silente, reservando a nulidade para ser alegada em momento posterior, já foi rechaçada inclusive sob a denominação de “nulidade de algibeira”, pela terceira Turma do STJ.
Os vícios de vontade dos atos processuais das partes também se submetem ao regramento comum de sorte que somente dão ensejo à invalidade se houver provocação neste sentido (por exemplo, a coação e erro podem invalidar a confissão – art. 393 do CPC/2015).
Há invalidades processuais que podem ser decretadas por ofício. E decorrem em geral de defeito do procedimento, como a ausência dos pressupostos processuais (art. 485, terceiro parágrafo do CPC). Em tais casos, pendentes o processo, não há preclusão do poder de invalidar e nem há restrição quanto à legitimidade em suscitá-la tendo em vista que o juiz poderá fazê-lo de ofício.
E, finalmente existem defeitos que levam a invalidade que pode ser decretada de ofício, não tendo impugnação da parte interessada ou prejudicada, no primeiro momento processual que lhe cabia se manifestar, configurará a preclusão. É de difícil identificação, tal defeito.
Deve-se mitigar a regra de que toda a invalidade que pode ser decretada de ofício, possa sê-lo a qualquer tempo, posto que isso comprometa a segurança jurídica e as finalidades do processo.
Vejamos dois casos:
1) O magistrado pode invalidar uma citação ex officio, até por ser um vício transrescisório[4], mas, se o réu apresentar sua resposta, e não se manifestar sobre tal fato, há preclusão da possibilidade de invalidação do procedimento por tal motivo, independentemente da verificação de ocorrência de prejuízo; o magistrado pode reconhecer de ofício a sua incompetência em razão da abusividade de cláusula de foro de eleição, mas somente pode fazê-lo até a oitiva do réu, sob pena de prorrogação de competência.
A invalidade processual é sanção que somente pode ser aplicada se houver o defeito do ato processual aliado ao prejuízo. Não há nulidade sem prejuízo ou pas nullité sans grief. Mesmo quando se trate de nulidade cominada em lei, ou as chamadas nulidades absolutas.
Há prejuízo sempre que o defeito impedir que o ato atinja a sua finalidade não basta a violação de norma constitucional para que o prejuízo se presuma. O prejuízo, decorrente do desrespeito a uma norma, deverá ser demonstrado caso a caso.
Consagra o art. 277 do CPC o chamado princípio da instrumentalidade das formas[5], assim será válido o ato se, realizado de outro modo, mas lhe alcançar a finalidade.
O art. 281 do CPC, segunda parte, a mesma linha de raciocínio, temperando o princípio de causalidade: “a nulidade de uma parte do ato não prejudicará as outras que dela seja independentes”. O ato não será repetido nem sua falta será suprida quando não prejudicar a parte.
O não menos importante há o art. 283 do CPC[6] que se dedica totalmente ao tema. O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo ser praticados os que forem necessários a fim de se observarem as prescrições legais.
Assim, ressalva o parágrafo único que: dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados desde que não resulte prejuízo à defesa de qualquer parte.
A falta de intervenção do Ministério Público[7] implica em nulidade do procedimento a partir do momento em que ele deveria ter sido intimado (art. 279, caput e primeiro parágrafo do CPC/2015). Nesses casos, a participação do MP é considerada como pressuposto processual sendo objetivo intrínseco de validade.
A nulidade somente pode ser decretada após a intimação do Ministério Público que se manifestará sobre a existência ou inexistência de prejuízo (art. 279, segundo parágrafo do CPC/2015).
A decretação de nulidade por falta de intervenção do MP deve ocorrer em consonância com diversas outras regras que norteiam os sistemas de invalidades do processo civil brasileiro.
Daí ter o Enunciado 42 do ENTA (Encontro Nacional dos Tribunais de Alçada) prever que a intervenção da Procuradoria da Justiça, no segundo grau de jurisdição evita a anulação desde que não demonstrado prejuízo do interesse tutelado[8].
Também não se invalida o procedimento por falta de intervenção do MP, quando a decisão for favorável ao incapaz, cuja presença em juízo é o motivo da intervenção do MP (art. 178, II do CPC).
Também só se deve nulificar um ato do procedimento ou o próprio procedimento se não for possível aproveitá-lo. Assim como a invalidação deverá se restringir ao mínimo necessário.
O princípio do aproveitamento dos atos processuais defeituosos, que se aplica sempre sendo o princípio da fungibilidade dos meios processuais a autêntica norma de conversão do ato nulo já consagrada no direito brasileiro (art. 170, do Código Civil).
Há regras específicas sobre a fungibilidade da tutela de urgência (art. 305, parágrafo único do CPC) e as que se referem aos recursos extraordinários (art. 1.032 e 1.033 do CPC).
Quase a totalidade dos defeitos pode ser sanada[9]. Por mais grave que seja, mesmo que apto a gerar a invalidade do procedimento ou de um dos seus atos, o defeito é sanável.
O art. 938, primeiro parágrafo do CPC/2015 ratifica esse princípio ao concretizá-lo no âmbito do tribunal, já em julgamento de recurso. Há duas exceções a essa regra: a) a falta de interesse de agir (o que se torna não suprível a falta de utilidade ou necessidade do processo); b) a intempestividade do ato processual.
O STF e STJ poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar a sua correção, desde que não repute grave. Além de poder ser sanado com repetição do ato ou a simples correção, o defeito pode ser sanado:
a) Pela preclusão da oportunidade de aponta-lo e, pois, de requerer a invalidade;
b) Pela eficácia preclusiva da coisa julgada (art. 508 do CPC), neste caso, cumpre verificar se o defeito processual transformou-se em hipótese de rescindibilidade da decisão judicial (art. 966 do CPC);
c) Ultrapassado o prazo de dois anos da ação rescisória, a decisão judicial é mantida. Sendo irrelevante a existência do defeito que possam invalidá-la.
Perceba-se que não há propriamente correção do defeito em tais hipóteses. Estes remanescem, mas se tornam inaptos de servir de fundamento para invalidade processual.
Mesmo nos casos de ausência de citação ou a citação defeituosa[10] que gerou revelia, vícios transrecisórios, que permitem a invalidação da decisão judicial há possibilidade de suprimento de defeito pelo comparecimento do réu ao processo[11] (art. 239, primeiro parágrafo do CPC).
Para Pontes de Miranda, inclusive, se o réu, citado/intimado regularmente na execução da sentença proferida em processo com tal defeito, comparecer e não o apontar, sanado estará o vício, pela preclusão.
Há invalidade do procedimento e a invalidade de cada um dos atos do procedimento. A nulificação do processo está condicionada ao não preenchimento dos requisitos de admissibilidade do processo (pressupostos processuais). São os chamados vícios de fundo segundo Teresa Wambier.
Inadmissibilidade é o nomen iuris da sanção de invalidade de procedimento ou do ato postulatório. Essa concepção deve ser aplicada a qualquer procedimento (principal ou incidental), de primeiro grau ou recursal, de conhecimento ou executivo e a qualquer ato postulatório, inicial ou incidental (petição inicial, contestação, recurso, pedido de procuração de prova, reconvenção, denunciação da lide, conflito de competência e, etc.).
Cada um dos atos de procedimento tem os seus próprios requisitos de validade. A invalidação de um dos atos do procedimento é o que determina a invalidação dos demais atos que lhe seguirem (é a regra da causalidade normativa) impedindo a realização do ato final e impondo a invalidação do todo o procedimento (ato jurídico complexo).
Os atos praticados anteriormente a nulificação não são afetados, porquanto já executados. O art. 281[12], primeira parte do CPC/2015, consagra o princípio da causalidade ou da concatenação e da interdependência dos atos processuais.
Os atos posteriores somente serão desfeitos se dependerem do ato invalidado. O juiz terá de fundamentar a razão pela qual desfaz o ato posterior.
O estudo das invalidades processuais abrange não somente os defeitos relevantes (aptos a gerar a invalidade) dos atos processuais, mas, também, os defeitos de todo o procedimento. Em ambos os casos, há invalidade processual, que deve seguir todo regime jurídico.
Admite-se que o juiz possa, apesar do defeito do procedimento (como a falta de pressuposto processual de validade) em certos casos poderá ignorar, e avançar no mérito e até a pretensão do demandante. Isso não causaria prejuízos ao demandado, muito ao contrário.
Mesmo diante de um defeito que gera a nulidade do processo (nulidade absoluta) na linguagem comum dos doutrinadores, o juiz estará autorizado a desconsiderá-lo e evitar a nulidade.
E, se puder aproveitar o ato sem causar prejuízo à parte que se beneficiaria com a nulificação (art. 282, segundo parágrafo do CPC/2015).
A regra é reforçada pelo art. 428 do CPC/2015. Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485 do mesmo diploma legal.
É distinto o regime de invalidação dos atos do juiz do sistema de qualificação dos atos dos demais sujeitos processuais. A decisão judicial defeituosa deve ser invalidada por meio da interposição do recurso, pelo qual se alegue error in procedendo.
A não impugnação da decisão defeituosa implica em preclusão ressalvada regra em sentido contrário. (Vide art. 485, terceiro parágrafo do CPC/2015).
É possível pedir a invalidação da decisão que encerra certo procedimento em certo grau de jurisdição, quando é possível pedir a invalidação da decisão por simples petição dirigida ao próprio juízo que a proferiu, que poderá desfazer a sua decisão (é o que acontece com o reconhecimento de impedimento que pode ocorrer ex officio).
Após o encerramento da instância ainda é possível haver a correção dos defeitos da decisão dos defeitos da decisão no julgamento de embargos de declaração ou em razão de erro material (art. 494 do CPC/2015).
Após o término do processo, com o surgimento da coisa julgada, a decisão somente poderia ser desfeita por ação rescisória (art. 966 do CPC/2015). Pois a coisa julgada material transforma o defeito em hipótese de rescindibilidade, mas decorrido in albis o biênio decadencial, a decisão defeituosa não mais poderá ser desfeita.
A ação rescisória, no direito pátrio, permite a rescisão da sentença por motivos relacionados à sua validade (art. 966, incisos II e IV) e à sua justiça (art. 966, incisos VI e VII). Não é correto estabelecer fidelidade entre a ação rescisória e a invalidade.
Há no direito brasileiro existem apenas duas hipóteses de decisão judicial existente que pode ser invalidada após o prazo de ação rescisória, decisão proferida ao desfavor do réu, em processo que correu à sua revelia quer porque não fora citado, ou fora citado de maneira defeituosa (art. 525, § 1º, I e art. 525, I do CPC/2015).
Mediante os chamados vícios transrescisórios[13] impugnam-se a decisão judicial, por meio de ação de nulidade, denominada querela nullitatis, que se distingue da ação rescisória, não só pela hipótese de cabimento ser mais restrita, como também por ser imprescritível e deve ser proposta perante o juízo que proferiu a decisão (e não necessariamente em tribunal, como é o caso da ação rescisória). Ambas, porém são ações constitutivas.
E pode fazer a impugnação à sentença seja através de impugnação do cumprimento de sentença; a ação imprescritível de nulidade de sentença; exceção de não-executividade;
É importante a ressalva, pois a hipótese do art. 525, §1º, I do CPC/2015, refere-se à sentença que reconhece a existência de obrigação, e que, portanto é título executivo.
Sentenças constitutivas ou declaratórias (sem eficácia executiva) que padecessem de tal vício, não poderiam ser invalidades pela impugnação, porque a execução não haveria.
Com relação aos atos das partes se distingue o modo de sua invalidação pela existência ou não da coisa julgada material. Se existir coisa julgada, os atos das partes tornam-se invulneráveis, não podendo mais ser invalidados.
A eficácia preclusiva da coisa julgada torna anódina a apreciação da validade de tais atos jurídicos, ressalvadas as hipóteses em que isso for relevante para destituir a própria coisa julgada, como nos casos do inciso III do art. 966 do CPC/2015.
Por outro lado, se não há coisa julgada, o ato processual da parte pode ser invalidado, se não tiver havido preclusão, de ofício, quando for o caso, ou a partir da simples petição dirigida ao juiz da causa (ao relator, ad referendum do colegiado a que pertença, quando processo estiver em tribunal).
Não é necessário o ajuizamento da demanda judicial com objetivo específico, ressalvada a hipótese legal expressa que exija a propositura de ação autônoma.
A doutrina não costuma tratar da invalidade de ato processual da parte. Mas não se justifica, pois pensemos em dois exemplos muito frequentes: o indeferimento da petição inicial ou do recurso, que não preencheu seus requisitos de validade, e a nulidade do ato praticado sem capacidade processual.
Aliás, o EOAB reputa nulo o ato privativo de advogado praticado por quem não o seja. Além disso, o art. 393 do CPC/2015 expressamente autoriza a invalidação da confissão, ato exclusivo da parte.
Infelizmente, costuma-se adotar o dogma da irrelevância da vontade na prática dos atos processuais, o que é injustificável, pois parte da premissa não justificada sobre a inexistência de negócios processuais.
Questiona-se: uma demanda simulada ou promovida por coação ou dolo não pode ser invalidada? Isto significa que terá de produzir seus efeitos necessariamente, sem a possibilidade de, como ato jurídico ser desconstituída? Não há nada no sistema jurídico brasileiro que autorize essa interpretação.
A vontade é relevante no processo civil e os atos da parte são atos jurídicos como quaisquer outros. Desta forma, aplica-se ao ato processual da parte a regra do art. 166 do Código Civil.
Tal observação é, ainda, importantíssima em um sistema que estimula a negociação processual. Nada impede que se exija o ajuizamento de ação autônoma para invalidar o ato processual.
Se, não há a coisa julgada e, o processo, já se encerrou, é possível o ajuizamento de ação de invalidação. Os atos processuais dos auxiliares do juiz são invalidados pelo magistrado da causa, o que inclui o relator, ao referendum do colegiado a que pertença, quando o processo tramitar em tribunal nos próprios autos, e no mesmo processo, sem necessidade de ação autônoma com esse objetivo, ex officio ou a requerimento da parte interessada. É o caso do pedido da invalidação da penhora, da citação ou do ato praticado por delegação nos termos do art. 203, §4º do CPC.
Existem três normas fundamentais sobre o processo civil com relevante influência na decretação das invalidades processuais. São estas: proporcionalidade (devido processo substancial), eficiência e cooperação.
É curial verificar a relação de adequação-necessidade e razoabilidade entre o defeito do ato processual e a sanção da invalidade, que dele, é consequência.
Na avaliação da gravidade do defeito, também é indispensável ponderar a invalidação do ato do procedimento não seria medida por demais drástica e não-razoável.
Na verdade, a proporcionalidade deve ser observada, principalmente na própria análise da gravidade do defeito. O princípio da eficiência está muito ligado ao sistema de invalidação dos atos processuais.
Muitas regras recomendam que o juiz procure extrair o máximo de eficácia dos atos defeituosos, para se evitar a desnecessária repetição.
O princípio da cooperação aplica-se ao sistema de invalidades processuais. Revela-se facilmente quando o juiz cumpre o seu dever de prevenção que lhe impõe a conduta de advertir às partes sobre os defeitos processuais de seus atos, dando-lhes prazo para correção do defeito e, indicando o modo como o defeito deve ser sanado.
Como lembrança, cabe ressaltar o dever do magistrado de apontar o defeito para petição inicial antes de indeferi-la, exatamente para que a parte autora possa exercitar o seu direito de emenda do instrumento da demanda (art. 321 do CPC).
Vige também o princípio da boa-fé objetiva que proíbe o venire contra factum proprium (que é o comportamento contraditório) que ocorre quando se exerce posição jurídica em franca contradição com o comportamento anteriormente da mesma pessoa diferidos no tempo, senão o primeiro (o factum proprium) contrariado pelo segundo ato. Trata-se de produção à deslealdade.
No tratamento positivo dado à preclusão que significa a perda de poder jurídico processual ou faculdade processual, a doutrina se refere à preclusão lógica que consiste na impossibilidade da parte em praticar determinado ato ou postular certa providência judicial em razão de incompatibilidade existente com aquilo que a parte procedeu como conduta anterior.
Enfim, consagra-se pela preclusão lógica a regra nemo potest venire contra factum proprium. O novo CPC prevê o art. 276 que prevê. Quando a lei prescrever determinada forma sob pena de nulidade, a decretação desta não pode ser requerida por quem lhe deu causa. O enunciado se aplica às nulidades relativas ou anulabilidades processuais.
O ato processual é espécie de ato jurídico, sendo que a lei estabelece determinada forma para a sua prática cuja inobservância pode gerar a ineficácia, nulidade ou inexistência do ato processual.
Assim ao não observar a forma prevista em lei para o ato processual, configura-se um ato viciado, defeituoso, atípico, contrário às previsões legais. A consequência da imperfeição do ato guarda íntima relação com a natureza e a gravidade do vício, além da própria natureza do ato processual.
É curial sublinhar que não cabe confundir os conceitos de existência, a validade, eficácia do ato processual.
O plano da existência deve ser o primeiro plano a ser analisado, considerando-se que para o ato processual não existir juridicamente, não passará de mero fato, não podendo ter qualquer validade. E, no que se refere aos efeitos, o direito processual civil afasta-se significativamente do direito civil, sendo plenamente possível que um ato processual inexistente gere efeitos como se existente e válido fosse, somente cessando tal eficácia, quando da declaração judicial do vício.
Imagine-se uma sentença proferida por um juiz aposentado, em nítido caso de inexistência do ato processual (quando, por exemplo, faltou o pressuposto processual subjetivo da investidura). A parte vencedora poderá executar tal sentença, e caso o executado nada alegue é possível imaginar tal execução chegando ao seu final com a satisfação do direito do exequente. Enquanto não existir a decisão que declare o ato inexistente, portanto, é correto afirmar-se que mesmo o ato inexistente gera efeitos.
Conforme afirma parte da doutrina, os atos processuais com defeitos dessa ordem não produzem efeitos porque em si mesmo não os têm, ou porque o resultado desejado encontra barreiras jurídicas tão sólidas que, de modo absoluto, impedem sua produção.
É certo que mesmo os atos inexistentes juridicamente, por simples existência fática, poderão gerar efeitos. Por outro lado, também é verdade que existem atos juridicamente inexistentes que não geram efeitos, antes mesmo de sua declaração judicial como a sentença sem dispositivo.
Somente se chegará ao plano da validade quando se ultrapassa o plano da existência aferindo-se a validade do ato jurídico processual desde que exista juridicamente. O ato inválido é o ato viciado, que não vale em razão de sua imperfeição formal, mas pode gerar efeitos.
Ato que não gera efeitos é ato ineficaz, e, conforme visto no processo civil, todos os atos são eficazes, independente de sua regularidade ou imperfeição, sendo que os viciados somente gerarão efeitos até que sejam declarados por decisão judicial atos nulos e inexistentes.
É relevante consignar que qualquer que seja o vício do ato processual, o mesmo somente não será apto, ou deixará de produzir efeitos, após decisão judicial que reconheça tal imperfeição do ato. Significa afirmar que no direito processual não existe a figura do ato jurídico nulo de pleno direito, que desde o momento de sua prática não gera efeitos, sendo todos os atos meramente anuláveis, já que sempre dependem de decisão judicial a reconhecer o vício, somente deixando de produzir efeitos após a prolação da decisão.
É possível, em razão de tal regra, inclusive imaginar situação em que ato viciado (frise-se, qualquer espécie de imperfeição) gere efeitos eternamente, como se válido fosse, bastando para tanto não existir decisão judicial que ateste o vício, declarando-o nulo ou até mesmo juridicamente inexistente.
Igualmente importante é diferenciar o vício do ato processual com sua nulidade que representa a consequência natural da inadequação de confundir objeto e efeito de um mesmo fenômeno processual – até mesmo porque nem sempre a ocorrência desse fenômeno gerará o efeito programado a ele por lei.
Da mesma forma, a revelia não se confunde com seus efeitos que são aspectos diferentes do fenômeno consubstanciado na ausência jurídica de contestação que, se é fato suficiente para gerar a revelia, dependerá de outras circunstâncias para gerar seus efeitos (lembre-se de quando se tratar de direito indisponível para que o efeito de presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor não seja gerado).
O ato viciado corresponde ao ato imperfeito, ou seja, o ato que fora praticado com defeito, pois houve desrespeito à forma legal prevista expressamente para sua prática. Afinal, todo ato processual tem um objetivo e um resultado pretendido pela parte que o pratica, a lei assegurada às partes que, praticado o ato dentro das formalidades legais, o efeito legal será gerado e o objetivo pretendido alcançado.
Nota-se que a formalidade é relevante no sistema processual, pois representa a segurança jurídica à parte que, respeitando as formas[14] legais, garantindo-se de antemão que se conseguirá atingir seus objetivos.
O réu já sabe antecipadamente que caso sua contestação for formalmente perfeita, evitará a revelia e tornará os fatos alegados pelo autor controvertidos, a parte sabe que, se apelar da sentença cumprindo as exigências formais, evitará o trânsito em julgado, e assim por diante.
Da mesma maneira que a lei garante que o respeito à forma legal leva à geração dos efeitos legais e à obtenção do resultado pretendido por quem o praticou, o que justifica a criação da sanção processual a ser aplicada para a parte que descumpre a forma legal na prática do ato, que é chamada de nulidade.
O desrespeito à forma[15] é suficiente para a configuração de um ato defeituoso, e que em regra esse desrespeito com a forma é sancionado pela nulidade, que impedirá que o ato processual gerasse os efeitos previstos em lei e, por consequência, que a parte que o praticou alcance o objetivo pretendido. A doutrina afirma que nesse caso o ato defeituoso será um ato inválido ou atípico.
Portanto o ato viciado não se confunde com o ato nulo, sendo o primeiro apenas o ato defeituoso, enquanto o segundo é o ato defeituoso atingido pela nulidade. A distinção fica mais visível quando se perceber que, apesar de binômio “ato defeituoso-nulidade” ser a regra de nosso sistema, nem sempre um ato imperfeito gera a nulidade, ou ainda, gera diferentes formas de nulidade.
O sistema processual pode excluir certas espécies de vícios do âmbito das nulidades, é o que ocorre com a mera irregularidade, que apesar de tomar o ato defeituoso nunca gera a nulidade do ato. Ademais, podem ser criadas exceções na praxe forense, como ocorre na aplicação do princípio da instrumentalidade das formas.
Na instrumentalidade das formas[16] apesar de se reconhecer que o ato seja defeituoso, porém, por escolha do legislador no sentido de não impor formalismo exagerado, afasta-se a nulidade do ato, permitindo-se que este gere normalmente seus efeitos e, que a parte que o praticou venha atingir o objetivo almejado, desde que não exista prejuízo.
Note-se que na aplicação do referido princípio, não se considera a convalidação do vício ou ainda com a sua retificação, mas simplesmente reconhece-se que o ato é defeituoso, mas não deve gerar nulidade, o que o faz em termos de eficácia com ato idêntico ao praticado em respeito às formalidades legais.
Por outro viés, a gravidade do dano determina a forma pela qual a nulidade é procedimentalmente disciplinada: quem pode alegar, em qual momento, de que maneira, e, etc. Eis a justificativa porque as diferentes espécies de vícios primeiramente levam à geração ou não nulidade; e num segundo momento, determinam o tratamento procedimental dessa nulidade. Resta evidenciada, portanto, a importância crucial da distinção entre o ato viciado e a nulidade.
Boa parte da doutrina considerando a gravidade do vício e a natureza do ato processual divide as imperfeições em quatro categorias: meras irregularidades, nulidades relativas, nulidades absolutas e inexistência. Porém, tal classificação não é pacífica.
Calmon de Passos sobre o tema entendeu incorreta a diferenciação da nulidade absoluta e relativa ou da nulidade e da anulabilidade, que gerariam vícios sanáveis ou insanáveis. Para o sistema brasileiro existem somente dois tipos de atos: os perfeitos e os defeituosos, também chamados de atos atípicos porque desviados do tipo legal. Os atos defeituosos podem sofrer a sanção da nulidade, desde que satisfeitas algumas exigências legais, quando então se tornarão ineficazes.
Há quem proponha a classificação fundada em nulidades de forma e de fundo, além de admitir as meras irregularidades e os atos juridicamente inexistentes. As nulidades de forma são em regra relativas, somente sendo absolutas, quando expresso em lei, havendo nesse caso a presunção absoluta de prejuízo.
Por outro lado, as nulidades de fundo são as consubstanciadas em vícios referentes às condições da ação, pressupostos processuais positivos de existência e de validade e os pressupostos processuais negativos que correspondem sem as nulidades absolutas. Trata-se de uma classificação original, mas que não destoa muito da classificação adotada que aponta nulidades relativas e absolutas.
Segundo Aroldo Plínio Gonçalves não existe no processo norma que proteja o interesse das partes, sendo todas estas imperativas ao disciplinar a atuação jurisdicional e a participação das partes durante o procedimento processual.
Desta forma, não se admite a clássica distinção em nulidade relativa e nulidade absoluta. Mas, sim as nulidades cominadas e não cominadas, sua distinção não reside nos efeitos que sua declaração produz, tampouco no grau de gravidade do vício, tão somente na legitimação para sua arguição e no momento adequado para sua alegação.
Marinoni e Mitidiero afirmam com razão que qualquer classificação se mostra inadequada, sustentando que o ato somente será nulo quando a infração vier a comprometer os fins de justiça no processo, frustrando o alcance de sua finalidade ou causando prejuízo. Do contrário, o ato é válido.
O art. 277 do CPC/2015 prevê a hipótese de nulidade absoluta cominada que é a ausência de intimação do Ministério Público nos processo em que deve participar como fiscal da ordem jurídica.
A novidade ficou por conta do segundo parágrafo do mesmo artigo, ao prever que a nulidade somente será decretada após a intimação do MP, que se manifestará sobre a existência ou não do prejuízo.
Assim, o dispositivo criou uma regra formal para a decretação da nulidade e que se for descumprida gera uma nulidade absoluta.
Deixa claro, portanto que só haverá anulação se demonstrado o prejuízo em face da ausência do MP no processo, consagrando, implicitamente o princípio da instrumentalidade[17] das formas.
Apesar de ser imprescindível a intimação do MP para a referida decretação de nulidade, a decisão é do juízo que analisará e concluirá se a ausência realmente gerou ou não prejuízo no caso concreto.
A análise da persistência dos defeitos nos atos processuais tem grande ligação com o atingimento de sua finalidade prática. E o Código Fux superou assim o Código Buzaid, pois enquanto que este permitia a saneabilidade de atos processuais quando envolvida formalidade sem cominação de nulidade, o CPC/2015 realizou proposital omissão da expressão “sem cominação de nulidade”, possibilitando assim a regra geral de saneabilidade de todo e qualquer ato processual desde que atingida sua finalidade.
E, o Enunciado 279 do IV FPPC expressa claramente tal entendimento: “O CPC adota como princípio a saneabilidade dos atos processuais defeituosos”.
O CPC/2015 ainda divide as nulidades em absolutas e relativas, sendo que a referida divisão se dá pela possibilidade ou não de serem reconhecidos de ofício e cobertas pela preclusão.
As nulidades relativas devem ser arguidas na primeira oportunidade em que a parte pude se manifestar nos autos após sua ocorrência, sob pena de não mais poderem ser suscitadas. Ressalte-se que o magistrado sobre tais nulidades não poderá conhecer sem a iniciativa da parte.
Já quanto às nulidades absolutas, entre estas, a falta de pressupostos processuais positivos, a presença de pressupostos negativos e condições da ação, podem ser aventadas a qualquer momento, posto que não precluem, bem como podem ser conhecidas de ofício. Mas, ainda que se trate de nulidade absoluta a decretação de nulidade pode ser obstada pela aplicação da boa-fé objetiva (arts. 5 e 276 do CPC/2015) e ainda pelo atingimento de sua finalidade (art. 277 do CPC/2015).
O Código Fux deu passo firme e decisivo pela preponderância do mérito (vide arts. 4,6, 139, inciso IX, 317, 321, 352,932, parágrafo único, 938, primeiro parágrafo, 1.007, 1.013, 1.029, terceiro parágrafo e 1.033 do CPC/2015).
Professora universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, pedagoga, advogada, conselheira do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.
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