Resumo: O presente trabalho visa apresentar o benefício de aposentadoria especial, que foi instituída pela Lei n° 3.807, de 26 de agosto de 1960. O instituto foi criado com o intuito de retirar antecipadamente do mercado de trabalho os trabalhadores expostos a agentes insalubres e agentes prejudiciais à sua integridade física antes do tempo exigido para se aposentar. O instituto sofreu alterações legislativas ao longo dos anos. Tema bastante extensivo, abordaremos nesse trabalho, a aposentadoria especial dos guardas municipais, servidores públicos estatutários, fundamentada no artigo 40, parágrafo 12 da Constituição Federal, Súmula 33 do STF e aplicação analógica do artigo 57 da lei 8.213 de 1991, aplicada ao Regime Geral de Previdência. Para tanto, o presente artigo abordará o conceito, as alterações legislativas, os requisitos legais, demonstrando as questões, controvérsias e entendimento jurisprudencial.
Palavras chave: Servidor Público Estatutário. Aposentadoria Especial. Guarda Municipal.
Abstract: this work aims to present the special retirement benefit, which was established by the law n° 3,807, of 26 August 1960. The Institute was created with the intention of withdrawing in advance of the labour market workers exposed to unhealthy agents and agents harmful to your physical integrity before the time required to retire. The Institute underwent legislative changes over the years. Fairly extensive topic, we will discuss in this work, the special retirement of the municipal guards, statutory civil servants, based on article 40, paragraph 12 of the Federal Constitution, 33 the Supreme Court Precedent and analog application of article 57 of law 8,213 of 1991, applied to the General Social Security Scheme. For both, this article will address the concept, legislative amendments, legal requirements, demonstrating, issues and controversies understanding jurisprudence.
Keywords: Statutory Public Server. Special Retirement. Municipal Guard.
INTRODUÇÃO
Será abordado de forma objetiva e clara o benefício de aposentadoria especial, cuja intenção do legislador foi retirar o trabalhador mais cedo do trabalho que o expõe a agentes insalubres e ou agentes que prejudicam sua integridade física.
Foi instituída pela lei 3.808/60 e desde então, várias são as leis e decretos que a regulamentam.
A aposentadoria especial do servidor público estatutário, será apresentada, com ênfase na atividade do guarda municipal, cuja jurisprudência vem sendo favorável à concessão desse benefício a esses trabalhadores, com fundamentação na Súmula 33 do STF e aplicação subsidiária do artigo 57 da lei 8.213 de 1991.
Demonstraremos que, a concessão da aposentadoria especial a esse núcleo de trabalhadores é justa diante o risco inerente a sua função.
E para isso, foram efetuadas pesquisas doutrinárias, sob a ótica desses autores, jurisprudência e legislação.
Com a edição da Súmula 33 pelo STF em 2014, onde se autoriza a aplicação da lei do regime de previdência geral, aos servidores públicos, abriu-se um precedente de grande valia aos servidores públicos que trabalham expostos a agentes nocivos.
O presente estudo enfatizando o guarda municipal-estatutário, visa auxiliar os estudantes e operadores do direito, abordando os pontos específicos, e demonstrando o entendimento de doutrinadores e do poder judiciário.
1. APOSENTADORIA ESPECIAL
1.1. CONCEITO
Aposentadoria especial na definição de Maria Helena Carreira Alvim Ribeiro[1]:
“A aposentadoria especial é um benefício que visa garantir ao segurado do Regime Geral da Previdência Social uma compensação pelo desgaste resultante do tempo de serviço prestado em condições prejudiciais à sua saúde ou integridade física.”
Na definição de Aleksandro Menezes Farinelli[2]:
“Aposentadoria especial é espécie de aposentadoria por tempo de contribuição, onde o segurado poderá requerê-la dependendo da atividade, sendo ela exercida por 15, 20 ou 25 anos, em razão do exercício de atividade que exponha o segurado a exposição de agentes prejudicais a saúde ou a integridade física, de forma não intermitente e habitual.”
João Batista Lazzari a define como[3]
“A aposentadoria especial é uma espécie de aposentadoria por tempo de contribuição, com redução do tempo necessário a inativação, concedida em razão do exercício de atividades prejudiciais a saúde ou a integridade física”.
Verifica-se desses conceitos, tratar-se de uma aposentadoria diferenciada, já que essa atividade exige a exposição do trabalhador a agentes prejudiciais à saúde ou a sua integridade física e exige a contribuição mínima de 15, 20 ou 25 anos.
1.2. EVOLUÇÃO LEGISLATIVA
Várias foram às alterações da legislação que trata da aposentadoria especial. Todavia, nesse artigo científico, demonstraremos as mudanças significativas para entendermos um pouco sobre a instituição dessa modalidade de aposentadoria.
A aposentadoria especial foi instituída pela lei 3.807/60, e era concedida ao segurado que contasse com no mínimo 50 anos de idade e com 15, 20 ou 25 anos de contribuição exercidos em atividade profissional cujo exercício fosse considerado penoso, insalubre ou perigoso[4].
Dentre os decretos e seus anexos, que dispuseram sobre a aposentadoria especial temos: 53.831 de 25.03.1964 e 83.080/79, estando em vigência e que trazem os quadros dos agentes nocivos à saúde do trabalhador.
A exigência da idade mínima foi suprimida pela Lei 5.440 de 23 de maio de 1968 e a carência foi reduzida para 5 anos, nos termos da Lei 5.890 de 8 de junho de 1973[5].
Com a edição da Lei 8.213 de 1991, em seu artigo 57, foi restabelecida a exigência de 15 anos e o exercício da atividade em exposição a agentes prejudiciais a saúde e integridade física.
Mas foi com a edição da Lei 9032 de 1995 que modificou o artigo 57 da Lei 8.213/ 91, que houve uma mudança na forma de aplicar a aposentadoria especial[6]:
“o enquadramento por categoria profissional foi abolido e o benefício passou a ser concedido em função da comprovação do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e da efetiva exposição dos trabalhadores aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde”.
Desta forma a redação do artigo 57 da Lei 8.213/91[7], passou a ser:
“Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.”
Ou seja, até 28/04/1995 a atividade do segurado é enquadrada como especial por categoria profissional, cujo rol está inserido nos decretos 53.831 de 25.03.1964 e 83.080/79. A partir de 29/04/1995, que instituiu o parágrafo 3, no artigo 57, exige-se que o segurado trabalhe e comprove sua exposição a agentes nocivos a sua saúde ou integridade física.
2. APOSENTADORIA ESPECIAL DO SERVIDOR PÚBLICO
2.1 CONCEITO E LEGISLAÇÃO
O artigo 40 da constituição Federal, § 4º, inciso III e § 12º, prescreve que[8]:
“Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.
§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores.
§ 12 – Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social.”
Porém até a presente data não houve promulgada lei que regulamentasse o previsto no artigo 40. Assim, no mandado de injunção 721 o Supremo Tribunal Federal, decidiu pela aplicação analógica do artigo 57 da lei 8.213/1991[9].
Diante dessas decisões vários foram os mandados de injunção interpostos, o que levou o Supremo Tribunal Federal a editar a Súmula 33[10], quanto a matéria:
“Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica. “
Com a edição da Súmula 33, os servidores públicos, estando expostos a agentes nocivos à saúde e integridade física, poderão no que couber, requerer a aposentadoria especial junto ao órgão competente.
2.2 DA APOSENTADORIA ESPECIAL DO GUARDA MUNICIPAL ESTATUTÁRIO
A Guarda Municipal (GM) é a denominação utilizada no Brasil para designar as instituições que podem ser criadas pelos municípios para colaborar na segurança pública, utilizando-se do poder de polícia delegado pelo município através de leis complementares[11].
Dentre as atribuições do guarda municipal, está a vigilância patrimonial de bens da Administração Pública Municipal, a exemplo de prédios públicos (escolas, hospitais, centros médicos), de bens de uso comum do povo (parques, jardins, praças e monumentos), bem como áreas de preservação do patrimônio natural e cultural do município e conflitos com camelôs; entre outras atividades.[12].
Os guardas municipais estatutários são regidos pelas leis do município o qual são lotados, ou seja, há um regime próprio de previdência.
Com a edição da Súmula 33 do STF, abriu-se o leque para a aposentadoria especial dos servidores públicos, nos termos do artigo 57 da lei 8.213/91. Mas ficou a pergunta: e as atividades consideradas perigosas como as do guarda municipal?
Os agentes e atividades perigosas eram previstos no quadro anexo do Decreto 53.831/64. Ou seja, bastasse ter a atividade ali descrita que se fazia juz à aposentadoria especial ou conversão desta em tempo comum.
A atividade de guarda consta no código 2.5.7 do quadro anexo do Decreto 53.831/64[13].
Desta forma, até a edição do decreto 2.172/97, que não trouxe essa atividade no seu anexo, a função de guarda é reconhecida pela categoria profissional. Após a edição do decreto, há necessidade de comprovação da atividade com exposição aos agentes nocivos à saúde e a integridade física[14].
Tal prova se faria com o PPP, mas como dito, os guardas municipais, servidores públicos estatutários possuem o regime jurídico próprio e o órgão público municipal não expede esse documento, por se tratar de um documento específico para o regime geral da previdência social.
A atividade de guarda municipal se enquadra na definição de perigosa, nos termos do anexo 3 da NR16[15]:
“ATIVIDADES E OPERAÇÕES PERIGOSAS COM EXPOSIÇÃO A ROUBOS OU OUTRAS ESPÉCIES DE VIOLÊNCIA FÍSICA NAS ATIVIDADES PROFISSIONAIS DE SEGURANÇA PESSOAL OU PATRIMONIAL
As atividades ou operações que impliquem em exposição dos profissionais de segurança pessoal ou patrimonial a roubos ou outras espécies de violência física são consideradas perigosas.
São considerados profissionais de segurança pessoal ou patrimonial os trabalhadores que atendam a uma das seguintes condições:…
…b) empregados que exercem a atividade de segurança patrimonial ou pessoal em instalações metroviárias, ferroviárias, portuárias, rodoviárias, aeroportuárias e de bens públicos, contratados diretamente pela administração pública direta ou indireta.”
Embora com a edição da Súmula 33, os guardas municipais estatutários, encontram dificuldade em se aposentar na modalidade especial de forma administrativa, tendo que se socorrer do poder judiciário estadual para fazer jus à aposentadoria especial.
A maioria dos desembargadores no Estado de São Paulo tem sido favoráveis a concessão da aposentadoria aos guardas municipais estatutários[16]:
“SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. Guarda Civil. Concessão da aposentadoria especial. Admissibilidade. Incidência da Súmula vinculante nº 33. Aplicação ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica. Pagamento de todo o período atrasado desde o requerimento administrativo. Possibilidade. APELAÇÃO DESPROVIDA E REMESSA NECESSÁRIA DESACOLHIDA”.
Desta forma, o guarda municipal estatutário, ainda tem uma grande empreitada para ver reconhecido seu direito à aposentadoria especial, seja com fundamentos na súmula 33, no artigo 40 da CF/88, no artigo 57 da lei 8.213/91 ou ainda, poderão se valer também da Constituição Federal pelo princípio da igualdade aos guardas municipais celetistas, tendo em vista que estes tem seu direito garantido pela justiça federal, inclusive pelo uso de arma de fogo, incluído pela NR 16.
3. CONCLUSÃO
O presente trabalho tem como objetivo apresentar que essa categoria de servidor público, mesmo com edição da Súmula 33, ainda se depara com o seu empregador que é um ente público municipal, o qual aplica as regras do regime próprio de previdência, indeferindo os pedidos administrativos de aposentadoria especial, alegando exatamente a falta de regulamentação legal.
Os guardas municipais buscam então o poder judiciário para sanar essa lacuna. O judiciário estadual de São Paulo tem sido tímido quanto à aplicação analógica da lei do regime geral. Ora as ações são improcedentes ora procedentes, sempre com a alegação de que aplica-se o artigo 57, somente no que couber.
A questão maior encontra-se no perigo da função, já que o artigo 57 não traz esse requisito, embora a questão da periculosidade esteja resolvida no tema 543 do STJ.
Entendo como justa a concessão da aposentadoria especial aos guardas municipais estatutários, é uma atividade que traz prejuízo à integridade física do trabalhador, inclusive risco de morte, já que estão expostos a todo tipo de agressão.
No mais, meu posicionamento é que o poder judiciário deve respeitar o princípio da isonomia, uma vez que os guardas municipais contratados pelo regime celetista não tem encontrado óbice junto a Justiça Federal.
Se a atividade e a exposição ao risco são os mesmos, entendo que o poder judiciário, mais uma vez por decisão do STF, há de ter uma pacificação jurisprudencial quanto ao tema, o qual, espero, seja favorável aos guardas municipais estatutários em equidade aos contratados pelo regime celetista.
Advogada graduada pela Universidade de Mogi das Cruzes pós graduada em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Faculdade Legale
Carlos Alberto Vieira de Gouveia é Mestre em Ciências Ambientais e Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais; Vice-Presidente para a área Previdenciária da Comissão Direitos e Prerrogativas e Presidente da Comissão de Direito Previdenciário ambas da OAB-SP Coordenador do curso de pós-graduação em Direito Previdenciário da Faculdade Legale
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