Casamento homoafetivo com fundamento no direito contramajoritário

Resumo: Este trabalho tem por objetivo abordar o direito ao casamento homoafetivo em vista de uma garantia constitucional, qual seja, o princípio da igualdade, considerado um dos maiores pilares do ordenamento jurídico. Neste estudo utilizou-se o método dedutivo, partindo da diferenciação entre igualdade formal e igualdade material, se direcionando para a apuração da previsão constitucional da igualdade material. Para, por fim, tornar-se possível tratar especificamente do direito ao casamento homoafetivo como garantia assegurada pelo princípio de igualdade material. A pesquisa é de caráter bibliográfico, buscando explicar o problema a partir de referências teóricas já reconhecidas, para compreendê-lo em sua profundidade e amplitude. Constatou-se que a existência da possibilidade jurídica do casamento homoafetivo decorre de uma premissa fundamental, que é a transgressão do princípio da igualdade formal em igualdade material, tornando legítima essa modalidade de casamento.

Palavras-chave: Princípio da Isonomia. União homoafetiva. Casamento. Igualdade material.

Resumen: Este estudio tiene como objetivo abordar el derecho a homoafetivo matrimonio en vista de una garantía constitucional, es decir, el principio de igualdad, uno de los principales pilares del sistema legal. En este estudio se utilizó el método deductivo, basado en la diferenciación entre la igualdad formal y la igualdad material, moviéndose hacia la determinación de la disposición constitucional de igualdad material. Para llegar a ser finalmente posible para tratar específicamente el derecho a homoafetivo matrimonio como una garantía proporcionada por el principio de la igualdad material. La investigación bibliográfica es, tratando de explicar el problema de las referencias teóricas ya reconocidos, para entenderlo en su profundidad y amplitud. Se encontró que la existencia de la posibilidad legal de homoafetivo matrimonio se deriva de una premisa fundamental, que es la transgresión del principio de la igualdad formal en igualdad material, por lo que este modo legítimo de la boda.

Palabras clave: Principio de igualdad. Unión homosexual. El matrimonio. Igualdad material.

Sumário: Introdução. 1. Igualdade formal e igualdade material, diferenciação. 2. Previsão da igualdade material na Constituição Federal. 3. Direito ao casamento homoafetivo em vista da garantia de igualdade material. Considerações finais. Referências.

INTRODUÇÃO

Ao longo dos anos, questionamentos pertinentes a homossexualidade vem sendo objeto de estudo e debate jurídico. Trata-se de uma mudança das entidades familiares, que passam a ser fundadas no afeto, não mais somente no casamento entre homem e mulher. O direito ao casamento homoafetivo, embora não se tenha previsão expressa no texto da Magna Carta Brasileira, encontra legitimidade em um princípio constitucional, qual seja o princípio da isonomia que norteia todo o ordenamento jurídico.

1– IGUALDADE FORMAL E IGUALDADE MATERIAL, DIFERENCIAÇÃO

O presente estudo tem por escopo efetuar a diferenciação entre a igualdade formal e a igualdade material, bem como, tratar brevemente da evolução do princípio da isonomia e sua aplicação sob a perspectiva constitucional, dando bases para o debate acerca da previsão constitucional da igualdade material, para posteriormente verificar o direito ao casamento homoafetivo como garantia de igualdade material.

Desde o nascimento da história constitucional do Brasil, o princípio da igualdade fez-se presente, sendo que em maior ou menor proporção, sempre se tratou da isonomia. (MENUZZI, 2010, p. 49) O indivíduo independente não mais é aceito, só existindo inserido na sociedade, dentro do corpo coletivo.  (MENUZZI, 2010, p. 42) A igualdade situa-se no campo social, sendo que a convenção social pode produzi-la ou negá-la. Então, “a igualdade pressupõe a superação das desigualdades”. (MENUZZI, 2010, p. 41)

De acordo com Walter Claudius Rothenburg (2008, p. 78), “igualdade é algo que precisa ser obtido a partir de reivindicações e conquistas e, para tanto, o Direito pode servir de valiosa ferramenta.”

Em tal empreitada faz-se conveniente respaldar que o caput do art. 5° da Constituição Federal, prevê que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, […]”.[1]Nesse sentido, para Luis Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior (2010, p. 153), o constituinte ao mencionar no caput do art. 5° da Magna Carta a garantia dos direitos individuais e coletivos, dentre eles a igualdade, reconhece de imediato que “todos são iguais perante a lei”.

Ao preceituar no texto legal da Constituição Federal “a igualdade de todos perante a lei”, não é outra coisa senão a “igualdade formal, pura identidade de direitos e deveres entre os membros da coletividade através da legislação”. (MENUZZI, 2010, p. 50) E, por estar presente tanto no Preâmbulo quanto no caput do art. 5°, é considerada como “norma supraconstitucional, ou seja, princípio, direito e garantia, a que todas as normas devem adequar-se”. (MENUZZI, 2010, p. 49-50) O principal texto constitucional a versar sobre direitos fundamentais, dentre eles o princípio da igualdade, é a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Princípio o qual é considerado “a premissa mais importante do Estado Moderno juntamente com a Liberdade, que é a Igualdade.” [2]

Torna-se imprescindível, o direcionamento acerca das duas dimensões da igualdade. Para tal, importa trazer à colagem o seguinte pensamento:

 “A igualdade entre todos, proclamada na Constituição Federal, deve ser entendida como uma ligação entre o direito e a realidade que lhe é subjacente e, nesta perspectiva, implementada em duas dimensões distintas, como igualdade material e como igualdade formal.” (MENUZZI, 2010, p. 51)

O discernimento entre essas duas dimensões reside na dicotomia entre o real e o abstrato,

“[…] entre igualdade formal (de direito) e material (de fato), reproduz-se a distância entre o esperado (no plano normativo) e o acontecido (no plano da realidade), e a distinção corresponde a uma suposta diferença entre teoria (igualdade formal) e prática (igualdade material).” (ROTHENBURG, 2008, p. 85)

A igualdade de direito refere-se a uma declaração abstrata (textual), enquanto a igualdade de fato diz respeito à efetividade da igualdade, à concretização. Existe uma distinção entre os planos da validade (plano do dever ser) e da efetividade (plano do ser).  (ROTHENBURG, 2008, p. 84-85)

É preciso que se tenha claro, para melhor compreensão, que a igualdade formal tornou-se ineficiente na tarefa de garantir a emancipação de grupos historicamente discriminados, e que, na atual conjuntura, faz-se necessária a transgressão da igualdade puramente formal, perante a lei, para a igualdade material, concreta. (MENUZZI, 2010, p. 70) Isto se deve à mudança das demandas, que diferentemente daquela divisão da sociedade industrial entre burgueses e proletários, agora são referentes a um corpo coletivo, “às novas identidades”. Sendo que as minorias agora são outras, “como, por exemplo, negros, mulheres, homossexuais, idosos, crianças e adolescentes, deficientes físicos, e assim por diante”. (MENUZZI, 2010, p. 72)

Para Araújo e Nunes Júnior (2010, p. 153), o princípio da isonomia deve ser observado tanto pelo legislador quanto pelo aplicador da lei, sendo dispensado “tratamento igualitário a todos os indivíduos, sem distinção de qualquer natureza”. Ou seja, conforme Aristóteles, tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual na medida de suas desigualdades. Contudo, existe a dificuldade em apontar em cada caso concreto quem são os iguais, quem são os desiguais e qual a medida dessas desigualdades. Então a lei deve primeiramente discriminar as situações para assim poder regulamentá-las. Em várias hipóteses é a Constituição que aprofunda a regra da isonomia material,[3] em outras, é o próprio constituinte quem estabelece as desigualdades. Nesta linha de raciocínio, argumenta Lenza (2014, p. 1072-1073): “[…] a grande dificuldade consiste em saber até que ponto a desigualdade não gera inconstitucionalidade”.

Em determinadas situações a discriminação não contradita, mas realiza o preceito constitucional da isonomia. Como é visto, na exigência de altura mínima de 1,5m para inscrição em concurso de advogado da Prefeitura, sendo tal exigência inconstitucional. O mesmo requisito, se adotado em concurso para ingresso na carreira policial encontra-se de acordo com o princípio da igualdade e com a ordem constitucional. Isso, pelo porte físico nesse caso, constituir-se elemento essencial para o bom desempenho das funções policiais. (ARAUJO; NUNES JÚNIOR, 2010, p. 153-154)

O constituinte usando a disciplina do princípio da igualdade tratou de proteger certos grupos historicamente marginalizados da sociedade ou hipossuficientes devido a outros fatores, estabelecendo medidas de compensação em busca de concretizar uma igualdade de oportunidades com os demais indivíduos. São as ações afirmativas, tais como previstas na Constituição Federal a posse indígena (art. 231, §2°), o trabalho da mulher (art. 7°, XX), a reserva de mercado de cargos públicos aos portadores de deficiência (art. 37, VIII) dentre outras regras. (ARAUJO; NUNES JÚNIOR, 2010, p. 156)

Convém apontar o conceito de ações afirmativas, que “são políticas públicas que se destinam à realização do princípio constitucional da igualdade material e à neutralização dos efeitos da discriminação”. (MENUZZI, 2010, p. 76) Servindo de mecanismo de inclusão social, “constituindo-se em medidas especiais que objetivam acelerar o processo de igualdade, como o alcance da isonomia não apenas formal, mas material por parte dos grupos tidos como vulneráveis”, com propósito de garantir direitos negados por ações discriminatórias.[4]

Utilizando-se da força normativa do vértice do ordenamento jurídico brasileiro, que é a Constituição, devem ser geradas políticas públicas para viabilizar a transformação da igualdade formal em igualdade material. Importa, porém, realizar a fundamental distinção entre igualdade formal e igualdade material, sendo que na primeira os direitos eram simplesmente reconhecidos pelo Estado, enquanto que, para concretização da igualdade material fazem-se necessárias políticas sociais reconhecidas normativamente. (MENUZZI, 2010, p. 72-73)

Em outros termos, “[…] as ações afirmativas representam o mais avançado estágio evolutivo do Estado Democrático Social de Direito na busca da transformação da ‘igualdade formal’ em ‘igualdade material’”. (MENUZZI, 2010, p. 73) Sem dúvida, é extrema a relevância social das ações afirmativas na diminuição das disparidades. Uma vez que, de nada adiantaria apenas a garantia de isonomia prevista no texto legal, sem medidas que pudessem proporcionar a materialização deste princípio que é um dos maiores pilares da Magna Carta Brasileira, bem como de todo ordenamento jurídico.

2 – PREVISÃO DA IGUALDADE MATERIAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

A segunda etapa da presente pesquisa visa buscar a previsão legal do princípio da igualdade material consubstanciada nos ditames constitucionais.

Interessante se faz retomar o conceito de igualdade material antes de procurar sua previsão constitucional. A igualdade material, geralmente é associada ao pensamento do célebre filósofo Aristóteles, de que é necessário tratar de maneira igual os iguais e desigualmente os desiguais, na real proporção da sua desigualdade. Rodrigues[5] explica que sobre essa conceituação, "aplica-se a igualdade material ou substancial, que é aquela igualdade baseada no caso concreto e não especificamente como está na lei, formalizada. Deve haver uma interpretação da norma abstrata com o caso concreto."

O princípio da igualdade encontra-se tanto no texto constitucional em seu art. 5°, quanto no preâmbulo da Magna Carta Brasileira, se tratando, portanto de norma supraconstitucional, princípio, direito e garantia; tendo por finalidade a equiparação entre os cidadãos em todos os aspectos, incluindo o jurídico.[6] Cardoso[7] tece que o princípio da igualdade assume duas personalidades, sendo uma delas teórica objetivando reprimir privilégios injustificados e a outra no sentido de almejar a diminuição dos efeitos consequentes das desigualdades demonstradas perante o caso concreto. Nessa mesma linha de pensamento Martinez [8] esclarece que:

“Nunca é demais lembrar que o princípio da igualdade deve operar tanto no sentido de se tornar uma vedação ao legislador na edição de leis que possam criar privilégios entre pessoas que se encontram em situação idêntica como deve ser considerado uma regra de interpretação para o operador do direito, que deverá aplicar a lei e os atos normativos de forma igualitária, ou seja, sem distinções, se estiver diante de pessoas em situações iguais. Além disso, esse princípio exerce uma função limitadora perante os particulares, que não poderão praticar condutas discriminatórias, sob pena de responsabilidade civil e penal, nos termos da legislação vigente.”

Pode-se assegurar que a isonomia é o mais amplo dentre todos os princípios constitucionais, possuindo caráter absoluto, impondo-se por si mesmo. Torna-se obrigatório então, a adequação e o cumprimento de tal princípio, que uma vez contrariado é caso de flagrante inconstitucionalidade. Destarte, para que esse preceito tenha eficácia jurídica, o aplicador do direito deverá realizar a análise primeiramente do conteúdo da norma, buscando compreender todos os seus sentidos, para, a partir de então, interpretar o caso concreto e decidir da forma mais justa possível, efetivando e garantindo o direito.[9]

Conseguintemente, pode ser constatado que sob os parâmetros da igualdade material, o propósito vai além de proporcionar apenas a equivalência entre as partes, mas assume a intenção de promover a justiça mais adequada e proporcional ao fato que se apresenta particularizado, corporificando a real acepção da palavra justiça.

3 – DIREITO AO CASAMENTO HOMOAFETIVO EM VISTA DA GARANTIA DE IGUALDADE MATERIAL

O termo homoafetividade consiste em um neologismo criado pela renomada desembargadora Maria Berenice Dias (2011, p. 9), com o nítido objetivo de impor respeito às uniões homossexuais e oferecer maior visibilidade às mesmas. Uma vez que a expressão homossexual aparenta ter uma conotação unicamente de natureza sexual.

As uniões homossexuais são caracterizadas por sociedades de afeto e amor. Tal concepção é fortificada em razão da análise ao art. 226 da CF/88, o qual é considerado como a “porta para o Direito de Família”, pacificando diversos entendimentos, não obstante deixando a desejar no que concerne ás discussões relativas ao caráter familiar das uniões homoafetivas. No § 3°, refere-se à família como sendo o núcleo formado pela união estável, somente entre homem e mulher. Já no § 4° inclui como entidade familiar aquela denominada monoparental, constituída por um dos pais e sua prole. O afeto é requisito para o reconhecimento do caráter familiar tanto à união estável quanto à família monoparental. A partir dessa compreensão, torna-se evidente que também deve ser atribuído o status de família àquelas formadas por casais homossexuais. (VARGAS, 2011, p. 84-85)

É de conhecimento amplo, que a Constituição Federal de 1988, ao tratar sobre o casamento ou conversão de união estável em casamento, menciona em seu texto apenas a união entre homem e mulher, mas emprega interpretação conforme a Resolução n. 175, de 14-5-2013, que veda às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil, ou conversão de união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo. Além da declaração procedente do STF sobre a ADIn n. 4.277 e a ADPF n. 132, em 5-5-2011, que declarou aplicabilidade de regime da união estável às uniões homoafetivas.(NERY, 2013, p. 75-76)

Nesta senda, em concepção esclarecedora de Dias (2013, p. 205), não há exigência que o casal seja formado por pessoas de sexo diferente, no que concerne ao tratamento do Código Civil em relação ao casamento. Desse modo, não existindo proibição constitucional ou legal, não se tem argumentos plausíveis para impedir o casamento homoafetivo. Tal ideia encontra-se arraigada no texto constitucional, em seu artigo 5°, inciso II o qual prevê que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.[10] Neste liame, se não há lei, não quer dizer que não exista um direito a ser juridicamente tutelado. (DIAS, 2013, p. 206)

A Magna Carta Brasileira, acompanhando a evolução dos fatos da vida, restou evidente em seu artigo 226, o reconhecimento da existência de relações afetivas fora do casamento, emprestando especial proteção à união estável entre homem e mulher e às famílias monoparentais. Por conseguinte, não restringiu em momento algum no texto constitucional, a entidade familiar homoafetiva, logo, deve ser reconhecida sua união estável. Considerando que se encontra sob a tutela constitucional a família, ou seja, qualquer família originada em um vínculo afetivo. (DIAS, 2013, p. 206)

Nesse mesmo sentido, levando em consideração o enunciado do art. 5º caput da atual Carta Maior Brasileira, é assegurado que perante a lei todos devem ser tratados de forma igual, de modo que não haja distinções de natureza alguma. Pela própria literalidade dessa expressão legal, pode ser constatado, que o tratamento desigual e a discriminação aos diversos, acabam por resultar em um desrespeito ao preceito constitucional que fundamenta a igualdade. De tal sorte, no que tange essa questão, imprescindível se faz trazer à baila o julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a seguir colacionado:

“APELAÇÃO CÍVEL. CONVERSÃO DE UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA EM CASAMENTO. CASAMENTO ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. DESCONSTITUIÇÃO DA SENTENÇA PARA REGULAR PROCESSAMENTO DO FEITO. 1. Tendo em vista o julgamento da ADI nº 4.277 e da ADPF nº 132, resta superada a compreensão de que se revela juridicamente impossível o reconhecimento de união estável, em se tratando de duas pessoas do mesmo sexo. 2. Considerando a ampliação do conceito de entidade familiar, não há como a omissão legislativa servir de fundamento a obstar a conversão da união estável homoafetiva em casamento, na medida em que o ordenamento constitucional confere à família a "especial proteção do Estado", assegurando, assim, que a conversão em casamento deverá ser facilitada (art. 226, § 3º, CF/88). 3. Inexistindo no ordenamento jurídico vedação expressa ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, não há que se cogitar de vedação implícita, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais da igualdade, da não discriminação, da dignidade da pessoa humana e do pluralismo e livre planejamento familiar. Precedente do STJ. 4. Afirmada a possibilidade jurídica do pedido de conversão, imperiosa a desconstituição da sentença, a fim de permitir o regular processamento do feito. APELO PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70048452643, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 27/09/2012- Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 20 out. 2015).[11] (grifo do autor)

Depreende-se que resta evidente a legitimidade e a possibilidade jurídica da conversão de união estável homoafetiva em casamento, embasando-se em uma interpretação mais ampla da lei e dos princípios constitucionais. O julgado supramencionado demonstra com propriedade as razões a que se pode afirmar que o casamento homoafetivo, nada mais é que o reconhecimento de um direito existente, legítimo. Embora haja omissão por parte do legislador, não ocorre em momento algum no ordenamento jurídico a vedação à modalidade de casamento entre pessoas do mesmo sexo. Neste viés, Fábio de Oliveira Vargas (2011, p. 26) argumenta que:

“Em um Estado Democrático de Direito formalmente organizado, cujo ordenamento jurídico confere aos cidadãos, entre outras garantias fundamentais, o direito à privacidade, à igualdade e à liberdade, não se pode admitir que persistam vedações de natureza meramente discriminatória, atentatórias ao direito e liberdades, como as restrições feitas às células familiares homossexuais, no sentido de impossibilitar o exercício de direitos patrimoniais, como, por exemplo, os sucessórios.”

Ainda relatando os princípios constitucionais, Carolina Valença Ferraz (2013, p. 213), esclarece que o princípio da dignidade da pessoa humana, expresso no art. 1º, inciso III, da Carta Magna Brasileira, deixa esclarecido que qualquer pessoa deve ter sua dignidade respeitada, argumenta ainda que, “o respeito à orientação sexual de cada ser humano implica respeitar a sua dignidade e a sua intimidade. Afinal, a sexualidade representa o livre desenvolvimento da personalidade."

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao realizar uma análise detalhada sobre os preceitos que a Constituição Federal promulgada em 1988, procura resguardar, em especial ao princípio da isonomia, pode ser verificado que a união homoafetiva não encontra meios que excluam a possibilidade de efeitos na esfera civil. Os princípios amparam a busca pela concretização da igualdade material entre os indivíduos, de igual forma auxiliam na conquista de direitos ainda não positivados, mas que podem e devem ser reconhecidos como legítimos. Tal como o direito a conversão da união estável homoafetiva em casamento, por não haver restrição legal, apenas omissão por parte do legislador, não existem argumentos convincentes para justificar o não reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Portanto conclui-se que é de extrema relevância a abordagem trazida pela concepção de igualdade e justiça, presente no princípio da isonomia, que é um dos maiores pilares do ordenamento jurídico brasileiro.

 

Referências
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BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70048452643, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 27/09/2012- Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 20 out. 2015.
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VARGAS, Fábio de Oliveira. União Homoafetiva: direito sucessório e novos direitos. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2011.
Notas:
[1] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao /Constituicao.htm>. Acesso em: 05 maio 2016.
[2] STEFENI, Roberto José; MENUZZI, Jean Mauro. Igualdade de gêneros. Em busca da equiparação. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XVII, n. 121, fev 2014. Disponível em: <http://www.ambitojuridico. com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_i d=14248>. Acesso em: maio 2015.
[3] Na concepção de LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 18. ed. rev., atual. eampl. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 1072. “a própria Constituição se encarrega de aprofundar a regra da isonomia material: a) art. 3°, I, III e IV; b) art. 4°, VIII; c) art. 5°, I, XXXVII, XLI e XLII; d) art. 7°, XX, XXX,29 XXXI, XXXII e XXXIV; e) art. 12, §§ 2° e 3°; f) art. 14, caput;g) art. 19, III; h) art. 23, II e X; i) art. 24, XIV; j) art. 37, I e VIII; k) art. 43, caput; l) art. 146, III, “d” (EC n. 42/2003- Reforma Tributária); m) art. 150, II; n) art. 183, § 1°, e art. 189, parágrafo único; o) art. 203, IV e V; p) art. 206, I; q) art. 208, III; r) art. 226, § 5°; s) art. 231, § 2° etc.”
[4] MENUZZI, Jean Mauro. MENUZZI, Loreni Saugo. Revista Temas Sociais em Expressão. Frederico Westphalen. v. 9, n.9, p. 75-96. Maio 2010, p. 82.
[5] RODRIGUES, Isabelle Cristina. Princípio da igualdade e a discriminação positiva. In: Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 jul. 2012. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos& ver=2.38099&seo=1>. Acesso em: 13 out. 2015.
[6] SILVA, Marcelo Amaral da. Digressões acerca do princípio constitucional da igualdade – Página 2/2. In: Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 66, 1 jun. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/ 4143>. Acesso em: 10 out. 2015.
[7] CARDOSO, Rodrigo Eduardo Rocha. Abordagem constitucional acerca do princípio da igualdade e das ações afirmativas no ensino superior. In: Direito Net Disponível em: <http://www.direitonet. com.br/artigos/exibir/2787/Abordagem-constitucional-acerca-do-principio-da-igualdade-e-das-acoes-afirmativas-no-ensino-superior>. Acesso em: 13 out. 2015.
[8] MARTINEZ, Anna Luiza Buchalla. Princípio da igualdade: evolução e aplicação na Constituição. In: Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3128, 24 jan. 2012. Disponível em: <http://jus.com. br/artigos/20924>. Acesso em: 13 out. 2015.
[9] SILVA, Marcelo Amaral da. Digressões acerca do princípio constitucional da igualdade – Página 2/2. In: Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 66, 1 jun. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/ 4143>. Acesso em: 10 out. 2015.
[10] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao /Constituicao.htm>. Acesso em: 05 maio 2016.
[11] Apelação Cível Nº 70048452643, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 27/09/2012- Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 20 out. 2015.

Informações Sobre os Autores

Jacó Ziech

Acadêmico de Direito na Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões / Câmpus de Frederico Westphalen / RS – URI / FW

Jean Mauro Menuzzi

Mestre em Direito, Funcionário Público Estadual e professor universitário – URI/FW. Possui licenciatura em Filosofia, Psicologia e História, área em que é especialista


Equipe Âmbito Jurídico

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