Defensor público não exerce advocacia pública

Resumo: O presente artigo aborda a temática da Defensoria Pública dos seus Membros e Usuários a natureza jurídica e autonomia da Instituição e a natureza jurídica e independência funcional dos Defensores a capacidade postulatória destes para o exercício das atribuições institucionais a partir da nomeação e posse no cargo público independentemente de inscrição nos quadros da OAB e outorga de mandato do Assistido no caso de atuação judicial individual esclarecendo que Defensor Público não é Advogado Público na medida em que não exerce Advocacia Pública conceito constitucional próprio e apartado da atividade orgânica da Defensoria além de abordar o conceito deste Autor acerca da Advocacia Institucional própria da Defensoria Pública e do Ministério Público além da Advocacia de Partido ambas não abrangidas pelo Estatuto da Advocacia e da OAB.

Sumário: 1. Defensoria Pública. 2. Advocacia Institucional. 3. Funções Essenciais à Justiça. 4. Defensor Público não é Advogado Público. 5. Desnecessidade de inscrição na OAB. 6. Não submissão à fiscalização ética da OAB.

1.  INTRODUÇÃO

O presente Artigo aborda a temática da Defensoria Pública, dos seus Membros e Usuários (Assistidos), a natureza jurídica e autonomia da Instituição e a natureza jurídica e independência funcional dos Defensores, a capacidade postulatória destes para o exercício das atribuições institucionais a partir da nomeação e posse no cargo público, independentemente de inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e outorga de mandato (por procuração) do Assistido no caso de atuação judicial individual, esclarecendo que Defensor Público não é Advogado Público, na medida em que não exerce Advocacia Pública, conceito constitucional próprio e apartado da atividade orgânica da Defensoria, além de abordar o conceito deste Autor acerca da Advocacia Institucional, própria da Defensoria Pública e do Ministério Público, além da Advocacia de Partido, ambas não abrangidas pelo Estatuto da Advocacia e da OAB (EAOAB – Lei n. 8.906/94).

2.  DESENVOLVIMENTO

2.1. Da natureza jurídica do Defensor Público, da Defensoria Pública, sua Autonomia Institucional e os beneficiários do direito fundamental à Assistência Jurídica Integral e Gratuita (terminologia “Assistido”)

O Defensor Público é um Membro (ou Órgão de Execução) da Defensoria Pública (seja da União, dos Estados-membros, seja do Distrito Federal e dos Territórios), esta enquanto Instituição Pública, Permanente, Democrática, Autônoma e com natureza jurídica de Função Essencial à Justiça, na inteligência dos artigos 134, “caput” e § 2.° (Seção III, Capítulo IV, Título IV, da Constituição da República – CRFB) e 1.º, 2.º, 5.º, inc. III, “a”, 53, inc. III, 97-A, 98, inc. III, “a”, da LC n. 80/94 (com alterações da LC n. 132/09) – Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública (LONDP).

Trata-se de Agente Público Político de Transformação Social. Não é simples Servidor Público (Agente Público Administrativo, sujeito à hierarquia e disciplina do Poder Executivo ou de outro), mas sim em sentido amplo Agente Público Político, haja vista que detém parcela de soberania estatal em suas mãos, ou seja, o exercício da Assistência Jurídica Integral e Gratuita, individual e coletiva, judicial e extrajudicial, aos Vulneráveis, Hipossuficientes ou Necessitados (arts. 5.°, inciso LXXIV e 134 da CRFB), estes enquanto conceito jurídico indeterminado, aberto, vago, impreciso, o qual deve ser interpretado a partir da Unidade da Constituição e da inexistência de hierarquia entre normas constitucionais oriundas do Poder Constituinte Originário com o escopo de extrair o real significado da expressão constitucional, a qual não permite interpretação restritiva, reducionista, pena de ofensa às garantias da dignidade da pessoa humana, do desenvolvimento nacional e do acesso à Justiça (arts. 1.º, III, 3.º, II, e 5.º, XXXV, da CRFB) e demais direitos fundamentais correlacionados.

Remeto oportunamente o Leitor ao meu Artigo “Defensoria Pública na concretização de políticas públicas: um controle da aparente discricionariedade administrativa governamental” (ARRUDA, Ígor Araújo de., Revista Jusnavigandi, 2012), com os devidos apontamentos sobre Vulnerabilidade Econômica, Jurídico-Social e Organizacional e a atuação institucional da Defensoria no âmbito individual simples e homogêneo, coletivo stricto sensu e difuso (transindividual), judicial e extrajudicial, com enfoque no campo difuso e extrajudicial.

Na Instituição há os servidores auxiliares componentes da Carreira de Apoio (arts. 97-A, incs. II e VI, e 109, da LONDP), por exemplo, Médicos, Psicólogos, Assistentes Sociais, Assessores Jurídicos e Administrativos, Estagiários, Técnicos em Informática e Telemática, Engenheiros e Arquitetos, e os Membros (Defensores Públicos Estaduais, Distritais, Territoriais ou Federais), sem olvidar a divisão orgânica (Órgãos da Administração Superior, de Atuação, de Execução e, nos Estados-membros, Auxiliar).

Tais Órgãos e Serviços Auxiliares só foram previstos expressamente para as DPEs (Defensorias Estaduais), dada a atual ausência de expressa Autonomia Financeiro-Orçamentária da DPU, da DPDF e da DPT na Constituição da República (§ 2.° do art. 134 da CRFB), o que repercutiu na regulamentação legal pela Lei Orgânica da Carreira.

Malgrado o artigo 2.º da LONDP aparentemente divida a Instituição em três (3): da União – DPU (I), do Distrito Federal e Territórios – DPDFT (II) e dos Estados – DPEs (III), entendo que a partir da vigência da Emenda Constitucional (EC) n. 69/2012, deva a divisão ser feita em quatro (4), a partir de uma leitura constitucional do indigitado dispositivo legal e partindo-se da premissa de que o Princípio da Unidade Institucional deva ser analisado no âmbito de cada Defensoria, e não globalmente, em consonância ao AREsp n. 194.892/RJ e ao artigo 3.º, “caput”, LONDP, à semelhança dos artigos 127, § 1.º da CRFB, 1.º, parágrafo único, da Lei n. 8.625/93 (LONMP – Lei Orgânica Nacional do Ministério Público dos Estados) e 4.º da LC n. 75/93 (LOMPU – Lei Orgânica do Ministério Público da União), haja vista a simetria constitucional e a similitude de divisão institucional entre ambas Funções Essenciais à Justiça.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça – STJ preceituou na fundamentação jurídica deste julgado (AgRg no AgRg no AREsp n. 194.892/RJ, 1.ª Seção, DJe 26/10/12) que:

“Por outro lado, a Constituição Republicana estabelece como princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional (art. 127, § 1.º da CR/88), organizando o Ministério Público brasileiro em dois segmentos: Ministério Público da União, que compreende o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios; e o Ministério Público dos Estados (art. 128, incisos I e II, da CR/88).

Tal estruturação assentada constitucionalmente implica duas consequências: (i) não há hierarquia entre os dois ramos distintos do Ministério Público (da União e dos Estados); (ii) a unidade institucional é princípio aplicável apenas no âmbito de cada Ministério Público.” (grifo nosso)

Assim sendo, partindo-se da mesma premissa, embora o Princípio da Unidade Institucional ainda não tenha envergadura constitucional em relação à Defensoria, tem sua previsão infraconstitucional na Lei Orgânica da Carreira (art. 3.°), com o mesmo significado, devendo ser aplicado no âmbito de cada Defensoria Pública, cada qual considerada como uma só (una).

Com o texto da EC n. 69/2012, a organização administrativa e a manutenção da Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF), bem como a competência privativa para legislar sobre esta, deixaram de ser de competência da União (arts. 21, inc. XIII, e 22, XVII, da CRFB), e passaram para o próprio DF, por se tratar de competência concorrente (art. 24, inc. XIII, CRFB), permanecendo apenas quanto à Defensoria Pública dos Territórios (DPT), nos termos dos indicados artigos e do 48, IX, da CRFB, após redação vigente desta Emenda à Constituição, senão vejamos:

“Art. 21. Compete à União:

XIII – organizar e manter o Poder Judiciário, o Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios e a Defensoria Pública dos Territórios;

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

XVII – organização judiciária, do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios e da Defensoria Pública dos Territórios, bem como organização administrativa destes;

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

XIII – assistência jurídica e Defensoria pública;

Art. 48. Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:

IX – organização administrativa, judiciária, do Ministério Público e da Defensoria Pública da União e dos Territórios e organização judiciária e do Ministério Público do Distrito Federal;”

Assim sendo, a divisão das Defensorias deve ser feita da seguinte forma: DPU (da União), DPEs (dos Estados-membros), do Distrito Federal (DPDF) e dos Territórios (DPT), interpretando-se o art. 2.º da LONDP em conformidade à EC n. 69/2012 e as alterações expressas ao texto constitucional (arts. 21, XIII, 22, XVII, 48, IX).

Naturalmente e por consectário da indigitada divisão orgânica, é vedada a criação das chamadas “Defensorias Públicas Municipais”, por falta de previsão constitucional (§ 1.° do art. 134 da CRFB) e legal (LC n. 80/94) que permita a sua instituição. Legislar sobre “assistência jurídica e Defensoria Pública” é de competência concorrente da União, dos Estados-membros e do Distrito Federal (art. 24, inc. XIII, da CRFB), cada qual no seu âmbito de atuação.

Ademais, sendo a Defensoria uma Instituição Pública Autônoma, Função Essencial à Justiça, acompanhou a divisão do Ministério Público (MP) e do Poder Judiciário, não havendo MP Municipal e Judiciário Municipal, malgrado exista Procuradoria Municipal, esta integrante do Minissistema da Advocacia Pública, integrante do próprio Executivo Municipal, ainda sem regulamentação constitucional expressa no art. 132 da CRFB (PEC 153/03 aprovada na Câmara dos Deputados e remetida ao Senado Federal – SF; e PEC 17/2012 do SF, com aprovação de Parecer na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania – CCJC).

Assim, a criação de Defensoria Pública Municipal, inclusive instituindo a figura do Defensor Público-Geral do Município, é eivada de inconstitucionalidade, devendo imediatamente ser desfeita pelo Executivo ou Legislativo, sob pena de eventual concurso público instaurado ser nulo, o profissional que exercer o cargo cometer ato de improbidade administrativa, recebendo verbas públicas indevidamente, além de poder responder pela infração penal de menor potencial ofensivo tipificada no art. 328 do CPB (usurpação de função pública), já que “o exercício do cargo de Defensor Público é indelegável e privativo de membro da Carreira” (§ 10 do art. 4.º da LONDP).

Como asseverado acima, a Defensoria Pública é Instituição Autônoma (Autonomia Institucional), com Autonomia Funcional, Administrativa e Orçamentária, fazendo parte da estrutura orgânica da União, dos Estados, do DF e dos Territórios, estes atualmente inexistentes. Essas autonomias, por infelicidade legislativa, só foram previstas expressamente no texto constitucional para as Defensorias dos Estados-membros (§ 2.° do art. 134 da CRFB), não o fazendo em relação às demais.

Não obstante a falta de previsão constitucional expressa, entendo que a DPU, a DPDF e DPT detêm a mesma autonomia. As Instituições, conquanto unas cada uma em sua estrutura institucional, são todas Funções Essenciais à Justiça, não integrantes de quaisquer dos Poderes da República (Legislativo, Executivo e Judiciário), livres de interferências política, administrativa e institucional, devendo receber tratamento paritário, sob pena de ofensa à própria garantia fundamental da isonomia constitucional, tratando-se diferentemente situações semelhantes, prejudicando os Assistidos (usuários dos serviços da Defensoria), os quais terão tratamento distinto a depender da Instituição Defensorial que os ampare.

Em breves explanações cruzadas, explico que os usuários dos serviços da Defensoria são tachados de “Assistidos”, à luz do artigo 4.°-A da LONDP, ipsis litteris:

“Art. 4.º-A.  São direitos dos assistidos da Defensoria Pública, além daqueles previstos na legislação estadual ou em atos normativos internos:  (…)” (grifo nosso)

A utilização do termo “cliente” ou “clientela” é incorreta, já que eles indicam caráter lucrativo e econômico, o que não se coaduna com a Instituição Pública representante do Estado e prestadora de serviços jurídicos integrais e gratuitos. Cliente é o contratante dos serviços advocatícios de Escritórios e Advogados Privados.

O uso da expressão “clientela da Defensoria” começou a grassar na mídia e em outros meios de comunicação, até mesmo jurídicos. Recentemente no caso do “Mensalão” (APn 470, STF), um dos denunciados foi assistido e representado judicialmente pelo Defensor Público-Geral Federal (chefe da DPU, antes denominado Defensor Público-Geral da União, com atuação no STF, nos termos do art. 23 da LONDP).

Foi divulgado que o “cliente” da DPU conseguiu anular o processo por falta de intimação da Defesa Técnica anterior, prejudicando a ampla defesa e o contraditório, ou seja, o próprio devido processo legal formal de material. Naturalmente os meios de comunicação não detêm o conhecimento de todos os detalhes técnicos das mais diversas profissões, carreiras e Instituições; apenas registro a imprecisão terminológica com previsão orgânica expressa.

No recente e excelente livro “Biscaia” (Ed. Cassará, RJ, 2012), o qual versa a biografia do ex-Procurador-Geral de Justiça do Rio de Janeiro (MPRJ) e ex-Deputado Federal Antonio Carlos Biscaia, o autor Marcelo Auler fez uso incorreto da expressão “cliente” (pág. 57):

“Como defensor, Biscaia tinha o dever de empenhar-se na absolvição do cliente, independentemente do crime cometido. (…)

Ao defensor, que recebe do Estado para garantir o direito de defesa dos réus sem condições financeiras, não é dada a opção de desistir, mesmo quando o crime cometido lhe cause repugnância, como nos casos de violência sexual contra crianças.” (g. nosso)

A passagem versava a atuação do Defensor Público na Defesa (Pública) Criminal Técnica, exortando a atuação defensiva do profissional, independentemente da compreensão ética, religiosa, moral e do clamor e comoção sociais causados por uma infração penal grave.

A despeito dos precisos esclarecimentos, registro que o Defensor age com Independência Funcional (arts. 43, inc. I, 88, I, e 127, inc. I, LONDP), enquanto garantia dos Membros da Instituição, atuando livremente de acordo com sua independência e inteligência técnica, convicções pessoais, morais e jurídicas, sem qualquer hierarquia ou pressão intelectual, desde que não prejudique atentatoriamente a amplitude ou plenitude de defesa (art. 5.°, incs. XXXVIII, “a”, e LV, da CRFB), bem como não cometa desvirtuamento de conduta e violação de direitos de terceiros e prejuízo aos interesses dos Assistidos.

Ademais, a Defesa Criminal Técnica é exercida pela Defensoria não apenas em favor daqueles Hipossuficientes Financeiros, que não tenham condições de custear a contratação de Advogado Particular, mas também dos que tenham recursos econômicos, embora não constituam por algum motivo, já que a Defesa Criminal Técnica é instrumento imprescindível ao devido processo legal, consoante registrado no Enunciado n. 523 de Súmula do STF, sob pena de nulidade do processo penal. Entrementes, estes ficarão responsáveis pelo pagamento das custas e despesas processuais, não se beneficiando com a gratuidade judiciária (a qual não se confunde com assistência jurídica), prevista na Lei n. 1.060/50 e respectiva lei estadual.

Regressando aos comentários acerca da Autonomia da Instituição, em suas 4 (quatro) divisões institucionais, após a edição da EC n. 69/2012, a autonomia da DPDF ficou clara com o repasse das atribuições de organizar e manter a Defensoria do Distrito Federal, malgrado continue sem previsão constitucional expressa.

No mesmo sentido, tramita no STF a ADI n. 4.282, ajuizada pela ANADEF (antiga ANDPU) – Associação Nacionais dos Defensores Públicos Federais, a qual busca dar interpretação conforme a Constituição à EC n. 45/04 que conferiu autonomia às Defensorias Estaduais, retirando qualquer interpretação que submeta a DPU ao Ministério da Justiça, órgão do Executivo Federal.

A despeito dos argumentos, tramita no Parlamento Nacional a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) n. 207/2012 que confere autonomia expressa à DPU e DPDF. A Proposta inclui um terceiro parágrafo ao artigo 134 da CRFB, assegurando aplicar-se “o disposto no § 2.º às Defensorias Públicas da União e do Distrito Federal”. Ela já foi aprovada no Senado Federal e já recebeu Parecer favorável da Câmara dos Deputados, aguardando aprovação em Plenário.

Como consequência da Autonomia Institucional, exemplifico casos práticos e de repercussão cotidiana.

Primeiro, o Poder Judiciário (o Magistrado) não nomeia Defensor Público para fazer a Defesa Criminal Técnica daquele que esteja sem assistência jurídica, mormente quando aponta pessoalmente a figura do Defensor, sob pena de violar a autonomia da Instituição, interferindo na sua hierarquia e divisão funcional.

O magistrado deve intimar ou oficiar a Defensoria Pública para que esta indique e nomeie Defensor (Membro, e não Servidor), ordinariamente aquele já titularizado no Núcleo Regional de Interior, Núcleo Especializado ou com atuação em Vara ou Seção Judiciária ou no próprio Tribunal.

O artigo 263 do Código de Processo Penal (CPP) deve ser interpretado à luz da Constituição (§ 2.º do art. 134 da CRFB). Dispõe o artigo que “se o acusado não o tiver, ser-lhe-á nomeado defensor pelo juiz, ressalvado o seu direito de, a todo tempo, nomear outro de sua confiança, ou a si mesmo defender-se, caso tenha habilitação”.

Trata o dispositivo da nomeação da esdrúxula e em paulatina extinção figura do Advogado Dativo (Advocacia Dativa), e não de Defensor Público, atuante aquele nos casos de inexistência ou falta de estruturação adequada da Defensoria (STJ, HC 167.521/SP, T6, DJe 11/10/2012). Esta previsão legal é anterior à própria Constituição de 1988, o que dizer em relação à EC n. 45/04.

Entretanto, redação errônea também foi empregada nos arts. 396-A, § 2.º, e 408 do CPP (alterados pela Lei n. 11.689/2008), além dos arts. 186 e parágrafos do ECA (que versa o procedimento de apuração de Ato Infracional) e 55, § 3.º, da Lei n. 11.343/06 (Lei Antidrogas), demonstrando desconhecimento do Legislador Ordinário quanto às atribuições e estruturação da Defensoria Pública.

Acerca da nomeação de Advogado Dativo na ausência ou insuficiência da Defensoria Pública, decidiu o STJ (no AgRg no HC 141.659/ES, T5, DJe 12/09/2012) que:

“AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. (…) ADVOGADO DATIVO. PEDIDO DE HONORÁRIOS. RESOLUÇÃO 558-CNJ. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO CONHECIDO. (…)

3. No âmbito da Justiça Federal a assistência judiciária aos beneficiários da gratuidade de justiça será realizada pela Defensoria Pública da União.

4. A atuação dos advogados voluntários e dativos, necessariamente nessa ordem, só se legitima para os casos de inexistência ou deficiência da Defensoria Pública da União, lembrando-se, ainda, que os advogados voluntários não farão jus a qualquer remuneração.”

Desta feita, o Magistrado nomeará Defensor (Advogado) Dativo, e não Defensor Público, pressupondo-se inexistência de Advogado Particular Constituído e de Defensoria Pública ou Núcleo Regional instalados na Comarca ou Seção Judiciária, sob pena de ofensa à autonomia da Instituição Defensoria e à garantia fundamental da Assistência Jurídica Integral e Gratuita (arts. 5.º, inc. LXXIV, e 134 da CRFB e art. 4.º, § 5.°, da LONDP) prestada pelo Defensor Natural, enquanto direito do Assistido (arts. 4.º, § 10, e 4.º-A, inc. IV, da LONDP), asseverando a LONDP que “são direitos dos assistidos da Defensoria Pública, além daqueles previstos na legislação estadual ou em atos normativos internos: IV – o patrocínio de seus direitos e interesses pelo defensor natural” (art. 4.º-A).

Previsão infralegal adequada à interpretação constitucional foi dada na Resolução n. 113/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), art. 1.°, inc. VI, in fine:

“Art. 1º A sentença penal condenatória será executada nos termos da Lei 7.210, de 11 de julho de 1984, da lei de organização judiciária local e da presente Resolução, devendo compor o processo de execução, além da guia, no que couber, as seguintes peças e informações:

VI – instrumentos de mandato, substabelecimentos, despachos de nomeação de defensores dativos ou de intimação da Defensoria Pública.”

No mesmo viés, preceitua o artigo 34, inciso XII, da Lei n. 8.906/94 (EAOAB) ser infração disciplinar a recusa do Advogado (Dativo) nomeado pelo Poder Judiciário para atuar no patrocínio de causa na qual não exista Defensor Público presentando a Defensoria e representando o Assistido:

“Art. 34. Constitui infração disciplinar:

XII – recusar-se a prestar, sem justo motivo, assistência jurídica, quando nomeado em virtude de impossibilidade da Defensoria Pública;”

Segundo, a Defensoria Pública do Estado não tem “status” de Secretaria de Estado, não faz parte da estrutura orgânico-administrativa do Poder Executivo e o Defensor Público-Geral não é Secretário de Estado. Trata-se de Função Essencial à Justiça com Autonomia Institucional, livre de interferências políticas e governamentais. Nas ADIs n. 3965/MG e 4056/MA, o Supremo assegurou que o § 2.º do art. 134 da Constituição é norma de eficácia plena e aplicabilidade imediata, não integrando a Defensoria a estrutura e a organização administrativa do Órgão Executivo, descabida relação de subordinação a qualquer Secretaria de Estado.

Neste viés a DPU não pode figurar como órgão do Ministério da Justiça, este enquanto órgão do Poder Executivo Federal. A DPDF, igualmente, não ingressa nesta divisão administrativa do Executivo Distrital, nos termos do art. 2.° da EC n. 69/2012, já que “sem prejuízo dos preceitos estabelecidos na Lei Orgânica do Distrito Federal, aplicam-se à Defensoria Pública do Distrito Federal os mesmos princípios e regras que, nos termos da Constituição Federal, regem as Defensorias Públicas dos Estados.”

Destarte assegurada a Autonomia Institucional à Defensoria Pública e a Independência Funcional aos seus Membros, aquela não se submete à estrutura orgânico-administrativa de qualquer outro Ente, Poder, Órgão ou Instituição, tampouco a forma de controle destes, como os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e a OAB, por já haver previsão institucional e funcional própria.

2.2. Membro da Defensoria Pública não é Advogado Público: desnecessidade de registro na OAB para aquisição de capacidade postulatória e não submissão dos Defensores à fiscalização ético-profissional desta Entidade

Advogado Público é o Agente Público incumbido da Defesa e da Postulação Técnico-Jurídica, do Patrocínio e da Representação Judicial e Extrajudicial, da Consultoria e Assessoramento Jurídicos dos Entes Públicos da Administração Direta e Indireta, máxime dos Entes Políticos, tais como União, Estados-membros, Municípios, Distrito Federal, à luz dos arts. 131 e 132 da Constituição do Brasil, não sendo mais tal atividade de atribuição do Ministério Público (art. 129, inc. IX, da CRFB).

Nesta senda consideram-se Advogados Públicos, por exemplo, os Procuradores Municipais e dos Estados, Procuradores Federais e da Fazenda Nacional, Advogados da União.

A atuação do Defensor Público, pelo contrário, mormente em se tratando da DPU, dá-se frequentemente contra os interesses dos Entes Públicos, defendendo o Interesse Público Primário, e não o Secundário, configurando aquele os interesses da coletividade, da sociedade em geral, e este, os interesses dos quadros da Administração Pública, os interesses do Ente Público, não do Governante ou da Pessoa Física ocupante do cargo público político.

Preceitua o artigo 4.°, § 2.°, da LONDP que “as funções institucionais da Defensoria Pública serão exercidas inclusive contra as Pessoas Jurídicas de Direito Público.”

Sabe-se que esta divisão de interesse público está paulatinamente ficando ultrapassada pela Doutrina mais moderna, já que o Estado (Poder Público) deve também perseguir o interesse público primário, da coletividade em geral, mas devo reconhecer a existência de conflitos de interesses em diversas situações.

Advocacia Pública significa advogar para os Entes Públicos da Administração Direta e Indireta, e não advogar para o Governo (interesse do Governante, alheio ao interesse público primário e secundário).

O Advogado Público persegue a proteção do patrimônio e da moralidade públicos, das políticas públicas legítimas, do interesse público, evitando equívocos na gestão pública, defendendo os interesses do Estado (Ente Público), seja no contencioso, ajuizando ações ressarcitórias em virtude de dano ao Erário por Improbidade Administrativa ou outro ilícito civil ou penal, ajuizando demandas fiscais na busca dos tributos líquidos e não pagos, defendendo o Estado judicial e extrajudicialmente nas demandas contra ele propostas, seja na atividade consultivo-preventiva dos Pareceres Jurídicos sobre legalidade, constitucionalidade e viabilidade jurídica.

A Advocacia Pública geral passou a ter Seção própria na Constituição da República a partir da EC n. 19/98 (Seção II, Capítulo IV, Título IV da CRFB), já que antes havia previsão expressa apenas da Advocacia-Geral da União (art. 131, CRFB), não versando as Procuradorias dos Estados e do Distrito Federal (art. 132, CRFB).

Ela compõe as famigeradas Funções Essenciais à Justiça, compostas pelo Ministério Público (arts. 127 a 130); Advocacia Pública (arts. 131 e 132); Advocacia (art. 133); e Defensoria Pública (arts. 134 e 135).

As Funções Essenciais à Justiça não se circunscrevem à atuação judicial, no âmbito do Órgão (Poder) Judiciário, abrangendo o próprio exercício da Cidadania, dos Direitos Humanos e a expressão do Estado de Direito e Democrático (ordem jurídica justa), destinando-se, também, a “assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias”, consoante previsão não vinculante do Preâmbulo da Constituição Republicana de 1988.

Essas Funções estão previstas no Capítulo IV dentro do Título IV, o qual trata da Organização dos Poderes. O Poder Constituinte Originário previu os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, bem como as Funções Essenciais à Justiça. Não integram estas o Poder Judiciário, pela própria separação dos Capítulos, já que poderiam ter vindo como Seção de um dos Capítulos dos Poderes Constituídos.

Também não podemos denominar de Quarto Poder, na nomenclatura usada pelo artigo 2.º da CRFB, já que na verdade o Poder Republicando é Uno, havendo uma Divisão Orgânica de Funções, ou seja, Órgãos Públicos e Políticos prestadores das funções primárias legislativa, executivo-administrativa e jurisdicional.

Nesse sentido preleciona Hugo Nigro Mazzilli (Regime Jurídico do Ministério Público, 2007, pág. 102) que:

“Em essência, é una a soberania, pois existe apenas divisão das funções de fazer a lei (o chamado Poder Legislativo) e de aplicar a lei (não contenciosamente, pela administração ou pelo chamado Poder Executivo, e contenciosamente, pelo chamado Poder Judiciário). Os ramos do Poder são antes um sistema de freios e contrapesos aos órgãos que exercem a soberania, que propriamente uma divisão fundada em critérios científicos.”

Nessa senda as Funções Essenciais à Justiça compõem o Sistema de Justiça. Posso dividi-lo em Poder Judiciário (órgão central das garantias fundamentais) e Funções Essenciais à Justiça, ou mesmo em Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Advocacia Pública e Advocacia (Privada).

O Advogado Público integra o Minissistema da Advocacia Pública, enquanto o Defensor Público integra o da Defensoria Pública, todos integrantes de um mesmo Sistema (de Justiça), mas com Minissistemas diferenciados e com particularidades diversas.

O Defensor Público, a partir da leitura do art. 1.º da LONDP com o art. 134 da CRFB, exerce “a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5.º da Constituição Federal”.

Este Órgão de Execução da Defensoria ampara os Necessitados, os Vulneráveis ou Hipossuficientes. Naturalmente por se tratar de cláusula aberta, com emprego de conceito jurídico indeterminado, seu sentido e alcance devem ser extraídos a partir de uma leitura unitária e densa do todo constitucional, e não apenas de uma abordagem literal do art. 2.°, parágrafo único, da Lei n. 1.060/50 (o qual trata da Gratuidade Judiciária, e não de Assistência Jurídica Gratuita), sob pena de restringi-la indevidamente, quando o Constituinte não o fez, limitando-se a interpretação constitucional.

A discussão sobre o termo “Necessitados”, Hipossuficientes Econômicos e demais Vulneráveis (Jurídicos, Sociais, Organizacionais) foi feita no Artigo indicado no ponto “2.1.”, em seus primeiros parágrafos, ao qual novamente remeto o Leitor.

Como consequência, o Defensor Público não advoga para o Ente Público, defendendo seus interesses, atuando na representação judicial e extrajudicial, consultoria e assessoramento jurídico. Sua atuação, ao revés, dá-se em polos judiciais e extrajudiciais opostos, por exemplo, DPU em face do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), CEF (Caixa Econômica Federal), IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), União, Ministérios, e demais entidades autárquicas, empresas públicas federais, na inteligência do art. 109, inc. I, da CRFB. No mesmo sentido, as DPEs em face das Secretarias de Estado, do Estado, Município, sociedades de economia mista estadual ou federal.

Na lavratura de Termo de Ajustamento de Conduta – TAC, à guisa de exemplo, assina o Defensor presentando a Defensoria Pública e representando a sociedade ou setores desta, enquanto o Advogado Público assinará representando o Ente Público do qual se toma o ajuste do comportamento às exigências legais (Lei n. 7.347/85 – LACP, art. 5.º, inc. II e § 6.º).

O Membro da Defensoria age dentro do seu campo legal e orgânico de Atribuições Institucionais, respeitada sua vocação constitucional (art. 134, “caput” e §§ 1.° e 2.° da CRFB). Não pode ele exercer a Advocacia (leia-se “Privada” do art. 133 da CRFB) fora das atribuições institucionais, conforme vedação constitucional expressa na parte final do § 1.º do art. 134 da Constituição, e legal, consoante arts. 46, I, 91, I, e 130, inc. I, da LC n. 80/94.

A expressão “vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais” traz divergências entre Estudiosos que discorrem sobre o interessante tema. Para alguns, infere-se da expressão que os Defensores não exercem Advocacia, apenas atuando na conformidade de suas atribuições institucionais previstas na Lei Orgânica da Carreira (LONDP), já que lhe é proibido exercer advocacia fora de sua atuação institucional.

Defensor Público, por exemplo, não pode ajuizar demanda cível em benefício próprio ou de algum parente, já que não detém capacidade postulatória para atuar fora das atribuições institucionais do cargo público, não podendo exercer Advocacia Privada Paralela à sua atuação pública funcional.

Nesse sentido decidiu o STF (ADI n. 3.043-4/MG, Pleno, DJ 27/10/06), que “o § 1.º do art. 134 da Constituição do Brasil repudia o desempenho, pelos membros da Defensoria Pública, de atividades próprias da advocacia privada. Improcede o argumento de que o exercício da advocacia pelos Defensores Públicos somente seria vedado após a fixação dos subsídios aplicáveis às carreiras típicas de Estado.”

Sustento a linha interpretativa de que o Defensor Público exerce Advocacia. Entrementes esta Advocacia não é a Pública (Seção II) tampouco a Privada (Seção III), já que lhe é vedado exercer Advocacia Privada Paralela (como é permitido para alguns Advogados Públicos, Procuradores de Estado e de Município, sem dedicação exclusiva ao cargo público), mas sim uma própria, à qual denomino de “Advocacia Institucional”, dentre ela a “Advocacia de Partido” (para os casos de atuação coletiva na defesa dos Vulneráveis, não significando atuação político-partidária).

Esta segunda Advocacia (de Partido) foi mencionada por H. N. Mazzilli (2007, págs. 70-1) em relação aos Membros do Ministério Público, comparando sua atuação com a Magistratura e a Advocacia (Privada):

“No fundo, tirantes as garantias e predicamentos que, sob o aspecto do ofício desempenhado, aproximam o promotor da Magistratura, a função da qual o Ministério Público mais se aproxima, certamente, é a do advogado. Ambas as funções constituem munus público de igual nobreza. A natureza das funções, a forma dos trabalhos, a maneira de deduzir as pretensões em juízo – tudo isso lhes é similar. O Ministério Público é advocacia de partido – o partido dos interesses sociais e individuais indisponíveis.” (grifo nosso)

O Ministério Público exerce a proteção e a advocacia dos interesses sociais e individuais indisponíveis, além da defesa da ordem jurídica e do regime democrático, consoante previsto na parte final do art. 127, “caput”, da CRFB.

Na mesma senda está a Defensoria Pública quando da atuação coletiva, transindividual ou metaindividual, exercendo a proteção e a advocacia dos Hipossuficientes e Vulneráveis. Quando atuar na defesa e na proteção supraindividual de interesses dos Assistidos (Vulneráveis econômica, organizacional ou juridicamente, Grupos Sociais Vulneráveis, Consumidores, Idosos, Crianças e Adolescentes, Encarcerados provisória ou definitivamente nas masmorras presidiárias do Estado Brasileiro, Mulheres Vítimas de Violência Doméstica ou Familiar, Usuários de Serviço Público Regular, Adequado e Contínuo, dentre outros previstos exemplificativamente na Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública) estará exercendo a denominada “Advocacia de Partido”.

O verbete “Partido” não significa Partido Político ou qualquer outro sentido político-partidário, mas sim uma metáfora jurídica de “partido dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (Mazzilli, 2007, págs. 70-1), cujo sentido deve ser empregado, com adaptações, igualmente à Defensoria Pública, haja vista a afinidade de atribuições e a similitude das Instituições Essenciais à Justiça.

O fato de um Promotor ou Procurador de Justiça, e demais Membros dos Ministérios Públicos, exercerem a Advocacia de Partido dos interesses sociais e individuais indisponíveis, além da Advocacia Institucional no exercício das atribuições institucionais na defesa da ordem jurídica e do regime democrático, em atuação postulatória semelhante à do Advogado Particular ou Público, não o torna Advogado. Os Membros do MP “peticionam, participam de audiências, recorrem, sustentam oralmente suas teses e, enfim, exercem atividades privativas de advocacia” (Petição Inicial da ADI 4.636 do CFOAB no STF), mas nem por isso são Advogados e se sujeitam ao EAOAB.

Da mesma maneira, a atuação do Defensor Público na Advocacia dos Necessitados, amplamente considerados, seja Advocacia de Partido, seja Advocacia Institucional, não o torna Advogado Público pelo simples fato da semelhança de atuação e pela remuneração dos cofres públicos.

Admite-se a um leigo tachá-lo de Advogado Público, pela junção irrefletida e inadvertida dos termos “Advogado” e “Público”, ou seja, profissional que exerce uma Advocacia Institucional (própria de suas atribuições institucionais) e remunerado pelo Poder Público: “Advogado Público”. Falha que só se tolera a indivíduos sem formação jurídica acadêmica.

A Advocacia não é atividade exclusiva, sob o monopólio de Advogados. Assevero que todo Advogado exerce Advocacia, mas nem todo aquele que exerce Advocacia é Advogado.

Defensores Públicos Estaduais, Distritais, Territoriais e Federais, Promotores de Justiça, Procuradores da República, Promotores de Justiça Militares da União, Procuradores do Trabalho, p. ex., exercem Advocacia (Institucional e de Partido), mas não são Advogados.

Posso afirmar que todos aqueles integrantes do Sistema de Justiça, e que não estejam dentro do Poder Judiciário (Magistrados amplamente considerados), exercem Advocacia: Pública, Privada ou Institucional.

O Defensor Público não pode exercer a Advocacia Privada Paralela, atividade própria dos Advogados Particulares, Profissionais Liberais ou Empresários (na forma do art. 966, parágrafo único, in fine, do Código Civil), inscritos nos quadros da OAB e submetidos ao EAOAB (aos deveres profissionais e ao Tribunal de Ética).

Advocacia Institucional seria o exercício de atividade postulatória em juízo e extrajudicial circunscrita às atribuições institucionais e funcionais. Esta Advocacia não é aquela prevista na Lei n. 8.906/94, pois ela abarca apenas a Advocacia Privada (arts. 133 da CRFB e 2.°, “caput” e § 3.º do EAOAB) e Pública (arts. 131 e 132 da CRFB e 3.°, § 1.º do EAOAB), regulamentando a atividade dos Advogados Privados, Advogados Sócios e Empregados, Escritórios e Sociedades de Advogados, bem como subsidiariamente a atividade dos Advogados Públicos, sem prejuízo do regime próprio a que eles estejam sujeitos.

Por omissão constitucional, e não por conceituação de Defensor Público como Advogado Público, os Defensores não podem concorrer às vagas do Quinto Constitucional (arts. 94, 104, II, 107, I, 111-A, I, 119, II, 120, § 1.º, III, 123, parágrafo único, I, da CRFB), apenas previstas para Advogados Públicos e Privados (inscritos na OAB) e Membros do Ministério Público, não havendo previsão para Membros da Defensoria Pública, o que deveria haver, a fim de dar maior pluralidade de pensamentos, mundividências e diversidade de julgadores em órgãos colegiados, mormente em se tratando do Defensor Público, o qual lida com situações de vida e de desrespeito social e estatal inimagináveis.

O artigo 2.º (“caput” e § 3.º) do EAOAB reitera a redação do art. 133 da CRFB (“o advogado é indispensável à administração da justiça”), indicando clareza ao demonstrar que sua intenção é regular a atuação dos Advogados Privados e Públicos, não podendo invadir a autonomia da Defensoria Pública, regulada nos arts. 134 e 135 da CRFB, sob pena de interpretá-la a partir da legislação infraconstitucional, e não como determina a hermenêutica jurídica básica, buscando-se o sentido e o alcance das leis a partir de uma leitura inicial da Constituição da República.

O EAOAB não pode regular a atuação funcional de Membros de Instituição diversa, autônoma e com independência técnica, cuja regulamentação institucional, ética, de direitos, deveres e obrigações, prerrogativas e garantias, foi exaustivamente prevista cada qual com o cargo respectivo. Submeter membros de carreira pública, com Instituição por completo regulamentada, a um Estatuto com finalidade diversa, significa ingressar na divisão institucional da carreira e violar sua autonomia, impondo-se deveres diversos, retirando-se prerrogativas e garantias, e submetendo os membros a processo ético-disciplinar outro que não aquele regulado para sua carreira (LONDP, arts. 49 a 51; 94-96; 133-135 e legislação estadual respectiva).

O controle ético e funcional dos Defensores é feito por sua própria Corregedoria por intermédio da instauração de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) ou Judicial, com direito ao devido processo legal, com ou sem prévia instauração de Sindicância (investigação administrativa).

Futuramente poderá ser criado o Conselho Nacional da Defensoria Pública (CNDP), em discussão no CONDEGE – Conselho Nacional dos Defensores Públicos-Gerais, à semelhança do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), com atuação concorrente (STF, MS 28.003/DF, Pleno, DJe 31/05/12) com as Corregedorias locais na apuração de desvio ético-funcional, abuso de poder e de autoridade, erros ou omissões do Agente Público Defensorial.

Membro da Defensoria Pública não se submete a processo ético-profissional no Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da OAB (arts. 70-4 do EAOAB), instituição própria, cuja finalidade é a mesma das Corregedorias das Instituições Autônomas, não havendo diferença entre “fiscalização ético-disciplinar” e “fiscalização funcional”, ambas resultantes em punição administrativo-disciplinar, sob pena de dupla aplicação de penalidade semelhante, em claro “bis in idem”, trazendo as mesmas características e consequências disciplinares, sendo incorreto afirmar tratar-se de objetivos e resultados diversos.

Preceituam os artigos 35 do EAOAB e 50, § 1.º, da LONDP (quanto à DPU), respectivamente, que:

Art. 35. As sanções disciplinares consistem em: I – censura; II – suspensão; III – exclusão; IV – multa.

Art. 50. Constituem infrações disciplinares, além de outras definidas em lei complementar, a violação dos deveres funcionais e vedações contidas nesta Lei Complementar, bem como a prática de crime contra a Administração Pública ou ato de improbidade administrativa. § 1º Os membros da Defensoria Pública da União são passíveis das seguintes sanções: I – advertência; II – suspensão por até noventa dias; III – remoção compulsória; IV – demissão; V – cassação da aposentadoria.”

A submissão disciplinar dos Defensores Públicos, pois, é apenas ao regime disciplinar-funcional das Defensorias Públicas, e não ao regime ético-disciplinar da OAB (Estatuto da OAB, Regulamento Geral e Código de Ética e Disciplina), como intenta o CFOAB na ADI 4.636, além do controle externo da sociedade civil, sujeitando-se aos Princípios Constitucionais da Administração Pública (art. 37, “caput”, da CRFB), por se tratar a Defensoria de Entidade Pública de Estado, carreira jurídica estatal, e não órgão de governo.

Sujeitam-se, ainda, nas DPEs ao controle da Ouvidoria-Geral (arts. 98, inc. IV, e 105-C, I, da LONDP), competindo a esta “receber e encaminhar ao Corregedor-Geral representação contra membros e servidores da Defensoria Pública do Estado, assegurada a defesa preliminar”.

A defesa das prerrogativas dos Membros da Defensoria é feita pela Associação dos Defensores Públicos, de âmbito estadual ou nacional, como a ANADEP (Associação Nacional dos Defensores Públicos dos Estados), a ANADEF (Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais) e respectivas Associações Estaduais.

A OAB, como entidade defensora da Constituição, da boa aplicação das leis e da justiça social (EAOAB, art. 44, inc. I), é sempre bem-vinda no apoio às demais Instituições com atribuições semelhantes, reforçando a atuação dos profissionais. No entanto, esta tarefa não indica estarem autoridades de outras Instituições sujeitas à OAB hierárquica e disciplinarmente.

Ingressando no ponto central da desnecessidade de os Defensores Públicos se inscreverem nos quadros da OAB para adquirirem capacidade postulatória e exercer sua atividade institucional plena, esclareço de antemão que há setores da OAB e da Justiça Federal que entendem pela necessidade da inscrição, apontando ser os Defensores Públicos, antes de qualquer coisa, Advogados (Públicos), exercentes de Advocacia Pública e sujeitos ao EAOAB, por força dos seus artigos 1.° e 3.°, “caput” e § 1.º, sob pena de nulidade dos atos por ele praticados (art. 4.°).

Por esse motivo o Conselho Federal da OAB (CFOAB) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) distribuída no STF no dia 1.° de Agosto de 2011 (01/08/11) e autuada sob o n. 4.636 requerendo seja declarada a inconstitucionalidade do § 6.º do art. 4.º da LC n. 80/94, com redação dada pela LC n. 132/09, além de impugnar a atuação institucional da Defensoria no amparo das Pessoas Jurídicas (art. 4.°, inc. V, da LONDP), asseverando em trecho da Exordial que:

“A rigor, tais dispositivos são inconstitucionais por evidente afronta ao art. 5º, inciso LXXIV, e ao art. 134, eis que admitem o extrapolamento do campo de atuação da Defensoria Pública para além da premissa estabelecida na Constituição Federal, qual seja, “necessitado” (cidadão carente, desprovido de recursos e desassistido do direito à orientação jurídica e à assistência judiciária), bem como ofensa ao art. 133, da Carta Maior, porquanto os Defensores Públicos são, na essência, advogados e, como tais, hão de ficar sob a disciplina da Advocacia estabelecida em seu Estatuto, a Lei nº 8.906/94, editada em cumprimento ao art. 5º, XIII, da Carta Política.”

A caracterização do Membro da Defensoria Pública como Advogado ficou afastada nos comentários acima, não restando qualquer dúvida jurídica, a não ser o interesse corporativo na manutenção de autoridades públicas integrantes de Instituição Autônoma diversa, com evidências de escopos obscuros sobre os quais se evita adjetivações.

Apenas reitero que todo Advogado exerce Advocacia, mas nem todo aquele que exerce alguma forma de Advocacia é Advogado, afastando-se por completo o desejo do CFOAB de sujeitar os Defensores Públicos ao EAOAB, utilizando-se de interpretação reversa, qual seja, interpretar o texto constitucional a partir do EAOAB, desconsiderando que a regulamentação feita pela LC n. 132/09 além de atender à constitucionalidade formal e material, é superveniente e especial à Lei n. 8.906/94, demonstrando o interesse do Legislador Complementar em salvaguardar os Defensores de qualquer ingerência da presidência da OAB e de demais órgãos com atribuição ético-disciplinar ou financeira.

De mais a mais, a alegada inconstitucionalidade é do § 6.º do art. 4.º da LONDP frente ao art. 133 da CRFB, completamente inaplicável à Defensoria Pública, além do dispositivo constitucional não indicar monopólio de capacidade postulatória dos Advogados.

Membro da Defensoria Pública não é “indispensável à administração da justiça” (art. 133, CRFB), mas sim “essencial à função jurisdicional do Estado” (art. 134, CRFB), à semelhança dos Membros do Ministério Público (art. 127, CRFB), diferentemente da conclusão de José Afonso da Silva no Parecer mencionado na ADI 4.636.

Malgrado a Seção III do Capítulo IV do Título IV da Constituição mencione “Da Advocacia e da Defensoria Pública”, denota-se facilmente que o art. 133 versa a Advocacia dos Advogados Privados, já que os Advogados Públicos estão indicados nos arts. 131 e 132, e o art. 134 versa a Defensoria Pública, não havendo nexo de interdependência entre os dispositivos constitucionais pela simples técnica legislativa de tratá-los numa mesma Seção (III), não pressupondo a atuação de Defensoria a prévia habilitação nos termos do art. 133 da CRFB, sob pena de afirmar-se que a Advocacia Pública, por encontrar-se em Seção diversa (II), estaria desvinculada da ideia de Advocacia própria do EAOAB, o que neste caso não é correto, e que o Ministério Público (arts. 127 a 130) teria obrigação de habilitação prévia nos termos do art. 133 do CRFB, por exercer atividade de Advocacia (Institucional) e encontrar-se no mesmo Capítulo IV do Título IV da Constituição (Funções Essenciais à Justiça).

Reconheço que existe certa ligação objetiva entre Advocacia e Defensoria Pública. A despeito da ligação objetiva, não existe nexo de interdependência entre elas, não se podendo asseverar que para o exercício da Defensoria há necessidade de prévia habilitação na Advocacia do art. 133 da Constituição.

Os Membros das Funções Essenciais à Justiça “Ministério Público” e “Defensoria Pública” detêm capacidade postulatória automaticamente com a nomeação e posse no cargo público, na medida em que recebem poderes, deveres, garantias, prerrogativas e atribuições institucionais da Constituição da República e de sua respectiva Lei Orgânica, além dos atos infralegais da Administração Superior da Instituição respaldados na legalidade estrita. Por esse motivo afirmo tratar-se de Advocacia Institucional, cuja capacidade postulatória e os poderes decorrem da Lei da Carreira, sem qualquer violação constitucional ou extrapolamento legislativo.

A exigência de inscrição na OAB nos concursos públicos de provas e títulos (art. 134, § 1.º, CRFB) para o cargo de Defensor Público é mero requisito de comprovação de mérito e capacidade técnica (aprovação no Exame de Ordem) para investidura no cargo público político, e não condicionamento desta, devendo afastar-se dos quadros da OAB a partir de sua nomeação e posse, já que exercerá atividade incompatível com a advocacia (art. 134, § 1.º, in fine, da CRFB), embora não previsto expressamente no EAOAB, inclusive entregando sua Carteira e Identidade Profissional, identificando-se apenas com sua Identidade ou Carteira Funcional (art. 4.°, § 9.º, LONDP, alterado pela LC n. 132/09), já que “o exercício do cargo de Defensor Público é comprovado mediante apresentação de carteira funcional expedida pela respectiva Defensoria Pública, conforme modelo previsto nesta Lei Complementar, a qual valerá como documento de identidade e terá fé pública em todo o território nacional”.

Da mesma maneira que se exige para os concursos da Magistratura e do Ministério Público a comprovação de, no mínimo, 3 (três) anos de atividade jurídica (arts. 93, I, in fine, e 129, § 3.º, in fine, ambos da CRFB), a exigência de inscrição na Ordem é demonstração mínima e prévia de habilitação técnico-profissional ao cargo de Defensor.

Essa comprovação de atividade jurídica de, no mínimo, 3 (três) anos também deveria ser exigida constitucionalmente dos candidatos ao cargo de Defensor, tendo em vista a responsabilidade funcional, social, ética, moral e a necessidade de vasto conhecimento para o exercício deste cargo de transformação social, lidando com questões de desestrutura estatal, podendo mudar a realidade social, mitigar a pobreza e a marginalização (impossibilidade prática da erradicação), além de reduzir as desigualdades sociais e regionais, como objetivos fundamentais da República (art. 3.º, inc. III, da CRFB), promover a defesa dos direitos humanos e da dignidade humana, e o amparo geral dos “grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado” (art. 4.°, inc. XI, da LONDP).

Entretanto não fazendo a Constituição essa exigência de atividade jurídica tampouco de inscrição na OAB, condicionando a capacidade postulatória dos Defensores, a Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública o fez em relação aos Defensores Públicos Federais e Distritais e Territoriais (arts. 26 e 71), deixando a faculdade dos Estados fazê-lo na Lei Orgânica Estadual (arts. 112 e 112-A da LONDP), não se tratando, naturalmente, de norma constitucional de observância obrigatória, sendo de observância facultativa pelo Legislador Estadual, já que sua exigência, como sobredito, é mero requisito de demonstração de mérito e de capacitação profissional, e não condicionamento para aquisição de capacidade postulatória (art. 4.°, § 6.º, da LONDP).

Há exigência, pois, de registro na OAB no momento da inscrição no concurso público, além de demonstração de, no mínimo, 2 (dois) anos de atividade forense para os cargos de Defensor Público Federal, Distrital e Territorial. Quanto aos Defensores Públicos dos Estados, caberá à Lei Estadual regulamentar ou não essa exigência, sendo faculdade dos Estados, não se tratando de norma de observância obrigatória, como anteriormente mencionado, não podendo o Edital do Concurso prever tal requisito sem prévia exigência legal estadual, já que a LC n. 80/94 apenas prescreveu “normas gerais” às Defensorias dos Estados, na inteligência do art. 134, § 1.º da CRFB.

Na mesma linha de pensamento discorre o Administrativista e Advogado Paulista Celso Antônio Bandeira de Mello no Parecer (datado de 08/07/2011) junto à Petição da ANADEP como “amicus curiae” nos autos da ADI 4.636. Preceitua o B. de Mello que:

Não são raras no Direito as hipóteses em que é exigido um determinado requisito para a constituição de uma certa situação, mas não o é para a persistência dela. (…)

Em suma: não há confundir a previsão de um requisito para a constituição de uma certa situação jurídica com a necessidade de sua persistência para que permaneça a situação em causa.”

A previsão infraconstitucional que indicaria possível obrigação dos Defensores Públicos de registro na OAB encontra-se no art. 3.°, § 1.º, do EAOAB. No entanto este dispositivo padece de vícios constitucionais e legais insanáveis, não podendo ser aplicado pela máxima do Princípio da Presunção (relativa) de Constitucionalidade. Este dispositivo assevera que os integrantes da Defensoria Pública exercem atividade de advocacia, sujeitando-se ao regime daquela lei, além do regime próprio a que se subordinam.

A atividade de Defensoria Pública só pode ser regulada por meio de Lei Complementar (arts. 59, II, e 69, da CRFB) de competência concorrente da União, dos Estados e do DF (art. 24, inc. XIII, da CRFB). A previsão constitucional atualmente se encontra no § 1.º do art. 134, por força de redação dada pela EC n. 45/04, e sua regulamentação infraconstitucional é feita pela LC n. 80/94 (LONDP), alterada substancialmente pela LC n. 132/09, além das Leis Orgânicas nos Estados e no Distrito Federal (a partir da EC n. 69/2012).

Todavia antes mesmo da Emenda Constitucional, esta exigência formal era apontada no antigo parágrafo único do indigitado artigo. É de se reconhecer, portanto, a clara inconstitucionalidade formal do § 1.º do art. 3.° do EAOAB, na expressão “da Defensoria Pública”, por desobediência de comando constitucional, não sendo recebido o Estatuto da OAB pela EC n. 45 no “status” de Lei Complementar.

No mesmo sentido é o entendimento do Defensor Público Federal Frederico R. V. de Lima no livro “Defensoria Pública” (págs. 439 a 445) e do Defensor Público Federal Felipe C. Menezes no Artigo-Capítulo “A reforma da Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública: disposições gerais e específicas relativas à organização da Defensoria Pública da União” no livro “Uma nova Defensoria Pública pede passagem: reflexões sobre a Lei Complementar 132/09” (pág. 158).

Ademais, a Defensoria Pública é Instituição livre de interferências políticas e de outros Poderes, Entidades ou Órgãos, não podendo seus Membros se sujeitar a normas legislativas diversas de sua Lei Orgânica, sob pena de clara violação à Autonomia Institucional da Defensoria (no caso Administrativa) e indicação de inconstitucionalidade material ou não recepção (se se entender que a Autonomia Institucional só surgiu com a EC n. 45/04) do dispositivo que assim o fizer.

Atento ao conflito aparente entre normas infraconstitucionais e ao Princípio da Presunção de Constitucionalidade das Leis, é forçoso reconhecer a revogação tácita parcial (derrogação) do dispositivo do Estatuto acima pelo § 6.º do art. 4.° da LONDP, este claramente constitucional, em adequação ao art. 134, demonstrando a intenção do Legislador em retirar qualquer vinculação dos Membros da Defensoria Pública à OAB, sendo desnecessário prévio registro nos seus quadros para aquisição de capacidade postulatória e de atuação institucional plena, sem mencionar a vedação ao exercício da advocacia fora das atribuições institucionais.

Assim, o § 1.º do art. 3.° do EAOAB foi derrogado tacitamente pelo § 6.º do art. 4.° da LONDP no ponto “da Defensoria Pública”, na inteligência do § 1.º do art. 2.° da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), haja vista a incompatibilidade entre os dispositivos, sendo o § 6.º do art. 4.° da LC n. 80/94, alterado pela LC n. 132/09, posterior, especial e plenamente constitucional formal e materialmente.

Resta apontar a derrogação, a inconstitucionalidade formal e não recepção, igualmente, do artigo 29 do EAOAB no ponto “Defensores Gerais”, pois regulou, sem competência para tanto, atividade de Defensoria Pública por meio de Lei Ordinária, sobre violar a autonomia da Instituição.

A ANADEP e a ANADEF (Associação Nacional dos Defensores Públicos Estaduais e Federais) ingressaram no feito da ADI 4.636 na condição de “amicus curiae”, sendo admitidas pelo Relator (Min. Gilmar Mendes) no Despacho publicado em 06/11/2012.

A ANADEP juntou em sua petição o indigitado Parecer de C. A. Bandeira de Mello, o qual foi provocado pela Associação Paulista dos Defensores Públicos com o fito de se manifestar acerca da necessidade ou não de os Defensores permanecerem inscritos na OAB, após a posse no cargo, para terem capacidade postulatória. Asseverou em conclusão que:

Para que o Defensor Público disponha de capacidade postulatória não é necessário que, havendo estado inscrito na OAB, por ocasião do concurso para o cargo ou da posse nele, permaneça inscrito no álbum profissional, pois sua capacidade postulatória decorre exclusivamente de sua nomeação e posse no correspondente cargo público.” (g. nosso)

A AGU – Advocacia-Geral da União (Parecer de 06/09/2011) manifestou-se pela improcedência da pretensão do CFOAB, asseverando que “o artigo 133 da Constituição Federal não exige que a advocacia seja atividade privativa daqueles que possuam inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil – OAB”. Tal exigência fora feita pelo § 1.º do art. 3.º do EAOAB, o qual fora derrogado pela LC n. 132/09 que conferiu nova redação ao § 6.º do art. 4.° da LC n. 80/94, haja vista a sucessão temporal de normas infraconstitucionais.

A Procuradoria-Geral da República – PGR (Parecer de 11/05/2012) criticou a ideia de que somente os Advogados regularmente inscritos na OAB têm legitimidade para o exercício do jus postulandi, figurando como compreensão há muito superada. Asseverou, pois, que (ADI 4.636):

Ou seja, não há, no art. 133, monopólio do advogado inscrito na OAB para a postulação em juízo. Em consequência, não é esse dispositivo que autoriza a conclusão de que o Defensor Público deve estar inscrito nos quadros da OAB, inclusive para obter capacidade postulatória.

A colocação topográfica da Advocacia e da Defensoria Pública na mesma seção tampouco tem o condão de levar à consequência pretendida pelo requerente (CFOAB). Muito pelo contrário, o que o art. 134 revela é o propósito de ter na Defensoria Pública instituição singular, independente e autônoma”. (grifo nosso)

Quanto ao pretendido poder disciplinar da OAB sobre os Membros da Defensoria Pública, preceituou a PGR que:

“Se a estrutura em carreira da Defensoria Pública “opera como garantia da independência técnica da instituição” (referindo-se à ADI n. 3.700, divulg. em 05/03/2009), não faz sentido algum vincular seus membros ao poder disciplinar da OAB. (…)

Portanto, em conclusão quanto a esse ponto, não há disposição constitucional que autorize entendimento de que os Defensores Públicos devam estar inscritos na OAB para atuarem como tal. Muito pelo contrário, o tratamento dispensado a essa instituição livra-a de ingerências externas, especialmente no que diz respeito ao exercício das funções que lhe são típicas.” (grifo nosso)

Além de a capacidade postulatória dos Membros da Defensoria Pública decorrer da simples nomeação e posse no cargo público, independentemente de inscrição nos quadros da OAB (vedada pela incompatibilidade), é desnecessária a juntada nos autos de feito judicial ou administrativo de instrumento de mandato (Procuração), tendo em vista que o mandato do Defensor é entregue pelo Estado (Poder Público) em um vínculo estatutário, e não de uma relação contratual com o Assistido da Defensoria. Para representar o Assistido em processo administrativo ou judicial não se exige mandato por procuração, tratando-se de prerrogativa dos Membros da Defensoria Pública, na inteligência dos arts. 44, XI, 89, XI, 128, XI, da LONDP, salvante “os casos para os quais a lei exija poderes especiais”.

A relação contratual existe entre Advogado Privado e Cliente na contratação de prestação de serviços advocatícios. Entre Defensor e Assistido há vínculo público, já que aquele mantém vinculação estatutária com a Administração Pública, dela recebendo poderes públicos. Por isso expliquei acima o conceito de “Assistido”, diferenciando-o da figura do “Cliente”, cujo caráter lucrativo-econômico é proeminente.

Nesta senda, preceitua o Defensor Público Frederico Lima (pág. 352):

“De fato, a natureza das funções exercidas pela Defensoria Pública não se compatibiliza com a outorga de mandato. O vínculo entabulado entre o assistido e a Defensoria Pública possui nuances que o distanciam do figurino contratual privado. Não se pactuam cláusulas, disposições e ajustes para definir o conteúdo do serviço público. Há subordinação de ambos os sujeitos (Estado e particular) ao regramento imposto pela Constituição Federal e pela legislação infraconstitucional. Por essa razão, os requisitos exigidos para o acordo privatístico não se fazem presentes no liame estabelecido com a Defensoria Pública.” (grifo nosso)

A atividade funcional do Defensor Público é muito superior à mera atuação judicial, à prestação de assistência judiciária individual, abarcando assistência jurídica integral e gratuita, que vai de assistência judiciária individual à assistência jurídica coletiva e supraindividual, educação e conscientização em direitos, elaboração de estudos para aprimoramento social, trabalho efetivo para redução das desigualdades sociais e regionais e erradicação da pobreza e da marginalização e outras situações diversas.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

De arremate, concluo que o Membro da Defensoria Pública (Defensor Público) não é Advogado Público, não exercendo Advocacia Pública, mas sim “Advocacia Institucional” no entendimento deste Autor, não precisando de inscrição e registro nos quadros da OAB, após nomeação e posse no cargo público respectivo, para aquisição de capacidade postulatória e exercício pleno da atuação institucional.

Por consequência, não se submetem os Defensores à fiscalização ético-disciplinar dos órgãos internos da OAB, sujeitando-se à Corregedoria da Defensoria, Ouvidoria-Geral das DPEs, ao controle externo da sociedade civil e aos princípios gerais da Administração Pública.

 

Referências
ARRUDA, Ígor Araújo de. Defensoria Pública na concretização de políticas públicas. Um controle da aparente discricionariedade administrativa governamental. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3277, 21 jun. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/22066>. Acesso em: 9 dez. 2012.
AULER, Marcelo. Biscaia. Rio de Janeiro: Cassará Editora, 2012.
LIMA, Frederico Rodrigues Viana de. Defensoria Pública. Bahia: JusPodivm, 2010.
MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime jurídico do Ministério Público: análise do Ministério Público na Constituição, na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, na Lei Orgânica do Ministério Público da União e na Lei Orgânica do Ministério Público Paulista. 6 ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.
SOUSA, José Augusto Garcia de. Uma nova Defensoria Pública pede passagem: reflexões sobre a Lei Complementar 132/09. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

Informações Sobre o Autor

Ígor Araújo de Arruda

Defensor Público na Defensoria Pública do Estado de Pernambuco DPE/PE desde outubro de 2015. Foi Defensor Público no Estado do Maranhão DPE/MA entre 23/04/2012 e 30/09/2015. Pós-graduado em Direito Público pela Universidade Anhanguera-Uniderp/LFG. Aprovado Defensor Público no 1. concurso público da Defensoria Pública do Estado da Paraíba DPE/PB 2014/5. Professor-orientador de curso preparatório para concursos públicos das Carreiras Jurídicas. Criador-moderador da página social “Defensoria Pública Modo de fazer”


Equipe Âmbito Jurídico

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