Resumo: O presente artigo tem por finalidade analisar o Comércio Eletrônico e suas implicações no Direito do Consumidor. O tema apresentado, e pontualmente delimitado, é de atual relevância no cenário jurídico, o que faz referência a diversas provocações, tanto nas implicações jusfilosóficas sobre os direitos quanto nas análises da efetivação e da garantia de proteção e defesa dos direitos do consumidor em relação a atuação do Poder Judiciário. Para defender, a atual necessidade de evolução dos Poderes Públicos na defesa do consumidor, o nosso trabalho fora dividido nos seguintes capítulos: posição dos juízes e tribunais; comércio eletrônico: conceito, implicações e dados estatísticos; regramento jurídico; cdc e decreto 7.962/13; projetos de lei em tramitação; as revoluções tecnológicas, modificação da atuação estatal e o surgimento do direito do consumidor. Por fim, deve-se afirmar que tal estudo é de grande valia para os operadores do Direito, ante a recente regulamentação do comércio eletrônico, bem como de uma recente posição jurisprudencial.
Palavras-chave: Revolução Industrial; Comércio Eletrônico; Jurisprudência.
Abstract: This article aims to analyze the Electronic Commerce and its implications on Consumer Law . The topic presented , and punctually defined , is of current relevance in the law , which refers to various provocations , both the implications jusfilosóficas rights as in the analysis of effectiveness and ensuring the protection and defense of consumer rights in relation to judicial power . To defend the current need for evolution of public powers in consumer protection , our work had been divided into the following chapters : position of judges and courts ; commerce : concepts , implications and statistical data ; regramento legal ; cdc and Decree 7.962/13 ; bills in progress , technological revolutions , change of state action and the emergence of consumer law . Finally , it should be stated that this study is of great value to the operators of the law, before the recent regulation of commerce , as well as a recent jurisprudential position .
Key words: Industrial Revolution ; Commerce ; Jurisprudence.
Sumário: 1. Introdução. 2. As revoluções tecnológicas modificação da atuação estatal e o surgimento do direito do consumidor. 3. Comércio eletrônico: conceito implicações e dados estatísticos. 4. Regramento jurídico. 4.1 CDC e Decreto 7.962/13. .2 projetos de lei em tramitação. 5. Posição dos juízes e tribunais. 6. Conclusão. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Nosso artigo científico tem como finalidade fazer uma análise sobre o Direito do Consumidor frente a utilização do comércio eletrônico, como gerador de contratos, em especial relações jurídicas de consumo, sem que o consumidor e o fornecedor estejam frente a frente.
O tema apresentado, e pontualmente delimitado, é de atual relevância no cenário jurídico, o que faz referência a diversas provocações, tanto nas implicações jusfilosóficas sobre os direitos quanto nas análises da efetivação e da garantia de proteção e defesa dos direitos do consumidor em relação a atuação do Poder Judiciário.
Para defender, a atual necessidade de evolução dos Poderes Públicos na defesa do consumidor, o nosso trabalho fora dividido nos seguintes capítulos: posição dos juízes e tribunais; comércio eletrônico: conceito, implicações e dados estatísticos; regramento jurídico; cdc e decreto 7.962/13; projetos de lei em tramitação; as revoluções tecnológicas, modificação da atuação estatal e o surgimento do direito do consumidor.
Faz-se necessário demonstrar que o artigo proposto busca realizar um profundo estudo sobre a atuação do Poder Judiciário na efetivação dos direitos e garantias de proteção e defesa do consumidor, ante a sociedade contemporânea.
É necessária a adequação do ordenamento jurídico e o posicionamento jurisprudencial brasileiro de proteção e defesa dos direitos do consumidor, com base na garantia e efetivação da dignidade da pessoa humana, ante a sociedade complexa de informação, capital e consumo, e a utilização dos meios eletrônicos na realização de negócios pela Internet.
2. AS REVOLUÇÕES TECNOLÓGICAS, MODIFICAÇÃO DA ATUAÇÃO ESTATAL E O SURGIMENTO DO DIREITO DO CONSUMIDOR
A partir do momento em que o homem decidiu viver em sociedade – lembrando-se que esta é dinâmica – ou seja, existe uma modificação dos valores sociais com o passar do tempo, em razão de diversos fatores, mas podemos citar que as revoluções tecnológicas ou industriais contribuíram imensamente para evolução da produção e da economia.
Nas palavras de Irany Ferrari[1]:
“A evolução econômica dos povos constitui-se das seguintes fases: a) economia doméstica ou familiar; b) economia urbana; c) economia nacional; d) economia mundial.”
Em razão da Revolução Industrial que segundo Irany Ferrari permitiu a produção em série – e não mais manufatureira ou artesanal, bem como impulsionou o crescimento das cidades, a economia passou de doméstica para economia nacional, ou seja, a produção industrial passa a ser responsável por um aumento da produção que só permite a realização da venda a inúmeras pessoas, através de contratos de adesão.
O professor Arion Romita[2], afirma que se pode distinguir em três revoluções na tecnologia e que tiveram como fonte a modificação da energia utilizada na indústria:
“A observação dos fatos históricos que caracterizam a evolução do capitalismo permite discernis três revoluções industriais: 1ª – fins do século XVIII, princípios do século XIX: proporcionada pela produção de motores a vapor por meio das máquinas; 2ª – fins do século XIX, princípios do século XX: desenvolvimento e aplicação do motor elétrico e do motor a explosão; 3ª – a partir da Segunda Guerra Mundial (1940 nos Estados Unidos e 1945 nos demais países): automação por meio de aparelhos eletrônicos. Observa-se sempre a apropriação de fontes energéticas distintas, que ditam as transformações nos meios de produção, as quais por seu turno vão gerar mudanças na organização do trabalho, com as consequencias sociais conhecidas. Na primeira revolução industrial, o vapor d´água; na segunda, a eletricidade e o petróleo; na terceira, a eletrônica e a energia atômica.”
Pode-se concluir nas palavras de Otávio Augusto[3] que a Revolução Industrial é:
“um processo de mecanização em inúmeros setores produtivos, gerando uma substituição da força muscular humana e animal”.
No que concerne ao Direito do Consumidor, faz-se necessário destacar que a 1ª revolução tecnológica influiu decisivamente para a modificação do paradigma estatal, com a consequente proteção do consumidor.
Afirma Cavalieri Filho[4] com precisão:
“Na constelação dos novos direitos, o Direito do Consumidor é estrela de primeira grandeza, quer pela sua finalidade, quer pela amplitude do seu campo de incidência, mas para entendermos sua origem, especial atenção merece a Revolução Industrial.”
Deve-se salientar que, com a produção industrial em série, modificaram-se totalmente o processo de fabricação, distribuição e de contratação, pois passamos da produção manufatureira e individual – para uma em série e de contratação em massa. Por tais razões, o produtor detentor do capital e dos meios de comercialização não se preocupava mais, nem como o trabalhador, e muito menos com quem estava adquirindo seus produtos, mas tão somente com a venda.
Mais uma vez, citamos as lições de Cavalieri Filho[5]:
“(…) a partir dessa revolução a produção passou a ser em massa, em grande quantidade (…). O novo mecanismo de produção e distribuição impôs adequações também ao processo de contratação, fazendo surgir novos instrumentos jurídicos – os contratos coletivos, contratos de massa, contratos de adesão, cujas cláusulas gerais seriam estabelecidas prévia e unilateralmente pelo fornecedor.”
Por tais razões, o Estado passou a verificar que não se poderia deixar apenas nas mãos do produtor a contratação de produtos e/ou serviços, mas precisava intervir nesta relação, pois em razão liberdade de imposição dos bens pelos fornecedores passaram a praticar inúmeros abusos contra os adquirentes consumidores.
Em razão da vulnerabilidade do consumidor, é que se fez necessária a proteção estatal efetiva nesta relação entre fornecedor e consumidor, buscando reequilibrar as partes nas relações de consumo.
No Brasil, a proteção do consumidor consiste numa obrigação pública, sendo uma norma constitucional programática, e depende da intervenção do Estado, através da implementação de políticas públicas, bem como da edição de leis e da atuação jurisdicional, para a sua efetivação.
Diante deste contexto, a Constituição Federal[6] criou uma obrigação ao Estado, além, do que é também um dos princípios norteadores da ordem econômica e financeira, conforme texto explícito da carta da república:
“Constituição da República Federativa do Brasil.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:(…)
XXXII – o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;
[1]Constituição da República Federativa do Brasil.
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:(…)
V – defesa do consumidor;”
Por fim, afirma-se que para cumprir a obrigação do legislador constitucional houve a publicação da Lei 8.078/90, o Código de Defesa do Consumidor, todavia, em razão da 3ª revolução tecnológica, a eletrônica, faz-se necessária uma atualização da política legislativa e judiciária para buscar a defesa do consumidor. Por tal razão é que passaremos a estudar o comércio eletrônico.
3. COMÉRCIO ELETRÔNICO: CONCEITO, IMPLICAÇÕES E DADOS ESTATÍSTICOS
Inicialmente, verificamos que o Estado precisou intervir nos negócios jurídicos, em razão da 1ª revolução tecnológica, a partir deste momento necessitamos verificar que é necessária uma nova atuação em razão da compra de produtos e serviços pela rede mundial de computadores Internet.
Em razão da utilização da Internet, por uma quantidade incontável de pessoas surgiu nos Estados Unidos da América – os chamados negócios eletrônicos, denominado “e-business”, que abrange não só comprar pela Internet, mas qualquer ação publicitária, ou quaisquer outras que visem transações virtuais.
Diante deste conceito, podemos conceituar o comércio eletrônico – “e-commerce” como aquisição de produtos e serviços pela Internet, nas palavras de Geral Robson Mateus[7]:
“Comércio eletrônico (e-commerce) é a realização de transações de compras e transferências de fundos eletronicamente, especialmente através da Internet. O e-commerce é parte integrante do e-business. Vai fazer a conexão eletrônica entre a empresa e o cliente, seguindo a estratégia estabelecida pelo e-business. Antes da Internet, já havia “comércio eletrônico”, entre empresas, com o uso de EDI (Electronic Data Interchange).”
Em estudo realizado, pesquisadores verificaram que a indústria da tecnologia e da informação tem crescido mais do que o dobro das normais, e consequentemente o número de negócios firmados se multiplicou de forma muito rápida.
Segundo os citados pesquisadores o Departamento de Comércio Eletrônico dos EUA[8] apontou:
“Menos de 40 milhões de pessoas no mundo estavam ligadas na Internet em 1996. No final de 1997 serão 100 milhões de pessoas;
Em dezembro de 1996 tínhamos 627.000 domínios registrados, e pelo final de 1997 já eram 1,5 milhões de domínios;
O tráfego na Internet tem dobrado a cada 100 dias;
A Cisco Systems encerrou 1996 com 100 milhões em vendas pela Internet. Pelo final de 1998, estima em 3,2 bilhões suas vendas anuais;
Em 1996, a Amazon.com, a primeira livraria na Internet vendeu 16 milhões de dólares.
Em 1997 foram 148 milhões de dólares;
Em janeiro de 1997 a Dell Computers tinha vendido menos de 1 milhão por dia na Internet. Em dezembro de 1997 esta empresa reportou ter atingido a cifra de 6 milhões de dólares em vários dias;
Auto-by-Tel, uma empresa de vendas de automóveis baseada na Internet, processou um total de 345.000 requisições de compra de veículos através de seu site em 1996.”
No Brasil, o órgão responsável pelo apoio de empresas e empreendedores é o Serviço de Apoio às Micro e Pequena Empresa – Sebrae[9], realizou a pesquisa estatística do mercado:
“Nos últimos 10 anos, o número de consumidores do e-commerce passou de um milhão em 2001 para mais de 40 milhões em 2012, sendo que temos hoje mais de 80 milhões de internautas.
As facilidades de acesso a cartões de crédito, a popularização da internet, o aumento na venda de computadores e notebooks são alguns aspectos que têm atraído as classes C e D a ir às compras on-line. Do total de consumidores virtuais, que em 2011 superou os 27 milhões, 47% se encaixam nesse perfil.
No ranking de comércio eletrônico dos países latinos, o Brasil é o país que lidera a participação de compras no e-commerce com 59,1%, seguido pelo México (14,2%), Caribe (6,4%), Argentina (6,2%), Chile (3,5%), Venezuela (3,3%), América Central (2,4%), Colômbia (2%) e Peru (1,4%).
Os produtos mais vendidos pelas empresas brasileiras no e-commerce são:
Eletrodomésticos em primeiro (13%),
Saúde, beleza e medicamentos em segundo (13%),
Moda e Acessórios (11%),
Livros, assinaturas de revistas e jornais (10%) e
Informática” (9%).”
Pelo estudo realizado pelo Sebrae[10], verifica-se o grande potencial do comércio realizado pela Internet no nosso país, sendo que além da possibilidade vendas existe uma série de vantagens que surgem com o mesmo. Como exemplo de vantagens podemos citar segundo Geral Robson Mateus:
“Vantagens:
Atingir um mercado global;
Ter um vendedor 24 horas/dia;
Ter um novo canal de vendas e de marketing.
Atendimento personalizado;
Melhor conhecimento e integração das empresas com seus clientes;
Redução de custos de estoques;
Redução de custos de vendas;
Integração de clientes e fornecedores.”
Todavia, nem só vantagens existem com o comércio eletrônico, também possui desvantagens, ou seja, riscos que ocorrem com os consumidores, e que deverão ser suportados pelos fornecedores, segundo Sebrae[11]:
“Desvantagens
vulnerabilidade de hackers para dados de cartões e senhas bancários; compras incorretas em razão da despadronização do tamanho de roupas, de calçados e outros itens do vestuário; possíveis atrasos ou danificação do produto durante a entrega;”.
Mas, não existem outras desvantagens não citadas pelo Sebrae que são de nossa preocupação: a primeira delas a ausência de uma legislação estatal específica para o comércio eletrônico; e a segunda é a interpretação jurisprudencial que será dada, pois a preocupação do Poder Judiciário deve ser maior nas compras eletrônicas, posto que o consumidor não está frente a frente com o fornecedor, não podendo ficar ainda mais a mercê do detentor do poder econômico, no caso o fornecedor que esta apenas preocupado com os lucros. Assim verificaremos o ordenamento jurídico e a interpretação jurisprudencial.
4. REGRAMENTO JURÍDICO
O comércio eletrônico se materializa, através dos contratos eletrônicos, não se caracterizando um novo tipo de contrato, mas sim um contrato de adesão nos moldes do art. 54, do CDC, utilizando-se a Internet para a sua celebração.
Nas palavras de Cavalieri Filho[12], pode-se compreender que:
“Se o contrato eletrônico, como ressaltado de início, não indica um novo tipo de contrato, apenas o meio pelo qual é celebrado, então aplicam-se ao comércio eletrônico as normas do Código Civil pertinentes aos contratos em geral e a cada espécie, bem como os princípios e preceitos do Código do Consumidor sempre que houver relação de consumo.”
Muito embora não exista nenhuma diferenciação entre o contrato comum, e o eletrônico, em razão das desvantagens apontadas alguns princípios do Direito do Consumidor assumem maior importância, o da vulnerabilidade, confiança, informação e segurança. Mais uma vez cita-se Cavalieri Filho[13]:
“Por último, o princicpio da segurança. A insegurança do meio eletrônico é um problema sério, cujo risco corre por conta do fornecedor. Cabe ao ofertante garantir um ambiente confiável e seguro, mesmo quando atua em redes abertas. O risco do empreendimento é do fornecedor, pelo que inaplicável, à luz do CDC, o entendimento daqueles que sustentam que esse risco deve ser repartido no comércio eletrônico.”
Pelas palavras do Desembargador e Professor Sérgio Cavalieri Filho, o ônus no comércio eletrônico deve ser suportado única e exclusivamente pelo fornecedor, não podendo imputar ao consumidor a não entrega de um produto, devendo nos termos do art. 6º, VI, do CDC realizar a reparação integral dos danos morais e materiais.
A efetiva reparação dos danos materiais e morais é direito irrenunciável do consumidor, nestes termos Sérgio Cavalieri Filho afirma que:
“Nestes casos, aplica-se o principio da restitutio in integrum, sendo expressamente vedado qualquer tipo de tarifação e/ou tabelamento da indenização.”
E continua Cavalieri Filho[14] mais uma vez no livro Programa de Direito do Consumidor afirma que:
“(…) Em outras palavras, o vício do produto ou do serviço pode gerar dupla indenização? Além da reparação do vício em si, ainda cabe indenização por perdas e danos? (…) A expressão latina extra rem indica vínculo indireto, distante, remoto; tem sentido de fora (…). O dano moral, o desgosto íntimo, está dissociado do defeito, a ele jungido apenas pela origem. Na realidade, repita-se, decorre de causa superveniente (o não-atendimento pronto e eficiente ao consumidor, a demora injustificável por parte do fornecedor). “Quanto ao dano moral (…) não pode, nem deve, ser insignificante, mormente diante da situação econômica do ofensor, eis que não pode constituir estímulo à manutenção de práticas que agridam e violem direitos do consumidor.”
Quando se trata de compras coletivas, o contratação por adesão ocorre da mesma forma que a individual, a mudança que ocorre é que as empresas se socorrem de uma venda em grande quantidade, a fim de que possam baratear o custo, todavia devem assumir à responsabilidade total da oferta.
A Patrícia Peck[15] afirma:
“(…) ao adquirir o cupom nos sites de compras coletivas, é como se o consumidor fechasse um contrato. Por isso, ela explica que esses sites precisam certificar-se de que estão promovendo a venda de algo que realmente é como está na oferta. Não adianta vender um cupom para ser usado em um salão de beleza que nunca tem horário para atendimento.”
Assim em resumo, o risco efetivo do comércio eletrônico é do fornecedor, devendo este reparar os danos morais, materiais e quaisquer outros causados aos consumidores em caso de não cumprimento da sua obrigação nos contratos eletrônicos de consumo celebrados.
4.1 CDC E DECRETO 7.962/13
O Comércio Eletrônico teve sua regulamentação apenas em 2013, sendo que o Decreto que o expedido pela Presidência foi apresentado à população na data comemorativa ao dia do consumidor 15 de março, tendo como finalidade trazer transparência e segurança aos contratos eletrônicos.
Todavia, antes de falarmos especialmente sobre o novo decreto, faz-se necessário destacarmos o principal dispositivo legal de proteção ao consumidor, o CDC[16] que em seu artigo 49, assim dispõe:
“Código de Defesa do Consumidor:
Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.
Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.”
Na aquisição de produtos e serviços pela Internet, o direito de reflexão, ou arrependimento, tem uma justificativa maior, posto que a vulnerabilidade do consumidor é mais acentuada, bem como não tem contato direto com o produto, portanto deve ser efetivado.
O Superior Tribunal de Justiça, ainda não chegou a uma decisão final em relação de quem deve arcar com os custos do envio do produto, mas como o risco corre por conta do fornecedor a jurisprudência, tende a determinar a arcar com os custos.
Em relação ao decreto que regulamentou o Comércio Eletrônico, a primeira análise a ser feita é sobre a sua constitucionalidade, posto que através de uma norma oriunda do executivo tem-se o regramento da matéria.
Como já dissemos o art. 5º, XXXII, da CF/88 trouxe uma norma programática ao Estado, obrigando-o a proteger o consumidor, de forma que não é só o Poder Legislativo que deve fazê-lo, mas todos os demais inclusive o Executivo.
Com vistas a cumprir o comando constitucional, o Executivo no uso das determinações do art. 84, IV, CF/88 regulamentou o comércio eletrônico.
Analisando a constitucionalidade de decretos, o STF na ADI 4.218, em voto do Ministro Luiz Fux[17] citando as lições de Celso Antônio Bandeira de Melo afirma que:.
“Todos eles [regulamentos] são expedidos com base em disposições legais que mais não podem ou devem fazer senão aludir a conceitos precisáveis mediante averiguações técnicas, as quais sofrem o influxo das rápidas mudanças advindas do progresso científico e tecnológico, assim como das condições objetivas existentes em dado tempo e espaço, cuja realidade impõe, em momentos distintos, níveis diversos no grau das exigências administrativas adequadas para cumprir o escopo da lei sem sacrificar outros interesses também por ela confortados. (…) estas medidas regulamentares concernem tão somente à identificação ou caracterização técnica dos elementos ou situações de fato que respondem, já agora de modo preciso, aos conceitos inespecíficos e indeterminados de que a lei se serviu, exatamente para que fossem precisados depois de estudo, análise e ponderação técnica efetuada em nível da Administração, com o concurso, sempre que necessário, dos dados de fato e dos subsídios fornecidos pela Ciência e pela tecnologia disponíveis”. (Op. Cit. p. 344-346).
Como precisamente definiu Rafael Fernandes Maciel[18]:
“Nem sempre o avanço tecnológico demanda a necessidade de novas leis. O Código de Defesa do Consumidor, já vinha sendo facilmente aplicado às transações realizadas em meio eletrônico, sobretudo o direito ao arrempedimento. (…) O Decreto, então, não inovou buscou apenas definir padrões para direitos já previstos no CDC (…)”.
Nesta perspectiva, em razão da constitucionalidade do Decreto[19], sendo este aplicável aos contratos eletrônicos podemos citar alguns dispositivos que buscam trazer mais informação e segurança aos consumidores, e até mesmo aos fornecedores:
“Art. 1o Este Decreto regulamenta a Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, para dispor sobre a contratação no comércio eletrônico, abrangendo os seguintes aspectos:
I – informações claras a respeito do produto, serviço e do fornecedor;
II – atendimento facilitado ao consumidor; e
III – respeito ao direito de arrependimento.
Art. 2o Os sítios eletrônicos ou demais meios eletrônicos utilizados para oferta ou conclusão de contrato de consumo devem disponibilizar, em local de destaque e de fácil visualização, as seguintes informações:
Art. 3o Os sítios eletrônicos ou demais meios eletrônicos utilizados para ofertas de compras coletivas ou modalidades análogas de contratação deverão conter, além das informações previstas no art. 2o, as seguintes:
I – quantidade mínima de consumidores para a efetivação do contrato;
II – prazo para utilização da oferta pelo consumidor;”.
Estes dispositivos demonstram apenas alguns exemplos da proteção que se quer impor ao consumidor nas comprar eletrônicas, por vim o não cumprimento das normas legais gera a imposição de penalidades devendo os Juízes e Tribunais, quando em conhecimento de infrações oficiar os órgãos competentes para tomar as medidas cabíveis:
“Art. 7o A inobservância das condutas descritas neste Decreto ensejará aplicação das sanções previstas no art. 56 da Lei no 8.078, de 1990.
Art. 56. As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas específicas:
I – multa; II – apreensão do produto; III – inutilização do produto; IV – cassação do registro do produto junto ao órgão competente; V – proibição de fabricação do produto; VI – suspensão de fornecimento de produtos ou serviço; VII – suspensão temporária de atividade; VIII – revogação de concessão ou permissão de uso; IX – cassação de licença do estabelecimento ou de atividade; X – interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade; XI – intervenção administrativa; XII – imposição de contrapropaganda.”[20]
Por fim, verifica-se que o dispositivo do art.56, do CDC afirma que além das penalidades administrativas são aplicadas sem prejuízo da reparação civil integral, razão pela qual deve ser deferido ao consumidor a indenização por danos materiais e morais, em razão da análise do caso pelo julgador.
4.2 PROJETOS DE LEI EM TRAMITAÇÃO
Segundo a pesquisa realizada pelo SEBRAE existem projetos de Lei em tramitação nas Casas do Congresso Nacional, com a finalidade de atualizar o Código de Defesa do Consumidor há mais de 10 (dez) anos, assim citamos os principais:[21]
“PL n° 1.483/1999 – pode ser considerado o marco inicial para a percepção da necessidade de criação de uma lei específica para o comércio eletrônico. A proposta institui a fatura eletrônica e a assinatura digital nas transações de e-commerce.
PL nº 1.589/1999 – dispõe sobre a validade jurídica do documento eletrônico e da assinatura digital, este último pode ser considerado o mais completo instrumento sobre o comércio eletrônico em trâmite no Brasil, tendo em vista que ele é o único que trata da autenticidade das assinaturas digitais.
PL n° 4.906/2001 – o Senado Federal também elaborou um projeto de lei que visa a regulamentação do comércio eletrônico. Tal projeto foi enviado à Câmara dos Deputados sob o n° 4.906 e ainda está aguardando votação em regime de prioridade.
Projetos de Lei do Senado 281 trata de alterações referentes ao comércio eletrônico: o prazo de arrependimento, para compra ou contratação a distância aumentou de 7 a 14 dias, contados da data da aceitação da oferta ou do recebimento do produto ou execução do serviço, o que acontecer por último. Mas se o fornecedor não tiver entregado a confirmação da compra ou o formulário de arrependimento, o prazo para o consumidor se arrepender passa a ser de 30 dias; O consumo sustentável, a obrigação de informar se o uso do produto causa impactos ambientais e a proibição de vender produtos ou serviços que causem impactos ambientais negativos, por exemplo, estão presentes na proposta.
Projeto de Lei n° 1.232/2011 para o comércio eletrônico coletivo, precursor na tentativa de regulamentar esse tipo de comércio: uma das normas prevê que a empresa proprietária do site de vendas coletivas e o estabelecimento ofertante serão responsáveis pela veracidade das informações publicadas, respondendo solidariamente por eventuais danos causados ao consumidor;
A matéria disciplina a venda eletrônica coletiva de produtos e serviços através de sites na internet e estabelece critérios de funcionamento para essas empresas. A maioria dos itens que consta no PL n° 1232/2011 vem sendo também proposto por inúmeras leis estaduais, que tramitam em assembléias legislativas de todo o País. O PL estabelece que essas empresas devem manter serviço telefônico de atendimento ao consumidor, gratuito, assim como informações sobre a localização da sede física do site de vendas coletivas. Além de prever que a empresa proprietária do sítio de vendas coletivas e o estabelecimento ofertante serão responsáveis pela veracidade das informações publicadas, respondendo solidariamente por eventuais danos causados ao consumidor. O projeto estabelece, ainda, “aplica-se ao comércio coletivo eletrônico, no que couber, o disposto no Código de Defesa do Consumidor”.
5. POSIÇÃO DOS JUÍZES E TRIBUNAIS
O Poder Judiciário é o órgão que possui autonomia e independência perante o Poder Executivo e o Poder Legislativo, sendo cada vez mais requisitado no Estado de Direito atual, pois faz uma interpretação sistemática e evoluída das normas jurídicas, além dos valores que a compõe, justamente por não só administrar a Justiça, mas por competir-lhe a atribuição de exercer a função de guardião da Constituição, pautando-se na preservação dos direitos humanos e seus princípios.
Nas palavras de Nelson Nery Júnior[22]:
“É importante que o Poder Judiciário acompanhe a evolução da sociedade e se insira no contexto do novo Direito: o Direito das Relações de Consumo. O juiz deve adaptar-se a modernidade, relativamente aos temas ligados aos interesses e direitos difusos coletivos, como por exemplo, os do meio ambiente do consumidor. Os princípios individualísticos do século passado devem ser esquecidos quando se trata de solucionar conflitos do meio ambiente e de consumo.”
Em razão da necessidade de uma maior proteção do Poder Judiciário aos consumidores, é que se pede “vênia” para citar os posicionamentos dos Tribunais e Juízos Monocráticos, sobre os mais variados temas nos seguintes julgados:
O primeiro julgamento tratou do direito de arrependimento ou reflexão:
“Apelação Cível – Contrato de consumo – Agência de viagens – Pacote de turismo Negociação pela Internet – Contrato a distância – Direito de arrependimento – Aplicabilidade – Formação do contrato – Aperfeiçoa-mento com a aceitação. Aplica-se à contratação feita por telefone e por meios eletrônicos o art. 49 do Codecon, concedendo-se ao consumidor um período de reflexão e a possibilidade de se arrepender, sem ônus, obtendo a devolução integral de eventuais quantias pagas.” (TJMG-ACi nº 1.0024.05.704783-9/002- 6/9/2006).[23]
Já o segundo e terceiro exemplos, um trata de indenização por danos morais e materiais pela não entrega de um livro comprado pelo consumidor, por um lapso de quase 8 (oito) meses, e o outro pela entrega de produto diverso do comprado:
“Ante todo o exposto:
1- Julgo PROCEDENTE o pedido de indenização por danos materiais para condenar a empresa demandada SARAIVA E SICILIANO S/A a pagar ao autor PAULO FERNANDO SANTOS PACHECO a quantia de R$ 19,90 (dezenove reais e noventa centavos) devidamente corrigida a partir da data do desembolso e incidindo juros de 1% ao mês a partir da citação.
2- Julgo PROCEDENTE o pedido de indenização por danos morais para condenar a parte demandada SARAIVA E SICILIANO S/A a pagar a parte autora PAULO FERNANDO SANTOS PACHECO a quantia de R$ 1.000,00 (um mil reais) devidamente corrigida e incidindo juros de 1% ao mês a partir da prolação da presente decisão.
3- Defiro o pedido de expedição de ofício ao PROCON devendo ser encaminhado junto com a correspondência extrato deste processo, cópia do presente termo de audiência como também cópia da sentença em áudio.” (TJ/SE n.º do processo: 201340200307 Natureza: Procedimento do Juizado Especial Cível).[24]
“RESPONSABILIDADE CIVIL. COMÉRCIO ELETRÔNICO. CONSUMIDOR. VÍCIO DECORRENTE DA DISPARIDADE ENTRE A OFERTA E O PRODUTO EFETIVAMENTE ENTREGUE. SERVIÇO DEFEITUOSO. LEGITIMIDADE PASSIVA. COMERCIANTE. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. REDUÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. O comerciante é responsável pelas informações prestadas ao consumidor, devendo cumprir com a proposta oferecida (CDC, art. 18 c/c art. 30). Da mesma forma, quem comercializa produtos na internet, figurando como intermediário entre o fabricante e o consumidor final, é responsável por defeitos nessa prestação (CDC, art. 14). Esse o caso dos autos, em que o autor adquiriu celular por meio do comércio eletrônico, sendo que lhe foi entregue produto com cor diversa, passando ele por verdadeira maratona para desfazer o negócio jurídico, o que culminou com a negativa de seu crédito quando tentou adquirir mercadoria com seu cartão, o qual ficou vinculado àquela aquisição imperfeita. Dano moral in re ipsa. […] PRELIMINAR REJEITADA. APELO E ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDOS.” (Apelação Cível Nº 70017299405, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ary Vessini de Lima, Julgado em 22/03/2007).[25]
Por último, segue um julgado sobre compras coletivas, no qual o consumidor não pode utilizar o cupom vendido pelo “Site Groupon”, sendo este indenizado moral e materialmente:
“Foi confirmada a decisão do 5º Juizado Especial Cível de Copacabana que condenou o site de compras coletivas Groupon a pagar R$ 5 mil a um consumidor que não conseguiu utilizar seu cupom de oferta. A empresa também terá que devolver o dinheiro pago pelo cliente. O consumidor comprou uma promoção que vendia uma pizza grande de R$ 30,00 por R$ 15,00 em um restaurante da Avenida Atlântica em Copacabana, mas, ao apresentar o código da promoção no local, o mesmo foi recusado. O entendimento apontou que se trata de quadro grave de inadimplência e má prestação de serviços do site de compras coletivas, que fragilizou o consumidor em evidente demonstração de descontrole do volume de ofertas e do cumprimento das mesmas junto a milhares de consumidores que aderem as promoções do Groupon.” (Processo nº 0014300-76.2011.8.19.0001).[26]
Estes são pequenos exemplos dos rumos que a jurisprudência vem tomando em nossos Tribunais, além dos posicionamentos dos julgadores monocráticos, com a nova reforma legislativa, outras ações serão propostas, todavia os aplicadores do Direito não poderão se esquecer dos princípios específicos de proteção ao consumidor.
6. CONCLUSÃO
O nosso artigo, teve como objetivo analisar o comércio eletrônico e sua influência perante o direito do consumidor, além dos projetos de lei em tramitação nas casas do Congresso Nacional, bem como as referências legais, e a atual aplicação do CDC e do Decreto 7.962/13, pelos Tribunais e Juízes.
Verificamos ainda que, o comércio eletrônico é um dos desdobramentos de negócios que são realizados através da Internet, tendo como principal influência a terceira revolução tecnológica que permite a realização de compras sem sair de casa, trazendo vantagens para os consumidores e vendedores.
Porém, além das vantagens trazidas por este meio de realização do comércio eletrônico, com ele também surgem desvantagens a maior vulnerabilidade e a ausência de legislação espeífica, as quais a nosso ver necessitam ser mais bem protegidas pelo Legislador e pelo Judiciário.
Enquanto, o Legislador não realiza seu ofício, o Poder Executivo no dia do consumidor determinou a publicação do Decreto 7.962/13, que de forma constitucional veio a regulamentar o CDC, permitindo-se pelos aplicadores do Direito uma interpretação mais facilitada dos dispositivos legais que já eram utilizados.
Conclui-se diante disso que, já existe regramento a ser aplicado nas relações que envolvem o comércio eletrônico, mas ainda o Poder Judiciário precisa dar efetividade à proteção do consumidor evitando abusos cometidos pelos fornecedores em especial o não cumprimento do contrato, e a consequente ausência de indenização ao consumidor. Mas, o Poder Judiciário já caminha para impor a teoria do risco integral aos fornecedores que realizam o comércio eletrônico, de forma que se dando a interpretação sistemática à Legislação e a Constituição Federal existirá a reparação integral prevista.
Professor do Curso de Direito da Universidade Tiradentes. Advogado OAB/SE 5003. Pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho. Aluno Especial do Mestrado em Direitos Humanos da UFS
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