Considerações ao PL 1589/99

Com o advento da Internet, como meio revolucinário de comunicação e realização de negócios, veio
atrelado o problema de se adequar institutos já consolidados à
uma nova realidade, agora  virtual.

O Direito, enquanto ciência que visa a solução dos conflitos de interesse, não poderia pretender
estar imune a estas reformulações, de forma que a edição de leis que versem
sobre a nova realidade cibernética, desses já consagrados conceitos, se torna
imperiosa, sob pena de se afastar do “e-commerce”
o Estado que não se dispuser a tais fins.

Em um primeiro momento, deve-se ter em
mente que regular as atividades realizadas no meio virtual, se difere
consideravelmente de qualquer outra edição de lei que vise regulamentar matéria
unicamente de âmbito interno, haja vista que quando se fala em Internet,
abstrai-se da idéia de fronteiras, havendo toda uma aldeia global participando
deste processo.

Desta forma, qualquer nação que
pretenda editar legislação visando regular as atividades
em meio eletrônico, deve buscar ao máximo a uniformidade com as leis já
editadas por outros Estados, ou em modelos já elaborados, como a da UNCITRAL, a
fim de que não se afaste, ou se crie óbice a este mercado que  movimenta
milhões em cifras diariamente.

No Brasil, ainda não há nenhuma legislação
vigente acerca do tema, não obstante os expressivos valores negociados neste
mercado.

Buscando se ajustar a essa nova
conjuntura mundial, vem sendo elaborado no Brasil, inúmeros Projetos de Lei,
visando regulamentar não só a validade do documento eletrônico, através da
assinatura digital e criptografia  assimétrica, como também o
próprio  comércio eletrônico.

Entre os projetos de lei em trâmite
perante o Congresso Nacional Brasileiro, destaca-se o Anteprojeto  n.
1589/99, desenvolvido pela Comissão Especial de Informática Jurídica, da OAB –
Ordem  dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo, e que trâmita junto ao Congresso, desde agosto de
1999,  por iniciativa do Deputado Federal Luciano Pizzato.

O anteprojeto, baseado no modelo da
UNCITRAL e na diretriz da União Européia, dispõe  sobre  o comércio
eletrônico, a validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital.

No tocante a validade jurídica do
documento eletrônico, as disposições daquele instituto são expressas ao
considerar sua originalidade, sempre que for assinado
pelo autor, utilizando-se da assinatura digital e do sistema de criptografia
assimétrica, havendo, nestes casos, a presunção  de veracidade do conteúdo
do documento,  em relação ao autor.

Entretanto, não se trata de presunção
absoluta, sendo mister a observância de determinados requisitos, também elencados no anteprojeto, tais como; de que seja a
assinatura digital  única e exclusiva para o documento que foi firmado,
seja possível a identificação de sua  validade, que o acesso a assinatura eletrônica seja exclusivo do signatário, que
esteja vinculada a totalidade  do texto do documento, e que não tenha sido
gerada após  o prazo para a sua expiração, que segundo o instituto, será
de 2 (dois) anos, na ausência de  sua estipulação, quando, então,
caberá  a  parte a quem a assinatura beneficiar comprovar que foi
a  mesma gerada em período anterior a  expiração ou a revogação.

No concernente ao comércio eletrônico,
o anteprojeto possui várias disposições que regulamentam a oferta de produtos e
serviços por meio eletrônico, assegurando direitos e deveres  individuais
e coletivos dos consumidores.

Também merece
destaque, as disposições atinentes aos provedores de acesso e armazenamento,
que regra geral, ficam  isentos da responsabilidade pelo conteúdo das
informações movimentadas pelos seus usuários ou clientes.

Um dos pontos mais controversos do
anteprojeto, é indubitavelmente a questão da
regulamentação da certificação digital.

As entidades certificadoras foram
divididas em  dois  grupos; entidades certificadoras  privadas,
de natureza comercial, e as certificações eletrônicas  por tabelião,
havendo  uma  clara distinção entre os efeitos dos serviços prestados
por elas, que teriam suas atividades  sujeitas ao controle do Poder
Judiciário e do Ministério da Ciência e Tecnologia.

A distinção nos efeitos das atividades
das duas autoridades certificadoras, pode  ser constatada   a
partir de  um paralelo entre  as disposições dos arts.
24 e 25, do anteprojeto:

O art. 24  dispõe,  in verbis:

“Os serviços prestados por
entidades certificadoras privadas são de caráter  comercial,
essencialmente privados e não se  confundem em seus efeitos
com a atividade  de certificação eletrônica por tabelião, prevista no
Capítulo II deste Título.”

Rege o
caput do  art. 25, in verbis:

O tabelião certificará a
autenticidade de chaves públicas
(grifo nosso) entregues pessoalmente pelo
seu titular, devidamente identificado; o pedido de certificação será efetuado
pelo requerente em ficha própria, em papel, por ele subscrita, onde constarão
dados suficientes para identificação da chave pública, a ser arquivada em
cartório”.

Assim,  resta claro que  a
certificação realizada por entidades certificadoras
particulares, embora legítima, não gera presunção de autenticidade
perante terceiros, ficando a cargo exclusivo do tabelião a atividade
garantidora da identidade do signatário de documento digital.

Ao conceder exclusividade ao tabelião
para autenticar chaves públicas, nota-se uma clara e inequívoca contradição
entre  as disposições do anteprojeto e a finalidade do mesmo. Isto porque, se o objetivo é regulamentar um mercado moderno, veloz
e de alta tecnologia, sendo mister que a certificação  feita pelas
autoridades  particulares  possuísse os mesmos efeitos da
certificação por tabelião, haja vista que tais entidades possuem um volume de
recursos muito maior do que as entidades públicas, que dificilmente
conseguirão  montar o aparato  tecnológico necessário para acompanhar
a rapidez do mercado eletrônico e seu rápido e constante desenvolvimento.

Assim, limitar a competência para
autenticar a chave pública ao tabelião, consagrando  o velho  hábito
do cartorialismo, é como
criar uma barreira ao fluxo natural do próprio comércio eletrônico, o que
implicaria  de maneira inconteste,  no afastamento  do Brasil
deste tão relevante mercado.

De todo o exposto, pode-se dizer que o
anteprojeto é, indubitavelmente, uma obra bem elaborada, visando a
disciplinar um mercado carente de regulamentação, e cuja expansão se dá a uma
velocidade cada vez  maior.

Entretanto, se faz necessária a
modificação de algumas disposições, em especial as que tocam às autoridades
certificadoras, a fim de que se possa  contar com uma legislação em
perfeita consonância com o mercado eletrônico e seus novos institutos.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Itamar Arruda Júnior

 

Bacharel em Direito pela Faculdade Milton Campos
Pós-Graduado em Direito Público

 


 

Equipe Âmbito Jurídico

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