Resumo: Atualmente o Direito de Família por sua peculiar condição necessita de cuidados especiais, tutelados juridicamente, sendo a mediação um instituto que contribuirá para que as partes entendam que não necessitam ser adversárias, buscando soluções conjuntas aos problemas que se apresentam. O mediador tem o papel fundamental de conseguir sensibilizar as partes, em especial, se houverem filhos.
Palavras-chave: Mediação. Família. Mediação no Direito de Família.
Introdução
As famílias têm passado por profundas modificações tanto em sua estrutura quanto em sua essência, necessitando o Direito de Família acompanhar a evolução da entidade familiar. A maioria das disputas judiciais envolvendo a família demonstram a dificuldade das partes em distinguir as funções parentais das conjugais, gerando competições, tornando a justiça estatal ineficiente para solucionar os conflitos familiares, geralmente imbuídos de forte carga emocional.
Os processos judiciais são julgados pelos fatos narrados, não representando o real interesse das partes, apontando-se a mediação como uma alternativa adequada para restabelecer o diálogo entre a família.
Objetiva o presente trabalho apresentar singelamente o instituto da mediação como uma alternativa eficiente na promoção e facilitação das relações familiares em situação de crise e conflito, auxiliando as partes a encontrarem soluções que correspondam às suas necessidades e da entidade familiar.
Utiliza-se o método jurídico de interpretação estudando o direito como um fenômeno cultural em evolução, através de pesquisa bibliográfica.
A mediação se revela como uma forma de resgatar a cidadania na construção de soluções humanizadas e integradoras, pois as partes conduzem a desobstrução de suas controvérsias, tornando-se responsáveis pelos resultados obtidos.
Breves considerações sobre a mediação no Direito de Família
Hodiernamente com a evolução dos conceitos e da constituição das famílias se faz necessária a adequação do Direito de Família para a composição dos conflitos que atingem esse núcleo, assumindo assim, a mediação um papel relevante neste contexto. Esta técnica de resolução de conflitos vem sendo utilizada como uma alternativa que busca levar as partes a uma solução consensual da demanda. Jamais deve ser utilizada como substituta da via judicial, mas de forma acessória, objetivando dirimir os conflitos.
A doutrinadora Maria Berenice Dias (2005, p. 80) define que a medição familiar é um acompanhamento das partes na organização de seus conflitos, objetivando uma decisão rápida, ponderada, eficaz e satisfatória aos interesses em conflito. Portanto, a decisão é tomada pelas partes, que orientadas por um mediador, resgatam a responsabilidade suas escolhas. Sendo uma complementação da via judicial que qualifica as decisões, tornando-as mais eficazes e as partes comprometidas com o resultado.
A mediação surge como uma aliada ao assoberbado sistema judicial, abreviando processos e o desgaste da entidade familiar, garantindo a segurança jurídica e a paz social. A mediação é tida como imparcial, veloz e de baixo custo, tendo como principal qualidade o compromisso das partes no cumprimento do acordado, fazendo com que as partes entendam a posição da outra e desta forma cheguem a um consenso. Manoella Fernandes Leite (2008, s.p.), reporta que a mediação é um instrumento de pacificação social, contribuindo para a evolução do Direito de Família, com o desafogamento da justiça estatal e o fortalecimento da ordem social.
Artigo publicado por Manoella Fernandes Leite (2008, s.p.) reporta que o Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, propôs a alteração do artigo 1.571 do Código Civil, através de Projetos de Lei encaminhados a Câmara dos Deputados (Projetos de Lei n.º 505/2007 e o 507/2007), que objetivam a regulamentação da mediação familiar, fazendo com que “a entrada explícita da medição familiar no Código Civil, permita uma reflexão diferente sobre as funções da justiça, que deve garantir uma resposta, seja ela institucional ou não” (SASSIER, 2001, p.137/138). É salutar a regulamentação deste instituto ao Direito de Família, mas ambos os Projetos de Lei estão na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania na Câmara dos Deputados, aguardando a designação de relator.
O Direito de Família por sua peculiar condição necessita de cuidados especiais, tutelados juridicamente, contribuindo a mediação para que as partes entendam que não necessitam ser adversárias, que podem ser aliadas, buscando soluções conjuntas aos problemas que se apresentam. O mediador tem o papel fundamental de conseguir sensibilizar ambas as partes, em especial, se houverem filhos.
A psicóloga Fernanda Müller (2005, p. 147) observa a mediação como forma de autocomposição das diferenças, na qual as pessoas conflitantes são auxiliadas, com reabertura do diálogo, a encontrar soluções que a todos satisfaça.
O processo de mediação quando aplicado ao Direito de Família possui um aspecto psicológico, evitando desgaste das partes e o prolongamento da demanda. Muitos juízes e advogados sensibilizados e na forma da lei, objetivando proteger a família, tem atuado como mediadores, buscando na mediação o fundamento filosófico e metodológico para suas atuações, facilitando a comunicação das partes para que elas próprias administrem seus problemas.
Manoella Fernandes Leite (2008, s.p.) reporta em seu estudo que:
“A mediação compreende o conflito como algo natural, ou seja, próprio do relacionamento humano e necessário para o aprimoramento das relações. Segundo a visão de Groeninga (2007) “o conflito é inerente ao ser humano, sendo assim uma conseqüência da vida dialética”. A questão é saber como gerenciá-lo de modo que as partes envolvidas no litígio saiam ganhando produtiva e eficazmente.
De acordo com Sales (2004) “o processo de mediação evidencia a existência de conflitos reais e de conflitos aparentes”. Em muitos casos, as pessoas trazem à discussão um conflito que não é de fato aquele que está causando o transtorno momentâneo – é o conflito aparente. Normalmente, quando o diálogo sobre o conflito real causa constrangimento, vergonha, medo, as pessoas criam conflitos aparentes para iniciar a comunicação. Por isso é de fácil constatação o fato de que o conflito, que é exteriorizado muitas vezes, não reflete o conflito real, assim, não há espaço para uma discussão profícua e consciente. Esse conflito dificilmente será revelado e os atos que porventura surgirem, inclusive violentos, podem decorrer da falta de discussão do problema que está verdadeiramente causando o desentendimento entre as pessoas.”
Os vínculos familiares, na atualidade, urgem rapidamente do início ao fim, iniciando-se com o período romântico, sem quaisquer problemas ou suposições problemáticas, e mal se inicia, finda de forma traumática, sendo levado as vias judiciárias para resolução. Aqueles que se vêm diante de um processo de separação judicial sofrem censuras de todos os lados, por isso é tão natural, que as pessoas envolvidas em questões de famílias, se encontrem em meio a uma avalanche de sentimentos, o que influencia negativamente a demanda.
Um processo judicial envolvendo questões do Direito de Família que seguir a via ordinária pelo litígio, deixará ambas as partes inseguras, havendo probabilidade de se sentirem desamparadas, pessimistas, abandonadas e deprimidas, pois as negociações estão nas mãos dos advogados e as decisões com o juiz. Provindo destas incertezas uma grande ansiedade. A sentença judicial não é garantia de resolução da problemática que envolve o caso, surgindo uma parte vencedora e outra vencida, ambas certas de serem detentoras de um direito subjetivo (LEITE, 2008, s.p.).
Hoje o escritório do profissional da advocacia tem papel fundamental na resolução de conflitos e na promoção da entidade familiar, pois é aonde, primeiramente, chegam os problemas do núcleo familiar, cabendo ao advogado estabelecer uma relação de confiança, prestando as informações indispensáveis que devem ser enfrentadas no âmbito jurídico e pessoal. Deve o profissional do direito ser um auxiliar na promoção da entidade familiar e não um fomentador de processos judiciais, auxiliando o cliente a lidar com o sofrimento, devendo orientar sobre a realidade jurídica do caso e procurar promover a mediação como primeiro passo.
Com base na compreensão de Warat (1999, s.p.), a justiça estatal em suas decisões na área do Direito de Família, não consegue extinguir a fonte do litígio, pois o que se pretende é resolver um problema de cunho afetivo-emocional, as pessoas envolvidas neste impasse, carregam um sentimento de fracasso pelo desfazimento do vínculo conjugal, os filhos atuam como produto desta relação desfeita e o casal como representantes deste projeto frustrado.
Atualmente, que a legislação não mais prevê a apuração da culpa ou do culpado da separação, a mediação surge com uma gama de vantagens a aprimorar o traumático processo judicial. O mediador tem o dever de mostrar a ambos os cônjuges que a separação não deve ser utilizada para punir ou se vingar da outra parte, principalmente, se existirem filhos. O mediador deve convencer as partes que, mesmo que o filho seja muito pequeno para entender o que está acontecendo, um dia ele irá crescer e tomará consciência de tudo que aconteceu durante o processo.
A vantagem mais relevante segundo Milton de Oliveira (2000, s.p.), diz respeito à diminuição dos desgastes emocionais, em face de não estimular a contradição e nem se busca desmentir os implicados, ao contrário, procura-se clarear as diferentes percepções dos envolvidos, sem que sejam desqualificadas, pois perceber diferentes aspectos de uma mesma questão não necessariamente implica que uma das partes esteja mentindo.
O mediador nestes processos envolvendo o Direito de Família deve pautar seu trabalho na busca de promover a esperança entre as partes, na possibilidade de firmação de novo laços, pacificando o conflito familiar e despertando a responsabilidade das partes e dos profissionais envolvidos na reorganização familiar.
A credibilidade da mediação, como processo eficaz para solução de controvérsias, está diretamente relacionada ao desempenho do mediador, que deverá pautar seu trabalho nos seguintes princípios: a voluntariedade (liberdade para escolher o método e optar pela continuidade ou desistência), a confidencialidade (garantia de sigilo), estímulo a não competitividade (incentivo a colaboração entre as partes), reaproximação entre as pessoas em conflito (manutenção do vínculo familiar) e autonomia das decisões (retomada da autodeterminação), conforme Sales (2003, s.p.).
Atua assim, o mediador, de forma imparcial, com competência, diligência e flexibilidade, fazendo da mediação um processo informal, sendo um facilitador da comunicação entre a família em conflito. Deve, o mediador, ser qualificado para este fim, sabendo ouvir as partes e ser capaz de explicitar as vantagens de um acordo, analisando a situação sob a ótica da Psicologia e do Direito.
Para a professora Ionete de Magalhães Souza:
“O mediador não sugere solução, não induz e nem tão-pouco decide. A sua função é propiciar uma maior e melhor escuta das partes, para que a compreensão seja introduzida na sequência dos fatos narrados, levando os litigantes ao exercício da tolerância recíproca. Por isso, não se confunde com a Conciliação, que pode sugerir e induzir comportamentos ou decisões.
O entendimento do que se vive faz com que ocorra uma satisfação bem mais eficaz, do que muitas das sentenças impostas por outrem, mesmo que fundamentadas no direito, mas vazias de compreensão psicofamiliar (ainda que da parte dita “vencedora da lide”).”
Embora existam os Projetos de Lei n.º 505/2007 e o n.º 507/2007, na Câmara dos Deputados, que visam a alteração do artigo 1.571 do Código Civil, com a regulamentação legal do instituto da mediação, não é possível olvidar que a mediação, efetivamente já existe, sendo utilizada num tratamento interdisciplinar, o qual conforme Ionete de Magalhães Souza objetiva “[…] tratar com prioridade o emocional, com a valorização dos sentimentos e a busca equilibrada de um diálogo finalista.”
No Direito de Família a mediação de conflitos tornou-se uma prática interdisciplinar com o objetivo de construir a interlocução entre as partes, para que estas perceberam e reconheceram as diferenças, discutindo suas divergências e negociando as convergências possíveis, com o fim de criar e/ou recriar vínculos, transformando possibilidades em ações, reconhecendo a si mesmo e ao outro como protagonista de experiências e comportamentos que, transformados, os levarão ao consenso e a preservação do relacionamento, convertendo assim o contexto adversarial em colaborativo, por isso a mediação transcende a solução de conflitos.
Considerações finais
As breves considerações realizadas sobre a mediação apresentam este instituto com um complemento e alternativa a resolução dos conflitos no Direito de Família, podendo ser realizado dentro ou fora do Poder Judiciário, mas como medida na qual as partes assumam a responsabilidade na solução dos impasses, estimulando a continuidade dos vínculos e o compromisso com o estipulado.
O mediador deve ser um profissional qualificado, pronto para ouvir as partes, estimulando o diálogo e a discussão do problema, reconhecendo as relações familiares contemporâneas como pautadas na afetividade, e sendo esta a base do Direito de Família capaz de gerar direitos e obrigações.
Compete ao Poder Judiciário, ao Ministério Público, aos Advogados, Psicólogos, Assistentes Sociais e demais profissionais que autuam na área do Direito de Família, estimular a mediação, como meio alternativo da resolução dos conflitos familiares, disseminando uma visão ética nos litígios e humanizando a justiça, vindo a se compreender a origem do litígio e as perspectivas dos lados divergentes.
A aprovação de lei ou alteração do Código Civil que normatize o instituto da mediação, talvez não concretize o que de fato consiste a sua essência. Mas, deve ser aperfeiçoada e estudada, tendo sempre em vista que o mediador deve apresentar-se de forma qualificada e com a técnica adequada a resolução dos conflitos familiares.
advogada. Graduada em Direito pela Universidade Regional Integrada (URI – Santiago); Mestranda em Educação na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM); Especializanda em Direito de Família e Sucessões na ULBRA – Santa Maria.
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