Resumo: Este trabalho tem como objetivo analisar a recepção e o controle no Direito Interno em que o Estado seja parte dos Tratados e Convenções Internacionais, e também dos Tratados e Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos, na medida em que, quando um Estado aceita e ratifica um Tratado ou Convenção Internacional, se obriga ao cumprimento das condições pactuadas, sendo estas um dos maiores pressupostos do Direito Internacional. Em outra perspectiva, há que se observar o princípio da supremacia da norma interna, que está consignada na Constituição que fundamenta a validade do Estado, quando define a competência da estrutura dos Poderes, Executivo, Legislativo, Judiciário e do Poder Soberano, que fundamenta a validade do Estado, não remanesce norma de índole constitucional que não esteja ao controle de constitucionalidade. Para tanto, verificar-se-á as teorias monistas e dualistas que norteiam os princípios e os institutos do Direito Interno, consubstanciado no Direito Constitucional e do Direito Internacional, de modo a demonstrar o efetivo o controle de Constitucionalidade dos Tratados e Convenções Internacionais e também dos Tratados e Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos no mundo globalizado. É sobre esta perspectiva que se propõe o estudo do controle de constitucionalidade dos tratados e convenções internacionais e a soberania do estado no mundo globalizado.
Palavras chave: controle, constituição, constitucionalidade, convenção, direito, dualista, globalização, humano, interno, externo, monista, recepção, recurso, soberania, Tratado.
Abstract: This work aims to analyze the reception and control the internal law where the State is part of the international treaties and conventions, and also the international treaties and conventions on human rights, in that, when a state accepts and ratifies an Treaty or the International Convention, is obliged to comply with the agreed conditions, which are one of the major assumptions of international law. From another perspective, it is necessary to observe the principle of the supremacy of the internal standard, which is enshrined in the Constitution which establishes the validity of the state, when you set the power structure of powers, Executive, Legislative, Judiciary and Sovereign Power, which underlies validity of the state, does not remain standard of a constitutional nature that is not the constitutionality control. This shall be verified the monistic and dualistic theories that guide the principles and National Law Institutes, embodied in constitutional law and international law, in order to demonstrate the effective the Constitutionality control of international treaties and conventions and also the international treaties and conventions on human rights in a globalized world. It is on this perspective that proposes the study of judicial review of international treaties and conventions and the state sovereignty in a globalized world.
Keywords: control, constitution, constitutional, convention, right, dualistic, globalization, human, internal, external, monistic, reception, resort, sovereignty Treaty.
Sumário: 1. Introdução; 2. Teorias: monista e dualista; 3. O poder soberano ou soberania do estado; 4. O controle de constitucionalidade no brasil; 5. O controle de constitucionalidade na argentina; 6. O recurso extraordinário como instrumento jurídico necessário para o controle de constitucionalidade; 7. Conclusão. Referências.
1 INTRODUÇÃO.
O Século XX assistiu a ascensão do Direito Público. A Teoria Jurídica do Direito do Século XIX se baseava, notadamente, sobre a categoria do Direito Privado. Assim, o Século XIX começou com a edição do Código Civil Francês, o denominado Código Napoleão, de 1804, e terminou com a promulgação do Código Civil Alemão, de 1900. Nessa linha do editado o Código Civil Argentino, de Dalmacio Velez Sarsfield e no Brasil, foi editado o Código Civil de 1916, de Clovis Beviláqua, que tinha como base o Código Civil Francês e o Alemão. Os protagonistas da relação obrigacional do Direito Privado eram o contratante e o proprietário.
Não obstante, no decorrer do Século XX assistiu-se a uma progressiva publicização do Direito, com a proliferação de normas de ordem pública. No final do Século XX, essa publicização do Direito resultou na centralização da Constituição. Vale dizer, toda interpretação jurídica deve ser feita à luz da Constituição, dos seus valores e dos seus princípios, e dessa forma, e como conseqüência, observa-se que toda interpretação jurídica, direta ou indiretamente, é uma interpretação constitucional, ou se preferirmos, uma inegável proeminência do Direito Público sobre o Direito Privado.
Dessa forma a separação que o positivismo jurídico havia imposto entre o Direito e a Moral, entre o Direito e outros domínios do conhecimento, baseava-se no pensamento de Hans Kelsen (1881-1973) jurista e filósofo austríaco, considerado um dos mais importantes e influentes estudiosos do Direito, na sua Teoria Pura do Direito (o conhecimento é restrito aos fatos e às leis que os regem) e, agora, com a publicização do Direito, este se aproximou de maneira mais eloqüente da Filosofia Moral, em busca da Justiça e de outros valores, da Filosofia Política, em busca de legitimidade democrática e da realização de fins públicos que promovem o bem comum, aproximou-se também das Ciências Sociais aplicadas, como a Economia, a Psicologia e a Sociologia, baseado no pensamento de Miguel Reale, filósofo e jurista brasileiro, na sua Teoria Tridimensional do Direito (o fato jurídico, o valor e a norma propriamente dita).
O denominado pós-positivismo não subtrai a importância nuclear da lei, porém, ele parte da perspectiva de que o Direito não se sustenta nos limites extremos da norma jurídica, mas, ao contrário, que a Justiça, como valor supremo da atividade humana, pode estar além da Lei e do normativismo jurídico.
Como se depreende, a respeitável Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen, evidencia o Positivismo Jurídico. Não obstante, no decorrer do Século XX, houve uma evolução como um fenômeno mundial que vem tomando força e tem sido expresso nas Constituições de vários países. Ele tem influenciado todo o ordenamento jurídico, assim como a forma de entender o Direito Contemporâneo, um Direito que está positivado, mas que vai além desta positivação, seja pela evidência de idéias jusnaturalistas, seja pela presença da ética e da moral como elementos fundamentais para a aplicação do Direito e a obtenção da Justiça.
O presente Artigo tem como objetivo esta perspectiva, que se insere na análise e na abordagem do Controle de Constitucionalidade dos Tratados e Convenções Internacionais e a Soberania do Estado no Mundo Globalizado, e também dos Tratados e Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos, sendo necessário, para tanto, a investigação do assunto, abordando a exposição dos princípios e normas de Direito Internacional, do Direito Constitucional, e, notadamente, das teorias monista e dualista, que norteiam os princípios e os institutos do Direito Interno, consubstanciado no Direito Constitucional e do Direito Internacional, de modo a demonstrar o efetivo controle de Constitucionalidade dos Tratados e Convenções Internacionais e também dos Tratados e Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos.
2 TEORIAS: MONISTA E DUALISTA.
Inicialmente, é necessário destacar o que seja Tratado e Convenção, embora, sob o ponto de vista da análise do controle de constitucionalidade, ambas terão uma mesma dimensão como Tratados e Convenções Internacionais.
Tratado. A expressão Tratado foi designada pela Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 23/05/1969, a qual, foi promulgada pelo Brasil, pelo Decreto nº 7030, de 14/12/2009, como termo para designar, genericamente, um Acordo Internacional, denominando-se tratado, o ato bilateral ou multilateral, ao qual se deseja atribuir especial relevância política. Nessa categoria se destacam, por exemplo, os Tratados de Paz e Amizade, o Tratado da Bacia do Prata, o Tratado de Cooperação Amazônica, o Tratado de Assunção, que criou o MERCOSUL, o Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares.
Convenção. Em semelhante nível de formalidade, costuma ser empregado o termo Convenção para designar atos multilaterais, oriundos de Conferências Internacionais e que versem assunto de interesse geral, como por exemplo, as Convenções de Viena Sobre Relações Diplomáticas, Relações Consulares e Direito dos Tratados. As Convenções sobre Aviação Civil, sobre Segurança no Mar, sobre questões trabalhistas, revestem-se como instrumento jurídico internacional, destinado a estabelecer normas para o comportamento dos Estados em uma série cada vez mais ampla de setores. No entanto, existem algumas poucas, é verdade, Convenções bilaterais, como a Convenção destinada a evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal celebrada com a Argentina (1980), a Convenção sobre Assistência Judiciária Gratuita celebrada com a Bélgica (1955), e ainda, a Convenção de Montevidéu sobre os Direitos e Deveres dos Estados, realizado em 1933, em Montevidéu, capital do Uruguai, que estabelece as prerrogativas e os critérios em que um Estado possa estar integrado ao Direito Internacional.
Por outro lado, antes da análise da teoria monista e dualista, urge ainda destacar o caráter de recepção previsto na Constituição Federal da República do Brasil, dos Tratados e Convenções Internacionais, e também dos Tratados e Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos conforme dispõe o art. 5º, parágrafos 2º e 3º, in verbis:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:(…)
§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte (nosso grifo).
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.” (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Atos aprovados na forma deste parágrafo) (nosso grifo).
Teoria Monista. Os monistas sugerem acreditar que tanto o Direito Internacional quanto o Direito Interno (Nacional), constituem o mesmo Sistema Jurídico, ou seja, há apenas uma única ordem jurídica que dá o nascimento às Normas Internacionais e Nacionais, conforme o ensinamento de Hans Kelsen.
Luís Roberto Barroso (58)[1], Ministro do Supremo Tribunal Federal do Brasil, Professor da Universidade Estatual do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade de Brasília (UNB), afirma que “o monismo jurídico, com melhor razão, constitui uma realidade, um Sistema, e que, tanto o Direito Internacional, quanto o Direito Interno (Constitucional) integram esse sistema. Por assim, torna-se imperativa a existência de normas que coordenem esses domínios e que estabeleçam qual deles deve prevalecer em caso de conflito. Kelsen admite em tese, o monismo com prevalência da ordem interna e o monismo com prevalência da ordem internacional, embora, seja partidário deste ultimo. A superioridade do Direito Internacional sobre o Direito Interno de cada Estado foi firmada desde 1930, pela Corte Permanente de Justiça Internacional.
Teoria Dualista. Na teoria dualista há uma distinção clara entre os dois ordenamentos, o Direito Interno e o Direito Internacional, de modo que a ordem jurídica interna compreende a Constituição e as demais instâncias normativas vigentes no País, e a externa, envolvem Tratados e demais critérios que regem o relacionamento entre os diversos Estados.
O ex- Ministro do Supremo Tribunal Federal do Brasil, Professor Emérito da PUC – Minas e da Universidade de Brasília – UNB, Carlos Mário da Silva Veloso[2], faz uma abordagem sobre os reflexos do conflito existente entre o Direito Interno e os Tratados Internacionais e a posição do Supremo Tribunal Federal do Brasil.
O conflito entre a norma interna e a norma internacional, ou entre norma brasileira de produção doméstica e norma brasileira de produção internacional, relaciona-se com as doutrinas do monismo e do dualismo.
Segundo a doutrina dualista, que teve como precursor Heinrich Triepel (1868-1946) jurista e filósofo alemão, “a ordem internacional e a ordem interna são duas ordens jurídicas que coexistem independentemente, não sendo passíveis de conflito entre si. Para que uma norma internacional possa valer na esfera interna é necessário que a mesma sofra um processo de recepção, transformando-se em regra jurídica interna. A partir daí, só é possível conflito entre duas normas internas, a ser resolvido pelo tradicional mecanismo: Lex posteriori derogat lex priori” [3] (A lei posterior derroga a anterior).
O monismo surgiu com Kelsen. Segundo essa doutrina, existe apenas uma ordem jurídica, pelo que nega coexistirem duas ordens jurídicas distintas. Por isso, admite a possibilidade da ocorrência de conflitos entre normas internas e internacionais. Daí acrescenta Grandino Rodas, “a possibilidade de duas espécies de monismo: um que afirma a supremacia do Direito Internacional e outro que propugna a primazia do Direito Interno[4]. O monismo kelseniano é o monismo radical, que prega o primado do Direito Internacional. Mas há, também, o monismo moderado, criado por Alfred Verdros (1890-1980), jurista austríaco, discípulo de Kelsen, que sustenta que “os juízes nacionais devem aplicar tanto o Direito Interno (Nacional) quanto o Direito Internacional, de acordo com a regra lex posteriori derogat legi priori, aplicada pela jurisprudência norte-americana e brasileira.[5]
A escola monista que defendia a primazia do Direito Interno, assim, uma terceira escola monista, acabou absorvida pela doutrina dualista.[6] Alguns países dão aos Tratados Internacionais a prevalência sobre o Direito Interno infraconstitucional: França, Constituição de 1958, art.55; Grécia, Constituição de 1975, art. 23, § 1º; Perú, Constituição de 1979, art. 101.[7]
Nos Estados Unidos da América, o Tratado equipara-se à Lei Federal, prevalecendo, entretanto, sobre a legislação dos Estados-Membros. Assim, tem entendido a jurisprudência da Suprema Corte dos EUA, interpretando o art. VI, 2, da Constituição Norte-americana, que define as Leis e os Tratados, juntamente, como suprema lei do País, supreme law of the land. Destarte, “em caso de conflito entre Tratado Internacional e Lei do Congresso, prevalece nos Estados Unidos, o texto mais recente, à base do princípio lex posteriori. É certo, pois, que uma Lei Federal pode fazer ‘repelir’ a eficácia jurídica de Tratado anterior, no plano interno. Se assim não fosse, observa Barnard Schwartz, estar-se-ía dando ao Tratado não força de lei, mas de restrição constitucional”[8]
No Brasil, antiga jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sustentava o primado do Direito Internacional sobre o Direito Interno.[9] Hoje, entretanto, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, orienta-se no sentido da paridade entre Tratado e a Lei federal. Assim decidiu o Supremo Tribunal, em 04 de agosto de 1971, portanto, o acórdão tinha a seguinte ementa:
“Lei Uniforme sobre o Cheque, adotada pela Convenção de Genebra. Aprovada essa Convenção pelo Congresso Nacional, e regularmente promulgada, suas normas têm aplicação imediata, inclusive naquilo em que modificarem a legislação interna” [10].
A mais importante decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, entretanto, foi tomada no julgamento do RE 80.004/SE, tendo como relator originário, Xavier de Albuquerque e, relator para o acórdão, Ministro Cunha Peixoto, julgamento realizado em 1º de junho de 77[11].
O relator originário, Ministro Xavier de Albuquerque, sustentou, vencido o primado do Direito Internacional. A maioria, entretanto, reconhecendo o conflito entre Tratado e a Lei Federal, esta, posterior àquele, garantiu a autoridade da Lei Nacional, mais recente, tendo em vista a paridade entre o Tratado e a Lei Nacional. Os Ministros Cordeiro Guerra, Rodrigues de Alckmin, Thompson Flores e Cunha Peixoto votaram no sentido de que, da mesma forma que o Tratado anterior, segundo a regra lex posteriori derogat legi priori.
O Ministro Antônio Neder, com base em argumentos diferentes, acompanhou a conclusão dos votos dos Ministros Peixoto, Guerra, Leitão, Alckmin e Flores. O voto mais importante foi do ministro Leitão de Abreu, voto que, segundo Francisco Rezek, melhor equacionou a controvérsia.[12] Segundo Leitão de Abreu, a lei posterior não revoga o Tratado anterior, “mas simplesmente afasta, enquanto em vigor, as normas do tratado com ela incompatíveis”, pelo que, “voltará ele a aplicar-se, se revogada a lei que impediu a aplicação das prescrições nele consubstanciadas”. Prevaleceu, na verdade, o entendimento de Leitão de Abreu, por isso que, revogado, posteriormente, o D.L. 427, pelo D.L. 1.700/79, o Supremo Tribunal Federal continuou a aplicar as Convenções de Genebra.[13]Realmente, no julgamento do RE 95.002/PR, relator o Ministro Soares Munhoz, julgamento ocorrido em 15 de setembro de 1981, o Supremo Tribunal aplicou o art. 20 da Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Promissórias, que regula o endosso dado após o vencimento[14].
Assim, pode-se assentar, em conclusão, as seguintes proposições:
(a) Na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, há paridade entre a norma brasileira de produção doméstica e a norma brasileira de produção internacional. Assim, o conflito entre uma e outra, resolve-se, de regra, pelo mecanismo tradicional: lex posterior derogat legi priori. Todavia, há de ser presente que a lei posterior não revoga o tratado anterior, “mas simplesmente afasta, enquanto em vigor, as normas do tratado com ela incompatíveis”. Assim, revogada a lei que afastou a sua aplicação, voltará o tratado a ter aplicação;
(b) Em matéria tributária, entretanto, observa-se o princípio contido no art. 98 do Código Tributário Nacional do Brasil: o primado da norma brasileira de produção internacional; (Código Tributário Nacional (…). Art. 98 – Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna e serão observadas pelo que lhes sobrevenha).
(c) São três as vertentes, na Constituição da República, dos direitos e garantias:
c1 direitos e garantias expressos na Constituição;
c2 direitos e garantias decorrentes do regime e dos princípios adotados na Constituição;
c3 direitos e garantias inscritos nos tratados internacionais firmados pelo Brasil (CF, art. 5º, § 2º e 3º);
(d) Quando a Constituição veda a concessão de isenções heterônomas ao vedar à União instituir isenções de tributos de competências dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (CF, art. 151, III), a proibição dirige-se à União como entidade parcial e não à União como Estado Total, vale dizer, a República Federativa do Brasil “formada pela União indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal” (CF, art. 1º).
3 O PODER SOBERANO OU SOBERANIA DO ESTADO.
Na evolução histórica, o Estado na forma em que o conhecemos hoje, começa a se consolidar com a centralização das monarquias absolutistas francesa, inglesa e russa, em meados do século XVII. O absolutismo é um sistema de governo em que o poder fica concentrado no monarca. Os reis, absolutos, controlam a administração do Estado, a moeda, os impostos, os exércitos, fixam as fronteiras dos países, e têm o total domínio da economia, por intermédio de políticas mercantilistas, e estabelecem a justiça real.
Estas monarquias estabeleceram a propriedade real sobre o solo e as minas, e tinham o total controle sobre a produção de reservas extrativas do ouro e da prata. Neste período surgiram as primeiras companhias mercantis, mantendo o monopólio da Coroa sobre o comércio de metais preciosos, mercadorias, especiarias, e escravos das colônias, surgindo também um sistema de impostos.
Com a evolução das leis, surgem teorias para justificar o absolutismo, como as de Nicolau Maquiavel (1469-1527), Thomas Hobbes (1588-1679) e Jacques Bossuet (1627-1704). São exemplos de Estados absolutistas a Inglaterra, com Henrique VIII, (1491-1547) e sua filha Elizabeth (1533-1603); e a Rússia, com Pedro I, o Grande. Mas, sem dúvidas, o maior exemplo do Estado absolutista foi a França, com Luis XIV (1638-1715), também conhecido como Rei Sol, que, segundo os historiadores, teria dito a famosa frase “O Estado sou Eu”. O fim do absolutismo acontece efetivamente com a Revolução Francesa no ano de 1789.
Antes do advento da Revolução Francesa, surgiu na Europa, na época do Renascimento, uma corrente de pensamento conhecida como o iluminismo, que defendia o domínio da razão sobre a fé, estabelecendo o progresso como destino da humanidade. Os principais idealizadores foram o inglês John Locke (1632- 1704), os franceses Charles Louis de Secondat, baron de La Brède et de Montesquieu, (1688-1755) que pregou a separação dos Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário, na obra, De l’esprit des lois – Do Espírito das Leis, de 1751); Voltaire (1694-1778) e o suíço Jean Jacques Rousseau (1712-1778).
Montesquieu é um dos grandes filósofos do século XVIII. Pensador iluminista, deixou uma grande herança por meio de suas obras. Na obra “Do Espírito das Leis”, o autor expõe uma política essencialmente racionalista, caracterizada pela busca de um equilíbrio entre a autoridade do poder e a liberdade do cidadão. A perspectiva tridimensional da separação do poder entre Executivo, Legislativo e Judiciário surgiria da necessidade de o poder deter o próprio poder, evitando assim o abuso da autoridade. A liberdade do cidadão é um dos pontos principais da obra deste iluminista.
Para Montesquieu[15], as leis não seriam resultados da arbitrariedade dos homens, elas surgem de acordo com a necessidade e derivam das relações necessárias da natureza das coisas.
A independência dos Poderes, proposto por Montesquieu, teve como propósito a garantia de liberdade. A França, em face da Revolução Francesa, de 1789, adotou como forma de governo a República, instituindo os três poderes, executivo, legislativo e judiciário, com a “máxima” liberdade, igualdade e fraternidade.
São Poderes da União o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Não há qualquer referência ao Poder Soberano, ou Soberania. Na realidade, a Soberania decorre ou nasce da soma dos três Poderes retro transcritos.
Soberania é o Poder ou autoridade suprema[16]. É a propriedade que tem um Estado de ser uma Ordem Suprema que não deve sua validade a nenhuma ordem superior. O conceito de Soberania do Estado foi objeto do Tratado de Westfália, firmado em 24 de outubro de 1648, que pôs fim à guerra dos 30 (trinta) anos na Europa.
O Poder Soberano não tem uma estrutura própria, mas utiliza-se de parte da estrutura do Poder Executivo para ter a sua materialização. A forma mais eloquente da materialização da Soberania evidencia-se por atos e ações próprias do Presidente da República, no exercício pleno de seus poderes, representando o Estado, o Governo e o Povo de seu País, sobretudo, em solenidades nacionais ou internacionais, realizadas no Brasil ou em outros Países, bem como perante os Fóruns e as Organizações Internacionais.
Além da expressão maior da Soberania, que é exercida pelo Presidente da República, existem diversas outras formas que também a evidenciam. Ela pode se expressar de forma particular, decorrente dos mais variados atos e ações, nas suas múltiplas atividades desenvolvidas por indivíduos, grupos, associações, organizações, fundações, empresas, organizações não governamentais (ONGs), que integram a sociedade de um País. Assim, a obtenção de resultados positivos no campo do conhecimento, da tecnologia, das ciências, da educação, da cultura, da economia, da política, do esporte, da música, das artes, das comunicações, do jornalismo, entre tantos outros, evidenciam a Soberania do povo de um País.
Entretanto, as formas que mais evidenciam a Soberania do Estado são aquelas que se materializam por intermédio dos órgãos e ações de natureza diplomática, externados pelo Ministério das Relações Exteriores, e ainda pelos órgãos e ações de natureza militar externados pelo Ministério da Defesa, que agregam as Forças Armadas (Marinha, Exército e Aeronáutica).
4 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE.
Entende-se por Controle de Constitucionalidade aquele que analisa a compatibilidade da norma ordinária com a Constituição Federal. Para o Professor Alexandre de Moraes[17], Doutor em Direito do Estado e livre-docente em Direito Constitucional pela Faculdade de Direito da Universidade São Paulo – USP, Professor titular da Universidade Presbiteriana Mackenzie, controlar a constitucionalidade significa verificar a adequação (compatibilidade) de uma lei ou de um ato normativo com a Constituição, verificando seus requisitos formais e materiais.
Entende-se por Controle de Convencionalidade um novo sistema de solução de antinomias (posições contraditórias) entre normas, que valoriza a compatibilidade entre a norma ordinária com os Tratados e Convenções Internacionais. Como afirma o Professor Valério de Oliveira Mazzuoli[18], Pós-Doutor em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade Clássica de Lisboa (2011), Doutor em Direito Internacional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRS (2008), Mestre em Direito Internacional pela Universidade Estadual Paulista 'Júlio de Mesquita Filho – UNESP (2003), Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de Presidente Prudente (2001), Professor Adjunto de Direito Internacional Público da Universidade Federal do Mato Grosso – UFMT, Professor dos cursos de especialização da UFRS, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP e Universidade Estadual de Londrina – UEL, foi o primeiro a desenvolver o tema no Brasil, “controle de convencionalidade” que é a compatibilidade da produção normativa interna com os Tratados e Convenções Internacionais de Direitos Humanos, ratificados pelo Governo e em vigor no país.
Todavia para efeitos deste Artigo, cingimo-nos à utilizar o termo num sentido mais amplo, que é o controle de constitucionalidade, seja para dos Tratados e Convenções Internacionais ou também para dos Tratados e Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos.
A Constituição, como Lei maior, edifica o Estado democrático de Direito, fazendo prevalecer a vontade da Lei e não a vontade do Governante. Dentro da perspectiva tridimensional, originada do pensamento de Monstesquieu, no qual o Poder se constitui em Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário, Leis são elaboradas pelo Poderes Executivo e Legislativo, da maioria da Nações, porém, o controle de constitucionalidade deve ser exercido constantemente pelo Poder Judiciário, notadamente pela sua mais alta Corte, que tem a incumbência de ser a guardiã da Constituição, e, pelos reflexos de suas decisões, seja para o individuo, seja para a Sociedade, seja para o Estado, a isso, configura-se, a rigor, no constitucionalismo.
Para Hans Kelsen a Constituição, em seu sentido estrito lógico-jurídico, é a norma hipotética fundamental. Dessa forma é o vértice de todo Sistema Normativo. Leva-se em consideração a posição de superioridade jurídica. As normas constitucionais são hierarquicamente superiores a todas demais norma jurídicas.
Raul Gustavo Ferreyra (57), é Advogado, Doutor pela Universidade de Buenos Aires, UBA, Professor Catedrático em Direito Constitucional na Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires, UBA, Argentina, Professor de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Buenos Aires, UBA, Consultor da Defensoria del Pueblo da Cidade Autônoma de Buenos Aires, Ministro Suplente da Corte Suprema Justiça da República da Argentina, afirma que a,
"Constituición" significa una categoria jurídica básica de la teoría prática del Derecho. Los modernos sistemas jurídicos estatales son sistemas normativos estructurados jeráquicamente. En su base se encuentra la norma constitucional, que a su vez implica propiamente un "subsistema normativo". La estructura jeráquica de sistema jurídico de un Estado puede expresarse de modo rudimentário: supuesta la existência de la norma fundamental, la constituiçión representa el nível más alto dentro del Derecho estatal” (FERREYRA, 2013, p49/50)[19].
Afirma ainda o Professor Ferreyra que no Estado constitucional, a eliminação radical no âmbito da discricionariedade é uma característica dominante da espécie humana. O sistema jurídico constitucional alemão contém uma disposição que exemplifica normativamente, a proposição que nesta dissertação se discute, de maneira muito aproximada à tese que aqui se descreve. Dispõe o art. 1, inciso 3, da Lei Fundamental de Bonn, de 1949, que os direitos fundamentais vinculam os poderes legislativo, executivo e judiciário a título de direito aplicável. Nesta tipologia de sistema jurídico, a verdadeira razão do mesmo também residiria na força normativa de seus direitos fundamentais. Na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, tal regra encontra-se no art. 5º, §1º. As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. (FERREYRA, 2014, P 62).
No caso da República Argentina, na atualidade sua ordem estatal se encontra instituída por seu Direito Constitucional, criação humana que emana basicamente das regras gerais contidas na Constituição Federal de 1853, com suas reformas de 1860 – "Constituição histórica" – 1866, 1898, 1957 e 1994, e nas regras do Direito Internacional dos Direitos Humanos, pode ser observada como um paradigma do Direito Constitucional da Argentina. Ditas regras constituem significativas linhas para a ação estatal cidadã (FERREYRA, 2014, p. 62/63)[20].
Em face da supremacia, todas as normas infraconstitucionais devem se harmonizar com a Constituição Federal, de tal sorte que para garantir a proteção constitucional e assegura que as normas infraconstitucionais sejam compatíveis com a norma mandamental, originou-se uma estrutura teórica e normativa de controle de constitucionalidade da legislação infraconstitucional.
A Constituição Federal do Brasil de 1988 adota um sistema de controle da constitucionalidade que é considerado misto, na medida em que funciona como um modelo difuso e como um modelo concentrado.
O controle difuso poderá ser exercido por qualquer juiz ou tribunal do país, com o fim de afastar a aplicação da lei ou do ato, apenas, e tão somente, naquele caso concreto contido em um determinado processo, interessando e produzindo efeitos, conseqüentemente, tão somente às partes envolvidas neste processo (efeito inter partes).
Já o controle concentrado, o qual, analisa a lei em tese, sem qualquer caso concreto a ser considerado, apenas e tão somente, poderá ser exercido pelos denominados “Tribunais Constitucionais”, que, quando o paradigma do controle de constitucionalidade é a Constituição Federal, será exercido com exclusividade pelo Supremo Tribunal Federal – STF. Quando o paradigma for as Constituições Estaduais ou as Leis Orgânicas dos municípios, será exercido, com exclusividade, pelos respectivos Tribunais de Justiça. (efeito erga omnes). A propósito, vide decisão do STF:
"A força normativa da CR, (Constituição da República) é o monopólio da última palavra, pelo STF, em matéria de interpretação constitucional. O exercício da jurisdição constitucional – que tem por objetivo preservar a supremacia da Constituição – põe em evidência a dimensão essencialmente política em que se projeta a atividade institucional do STF, pois, no processo de indagação constitucional, assenta-se a magna prerrogativa de decidir, em última análise, sobre a própria substância do poder. No poder de interpretar a Lei Fundamental, reside a prerrogativa extraordinária de (re)formulá-la, eis que a interpretação judicial acha-se compreendida entre os processos informais de mutação constitucional, a significar, portanto, que ‘A Constituição está em elaboração permanente nos Tribunais incumbidos de aplicá-la’. Doutrina. Precedentes. A interpretação constitucional derivada das decisões proferidas pelo STF – a quem se atribuiu a função eminente de ‘guarda da Constituição’ (CF, art. 102, caput) – assume papel de essencial importância na organização institucional do Estado brasileiro, a justificar o reconhecimento de que o modelo político-jurídico vigente em nosso País confere, à Suprema Corte, a singular prerrogativa de dispor do monopólio da última palavra em tema de exegese das normas inscritas no texto da Lei Fundamental." (ADI 3.345, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 25-8-2005, Plenário, DJE de 20-8-2010.) No mesmo sentido: AI 733.387, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 16-12-2008, Segunda Turma, DJE de 1º-2-2013. Vide: HC 91.361, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 23-9-2008, Segunda Turma, DJE de 6-2-2009; RE 227.001-ED, rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 18-9-2007, Segunda Turma, DJ de 5-10-2007.
As obrigações assumidas pelo Brasil quando este firma os Tratados e Convenções Internacionais, e também dos Tratados e Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos, devidamente ratificados pelo Congresso Nacional, nos termos do art. 49, I, da Constituição Federal, e, posteriormente, promulgados e publicados pelo Presidente da República, na medida em que, ao ingressam no ordenamento jurídico constitucional, nos termos do art. 5º, § 2º e §3º, não minimizam o conceito de soberania do Estado, devendo, pois, sempre serem interpretados como as limitações impostas constitucionalmente ao próprio Estado. Vale repetir, o disposto contido no art. 5°, §§ 2º e 3º, da Constituição Federal do Brasil, in verbis:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte (grifamos);
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Atos aprovados na forma deste parágrafo”) (grifamos).
O §2º, do art. 5º, da Constituição Federal do Brasil de 1988 determina que os direitos e garantias expressos na Constituição, não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos Tratados Internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. O referido § 2º, do art. 5º, da CF, determina que os direitos e garantias expressos na Constituição, não excluem direitos decorrentes dos Tratados e Convenções Internacionais.
Registre-se que a inserção no ordenamento jurídico brasileiro dos Tratados e Convenções Internacionais, em que a República Federativa do Brasil seja parte, equivale ao nível de uma lei ordinária, portanto, abaixo da Constituição, e também das Emendas Constitucionais. Na perspectiva de uma visão hermenêutica da hierarquia leis, sobressai o entendimento que a maior lei do ordenamento jurídico Estado é a Constituição. No caso do ordenamento jurídico brasileiro, abaixo da Constituição, esta hierarquia das leis, pode se encontrada no art. 59, da Constituição Federal do Brasil, que estabelece o processo legislativo que compreende a elaboração de: I – emendas à Constituição; II – leis complementares; III – leis ordinárias; IV – leis delegadas; V – medidas provisórias; VI – decretos legislativos; e; VII – resoluções. Neste sentido, já se posicionou o STF:
"Supremacia da CR (Constituição da República) sobre todos os tratados internacionais. O exercício do 'treaty-making power’ (poder de elaboração dos Tratados), pelo Estado brasileiro, está sujeito à observância das limitações jurídicas emergentes do texto constitucional. Os tratados celebrados pelo Brasil estão subordinados à autoridade normativa da CR. Nenhum valor jurídico terá o tratado internacional, que, incorporado ao sistema de direito positivo interno, transgredir, formal ou materialmente, o texto da Carta Política. Precedentes." (MI 772-AgR, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 24-10-2007, Plenário, DJE de 20-3-2009.)
“No plano dos tratados e convenções internacionais, aprovados e promulgados pelo Estado brasileiro, é conferido tratamento diferenciado ao tráfico ilícito de entorpecentes que se caracterize pelo seu menor potencial ofensivo. Tratamento diferenciado, esse, para possibilitar alternativas ao encarceramento. É o caso da Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas, incorporada ao direito interno pelo Decreto 154, de 26-6-991. Norma supralegal de hierarquia intermediária, portanto, que autoriza cada Estado soberano a adotar norma comum interna que viabilize a aplicação da pena substitutiva (a restritiva de direitos) no aludido crime de tráfico ilícito de entorpecentes.” (HC 97.256, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 1º-9-2010, Plenário, DJE de 16-12-2010).
Por outro lado o §3º, do art. 5º, da Constituição Federal do Brasil de 1988, determina que os Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às Emendas Constitucionais.
No Artigo “Tratados Internacionais na Constituição de 1988” o Professor Alexandre de Moraes, Doutor em Direito do Estado e livre-docente em Direito Constitucional pela Faculdade de Direito da USP[21], afirma que,
“Os direitos humanos fundamentais apresentam-se a partir de diversas fontes, com diferentes hierarquias, seja em âmbito internacional, seja em âmbito interno. Algumas têm caráter obrigatório, enquanto outras não. Além disso, segundo o próprio conteúdo, algumas são genéricas e outras específicas. Essa variedade acaba por vezes gerando dificuldades interpretativas na análise da aplicabilidade dos direitos e garantias fundamentais em vários níveis: confronto entre fontes internacionais; confronto entre fontes internacionais e fontes nacionais e confronto entre fontes nacionais. O conflito entre fontes internacionais, em face da existência de múltiplos tratados e atos internacionais bilaterais ou mesmo plurilaterais celebrados entre diversos Estados, surge a partir da ocorrência de tratamentos normativos diversos ao mesmo assunto. Para solucionar a questão, primeiramente, devemos fazer a distinção entre compromissos internacionais e meras recomendações, pois os primeiros, desde que devidamente incorporados ao ordenamento jurídico interno, vinculam; enquanto as segundas são meras pautas de orientação. Dessa forma, aqueles preferem estas. Se, porém, o conflito se der entre compromissos internacionais, devidamente incorporados pelo ordenamento jurídico local, será preciso interpretar-se o sentido preciso das diversas normas existentes em diferentes documentos, ou mesmo eliminar-se o conflito por negociação entre Estados ou ainda por conciliação arbitral, que deverão aplicar algumas regras:
Art. 103 da Carta das Nações Unidas: em caso de conflito entre as obrigações contraídas pelos membros das Nações Unidas em virtude de qualquer outro convênio internacional prevalecerão as obrigações impostas na presente Carta;
Art. 30 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 23 de maio de 1969, que regula a aplicação de tratados sucessivos dirigidos à mesma matéria, aponta algumas regras:
(1) conflito entre obrigações contraídas com base na Declaração das Nações Unidas prevalece em relação a outros tratados internacionais;
(2) quando um tratado especificar sua própria subordinação a outro anterior ou posterior, esses prevalecerão;
(3) quando todas as partes de um ato ou tratado internacional forem também partes de um ato ou tratado posterior, esse terá validade. Ressalte-se, porém, que em relação ao anterior, permanecerão as normas compatíveis com o posterior tratado.;
(4) na hipótese das partes contraentes na serem exatamente as mesmas do ato internacional anterior, devem ser aplicadas duas regras:
(4.a) as relações dos Estados Partes em ambos os atos ou tratados seguirão o definido no item anterior;
(4.b) as relações entre um Estado que somente seja parte no ato ou tratado internacional posterior e outro que seja parte de ambos os compromissos serão regidas pelas normas previstas naquele em que ambos sejam partes.
O conflito entre fontes internacionais e fontes nacionais deverá ser resolvido pelo Direito Constitucional de cada um dos países, em virtude do princípio da Soberania estatal. Assim, há países em que os tratados não produzem efeitos internos; enquanto em outros há a produção desses feitos, sejam como normas de hierarquia constitucional, sejam como normas de hierarquia infraconstitucionais, dependendo de cada ordenamento jurídico. Como já analisado no item anterior, no Brasil, os atos e tratados internacionais devidamente incorporados em nosso ordenamento jurídico ingressam com a mesma hierarquia normativa que as leis ordinárias, sendo que eventuais conflitos entre essas normas devem ser resolvidas pelo critério cronológico (norma posterior revoga norma anterior) ou pelo princípio da especialidade.[22]
Finalmente, existe a possibilidade de conflito entre fontes nacionais. Nesses casos deve-se analisar a reserva de competência de cada norma, bem como a hierarquia entre elas, ou ainda os princípios da especialidade e lex posterior abrogat priorem” (A lei posterior derroga a anterior).
A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988, consagrou de forma suficiente, os mais importantes direitos fundamentais, no sentido de proporcionar ao indivíduo irrestrita proteção a suas liberdades e almejando a igualdade e fraternidade social.
Ao longo de mais de uma década da Constituição Federal, coube à doutrina e à jurisprudência delinear os novos contornos democráticos desses direitos e garantias, relacionando-os com os princípios da soberania popular e da dignidade da pessoa humana, tendo seu intérprete maior, o Supremo Tribunal Federal, garantindo a plena eficiência jurídica de suas previsões.
Paralelamente, houve maior conscientização da obrigatoriedade e efetividade dos atos, Tratados e Convenções Internacionais consagradores de Direitos Humanos, em virtude da necessidade primordial de sua proteção efetiva, surgindo, no Brasil, um estudo mais aprofundado do Direito Internacional dos Direitos Humanos, cuja finalidade precípua, consiste na concretização da plena eficácia dos direitos humanos fundamentais, por meio de normas gerais protetoras primordiais de bens da vida.
Antes da Emenda Constitucional nº 45/2004, os Tratados e Convenções Internacionais de Direitos Humanos, eram aprovados por meio de Decreto Legislativo, por maioria simples, conforme art. 49, inciso I, da Constituição Federal de 1988 e, posteriormente, eram ratificados pelo Presidente da República. Tal forma de recepção dos Tratados e Convenções, idêntica à forma de recepção dos Tratados e Convenções que não versam sobre Direitos Humanos, gerou diversas controvérsias sobre a aparente hierarquia infraconstitucional, ou seja, nível de normas ordinárias dos Tratados e Convenções Internacionais de Direitos Humanos, no ordenamento brasileiro.
Portanto, com o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, que consignou nova disposição ao art. 5º, incluindo o §3º, da Constituição Federal do Brasil de 1988, determinando que os Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos passaram a ser equivalentes às emendas constitucionais. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 466.343- SP estabeleceu novo seu posicionamento acerca da hierarquia dos Tratados e Convenções Internacionais de Direitos Humanos. O STF firmou entendimento que esses Tratados e Convenções sobre Direitos Humanos, que antes eram equiparados às normas ordinárias federais, apresentam status de norma supra legal, vale dizer, estão acima da legislação ordinária, mas abaixo da Constituição, equivalendo às Emendas Constitucionais. Assim, em face deste posicionamento, admite-se a hipótese de que, tais Tratados e Convenções sobre Direito Humanos, adquirirem hierarquia constitucional, desde que, seja observado o procedimento previsto no §3º, do art. 5º da Constituição Federal do Brasil, acrescentada pela Emenda Constitucional no 45/2004. Neste sentido:
"A subscrição pelo Brasil do Pacto de São José da Costa Rica, limitando a prisão civil por dívida ao descumprimento inescusável de prestação alimentícia, implicou a derrogação das normas estritamente legais referentes à prisão do depositário infiel." (HC 87.585, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 3-12-2008, Plenário, DJE de 26-6-2009).
"(…) desde a adesão do Brasil, sem qualquer reserva, ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e à Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), ambos no ano de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel, pois, o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil, dessa forma, torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de adesão. Assim ocorreu com o art. 1.287 do CC de 1916 e com o DL 911/1969, assim como em relação ao art. 652 do novo CC (Lei 10.406/2002)." (RE 466.343, rel. min. Cezar Peluso, voto do min. Gilmar Mendes, julgamento em 3-12-2008, Plenário, DJE de 5-6-2009, com repercussão geral.) No mesmo sentido: RE 349.703, rel. p/ o ac. min. Gilmar Mendes, julgamento em 3-12-2008, Plenário, DJE de 5-6-2009. Vide: AI 601.832-AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, julgamento em 17-3-2009, Segunda Turma, DJE de 3-4-2009; HC 91.361, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 23-9-2008, Segunda Turma, DJE de 6-2-2009; HC 72.131, rel. p/ o ac. min. Moreira Alves, julgamento em 23-11-1995, Plenário, DJ de 1º-8-2003.
"Supremacia da CR (Constituição da República) sobre todos os tratados internacionais. O exercício do 'treaty-making power’(poder para elaboração de tratados) pelo Estado brasileiro, está sujeito à observância das limitações jurídicas emergentes do texto constitucional. Os tratados celebrados pelo Brasil estão subordinados à autoridade normativa da CR. Nenhum valor jurídico terá o tratado internacional, que, incorporado ao sistema de direito positivo interno, transgredir, formal ou materialmente, o texto da Carta Política. Precedentes." (MI 772-AgR, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 24-10-2007, Plenário, DJE de 20-3-2009.).
A competência do Supremo Tribunal Federal do Brasil, para o exercício do controle de constitucionalidade para diversas matérias, está prevista no art. 102, incisos I e II, da CF, seja como competência originária, seja como recurso ordinário, mediante a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ou Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), previstas no art. 103, da CF.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) é uma ação que tem por finalidade declarar que uma lei ou parte dela é inconstitucional, ou seja, que contraria a Constituição Federal. A Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) tem por finalidade declarar que uma lei ou parte dela é constitucional, ou seja, que não contraria a Constituição. A ADI e a ADC, são instrumentos daquilo que os juristas denominam de “controle concentrado de constitucionalidade das leis”. A Lei nº 9868, de 10/11/199, dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.
Todavia é com base no inciso III, alínea “b”, art. 102, da Constituição Federal do Brasil, que estabelece a competência ao Supremo Tribunal Federal, para julgar, mediante recurso extraordinário, “as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal”.
Registre-se que o Recurso Extraordinário é cabível, para os Tratados e Convenções já incorporados ou recepcionados ao ordenamento jurídico. Os Tratados e Convenções Internacionais que ainda não foram recepcionados ou não ingressaram regulamente no ordenamento jurídico de um Estado, não produz os seus efeitos jurídicos e nem podem compelir ao cumprimento de obrigações neles consignados, até que o Estado, de forma soberana, manifeste a sua intenção de regularizar ou formalizar a sua adesão como signatário daquele instrumento jurídico internacional.
A jurisprudência e a doutrina brasileira acolheram a tese de que os Tratados e Convenções Internacionais e as Leis Federais possuem a mesma hierarquia jurídica, ou seja, os Tratados e Convenções Internacionais são incorporados no ordenamento jurídico brasileiro como norma infra-constitucional, à exceção do Tratados e Convenções Internacionais relativos aos Direitos Humanos, que possuem a mesma hierarquia jurídica das emendas constitucionais.
5 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NA ARGENTINA.
A literatura jurídica concebe que a norma constitucional introduzida por emenda, como previsto no ordenamento jurídico brasileiro, é produto decorrente do poder derivado, ou seja, decorre do Poder Legislativo e votação qualificada e não de representantes do povo, eleitos especificamente para elaboração de novo texto constitucional[23].
No Brasil, a Constituição Federal de 1988, nos seus 27 anos de existência, já consolida 91 (noventa e uma) Emendas Constitucionais, sendo que a ultima é de fevereiro de 2016, e 6 (seis) Emendas Constitucionais de Revisão, nos termos do seu art. 60, combinado com o artigo 3º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ACDT[24]. Registre-se ainda, que atual Constituição Federal, para a sua exequibilidade, consigna a necessidade de 33 (trinta e três) leis complementares e cerca de 130 (cento e trinta) leis ordinárias.
Os constitucionalistas brasileiros defendem a tese de que a grande maioria das emendas constitucionais tem origem na não-regulamentação de inúmeros dispositivos previstos no texto original e pouca correlação com a essência em si. Por analogia, alegam alguns juristas, que a Constituição seria “melhor” se todos os seus dispositivos já tivessem sido regulamentados, o que praticamente triplicaria o número de emendas constitucionais, em um raciocínio puramente aritmético.
Todavia, as emendas constitucionais permitiram e contribuíram para o fortalecimento de instituições como o Congresso Nacional, o Judiciário e o Ministério Público, o que garante uma maior efetividade dos direitos coletivos e dos direitos fundamentais. Vale dizer, os momentos políticos e econômicos pelos quais passou o Brasil, necessitou que ordenamento jurídico evoluísse, adequando-se aos novos interesses coletivos e individuais, refletidos pelas mudanças político-sociais e progressistas.
Politicamente, o país sempre foi instável, porém, foi essa instabilidade política que contribuiu de forma salutar para o aprimoramento das leis, respeitando-se assim a vontade da atual sociedade, atualizando as normas ao atual momento sociopolítico.
A Constituição Federal dos Estados Unidos da América, EUA, também conhecida como a Convenção da Filadélfia, que é de 1787, recebeu 27 emendas, em 229 anos de existência, sendo que a última delas, foi em 1992, quando ficou decidido que aumento de salários para congressistas só valem para a legislatura seguinte.
A Constituição da Argentina foi primeiramente aprovada por uma Assembleia Constituinte, feita na cidade de Santa Fé, em 1853. Esta Constituição, nos seus 163 anos de existência, foi alterada por 7 (sete) vezes, sendo que a última ocorreu em 1994. A Constituição Argentina é composta por um preâmbulo e duas partes normativas: Primeira parte: Declarações, Direitos e Garantias (artigos 1-43). Segunda parte: Autoridades da Nação (artigos 44-129). Ademais, têm equivalência ao estatuto constitucional, em virtude da disposição do artigo 75, inciso 22, da Constituição Federal da República de La Nación, e vários instrumentos internacionais, como os Tratados e Declarações de Direitos Humanos.
Destaque-se que o Congresso Nacional da Argentina declarou a necessidade da Reforma Constitucional de 1994, por intermédio da Lei nº 24.309, na qual, foi estabelecido os limites materiais da mencionada reforma, e, ao mesmo tempo, consignou eleição direta pelo povo argentino, dos parlamentares constituintes, responsáveis para elaborarem a emenda constitucional.
Consigne-se não haver dúvida no sentido de que, nada obstante, tratasse de reforma constitucional, o texto inserido pela Reforma de 1994, resultou de parlamentares constituintes, tal como ocorre na formação do poder constituinte originário. Assim, apenas para pontuar, o novo texto inserido na Constituição Nacional da Argentina, pela Reforma de 1994, fica imune de ser questionado perante a Corte Suprema de Justiça[25].
Entre as modificações introduzidas pela Reforma Constitucional de 1994, consigna-se a nova redação do item 22, do art. 75, Constituição Nacional, relativa às atribuições conferidas ao Congresso, in verbis:
“Art. 75. Corresponde al Congreso:
22. Aprobar o desechar tratados concluidos con las demás naciones y con las organizaciones internacionales y los concordatos con la Santa Sede. Los tratados y concordatos tienen jerarquía superior a las leyes.
La Declaración Americana de los Derechos y Deberes del Hombre; la Declaración Universal de Derechos Humanos; la Convención Americana sobre Derechos Humanos; el Pacto Internacional de Derechos Económicos, Sociales y Culturales; el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos y su Protocolo Facultativo; la Convención sobre la Prevención y la Sanción del Delito de Genocidio, la Convención Internacional sobre la Eliminación de todas las Formas de Discriminación Racial; la Convención sobre la Eliminación de todas las Formas de Discriminación contra la Mujer; la Convención contra la Tortura y otros Tratos o Penas Crueles, Inhumanos o Degradantes; la Convención sobre los Derechos del Niño; en las condiciones de su vigencia, tienen jerarquía constitucional, no derogan artículo alguno de la primera parte de esta Constitución y deben entenderse complementarios de los derechos y garantías por ella reconocidos. Sólo podrán ser denunciados, en su caso, por el Poder Ejecutivo Nacional, previa aprobación de las dos terceras partes de la totalidad de los miembros de cada Cámara. Los demás tratados y convenciones sobre derechos humanos, luego de ser aprobados por el Congreso, requerirán el voto de las dos terceras partes de la totalidad de los miembros de cada Cámara para gozar de la jerarquía constitucional” (grifamos).
Como se depreende do novo texto decorrente da Reforma Constitucional de 1994, que os Tratados e Convenções firmados pela República Argentina, firmado com outras Nações, com as demais organizações supranacionais e com a Santa Sé, tem a hierarquia superior à das leis.
Não obstante, constata-se que os Tratados e Convenções sobre os Direitos Humanos têm equivalência hierárquica constitucional, sem, contudo, derrogar os direitos e garantias previstos na Primeira Parte da Constituição Nacional, ou, mais precisamente, deve ser entendido como normas complementares ao texto originário ou não reformado.
Assim, por exemplo, na Argentina os direitos e liberdades reconhecidos pelo Pacto de São José da Costa Rica foram incorporado a legislação interna através da edição da Lei 23.054, pela qual se reconhece a competência da Comissão Interamericana de Direitos Humanos por tempo indefinido, e da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre todos os casos relativos à interpretação e aplicação da Convenção, sob condições de reciprocidade. Vale dizer, a nova instância de jurisdição supraestatal[26] provocou algumas mudanças em institutos processuais de tradição conhecida, ao ponto de comover suas estruturas para encontrar o caminho acertado que define a denominada transnacionalidade.
A Corte Suprema da Nação Argentina tem entendido que, a exegese da Convenção Americana sobre Direitos Humanos constitui, em princípio, uma questão de ordem federal, vez que envolve matéria que corresponde aos poderes próprios do Congresso Nacional, como é a regulamentação da liberdade pessoal, mas ao estritamente processual, de modo à assinalar que ao incorporar-se o Pacto de São José da Costa Rica ao Direito Interno, e, prevendo aquele, a intervenção de Organismos Internacionais nos assuntos internos do País, pode dar origem a problemas que comprometam o caráter internacional da Nação, cuja disposição corresponde, obviamente, ao Governo Federal.
Na perspectiva da transnacioladidade e sobre a La Convencion Interamericana de Derechos Humanos como Derecho Interno, Eduardo Jiménez de Aréchaga, Professor de Direito Internacional Público e ex-Presidente da Corte Internacional de Justiça[27], afirma que,
“La pergunta que se plantea en el título del presente estudio – la Convención Interamericana de Derechos Humanos como Derecho Interno – suscita de inmediato la cuestión más vasta de las relaciones entre el Derecho Internacional y el Derecho Interno. Bajo esse rótulo común de ‘Relaciones entre el Derecho Internacional y el Derecho Interno’ se estudian en general dos problemas diferentes: la independencia o la interconexión entre ambos sistemas jurídicos, por un lado, y por el outro la jerarquia respectiva entre las normas internacionales y las internas. Se trata, sin embargo, de dos cuestiones que, del punto de vista lógico, pueden perfectamente distinguirse y el estudio gana en claridad si se analizan separadamente. Lo que contribuye a la confusión es el uso común e indiscriminado de la dicotomía ‘monismo – dualismo’ respecto de estas dos cuestiones diferentes. La primera cuestión consiste en determinar si el Derecho Internacional y el Derecho Interno son dos sistemas jurídicos tan separados e incomunicados que, a falta de una norma legislativa interna que opere una "transformación", los individuos no pueden ser alcanzados por las reglas del Derecho Internacional o si, por el contrario, existe una inter-conexión entre ambos sistemas jurídicos, admitiéndose entonces la posibilidad de una incorporación automática y una aplicación directa de las normas de Derecho Internacional por los tribunales judiciales y las autoridades administrativas internas. La etiqueta de ‘dualismo’ debe reservarse para la primera posición y el término ‘monismo’ para la Segunda. La segunda cuestión, que es totalmente distinta, no concierne la separación o inter-conexión entre ambos sistemas jurídicos, sino su jerarquía: en caso de conflicto entre normas de Derecho Interno, cuál es la que prevalece? Aquí nada tiene que ver la dicotomía monismo-dualismo.”
A Corte Interamericana de Direitos Humanos é um órgão judicial autônomo que tem sede em San José, na Costa Rica, cujo propósito é aplicar e interpretar a Convenção Americana de Direitos Humanos e outros Tratados de Direitos Humanos. Faz parte do chamado Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos.
Dispõe o art. 68, 1, da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos que “os Estados Partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes”. A Corte Suprema de Justicia de La Nación Argentina, tem firmado o entendimento de subordinar as suas decisões em consonância com as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, na ocorrência da previsão contida no art. 68,1, da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos. Neste sentido:
“La Corte Suprema como uno de los Poderes Del Estado Argentino, debe cumprir La sentencia del Tribunal Internacional dictada em el caso Bueno Alves VS. Argentina, que impone, como medida de satisfacción y garantia de no repetición, La obligación de ivestigar los hechos que generaron las violaciones denunciadas, obligación que si bien ES de médios, importa uma tarea seria y eficaz, y cuya exegésis debe efectuarse em El marco de lo dispuesto por El art. 68.1 de La Convención Americana Sobre Derechos Humanos, que pose jerarquia constitucional (art. 75, inc 22 de La Constitución Ncional)”. (Voto del Juan Carlos Maqueda)[28].
Na perspectiva dos Direitos Humanos observa que tanto a norma constitucional quanto à jurisprudência da Suprema Corte de Justiça da Argentina se alinham à valorização e supremacia dos Direitos Humanos, ou seja, a Corte Suprema admite o controle de constitucionalidade ou de convencionalidade dos atos normativos internos, em face do dos Tratados e Convenções Internacionais Sobre os Direitos Humanos, nos termos do inc 22, do art. 75, da Constituição Nacional, na redação que lhe foi dada pela Reforma Constitucional de 1994.
6 O RECURSO EXTRAORDINÁRIO COMO INSTRUMENTO JURÍDICO NECESSÁRIO PARA O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE.
6.1 Recurso Extraordinário no Brasil.
O Supremo Tribunal Federal – STF, é um órgão de cúpula do Poder Judiciário brasileiro que prima pelo controle da constitucionalidade, resguardando as normas constitucionais e seus princípios basilares, ou seja, é o guardião maior da Constituição Federal. O recurso extraordinário é o instrumento jurídico processual de competência exclusiva da instância máxima do judiciário e foi exatamente este instrumento que a Carta Magna previu para viabilizar a sua preservação.
A Constituição de 1988, da República Federativa do Brasil, estabelece que o Supremo Tribunal Federal – STF deve julgar o Recurso Extraordinário quando decisão inferior contrariar a Constituição ou, quando declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, estabelecendo em seu texto no artigo 102, III, b, que compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida declarar inconstitucionalidade de Tratado ou lei federal.
O recurso extraordinário tem seu cabimento previsto no art. 102, III, alíneas a, b, c e d, da Constituição Federal, que o admite, nas causas julgadas por outros tribunais, em única ou última instância quando a decisão recorrida:
“a) contrariar dispositivo desta Constituição;
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição;
d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.”
Pela alínea “b”, inciso III, do art. 102, da CF, percebe-se que não há exigência que a lei seja pós-constitucional, como há para o conhecimento no controle abstrato segundo a jurisprudência do STF inaugurada na ADIn 02, da relatoria do Min. Paulo Brossard, com importantes argumentos contrários do Min. Sepúlveda Pertence. Nesta ADIn ficou assentado que não há inconstitucionalidade superveniente no sistema de controle direto judicial brasileiro.
Portanto, as hipóteses de cabimento do Recurso Extraordinário:
(a) Contrariar a Constituição Federal. A ofensa a dispositivo da CF deve ser direto e frontal, e não reflexo. Porém, no juízo de admissibilidade, não se exige a prova real da contradição, bastando tão somente, a simples alegação. Caso exista afronta à questão federal e a questão constitucional, diretamente, a solução é a interposição simultânea do Recurso Especial e do Recurso Extraordinário, conforme o crivo do recorrente e respeitando as formalidades impostas pela lei;
b) Declarar inconstitucional tratado ou lei federal; O recurso extraordinário constitui num verdadeiro instrumento de controle da constitucionalidade das leis. Inicialmente, no juízo de admissibilidade, bastará que a decisão a quo tenha declarado inconstitucional tratado ou lei federal, para que seja admitido o recurso extraordinário. Já no STF, será examinado minuciosamente o mérito, a fim de declarar se há inconstitucionalidade ou não. Contudo, que o Tratado mencionado neste dispositivo, é aquele que já tenha sido incorporado no ordenamento jurídico conforme já exposto.
Por sua vez, há que se esclarecer que no controle de constitucionalidade, por meio concentrado, leva-se em conta tão apenas a análise da norma em abstrato, tendo por objeto a própria questão da inconstitucionalidade e gerando efeitos erga omnes.
6.1 Recurso Extraordinário na Argentina.
O recurso extraordinário na Corte Suprema de La Nación Argentina e a gravedad institucional. Dispõe os artigos 116 e 117 da Constituição Nacional da Argentina, in verbis:
“Artículo 116. Corresponde a la Corte Suprema y a los tribunales inferiores de la Nación, el conocimiento y decisión de todas las causas que versen sobre puntos regidos por la Constitución, y por las leyes de la Nación, con la reserva hecha en el inciso 11 del artículo 67: y por los tratados con las naciones extranjeras; de las causas concernientes a embajadores, ministros públicos y cónsules extranjeros; de las causas de almirantazgo y jurisdicción marítima; de los asuntos en que la Nación sea parte; de las causas que se susciten entre dos o mas provincias; entre una provincia y los vecinos de diferentes provincias; y entre una provincia o sus vecinos, contra un Estado o ciudadano extranjero.
Artículo 117. En estos casos la Corte Suprema ejercerá su jurisdicción por apelación según las reglas y excepciones que prescriba el Congreso; Pero en todos los asuntos concernientes a embajadores, ministros y cónsules extranjeros, y en los que alguna Provincia fuese parte, la ejercerá originaria y exclusivamente.]”
A Corte Suprema de La Nación exerce o controle de constitucionalidade: (I) na forma originária e exclusiva, nas hipóteses do art. 117 da Constituição Argentina; (II) por meio do Recurso de Apelação, nas matérias de competência da Justiça Federal; (III) pela via do Recurso Extraordinário nos casos do art. 14 da Lei 48 e naqueles em que há “supuestos de arbitrariedad” e de “gravedad institucional”.
Sobre as hipóteses em que é cabível a interposição do Recurso Extraordinario, é a lição de Alberto Ricardo Dalla Vía, Abogado por la Universidad de Buenos Aires, con dos (2) doctorados: em Derecho Constitucional (Facultad de Derecho) y en Ciencia Política (Facultadde Ciencias Sociales) :
"Es posible llegar por via de apelación a la Corte Suprema, una vez agotada la instancia ante el supremo tribunal de la causa. Los supuestos de procedencia son tres, pudiendo tratarse de una ‘cuestión federal simples’ (interpretación) o ‘cuestiones federales complejas’ en disputa de normas de derecho común con preceptos constitucionales y cuando un acto de uma autoridad local está controvertido com una norma de la Constitución Nacional (art. 14 Ley 48). Fuera de los casos mencionados, el recurso extraordinario sólo es procedente en los supuestos de ‘arbitrariedad’ y de ‘gravedad institucional’, que se encuentran legislados y que son producto de la elaboración ‘pretoriana’ de nuestra Corte Suprema."
No sistema jurídico da Argentina, no pensamento de Ricardo Dalla Vía, o método de controle é difuso, o que significa dizer que, todo e qualquer juiz é competente para "declarar inconstitucional una norma, siempre que esto haya sido solicitado por la parte y que el tema forme parte del litígio".
Por outro lado, a Corte Suprema de Justiça, sob a inspiração do modelo americano exerce o controle de constitucionalidade na forma originária e exclusiva, nos casos do art. 117 da Constituição, por apelação nas matérias próprias da competência da Justiça Federal e pela via do "recurso extraordinário", nos casos do art. 14 da Lei 48 e naquelas situações que evidenciam os "supuestos de arbitrariedad' y de "gravedad institucional". Vale registrar que a Lei nº 48, é de 26/08/1863, e a regulamentação do recurso extraordinário de constitucionalidade está prevista nos seus artigos 14, 15 e 16, nos seguintes termos :
"Artículo 14. Una vez radicado un juicio ante los tribunales de provincia, será sentenciado y fenecido en la jurisdicción provincial, y sólo podrá apelarse a la Corte Suprema de las sentencias definitivas pronunciadas por los tribunales superiores de provincia en los casos siguientes:
1) cuando en el pleito se haya puesto en cuestión la validez de un tratado, de una ley del Congreso, o de una autoridad ejercida en nombre de la Nación, y la decisión haya sido contra su validez;
2) cuando la validez de una ley, decreto o autoridad de provincia se haya puesto en cuestión bajo la pretensión de ser repugnante a la Constitución Nacional, a los tratados o leyes del Congreso, y la decisión haya sido en favor de la validez de la ley o autoridad de provincia;
3) cuando la inteligencia de alguna cláusula de la Constitución, o de un tratado o ley del Congreso, o una comisión ejercida en nombre de la autoridad nacional haya sido cuestionada y la decisión sea contra la validez del título, derecho, privilegio o exención que se funda en dicha cláusula y sea materia de litigio.
Artículo 15. Cuando se entable el recurso de apelación que autoriza el artículo anterior deberá deducirse la queja con arreglo a lo prescripto en él, de tal modo que su fundamento parezca de los autos y tenga una relación directa e inmediata a las cuestiones de validez de los artículos de la Constitución, leyes, tratados o comisiones en disputa, quedando entendido que la interpretación o aplicación que los tribunales de provincia hicieren de los códigos Civil, Penal, Comercial y de Minería, no dará ocasión a este recurso por el hecho de ser leyes del Congreso, en virtud de lo dispuesto en el inciso 11, artículo 67 de la Constitución.
Artículo 16. En los recursos de que tratan los dos artículos anteriores, cuando la Corte Suprema revoque, hará una declaratoria sobre el punto disputado, y devolverá la causa para que sea nuevamente juzgada; o bien resolverá sobre el fondo, y aun podrá ordenar la ejecución especialmente si la causa hubiese sido una vez devuelta por idéntica razón."
Portanto, nos termos da legislação citada, pode-se afirmar que "es posible llegar por via de apelación a la Corte Suprema, una vez agotada la instancia ante el supremo tribunal de la causa. Los supuestos de procedencia son tres, pudiendo tratarse de una ‘cuestión federal simples’ (interpretación) o ‘cuestiones federales complejas’ en disputa de normas de derecho común con preceptos constitucionales y cuando un acto de uma autoridad local está controvertido com una norma de la Constitución Nacional (art. 14 Ley 48). Fuera de los casos mencionados, el recurso extraordinario sólo es procedente en los "supuestos de arbitrariedad' y de "gravedad institucional", que se encuentran legislados y que son producto de la elaboración ‘pretoriana’ de nuestra Corte Suprema"
No que diz respeito ao instituto da "gravedad institucional", é mister esclarecer que o Recurso Extraordinário só será recebido caso a parte demonstre que a matéria debatida excede seus interesses (requisito de transcendência).
Tal instituto, assim como o writ of certiorari (direito de garantia de revisão judicial) da Suprema Corte Norte-Americana e o juízo de relevância do Tribunal Constitucional Espanhol, foi fonte de inspiração para a introdução da Repercussão Geral ao sistema constitucional brasileiro, contida no § 3º, do art. 102, da Constituição Federal do Brasil e art. 105, do Novo Código de Processo Civil (NCPC) de 2015.
7 CONCLUSÃO
A arte ou a técnica de interpretar a norma jurídica é um desafio para o homem e notadamente para os operadores ou profissionais do Direito. Esta arte ou técnica denomina-se Hermenêutica. A Hermenêutica Jurídica tem por objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito. Vale dizer, a Hermenêutica é a teoria científica da arte de interpretar. O festejado magistério do saudoso Carlos Maximiliano[29], in Hermenêutica e Aplicação do Direito, 13ª Edição, Ed. Forense, 1993, p.9 e 10, nos ensina que:
Graças ao conhecimento dos princípios que determinam a correlação entre as leis dos diferentes tempos e lugares, sabe-se qual o complexo de regras em que se enquadra um caso concreto. Estrema-se do conjunto a que parece aplicável ao fato. O trabalho não está concluído. Toda lei é uma obra humana e aplicada por homens; portanto imperfeita na forma e no fundo, e dará duvidosos resultados práticos, se não verificarem, como esmero o sentido e o alcance das suas prescrições.
Incumbe ao intérprete àquela difícil tarefa. Procede à análise e também a reconstrução ou síntese. Examina o texto em si, o seu sentido, o significado de cada vocábulo. Faz depois obra de conjunto, compara-o com outros dispositivos da mesma lei, e com os de leis diversas, do país, ou de fora. Inquire qual o fim da inclusão da regra no texto, e examina este tendo em vista o objetivo da Lei toda e dos Direitos em geral. Determina por este processo, o alcance da norma jurídica e assim, realiza, de modo completo, a obra moderna da hermenêutica.
Como se depreende, cabe aos operadores ou profissionais do Direito, aos intérpretes e doutrinadores e, principalmente ao Poder Judiciário a difícil tarefa de solucionar os conflitos entre os Tratados Internacionais (Direito Internacional) e as normas internas (Direito Interno) de um País. No mundo globalizado em que vivemos hoje, os Estados estão em constantes relacionamentos, seja por razões políticas, diplomáticas ou por razões comerciais. Estes relacionamentos quando há mútuo interesse, se materializam por Tratados, Convenções, Acordos e Pactos Internacionais, assumindo-se obrigações que, por diversas vezes, interferem no ordenamento jurídico de cada Estado. O simples fato de um Estado firmar um Tratado Internacional, não lhe retira a Soberania, já que a regra de autolimitação fundamenta-se na submissão voluntária ao Direito Internacional. Contudo é um fato limitador ao seu Poder Soberano.
Conforme pudemos observar, na ocorrência de conflito entre uma norma interna e o Tratado Internacional, aplicar-se-á o entendimento já consagrado do Colendo Supremo Tribunal Federal do Brasil: “há paridade entre a norma brasileira de produção doméstica e a norma brasileira de produção internacional. Assim, o conflito entre uma e outra, resolve-se, de regra, pelo mecanismo tradicional: lex posterior derogat priori (norma posterior revoga norma anterior). Todavia, há de ser presente que a lei posterior não revoga o tratado anterior, “mas simplesmente afasta, enquanto em vigor, as normas do tratado com ela incompatíveis”. Assim, revogada a lei que afastou a sua aplicação, voltará o Tratado a ter aplicação.
Esta limitação não deve ser vista como uma afronta à Soberania do Estado, mas como uma preservação desta, através da submissão à lei, uma vez que aquele, ao autolimitar-se, determina sua própria vontade, fazendo prevalecer sua Soberania. A submissão da Soberania aos limites da Lei, devido à obediência às regras jurídicas de que se revestem os Tratados e Convenções Internacionais, constitui, por óbvio, um fator de limitação ao seu Poder Soberano, que obriga o País a cumprir as condições impostas pelas regras do Tratado e Convenções Internacionais, mesmo considerando a regra estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal, lex posteriori derogat priori (norma posterior revoga norma anterior).
Por conseguinte, Parte inferior do formulário
como se depreende nos argumentos deste Artigo, constata-se que a história do Direito se confunde com a história e com a evolução da própria humanidade. O convívio em sociedade, desde a formação dos primeiros grupos pré-históricos até a organização de comunidades maiores e mais complexas, tomou rumos e perspectivas que acarretaram no nascimento dos Estados em fins do Século XIX. As relações entre os Estados nem sempre foram amistosas, muitas das vezes dando ensejo às rupturas sociopolíticas ou então declaração de guerras.
O Estado, por intermédio de sua organização político-administrativa, com seus órgãos e seus agentes, constituído em administração direta e indireta, tem como objetivo final o bem comum de seus cidadãos.
Por outro lado os Tratados e Convenções Internacionais tem por finalidade, a preservação dos interesses bilaterais ou multilaterais entre os Estados , e também, a ordem e da paz mundial. O Estado, constituindo-se como uma pessoa jurídica de Direito Público Interno e também como pessoa jurídica de Direito Internacional Público, tem como obrigação assumir os compromissos firmados na ordem interna e na ordem internacional, com outros Estados ou com entidades supranacionais, tais como a OMC, OIT, OMS, ONU, e assim, não obstante resguardar os interesses nacionais consubstanciada na sua Soberania, necessitando compatibilizar as obrigações consignadas nos Tratados e Convenções Internacionais.
E é dentro desta perspectiva, que surge o controle de Constitucionalidade de Tratados e Convenções Internacionais. O Brasil adota um sistema misto de controle. O controle difuso poderá ser exercido por qualquer juiz ou tribunal do país, com o fim de afastar a aplicação da lei ou do ato, apenas e tão somente naquele caso concreto, contido em um determinado processo, interessando e produzindo efeitos, conseqüentemente, tão somente às partes envolvidas neste processo (efeito inter partes).
Já o controle concentrado, o qual analisa a lei em tese, sem qualquer caso concreto a ser considerado, apenas e tão somente, poderá ser exercido pelos denominados “Tribunais Constitucionais”, quando o paradigma do controle de constitucionalidade é a Constituição Federal e será exercido com exclusividade pelo Supremo Tribunal Federal – STF. Já quando o paradigma forem as Constituições Estaduais ou as Leis Orgânicas dos municípios, será exercido com exclusividade pelos respectivos Tribunais de Justiça. (efeito erga omnes).
Portanto, o Controle de Constitucionalidade de Tratados e Convenções Internacionais e dos Tratados e Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos, são dotados de peculiaridade, que deve ser observada em sua realização, pois, ao se exercer o controle, negando-se ou admitindo-se a validade da norma internacional, além de se colocar em confronto o equilíbrio da segurança jurídica interna do país, paradoxalmente, depara-se com a capacidade de um Estado se demonstrar, ou não, um sujeito jurídico confiável na ordem internacional no que se refere à obediência das normas que ele se obriga a cumprir perante outros Estados.
A queda do muro de Berlim em 1989 precipitou o fim da Guerra Fria, o fim da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS, bem como o fim do modelo sociopolítico e ideológico do capitalismo e do socialismo, gerando um novo modelo político e econômico que é a Globalização. A Globalização é um fenômeno que aproximou os Estados, instituiu Blocos Econômicos, permitiu maior trânsito de capitais, pessoas, produtos e serviços, redesenhando o mapa geográfico mundial, e fez repensar o conceito de soberania do Estado.
Os ventos da globalização permitiram que muitos dos Estados, antes autoritários, marchassem rumo à constituição de Estados Democráticos de Direito, aperfeiçoando a relação entre si e a relação destes com as pessoas, notadamente, privilegiando a expansão do Direito Internacional, que se consubstanciou com a elevação dos Tratados e Convenções Internacionais, nos seus mais variados assuntos e temas e com os Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos.
O § 2º, art. 5º, da Constituição Federal do Brasil de 1988 determina que os direitos e garantias expressos na Constituição, não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos Tratados Internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. Registre-se que a inserção no ordenamento jurídico brasileiro dos Tratados e Convenções Internacionais, em que a República Federativa do Brasil seja parte, equivale ao nível de uma lei ordinária, portanto, abaixo da Constituição e também das Emendas Constitucionais.
Por outro lado, o § 3º, art. 5º, da Constituição Federal do Brasil de 1988, determina que os Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às Emendas Constitucionais, e nestas duas hipóteses, o Supremo Tribunal Federal do Brasil , STF, exerce o Controle de Constitucionalidade, de modo a compatibilizar a norma ordinária com a Constituição Federal, via recurso extraordinário, nos termos art. 102, III, letra ‘b”, da CF.
Nessa perspectiva decorre que Los tratados y concordatos tienen jerarquía superior a las leyes, enquanto os Tratados e Convenções sobre os Direitos Humanos, observando que, tanto a norma constitucional quanto à jurisprudência da Suprema Corte Argentina, se alinham à valorização e supremacia dos Direitos Humanos, ou seja, a Corte Suprema admite o controle de constitucionalidade ou de convencionalidade dos atos normativos internos em face do dos Tratados e Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos, nos termos do inc 22, do art. 75, da Constituição Nacional, na redação que lhe foi dada pela Reforma Constitucional de 1994.
Por conseguinte, a Corte Suprema de Justiça, sob a inspiração do modelo americano exerce o controle de constitucionalidade na forma originária e exclusiva, nos casos do artigo 117 da Constituição, por apelação nas matérias próprias da competência da Justiça Federal e pela via do "recurso extraordinário", nos casos do art. 14 da Lei 48 e naquelas situações que evidenciam os "supuestos de arbitrariedad" y de "gravedad institucional"
Finalmente, registre-se que cabe ao Poder Judiciário do Estado, por intermédio da sua maior Corte de Justiça ou ainda, de um Tribunal Constitucional, a responsabilidade pela Guarda da Lei maior que é a Constituição, e ainda, tem a difícil tarefa de solucionar os conflitos entre os Tratados e Convenções Internacionais e os Tratados e Convenções Internacionais de Direitos Humanos, bem como exercer o controle de constitucionalidade de tais Tratados e Convenções, que integram o Direito Internacional, com as normas internas, ou com o Direito Interno de um País, sem que isso possa configurar a perda da soberania política do Estado, dentro da perspectiva do mundo globalizado.
Advogado; Doutorando em Direito das Relações Internacionais pelo Centro Universitário de Brasília UNICEUB; Mestre em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo UNISAL; Professor de Graduação e Pós Graduação em Direito Público e Direito Internacional Público no Curso de Direito da Faculda de de Ciências Sociais e Tecnológicas – FACITEC Brasília DF; Ex-professor de Direito Internacional Público da Universidade Metodista de São Paulo UMESP; Colaborador da Revista Âmbito Jurídico www.ambito-jurídico.com.br; Advogado Geral da Advocacia Geral da IMBEL AGI; Autor de Artigos e Livros entre eles 200 Anos da Indústria de Defesa no Brasil e Soberania – O Quarto Poder do Estado ambos pela Cabral Editora e Livraria Universitária. Contato: rene@imbel.gov.br; renedellagnezze@yahoo.com.br.
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