Estudo recente da ABA – American Bar Association, a Ordem dos Advogados dos Estados Unidos, concluiu que a presença mundial e simultânea da Grande Rede de Computadores Internet implica na criação de uma comissão multinacional como única maneira para desenvolver e administrar as regras legais da Web. Há cerca de três anos os advogados americanos (com a colaboração de diversos profissionais de vários países) vêm estudando a questão, que abrange vários tópicos, entre eles a privacidade, a proteção ao consumidor, a incidência fiscal na Rede, os jogos de azar, o mercado mobiliário e o direito bancário. Um dos pontos mais polêmicos e que já vem chamando atenção dos juristas e profissionais do Direito no Brasil e em outros países, é o comércio eletrônico, que literalmente pulveriza fronteiras geográficas e independe de locação física. O estudo, coordenado pelo painel denominado Global Cyberspace Jurisdiction Project da ABA ainda está em fase embrionária, e deve colher opiniões e comentários de diversos outros setores da sociedade, como, por exemplo, a indústria, os empresários, o setor terciário etc. A eficiência do comércio eletrônico e seus desdobramentos ao nível do adquirente e da entrega de produtos precisa ser grandemente aperfeiçoada, para que se possa implantar um ordenamento jurídico com normas de organização e conduta práticas e viáveis. A tecnologia não dá trégua ao Direito e os governos não conseguem promulgar e aplicar leis na mesma velocidade do desenvolvimento da técnica. Um dos pontos unânimes do estudo afirma que nenhuma nação do mundo atualmente tem a capacidade de conferir plena eficácia ao ciberespaço por si própria, devido à sua volatilidade, velocidade e simultaneidade, o que sublinha a importância de uma comissão internacional para trabalhar junto aos governos e referendar novas regras. Da mesma forma como se descobriu agora parte do método de seqüenciamento do genoma humano – que apenas deu ao homem um colossal dicionário com cerca de 3 bilhões de verbetes e ainda levará um bom tempo para ser amplamente conhecido e manipulado – desenvolver legislação para o ciberespaço se assemelha a aterrissar num planeta distante e inóspito e iniciar a construção de módulos de sobrevivência para que outros possam retornar. Tudo o que é novo sempre causa algum estupor e retração. As pessoas e o mercado têm que se acostumar às novas regras. Entre as sugestões do painel duas são especialmente interessantes: a criação de um cibertribunal e conselhos arbitrais específicos ao nível da indústria para resolver disputas geradas pelo comércio eletrônico. Outra boa idéia aconselha que as autoridades regulatórias mundiais sejam estimuladas a estudar e desenvolver métodos de como leis poderiam ser aplicadas a produtos financeiros e aos serviços existentes no ambiente virtual, sem os contratempos causados pela variedade geográfica e sócio-política que hoje separa as nações mundiais. Na corrida mercantil para o cyberspace, a ICANN, sigla que responde por Internet Corporation for Assigned Names and Numbers, entidade americana que administra a designação de nomenclatura na Grande Rede de computadores, já se deu conta da necessidade de ampliar os sufixos dos endereços eletrônicos, com o objetivo de exercer melhor o controle das operações resultantes do crescente comércio eletrônico. Especificamente vinculados às áreas de atuação dos sites, nomes como “.shop”, “.travel”, “.bank”, “.union” e “.sex” visam conferir maior agilidade e facilidade de identificação nas transações comerciais realizadas através da Internet. Estima-se que o e-commerce deva atingir a substancial cifra de US$ 300 bilhões no próximo biênio e aproximar-se dos US$ 1 trilhão até 2006, pelas estimativas da WIPO – World Intellectual Property Organization, sediada em Genebra. Um dos obstáculos à obtenção de novo sufixo ainda fica por conta do preço salgado. Quem desejar adequar a finalização de seu endereço precisará desembolsar cerca de US$ 50 mil para se candidatar a um exame por parte da ICANN, que mesmo assim não garante a concessão. O controle através da diversificação dos sufixos será um sólido aperfeiçoamento legal para os profissionais do Direito, já que possibilitará um passo à frente no combate aos já denominados “ciberposseiros”, indivíduos que registram indiscriminadamente nomes de grandes corporações e celebridades, com o único intuito de depois revendê-los com fins lucrativos. Sua ação ainda é possível em função da diversidade da legislação marcária em vigor no mundo e da inexistência justamente de uma grade legal linear, em nível supranacional, unindo todas as nações que atualmente possuem interesses virtuais. Cerca de 20 mil novos registros são solicitados a cada semana em todo o mundo, com predominância para os sufixos “.com”, “.org”, e “.edu”. Já somam em torno de 15 milhões mundialmente. A tendência crescente é uma confirmação das leis de marcas e patentes já em vigor no mundo, bem como das convenções internacionais sobre a matéria, mas afigura-se como certa a necessidade de sua adaptação, do ajuste dos diplomas existentes aos novos usos da tecnologia. A própria OMPI, através de seu Centro de Arbitragem e Mediação, em operação desde dez/99, vem resolvendo controvérsias relativas a nomes de domínio de marcas já anteriormente registradas. Já ultrapassa a 500 o número de casos trazidos à baila perante a entidade e pelo menos uma dezena deles provêm do Brasil. Grandes clubes de futebol, a Rede Globo e a Embratel, são alguns dos nomes brasileiros que já foram alvo dos “ciberposseiros”. O problema é que esses processos não estão ao alcance das pessoas comuns, pois custam por volta de US$ 3.000,00 por caso, mais os honorários dos advogados, que adicionam pelo menos mais a metade desse valor ao custo final. Há árbitros da OMPI em vários países do mundo, inclusive no Brasil, o que só reforça a constatação de que graças à Internet, finalmente o Direito foi guindado à sua verdadeira importância mundial. Sempre existiram os tratados e convenções internacionais entre estados amigos e até antagônicos, mas com o advento da Grande Rede soou definitivamente o alerta na profissão legal: para ter eficácia e força vinculante diante da velocidade com que as coisas se processam na Web, a legislação cabível terá que transpor em forma célere as fronteiras geográficas dos países.
Advogado especializado em Direito Autoral, Show Business e CyberLaw
Prof. pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas – FGV/RJ
Professor da pós-Graduação da Escola Superior de Advocacia da OAB/RJ
Consultor de Direito Autoral da Revista CONJUR
membro da Ordem dos Advogados dos Estados Unidos (American Bar Association)
membro da Federação Interamericana de Advogados em Washington D.C.
membro da Câmara de Comércio Americana de São Paulo – AMCHAM/SP
membro do escritório Nelson Schver Advogados no Rio de Janeiro
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