Resumo: O presente trabalho tem por objetivo analisar as questões intertemporais após a alteração realizada na redação do art. 226, §6º, da Constituição Federal, que provocou o fim da separação judicial. Tais questões dizem respeito à situação das ações de separação em curso e as ajuizadas após a vigência da emenda, abordando ainda a situação dos já separados e a possibilidade de reconciliação. Nesse contexto, apresenta as posições sustentadas pela doutrina e faz uma abordagem desde a concepção histórica de família, origem e extinção do vínculo conjugal, bem como a explicação de pontos importantes resultantes da promulgação da Emenda Constitucional n° 66/2010, necessários à compreensão do presente estudo.[1]
Palavras-chave: Divórcio. Separação. Vínculo. Extinção.
Abstract: This study has the objective examine the intertemporal questions after changes made in the text of art. 226, § 6 of the Federal Constitution, which caused the end of judicial separation. These questions relate mainly to the situation of separated when the enactment of the amendment, and the actions of separation underway, also addressing, the conversion into a divorce and the possibility of reconciliation. In this context, it presents the views stated by the doctrine and approaches from the historical conception of family, origin and dissolution of the marital bond, and the explanation of important points arising from the enactment of Constitutional Amendment N°. 66/2010, necessary to understand the this study.
Keywords: Divorce. Separation. Bond. Extinction.
Sumário: 1. A família e o vínculo conjugal. 2. Breve histórico da dissolução do vínculo conjugal no Brasil. 3. A Emenda Constitucional N° 66/2010. 3.1. O Fim da Culpa. 3.2 As Demandas de Divórcio. 4. Os questionamentos de direito intertemporal. 4.1. Casos de Separação existentes no momento da promulgação da EC n° 66/2010. 4.2. Processos de Separação em andamento na vigência da EC n° 66/2010. 4.3 Ações ajuizadas após a promulgação da EC n° 66/2010
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo visa analisar as discussões de Direito Intertemporal relativas à dissolução do vínculo conjugal ocasionadas pela promulgação da Emenda Constitucional n° 66/2010.
Para tanto, abordará os entendimentos de renomados doutrinadores na área civilista, especialmente no âmbito de Direito de Família, tais como Maria Berenice Dias, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho, escolhidos através de uma cuidadosa pesquisa bibliográfica, considerando, também, artigos de visível relevância escritos por profissionais e operadores do Direito, extraídos principalmente no site do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito da Família).
Será estruturado sob a forma de tópicos, fazendo-se, a priori, uma análise sobre o vínculo conjugal e a formação da família e um breve histórico acerca da dissolução do vínculo conjugal no Brasil, até chegar-se à promulgação da Emenda Constitucional n° 66/2010, abordando, ainda, a conjuntura atual da separação, a possibilidade de discutir a culpa pelo fim do casamento e as formas possíveis de dissolução do casamento após a EC. 66/2010.
Por fim, será feita a análise das questões intertemporais resultantes da emenda em epígrafe, consistentes, basicamente, na situação dos processos em curso de separação judicial (se devem ser extintos ou transformados em ações de divórcio), na situação dos que vierem a ser requeridos atualmente (já em observância ao novo texto constitucional) e, ainda, daqueles que já possuem sentença de separação e como devem proceder para a obtenção do divórcio Abordará, também, a discussão em torno da reconciliação após a separação e após o divórcio.
Percebe-se que a alteração constitucional trouxe algumas controvérsias quanto às questões intertemporais e é nesse contexto que se revela a inequívoca importância da presente investigação, em compreender, de fato, como esta alteração afetou os institutos da separação e do divórcio no Brasil, esclarecendo as possíveis dúvidas práticas quanto às situações processuais consolidadas ou em trâmite quando da promulgação da “Nova Emenda do Divórcio”.
Tais dúvidas podem ser enfrentadas não só pelos operadores do Direito, como juízes, promotores e funcionários de cartórios, como também pelos próprios cônjuges e terceiros interessados, sendo necessário entender as formas de aplicabilidade da emenda para dar-lhe verdadeira efetividade e adequar essa nova norma à realidade vivida, atendendo, assim, aos almejos de uma sociedade em constante evolução.
2 A FAMÍLIA E O VÍNCULO CONJUGAL
O casamento é, basicamente, o ato solene que declara a união civil entre homem e mulher, constituindo umas das mais importantes instituições de uma sociedade: a família. Sua origem é bem remota, tendo sido inserido nos costumes de várias civilizações ao longo dos anos.
Pode-se considerar, logo de início, que o primeiro relato de casamento como base para a formação de uma família, que se tem história, encontra-se na Bíblia, mostrando que Adão e Eva, homem e mulher, criados por Deus, se uniram no intuito de dar continuidade à vida, procriando e povoando a Terra. Essa concepção de origem religiosa foi fundamental para conferir ao vínculo conjugal, também chamado de vínculo matrimonial, oriundo do casamento, o caráter de uma instituição natural, sagrada e indissolúvel.
Daí a celeuma criada quando se trava uma discussão mais aprofundada acerca da dissolução do vínculo estabelecido entre homem e mulher através do matrimônio.
Segundo Gomes apud Cunha (2010, p.4):
“Na organização jurídica da família hodierna é mais decisiva a influência do direito canônico. Para o cristianismo, deve a família fundar-se no matrimônio, elevado a sacramento por seu fundador. A Igreja sempre se preocupou com a organização da família, disciplinando-a por sucessivas regras no curso dos dois mil anos de sua existência, que por largo período histórico vigoraram, entre os povos cristãos, como seu exclusivo estatuto matrimonial. Considerável, em conseqüência, é a influência do direito canônico na estruturação jurídica do grupo familiar.”
Esse binômio casamento-família pode ser visualizado, ainda, na história da Roma antiga, de estrutura patriarcal, em que o casamento e as relações jurídicas dele resultantes, bem como o vínculo de sangue, eram a base da chamada “família natural”, contudo, já podia se observar a possibilidade de dissolver o casamento.
De acordo com Gonçalves (2010, p.32):
“Em matéria de casamento, entendiam os romanos necessária a affectio não só no momento de sua celebração, mas enquanto perdurasse. A ausência de convivência, o desaparecimento da afeição era, assim, causa necessária para a dissolução do casamento pelo divórcio. Os canonistas, no entanto, opuseram-se à dissolução do vínculo, pois consideravam o casamento um sacramento, não podendo os homens dissolver a união realizada por Deus: quod Deus conjunxit homo non separet.”
Essa visão do matrimônio como instituidor da família ganhou ainda mais força com a influência da Igreja Católica na Idade Média, que, no embalo da expansão do cristianismo ocasionado pelo fim do Império Romano, difundiu os valores cristãos em uma sociedade já marcada pelo pensamento religioso, fortalecendo ainda mais a idéia do matrimônio como um sacramento.
Conforme afirma Gonçalves (2010, p.32) “Durante a Idade Média as relações regiam-se exclusivamente pelo direito canônico, sendo o casamento religioso o único conhecido”.
Assim, depreende-se que a história da extinção do vínculo conjugal e os obstáculos criados para o seu reconhecimento estão intimamente ligados à evolução histórica de um pensamento, principalmente religioso, bastante enraizado há milhares de anos.
No entanto, em que pese considerar o vínculo conjugal, criado a partir do casamento ou mesmo de uma união estável, como formador de uma família, não se pode pretender que ele seja ad eternum, uma vez que os sentimentos são mutáveis e imprevisíveis.
A falência de uma união, muitas vezes, é inevitável e a sua dissolução acaba sendo recomendável para que se preserve não só os próprios cônjuges, como também os filhos, se existentes dessa relação.
É de tamanha severidade obrigar que duas pessoas permaneçam casadas, quando assim não o querem mais, quando a relação de afeto e amor, na qual o casamento deveria pautar-se, já se findou, impossibilitando-os de serem felizes novamente.
Pode-se notar que não é raro ver casais em busca da separação ou do divórcio atualmente, corroborando que o perfil da família brasileira está em transformação e necessita que as leis se adequem a essa nova realidade.
3 BREVE HISTÓRICO DA DISSOLUÇÃO DO VÍNCULO CONJUGAL NO BRASIL
O caminho percorrido na busca pelo reconhecimento do divórcio, da maneira que se tem hoje, não foi fácil e inúmeras foram as formas de resistência quando o assunto em pauta era a dissolução do vínculo conjugal.
Como marco inicial dessa longa caminhada destaca-se o Código Civil de 1916, no qual inexistia qualquer previsão para o divórcio, ou seja, não havia como se acabar com o vínculo conjugal, com exceção da morte ou da anulação do casamento.
Existia apenas a figura do “desquite”, em que se dissolvia a sociedade conjugal, mas permanecia o vínculo, não podendo os “desquitados” casarem-se novamente nem constituírem outras famílias, sem contar o preconceito que o termo gerava no meio social.
Como bem assevera Diniz (2010, p.17) “Mesmo indissolúvel o casamento, havia o desquite, que significava ‘não quites’, ou seja, alguém em débito para com a sociedade”.
É importante relembrar que a Igreja Católica sempre apresentou resistência ao instituto do divórcio, pregando o dogma de que o matrimônio seria um sacramento eterno e indissolúvel, tanto que até hoje não admite que alguém “suba mais de uma vez no altar”. Dessa forma, influenciou não só o pensamento e as atitudes das pessoas por muito tempo, como também contribuiu para a morosidade da mudança da lei.
As constituições de 1937 e a de 1946 continuaram atrasadas nesse sentido, restringindo-se a dispor apenas que o casamento seria indissolúvel e estava sob proteção do Estado.
Somente em 1977, com a entrada em vigor da Lei n° 6.515, de 26 de dezembro, chamada de Lei do Divórcio, posteriormente amparada pela Emenda Constitucional n° 9/77, é que surgiu a possibilidade de dissolver realmente a relação conjugal.
A referida emenda previu a possibilidade de dissolver o casamento, se, no entanto, houvesse a comprovação prévia de separação judicial por mais de três anos.
Embora tenha trazido a condicionante do tempo e sem a menção clara do termo divórcio, nota-se que a mudança foi significativa para a época, observando-se, inclusive, que as disposições referentes ao “desquite”, no Código Civil, foram substituídas por “separação judicial”.
De acordo com Stolze e Pamplona Filho (2010, p.41):
“Pela concepção originária da “Lei do Divórcio”, a separação judicial, forma de extinção da sociedade conjugal sem dissolução do vínculo matrimonial, passou a constituir um requisito para o exercício do chamado divórcio indireto (divórcio por conversão).”
Com a Constituição Federal de 1988, a mudança foi ainda mais significativa, conforme se depreende da leitura do antigo § 6° do art. 226: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos.”.
O tempo para o chamado divórcio indireto (por conversão), foi diminuído para um ano e apareceu uma nova forma de divórcio, o denominado direto, tendo como único requisito a separação de fato por mais de dois anos, ou seja, apenas necessário comprovar que os cônjuges já não conviviam como casados por mais de dois anos.
Esse era o cenário até a promulgação da Emenda Constitucional, n° 66/2010, que extinguiu, finalmente, não só a exigência de prazos prévios para a concessão do divórcio, como o instituto da separação judicial, lendo-se apenas na nova redação: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.”.
Conforme afirmam Stolze e Pamplona Filho (2010, p.43) “É o reconhecimento do divórcio como o simples exercício de um direito potestativo”.
4 A EMENDA CONSTITUCIONAL N° 66/2010
A promulgação da Emenda Constitucional n° 66/2010 e a mudança na disciplina do Divórcio já era mais do que esperada para o ordenamento jurídico pátrio.
Foi de iniciativa do Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFAM), que surgiu a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) levada ao Congresso Nacional pelo Deputado Antônio Carlos Biscaia através da PEC 413/2005, e posteriormente corroborada pelo Deputado Sérgio Barradas Careiro por meio da PEC 33/2007, posteriormente transformada na PEC 28/2009, famosa “PEC do Divórcio”, ou até mesmo “PEC do Amor”, como designada por alguns.
Mas só em 14 de julho de 2010 é que houve a publicação da Emenda n°66, alterando significativamente a redação do § 6° do art. 226 da Constituição Federal para “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.”.
Cumpre lembrar, conforme já exposto acima, que a redação antiga era “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos.”.
Como se vê, havia uma dualidade de procedimentos, ou seja, duas ações judiciais para se obter, ao fim, a verdadeira quebra do vínculo conjugal. Primeiro, os cônjuges teriam que se enquadrar no requisito de prévia separação, fosse judicial, fosse de fato. Só depois é que a concessão do divórcio era possível.
“O objetivo era dificultar o divórcio de forma imediata, exigindo-se uma prévia separação judicial por um ano e permitindo-se a reconciliação do casal, ou separação de fato por dois anos, entendendo o legislador constitucional que o prazo era necessário para amadurecer a decisão do casal em romper o vínculo matrimonial ou, até mesmo, atender ao desejo daqueles que mesmo com o fim do casamento preferiam manter o vínculo, dissolvendo apenas a sociedade conjugal, por conveniência e convicções morais ou religiosas (CARVALHO, 2010, p.13).”
Apesar da resistência de uma minoria, com a referida emenda, acabou-se de vez com a separação judicial e a exigência de qualquer prazo para dissolução do vínculo matrimonial, já se podendo, inclusive, ver decisões de vários tribunais brasileiros nesse sentido, a exemplo do aresto do TJ de Minas Gerais, in verbis:
“FAMÍLIA – AÇÃO DE DIVÓRCIO LITIGIOSO DIRETO – ADVENTO DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66/2010 – SUPRESSÃO DA EXIGÊNCIA DE LAPSO TEMPORAL DE SEPARAÇÃO DE FATO OU JUDICIAL – DECRETAÇÃO DO DIVÓRCIO – PEDIDO DE ALIMENTOS E PARTILHA DE BENS – CONTROVÉRSIA SOBRE MATÉRIA FÁTICA – RETORNO DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM PARA PROSSEGUIMENTO DA LIDE.- Com a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 66, deu-se nova redação ao §6º do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, restando suprimida a exigência de prévia separação judicial do casal por mais de 1 (um) ano ou da comprovação da separação de fato por mais de 2 (dois) anos, razão pela qual, havendo pedido, deve ser decretado, de imediato, o divórcio do casal. – Tratando-se de demanda cumulada, em que, além do divórcio, foram requeridos alimentos e partilha de bens do casal, tem-se como devida a imediata decretação do divórcio, com o retorno dos autos, entretanto, ao juízo de origem, para o prosseguimento da lide com relação aos demais pleitos.” (TJMG, Apelação Cível nº 1.0456.05.033464-2/001, Rel Des. Elias Camilo, 3ª Câmara Cível, public. 26/11/2010)
Com efeito, há que se fazer uma releitura dos dispositivos presentes no Código Civil relativos ao instituto da separação judicial, pois, diante da sua supressão, pode-se considerar que houve uma verdadeira revogação tácita de tais dispositivos, haja vista a incompatibilidade da norma constitucional posterior, com a matéria regulada pela lei anterior.
É o caso, por exemplo, do art. 1574 do referido diploma legal, que dispõe que a separação judicial se dá por mútuo consentimento dos cônjuges se forem casados por mais de um ano. Com a extinção do instituto da separação, é visível que tal artigo restou totalmente inaplicável.
Porém, de acordo com Sant’anna (2010, p.60) há “artigos que deverão permanecer com sua redação até que não mais existam casos de pessoas separadas judicialmente ou se caduque o prazo ali estipulado”. A exemplo do artigo 1577, que prevê a possibilidade de os cônjuges, separados judicialmente, restabelecerem a sociedade conjugal, por ato regular em juízo.
Ou seja, enquanto houver situações de pessoas com estado civil de separadas já consolidado, subsistirá a possibilidade de estas virem à reconciliar-se e retornarem ao casamento, bem como aos deveres conjugais. Por lógica, isso é uma questão, que com o passar do tempo, em virtude da mudança trazida pela emenda, necessariamente deixará de existir.
Há, ainda, para Sant’anna (2010, p.63) “artigos que permanecem em vigor, alterando-se a expressão ‘separação judicial’ para ‘divórcio’”.
“Não há como se negar que o instituto da separação judicial foi eliminado. Todos os dispositivos da legislação infraconstitucional a ele referente restaram derrogados e não mais integram o sistema jurídico. Logo, não é possível buscar em juízo a decretação do rompimento da sociedade conjugal” (DINIZ, 2010, p. 33).
A verdade é que, era tão incoerente e desnecessário manter essa situação, de separar-se, acabando a sociedade conjugal, e não dissolver o matrimônio, que a promulgação da emenda era só uma questão de tempo. Mas para a vertente dos antidivorcistas, o argumento defendido é de que com a facilitação para obter o divórcio, o casamento se tornaria um instituto fadado à banalização.
O que é um argumento fácil de ser derrubado, já que não é o divórcio que faz com que os casamentos acabem, e sim o fim do amor, do companheirismo, do respeito, enfim, do afeto e de valores que devem estar presentes na vida de um casal, mas que infelizmente, às vezes, acabam e nada se pode fazer. O divórcio é apenas um instituto jurídico que formaliza o fim da união, possibilitando que as pessoas sejam felizes com outras e se casem novamente, o que em nada se parece com banalização e sim uma busca pela verdadeira felicidade.
“Certamente ninguém acredita que alguém vai casar simplesmente porque ficou mais fácil se separar. Ora, quem está feliz não vai se divorciar somente porque agora o procedimento é mais rápido. Ao contrário, certamente vai acontecer o aumento do número de casamentos, pois a tendência é as pessoas oficializarem suas uniões, o que estava sendo evitado pelos entraves legais à sua dissolução” (DINIZ, 2010, p. 32).
Portanto, mesmo sendo alvo de acaloradas discussões e enfrentando alguns opositores, a então Emenda Constitucional n° 66/2010 conseguiu prevalecer e, a partir de então, só se pode falar em uma forma de dissolver o casamento civil: pelo divórcio.
4.1 O Fim da Culpa
Outro aspecto interessante de ser ressalvado com o advento da aludida emenda, é que não há mais a possibilidade de se aferir as causas pelo fim do casamento, ou seja, não se pode mais imputar a culpa a qualquer dos cônjuges pelo fim do matrimônio.
“A alteração constitucional extinguiu a necessidade de causa objetiva (lapso temporal) e subjetiva (culpa) de um dos cônjuges para a decretação do divórcio. A averiguação da culpabilidade como requisito para a decretação do divórcio era um resquício proveniente do instituto da separação, ora entendida como extinta, e que já fora minimizada pelo Código Civil de 2002, assim como pela doutrina e jurisprudência. Agora, tendo em vista que a Constituição Federal não mais impõe requisitos à sua promulgação, a não ser a intenção de rompimento da convivência por um dos parceiros, inexiste indagação sobre quem é inocente ou culpado” (SINDEAUX; FAGUNDES; FARIAS, 2011, p.04).
A discussão acerca da culpa representava uma verdadeira invasão na privacidade dos cônjuges, além de um processo traumático e doloroso além do esperado, não só para o próprio casal, como também para a prole. Ademais, era incentivar uma briga desgastante levada ao judiciário marcada pela vingança da parte que não aceitava a falência do casamento pelo fim do afeto.
Assim, como bem considera Diniz (2010, p.25) “Somente remanesce o instituto da culpa no âmbito da anulação do casamento e na quantificação dos alimentos”.
4.2 As Demandas de Divórcio
Pois bem. Uma vez extinta a separação judicial, é possível se verificar, como já explanado, que, após a vigência da Emenda Constitucional n° 66/2010, o divórcio se tornou a única forma de dissolver o vínculo conjugal. Por sua vez, este pode ser obtido extrajudicialmente ou judicialmente, salientando-se que, nesta última modalidade, pode-se ter a consensualidade ou a litigiosidade.
O divórcio extrajudicial é um procedimento previsto desde a Lei 11.441/2007, bem mais simples e rápido, mormente agora que não se faz necessária a espera do lapso temporal ou comprovação da situação de fato. Esta modalidade de divórcio é realizada por meio de escritura pública em cartório, e pode ser uma opção do casal que, de comum acordo, já convencionou acerca da partilha de bens, da pensão alimentícia, do uso do nome pelo outro cônjuge e não tiverem filhos menores ou estes forem maiores e capazes.
Importante também dizer que, nesta espécie, mesmo tratando-se de um procedimento de jurisdição voluntária, os cônjuges devem estar devidamente representados por advogado, podendo este ser comum aos dois. Ora, já que esse procedimento realizado na via administrativa tem por base o consenso entre os divorciandos, é interessante e mais econômico que ambos sejam instruídos pelo mesmo procurador.
O que se observa, nestes casos, é o verdadeiro exercício da autonomia privada. Para Stolze e Pamplona Filho (2010, p.70) os sujeitos, para se divorciarem, não precisam mais de fiscalização estatal, sendo protagonistas de suas próprias vidas.
O divórcio judicial consensual não difere muito do extrajudicial, já que ambos se baseiam no acordo e na vontade dos consortes em dissolver o matrimônio. O que pode surgir é a indagação: Porque não optar logo pela via administrativa, se há consensualidade?
A questão é simples. Há casos em que a existência de filhos menores ou incapazes impossibilita a escolha pelo procedimento extrajudicial, restando ao casal optar pela via judicial, mesmo que os consortes estejam de comum acordo em pôr fim ao matrimônio.
De acordo com Sant’anna:
“[…] deverão fazer seu pedido perante o juiz e a petição fixará o valor da pensão do cônjuge que dela necessitar indicando as garantias da obrigação assumida, apresentará a partilha dos bens para ser homologada, dissertará sobre a utilização do nome, da guarda e pensão dos filhos.”
Destarte, como pondera Carvalho (2010, p.61), após o recebimento da petição inicial, o juiz irá ouvir os cônjuges tentando reconciliá-los. Caso não haja essa possibilidade, será ouvido o Ministério Público, na hipótese de existência de incapaz no processo. Só assim, será decretado e homologado o divórcio.
Quanto ao divórcio judicial litigioso, é observado nos casos em que não há acordo entre os cônjuges ou é desconhecido o paradeiro de um deles, devendo o processo seguir o rito ordinário.
Mesmo com o fim da discussão da culpa no divórcio, pode-se falar em divórcio judicial litigioso, porquanto há a possibilidade de haver divergência entre o casal em relação à guarda dos filhos, à fixação de alimentos, ao uso do nome e à partilha dos bens comuns. Estas questões, no entanto, podem sem discutidas no mesmo processo de divórcio, ou em ação autônoma, como exemplifica Sant’anna (2010, p.74), que em relação aos bens, pode-se optar por um procedimento em separado de partilha, após o divórcio, a teor do próprio Código Civil, em seu art. 1.581.
De fato, o ideal seria resolver tudo em um único processo em respeito aos princípios da celeridade e da economia processual, contudo, às vezes é manifesto o consenso quanto ao fim do casamento e desejo pela sua dissolução, mas subsiste a divergência quanto às questões resultantes do divórcio, sendo possível a discussão dessas questões após a decretação do divórcio.
Isso repercute na necessidade de realização de audiência, pois de acordo com a maioria da doutrina, o entendimento é no sentido de esta ser desnecessária quando não existirem filhos incapazes e pedidos cumulativos, pois havendo consenso quanto ao divórcio, as questões resultantes podem ser discutidas em momento posterior.
Para Carvalho (2010, p.63):
“Admite-se o pedido cumulativo na ação de divórcio, de alimentos, guarda de filhos e partilha, cabendo reconvenção apenas quanto aos alimentos entre os cônjuges. Existindo contestação ou reconvenção, é necessária a realização de audiência de instrução, possibilitando a composição entre as partes.”
5 OS QUESTIONAMENTOS DE DIREITO INTERTEMPORAL
Ao dispor sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, dando nova redação ao art. 226, § 6° da Constituição Federal, eliminando a exigência de prazos prévios de separação judicial e separação de fato para a obtenção do divórcio, a promulgação da Emenda Constitucional n° 66/2010 trouxe certas dúvidas práticas quanto a sua aplicação que devem ser dirimidas no intuito de trazer maior efetividade a essa nova ordem constitucional.
Contudo, para melhor compreender o presente estudo, é importante, antes de tudo, esclarecer o que vem a ser o Direito Intertemporal e qual o seu contexto diante do presente tema.
Pois bem. Este pode ser entendido como o estudo dos conflitos práticos gerados por leis no tempo, ou seja, entre a lei nova e a lei anterior, ambas reguladoras de uma mesma situação.
Nesse sentido, Carvalho (2010, p.47) estabelece que:
“O direito intertemporal disciplina as relações jurídicas surgidas em um período, sob a vigência de uma lei, e as conseqüências sob o domínio de uma norma subseqüente em conflito com a anterior estabelecendo princípios reguladores, entre eles o da irretroatividade da lei para preservar os também princípios do direito adquirido, da coisa julgada e do ato jurídico perfeito.”
É exatamente o que ocorre com a Emenda Constitucional n° 66/2010, que veio de encontro a situações fáticas já firmadas ou em andamento quando da pertinente alteração constitucional.
Conforme afirma Carvalho (2010, p.47):
“Ocorre que várias situações já consolidadas ou transitórias foram surpreendidas com a EC n.66/2010, especialmente pela não recepção da separação de direito e o divórcio por conversão, exigindo-se solução de acordo com o ordenamento jurídico, obedecendo-se a coisa julgada, o direito adquirido e os princípios de direito intertemporal.”
Pode-se considerar, nesse contexto, a existência, em especial, de três situações atingidas pela aplicação da nova emenda e que necessitam ser estudadas à luz do Direito Intertemporal, preservando a segurança jurídica. A primeira diz respeito aos casos de separação judicial ao tempo da alteração, ventilando-se, aqui, a possibilidade de conversão em divórcio e restabelecimento do casamento.
A segunda situação é relativa às demandas de separação em trâmite já na vigência da emenda, ora questionada. E a terceira, seria relativa aos pedidos de separação formulados após a promulgação da emenda.
Veja-se, então, especificamente, quais são os casos práticos possíveis de ocorrência diante da vigência da “Emenda do Divórcio” que merecem ser estudados sob a ótica de questionamento intertemporal.
5.1 Casos de Separação existentes no momento da promulgação da EC n° 66/2010
Conforme já explanado, há uma conjuntura que não pode ser afastada com essa nova regência em matéria de Direito de Família, decorrente da EC n° 66: o das pessoas já separadas quando da edição do novo texto constitucional, havendo a indagação se elas poderiam proceder à conversão automática em divórcio, ou haveria a necessidade de se ingressar com uma ação autônoma requerendo a dissolução do vínculo conjugal.
Nestes casos é importante se observar que há a materialização de uma situação jurídica, constituindo um verdadeiro ato jurídico perfeito: o estado de separados, seja judicialmente ou extrajudicialmente. Ou seja, os casais separados antes da entrada em vigor da nova emenda, continuam com os estado civil de “separados”. Aliás, entendimento diverso seria ferir o princípio da segurança jurídica.
Assim, seguindo a mesma linha de observância ao princípio da segurança jurídica, não se pode considerar que aqueles que já estejam separados, com a entrada em vigor da emenda, sejam automaticamente tidos como divorciados.
Carvalho (2010, p.48) tem o entendimento de que os casais teriam a opção de converter as separações ocorridas antes da nova norma em divórcio, bastando, para isso, requerer a conversão da separação judicial.
Há quem sustente, como Diniz (2010, p.133/134), que os casais que já estiverem separados e quiserem pôr fim ao casamento, deverão ajuizar a competente ação de divórcio, pois:
“Com o desaparecimento do instituto da separação, com ele também acabou a possibilidade de sua conversão em divórcio (CC 1.580). Cabível somente a decretação do divórcio, não sendo preciso aguardar o decurso do prazo de um ano da separação de corpos ou do decreto da separação judicial.”
Assim, com a extinção da necessidade de transcurso do lapso temporal e da comprovada situação de fato, teria que se considerar que o divórcio por conversão, de igual modo, restou extinto. Ou seja, se a conversão da separação em divórcio só havia porque existente esse obstáculo do decurso do tempo do estado de separados; e se tal exigência foi eliminada do texto constitucional, não haveria mais fundamento para a permanência do divórcio indireto no ordenamento jurídico pátrio, ou seja, do divórcio por conversão.
Contudo, não parece a melhor solução. É mais plausível conferir aos cônjuges separados legalmente antes da EC. 66/2010, a possibilidade de postularem a conversão da separação em divórcio, mas, claramente, sem a necessidade de se observar exigências temporais, uma vez que estas restaram derrocadas.
Como salienta Pereira (2010, p.05):
“Caso queiram transformá-lo em estado civil de divorciado poderão, excepcionalmente, converter tal separação em divórcio ou simplesmente propor Ação de Divórcio, o que na prática tem o mesmo resultado. São exceções, necessárias e justificáveis, para compatibilizar com o respeito aos princípios constitucionais da coisa julgada e do ato jurídico perfeito”.
Com efeito, estes mesmo casais, já separados, ao tempo da promulgação da emenda, podem, se assim desejarem, proceder à reconciliação, voltando ao estado de casados por meio de petição dirigida ao juiz, ou mediante escritura pública.
Isso é possível, neste momento, visto que, como cediço, a separação tinha o condão de dissolver apenas a sociedade conjugal, permanecendo o vínculo conjugal, havendo previsão expressa de reconciliação para estes casos (art. 1.577 do Código Civil), o que leva essa situação a ser amparada pelo Direito Intertemporal.
Como a maioria doutrinária, Carvalho (2010, p.48) argumenta que a nova norma não pode retroagir em relação à situações já consolidadas na vigência da lei anterior.
Desse modo, a lei nova não pode ir de encontro a um direito já adquirido na vigência da lei anterior.
5.2 Processos de Separação em andamento na vigência da EC n° 66/2010
Outro caso controverso é o daqueles que estão com o processo de separação judicial ou extrajudicial em andamento e se vêem surpreendidos com a promulgação da nova norma reguladora, pois não há ainda coisa julgada nestas situações.
Embora as opiniões dos doutrinadores sejam diversas nesta espécie, uma coisa resta clara e uníssona, é que não há mais a possibilidade de se requerer a separação após a entrada em vigor da EC. 66/2010. Assim, não há mais como os processos de separação em curso, sejam judiciais, ou requeridos na via administrativa, seguirem tramitando normalmente.
Desse modo, há quem sustente, como Simão apud Carvalho (2010, p.49), que tais demandas devem ser extintas, sem julgamento do mérito, por superveniente impossibilidade jurídica do pedido, conforme preconiza o art. 267, VI do Código de Processo Civil.
Eis que surge o questionamento causador de dúvidas. Devem tais processos serem realmente extintos, de pronto, ou seja, de ofício pelo juiz, ou seria mais razoável transformá-los em ações de divórcio? E, ainda, como proceder a essa transformação?
Diniz (2010, p.130) entende que o procedimento de separação era utilizado apenas por exigência legal, e que, na verdade, a intenção dos cônjuges que o requeriam era, desde o início, pôr fim ao casamento, sendo assim, no momento em que deixa de existir o processo de separação, o juiz deve transformá-lo em ação de divórcio.
Para a vertente desse entendimento, o magistrado daria apenas ciência às partes da conversão, sendo que o silêncio destes seria tido como concordância tácita à decretação do divórcio. Na hipótese de as partes virem a manifestar-se em sentido contrário é que haveria a extinção do feito por impossibilidade jurídica do pedido.
Já para Stolze e Pamplona Filho (2010, p.140):
“Deverá o juiz oportunizar à parte autora (no procedimento contencioso) ou aos interessados (no procedimento de jurisdição voluntária), mediante concessão de prazo, a adaptação do seu pedido ao novo sistema constitucional, convertendo-o em requerimento de divórcio.
Nesse particular, não deverá incidir a vedação constante no art. 264 do Código de Processo Civil, segundo o qual, “feita a citação, é defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu, […]”. Isso porque não se trata de uma simples inovação de pedido ou da causa de pedir no curso do processo, […]. O que sucede, em verdade, é uma alteração da base normativa do direito material discutido, por força de modificação constitucional, exigindo-se, com isso, adaptação ao novo sistema, sob pena de afronta ao próprio princípio do devido processo civil constitucional.”
Do mesmo modo posiciona-se Carvalho (2010, p.50):
“A melhor solução nas ações de separação em andamento, em razão da norma constitucional modificadora, é intimar as partes, concedendo prazo para adequarem o pedido com o requerimento de divórcio, conduta que vem sendo adotada em diversas varas de família, até mesmo por economia processual, evitando-se o ajuizamento de novas ações de divórcio.”
Percebe-se, assim, que faz mais sentido oportunizar às partes a possibilidade de requererem a ação de divórcio, através de adequação do pedido, para não remanescer dúvidas acerca da vontade dos consortes em dissolver o vínculo conjugal.
Tal solução se faz mais adequada também, do que extinguir de ofício os processos de separação em trâmite, até mesmo por uma questão de economia e celeridade processual.
Caso as partes intimadas para a modificação do pedido no prazo determinado pelo juiz, não se manifestem, é que se faz necessária a extinção do processo sem resolução de mérito, devido à impossibilidade jurídica do pedido, posto que não se pode mais falar no instituto da separação no nosso ordenamento jurídico.
5.3 Ações ajuizadas após a promulgação da EC n° 66/2010
O outro caso inserido nesse debate de Direito Intertemporal ocasionado pela promulgação da emenda do divórcio, é o que fazer com as ações que foram ajuizadas após a publicação do novo texto constitucional, buscando a separação judicial.
Embora possa haver dúvida para alguns quanto a tais situações, a questão é de fácil esclarecimento, tendo sido, inclusive já respondida ao longo desse estudo.
Com o fim do instituto da separação no ordenamento jurídico brasileiro, por meio da Emenda Constitucional n° 66/2010, não se tem mais a possibilidade, até por questão de inutilidade, de se pleitear a separação, seja na via judicial ou na extrajudicial.
“Ajuizada ação de separação após 14.07.2010, o processo deve ser extinto por impossibilidade jurídica do pedido (CPC, art, 267, VI) e arquivados os autos” (CARVALHO, 2010, p.51).
Nestes casos, não há intimação das partes para adequarem o pedido, uma vez que, após a alteração constitucional, a única forma de dissolução do casamento admissível no Brasil, é o divórcio, possuindo a pertinente alteração eficácia imediata, senão veja-se:
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE DIVÓRCIO DIRETO CONSENSUAL – PROVA COLHIDA PERANTE CENTRAL DE CONCILIAÇÃO – CONTAGEM DO LAPSO DE SEPARAÇÃO DE FATO – EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66/2010 – APLICAÇÃO IMEDIATA E EFICÁCIA PLENA – – AUSÊNCIA SUPERVENIENTE DE INTERESSE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO. A Emenda Constitucional nº 66/2010 é norma de eficácia plena e de aplicabilidade direta, imediata e integral, que regulamenta, inclusive, os processos em curso, como ‘in casu’. […]” (TJMG, Apelação Cível nº 1.0210.09.061665-2/001, Rel. Des. Vieira de Brito, 8ª Câmara Cível, public., 01/12/2010)
Por fim, deve-se ressaltar que, diferentemente do que ocorre na situação dos já separados, com sentença transitada em julgada, não há a possibilidade de reconciliação após a concessão do divórcio. Para aqueles que se divorciarem e, por ventura, venham a se reconciliar posteriormente, desejando retomar o estado de casados, resta apenas a alternativa de contraírem novas bodas, já que o divórcio põe fim ao vínculo conjugal. Há quem sustente ser até mais romântico.
A reconciliação ocorrida entre o casal após terem ingressado com a ação de divórcio só é possível se advinda antes da prolação da sentença, ou seja, antes do reconhecimento do divórcio pelo magistrado, configurando caso de desistência da ação por parte dos divorciandos.
6 CONCLUSÃO
Percebe-se que a Emenda Constitucional n° 66/2010 veio facilitar a dissolução do casamento no Brasil, uma vez que acabou com a exigência de prazos prévios de separação judicial ou de fato para a obtenção do divorcio. A mudança era um desejo que há muito já se manifestava dentro da sociedade brasileira, representando um verdadeiro avanço em matéria de Direito das Famílias.
A emenda trouxe, além da extinção do instituto da separação judicial, a impossibilidade de se perquirir as razões subjetivas ou objetivas causadoras do fim do matrimônio, ou seja, buscar as causas pela falência da união.
A alteração promovida, no entanto, fez surgir algumas indagações acerca de situações processuais e procedimentais, que, diante das diversas interpretações dadas ao tema, põem em risco a segurança jurídica das relações envolvendo a quebra do vínculo matrimonial, devendo haver um entendimento firme seguindo os princípios do Direito Intertemporal.
Destarte, ao término do presente trabalho, chegou-se à conclusão de que para os casos de separação existentes no momento da promulgação da emenda, a conversão em divórcio é possível, só que sem a exigência outrora imposta. Caso esse seja o desejo dos então separados, é necessário, apenas, que estes postulem em juízo a conversão, pois com uma situação já consolidada no tempo, os envolvidos não podem ser prejudicados com o novo texto legal.
No tocante aos casos em que já há um processo de separação em curso, o ideal seria oportunizar as partes a possibilidade de adequarem o pedido presente na exordial para o requerimento do divórcio, por este ser a única forma de dissolução do casamento possível. Se as partes assim não o fizerem, a demanda deverá ser extinta por manifesta impossibilidade jurídica do pedido.
Para os pedido de separação realizados após a vigência da emenda, a extinção do processo é a medida mais adequada, vez que a norma tem eficácia imediata e a partir de então, somente deve se considerar os requerimentos de divórcio.
Pôde-se concluir, também, que aqueles que detêm o estado civil de separados podem restabelecer a relação matrimonial a qualquer tempo, vez que este instituto coloca fim apenas à sociedade conjugal. Já para os que estão divorciados, isso não é possível, em razão do rompimento do vínculo conjugal. Se os divorciados vierem a se reconciliar e desejarem retomar o vínculo conjugal, deverão convolar novo casamento.
Verifica-se, ainda, que, enquanto não houver uma modificação também na legislação infraconstitucional, abre-se margem a interpretações diversas. Assim, deve-se procurar a melhor maneira de dar efetividade à pertinente emenda, simplificando a sua aplicação, e não a dificultando, até mesmo por questão de celeridade e economia processual.
Acadêmica de Direito do Centro de Ensino Unificado de Teresina – CEUT – Teresina/PI
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