Resumo: O presente artigo tem como objetivo analisar um dos aspectos controvertidos que envolvem a responsabilidade tributária por transferência, especialmente no que diz respeito ao prazo prescricional de que dispõe a Fazenda Pública para efetivar o redirecionamento da ação de execução fiscal aos responsáveis devidamente estabelecidos na legislação pátria. Inicialmente, serão analisados os dispositivos legais que determinam a responsabilidade pelo crédito tributário a terceiras pessoas, que não o sujeito passivo da obrigação tributária, bem como o entendimento doutrinário majoritário, que classifica a responsabilidade por substituição ou por transferência e esta última em responsabilidade por sucessão, por solidariedade e de terceiros. Em seguida, serão estudados alguns aspectos gerais acerca do prazo prescrional em matéria tributária, dando-se ênfase à necessidade de configuração de inércia do Fisco para sua decretação. Por fim, será analisado o termo a quo do prazo prescricional para que a Fazenda realize o redirecionamento do feito executivo aos responsáveis pelo crédito tributário, levando-se em consideração os ditames do artigo 174, caput, e parágrafo único do Código Tributário Nacional.
Palavras-chave: Responsabilidade tributária por transferência. Execução fiscal. Redirecionamento. Prescrição.
Abstract: This article has the objective to examine one of the controversial aspects that involve the transfer tax liability, especially with regard to the statute of limitations available to the Treasury to effect redirection of Tax Enforcement Lawsuit to the responsible tax legislation duly established. Initially, will be analyze the legal responsibility for determining the tax credit to third parties other than the taxpayer's tax liability, as well as the majority doctrinal understanding, which ranks the responsibility for replacement or transfer and the last one in succession, for solidarity and third parties. Then, we will study some general aspects about the deadline in tax matters, giving emphasis to the need for configuration of inertia of the Treasury. Finally, will be analyzed the initial term of the deadline to redirect the Tax Enforcement Lawsuit, taking into consideration the dictates of the article 174 of Brazilian National Tax Code.
Keywords: Tax liability for transfer. Fiscal performance. Redirection. Prescription.
Sumário: Introdução 1. Aspectos gerais da responsabilidade tributária. 2. Disciplina legal da prescrição dos créditos tributários. 3. Prazo prescricional para redirecionamento da execução fiscal aos responsáveis tributários por transferência. Considerações finais. Referências bibliográficas.
INTRODUÇÃO
O presente estudo destina-se à análise do termo inicial do prazo prescricional que a Fazenda Pública dispõe para efetivar o redirecionamento da ação de execução fiscal em face dos responsáveis legais pelo crédito tributário exigido judicialmente, nas hipóteses em que a responsabilidade tributária é atribuída a terceira pessoa por transferência.
Trata-se de situação recorrente nas ações de execução de dívida fiscal, principalmente quando o redirecionamento se funda na responsabilização dos administradores em razão de condutas praticadas com excesso de poderes ou em descompasso com a lei, o contrato social ou o estatuto, conforme os ditames do artigo 135, inciso III do Código Tributário Nacional, bem como nos casos de responsabilidade por transferência em decorrência da sucesão empresarial, embasada nos artigos 132 e 133 do CTN.
A despeito de o tema em análise ter suscitado diversos estudos e manifestações da doutrina e jurisprudência pátrias, ainda não houve consenso acerca do termo inicial de contagem do prazo quinquenal para que a Fazenda Pública leve a efeito o redirecionamento do ação executiva contra os responsáveis pelo crédito tributário.
Inicialmente, portanto, serão traçadas linhas gerais acerca das hipóteses legais de responsabilização do crédito tributário, enfatizando-se as situações em que tal responsabilidade decorrer de transferência, circunstância onde o polo passivo é inicialmente ocupado pelo contribuinte, porém, com o advento de determinado ato ou fato jurídico definido em lei, este é substituído pelo responsável devidamente indicado na legislação de regência.
Em seguida serão apresentados os conceitos doutrinários e disposições legais que disciplinam o fenonômeno da prescrição em âmbito tributário, registrando-se os efeitos da interrupção da contagem do lapso prescricional pelo despacho do juiz que ordenar a citação do executado; o surgimento da prescrição intercorrente em razão da inércia da parte credora; e o reinício da contagem do prazo quinquenal de prescrição.
Serão, ainda, expostos os argumentos que embasam a corrente defendida no presente estudo, fundada no princípio da actio nata como regente do instituto da prescrição, o qual tem plena aplicabilidade em matéria tributária.
Neste sentido, buscar-se-á demonstrar que estabelecer o termo a quo do prazo para redirecionamento do feito executivo em momento anterior à efetiva possibilidade da Fazenda Pública exercer a cobrança forçada do crédito tributário contra os responsáveis legalmente definidos na legislação tributária afronta de maneira cristalina o princípio da actio nata.
Por fim, fazer-se-á uma análise crítica à jurisprudência majoritária do Superior Tribunal de Justiça, a qual defende que o prazo quinquenal para o Fisco requerer o redirecionamento do feito executivo aos sócios com fundamento no artigo 135, inciso III do CTN, tem seu marco inicial com o despacho do juiz que determinar a citação da pessoa jurídica.
Tendo em vista que se trata de uma pesquisa inicial acerca do tema, as questões enfocadas não serão exaustivamente abordadas, porém buscar-se-á apresentar argumentos que possibilitem o desenvolvimento dos questionamentos propostos.
1. Aspectos gerais da responsabilidade tributária.
O Código Tributário Nacional em seu artigo 121 dispõe que o sujeito passivo da obrigação tributária pode ser um contribuinte, quando tiver relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador, ou um responsável, que, apesar de não revestir a condição de contribuinte, responde pela obrigação em razão de expressa disposição de lei.
A terminologia adotada pelo artigo 121 do CTN pode fazer surgir a falsa ideia de que ao legislador é lícito apontar qualquer pessoa como responsável pelo pagamento de determinado tributo, no entanto, em decorrência dos ditames contidos no artigo 128 do CTN, a lei só poderá atribuir responsabilidade a terceira pessoa que esteja vinculada ao fato gerador da obrigação tributária.
Acerca da necessidade de vinculação entre o responsável legal e o fato gerador do crédito tributário ou o contribuinte, leciona Leandro Paulsen “O legislador não pode atribuir responsabilidades tributárias de modo aleatório, a quem não se relacione com o fato gerador ou com o contribuinte. A causa da responsabilidade e seus efeitos tem de se justificar”[1].
A doutrina pátria, levando em consideração o momento em que emerge o vínculo jurídico entre o contribuinte originário e a pessoa designada em lei como responsável pelo crédito tributário, classifica a responsabilidade como por substituição ou por transferência.
Dá-se a responsabilidade tributária por substituição quando a obrigação surge diretamente para o responsável, a quem compete recolher o tributo devido desde a ocorrência do fato gerador. Já a responsabilidade tributária por transferência, a obrigação tributária surge inicialmente em face do contribuinte, porém, a legislação prevê a mudança do polo passivo da obrigação em decorrência do advento de determinados atos ou fatos jurídicos.
O professor Ricardo Alexandre sintetiza com propriedade as diferenças entre as responsabilidades por substituição e por transferência:
“Na responsabilidade “por substituição”, a sujeição passiva do responsável surge contemporaneamente à ocorrência do fato gerador. Já na responsabilidade “por transferência”, no momento do surgimento da obrigação, determinada pessoa figura como sujeito passivo, contudo, num momento posterior, um evento definido em lei causa a modificação da pessoa que ocupa o pólo passivo da obrigação, surgindo, assim, a figura do responsável, conforme definida em lei.”[2]
Levando em consideração o desiderato do presente estudo, iremos nos ater às hipóteses de responsabilidade por transferência, que abrangem os casos de responsabilidade por sucessão, por solidariedade e de terceiros.
Nas hipóteses de responsabilidade por sucessão, a obrigação tributária nasce em relação ao contribuinte legalmente definido e, com o advento de determinado ato ou fato jurídico, a sujeição passiva é transferida ao sucessor expressamente designado em lei, no estado em que se encontrar quando do evento que motivou a sucessão. Assim, nos termos do artigo 129 do CTN, o sucessor será responsável pelos tributos devidos pelo contribuinte, cujos fatos geradores tenham ocorridos até a data da ocorrência do ato que enseje a responsabilidade por sucessão, ainda que o lançamento não tenha sido efetivado.
São exemplos da modalidade de responsabilidade por sucessão: a) sucessão imobiliária (artigo 130 do CTN); b) sucessão inter vivos de bens adquiridos ou remidos (artigo 131, I do CTN); c) sucessão causa mortis (artigo 131, II e III do CTN); d) sucessão empresarial (artigos 132 e 133 do CTN); e e) sucessão falimentar (artigo 184 do CTN).
Por força da inteligência do artigo 264 do Código Civil, há solidariedade no direito privado quando na mesma obrigação concorrer mais de um credor ou mais de um devedor, cada um com direito ou obrigado à totalidade da dívida. Dessa forma, na obrigação solidária ativa, qualquer um dos credores pode exigir a obrigação por inteiro, enquanto na obrigação solidária passiva, a dívida pode ser cobrada integralmente a qualquer um dos devedores.
Nos termos do artigo 124 do CTN, são solidariamente responsáveis pelo crédito tributário as pessoas que tenham interesse comum à situação que constitua o fato gerador (solidariedade de fato) e as pessoas expressamente determinadas na lei instituidora do tributo (responsabilidade de direito).
Em âmbito tributário, a solidariedade passiva, regra geral, decorre de expressa previsão legal, todavia, em determinadas situações, a obrigação tributária pode vir a ser exigida de devedor solidário convencional, como exemplifica Luciano Amaro:
“É o que se dá nas situações em que o crédito do Fisco é garantido por fiança (em geral, de bancos). Embora o fiador seja, em geral, devedor solidário, (quando não, pelo menos, subsidiário), trata-se porém de instituto de direito privado (a fiança), cujo objeto (obrigação afiançada) é que é de natureza tributária”.[3]
Cumpre, aqui, registrar que o parágrafo único do artigo 124 do CTN, fulminou o benefício de ordem nas obrigações tributárias, podendo a Fazenda Pública exigir de qualquer dos devedores solidários, de acordo com a sua conveniência, o cumprimento integral da dívida tributária em execução.
A responsabilidade de terceiros, por sua vez, é disciplinada pelos artigos 134 (responsabilidade decorrente de atuação regular) e 135 (responsabilidade decorrente de atuação irregular) do CTN, sendo que, “em ambos os casos, os ‘terceiros’ responsabilizados são pessoas que, em determinadas circunstâncias, falharam no cumprimento de um dever legal de gestão ou vigilância do patrimônio do contribuinte”[4].
Nas situações descritas nos incisos do artigo 134 do CTN, os terceiros exaustivamente enumerados nas sete alíneas, somente poderão ser responsabilizados se restarem presentes os seguintes requisitos: impossibilidade de cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte e ação ou indevida omissão da pessoa designada como responsável. Destarte, se não restar claramente configurada a atuação ativa ou omissão indevida das pessoas indicadas no artigo 134 do CTN, não surgirá a responsabilidade de terceiro por sua atuação regular.
O artigo 135 do CTN disciplina as situações de responsabilidade de terceiros em razão da atuação irregular, por violação à lei, ao contrato social ou o estatuto. Em tais casos, a responsabilidade do terceiro é pessoal, e não apenas solidária, conforme registra Sacha Calmon Navarro Coêlho:
“Aqui a responsabilidade se transfere inteiramente para os terceiros, liberando os seus dependentes e representados. A responsabilidade passa a ser pessoal, plena e exclusiva desses terceiros. Isto ocorrerá quando eles procederem com manifesta malícia (mala fides) contra aqueles que representam, toda vez que for constatada a prática de ato ou fato eivado de excesso de poderes ou com infração de lei, contrato social ou estatuto. O regime agravado da responsabilidade tributária previsto no artigo estende-se, é óbvio, peremptoriamente àquelas duas categorias de responsáveis previstas no rol dos incisos II e III (mandatários, prepostos, empregados e os diretores, gerentes e representantes de pessoas jurídicas de Direito Privado.”[5]
Cumpre salientar que parte da doutrina defende que quando a pessoa jurídica se beneficiar do ato praticado com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto, deverá responder solidariamente pelo débito com o responsável designado em lei, em razão da teleologia do artigo 124 do CTN. Neste sentido, eis a lição de Leandro Paulsen: “Certo é que, se a pessoa jurídica se beneficiou do ato, ainda que praticado com infração à lei ou com excesso de poderes, sua responsabilidade decorrerá, ao menos, da incidência do art. 124 do CTN, que diz da responsabilidade por interesse comum.”[6]
Feitas estas considerações introdutórias acerca da possibilidade de cobrança da dívida tributária dos responsáveis expressamente definidos em lei, passaremos a analisar a disciplina do instituto da prescrição no direito tributário, a fim de responder os questionamentos propostos no presente estudo.
2. Disciplina legal da prescrição dos créditos tributários.
O tempo tem expressiva relevância nas relações jurídico-sociais, porquanto tem o condão de fazer surgir determinados direitos, como no usucapião, modificar situações jurídicas, a exemplo do que ocorre na teoria das capacidades, ou, ainda, fulminar de morte certos direitos ou as pretensões deles decorrentes, como é o caso da decadência e da prescrição.
A fim de preservar a estabilidade e garantir a segurança jurídica das relações sociais, o instituto jurídico da prescrição implica na extinção da pretensão de se exigir determinado direito em juízo, em face do seu não exercício por seu titular no lapso temporal fixado em lei. Assim, tanto em âmbito público, como no privado, a regra é que as relações jurídicas sejam prescritíveis, como forma de salvaguardar a estabilidade das relações jurídico-sociais.
Impende registrar que, em razão do princípio da inafastabilidade do Poder Jurisdicional, a prescrição fulmina a pretensão de se exigir determinado resultado no mundo jurídico “e não o direito de ação em si, que sempre existirá, mesmo depois de decorrido o prazo prescricional estabelecido em lei”. [7]
A realização de um direito não auto-executável, portanto, depende do ajuizamento da competente ação judicial, a qual deverá ser proposta no prazo expressamente determinado em lei, sob pena de prescrever o poder de exigir o seu cumprimento de maneira coercitiva.
Em âmbito tributário, a prescrição refere-se ao prazo que a Fazenda Pública dispõe para propor, perante o Judiciário, a competente ação de execução fiscal, com o objetivo de obter a satisfação coativa da dívida fiscal não paga espontaneamente pelo contribuinte ou responsável.
Nos termos do artigo 174 do CTN, a ação de cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, sendo a data da constituição definitiva no crédito o termo a quo da sua contagem. Caso a Fazenda Pública não busque em juízo o cumprimento forçado da obrigação tributária no prazo estabelecido em lei, o crédito restará extinto, conforme dispõe o artigo 156, V do CTN.
Nas hipóteses em que os tributos sã constituídos por meio de lançamento de ofício, considera-se definitivamente constituído o crédito tributário quando o processo administrativo fiscal instaurado em razão de impugnação do sujeito passivo restar concluído ou quando esgotado o prazo legal para pagamento do crédito sem que o mesmo tenha sido efetivado pelo devedor. Por outro lado, nos casos em que os tributos encontram-se sujeitos a lançamento por homologação, a constituição definitiva do crédito tributário opera-se na data em que o contribuinte apresenta ao Fisco as informações necessárias à cobrança da dívida, por exemplo, por meio de Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Socia – GFIP ou Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF.
Sobre a constituição definitiva do crédito tributário como termo inicial do prazo prescricional, cumpre transcrever os ensinamentos de Luiz Emygdio F. da Rosa Júnior:
“Como se pode observar, não basta a efetivação do lançamento, mas há necessidade de regular notificação ao sujeito passivo e que decorra o prazo fixado em lei para pagamento ou impugnação ao lançamento, para que se considere o crédito tributário como definitivamente constituído. Se o sujeito passivo não se conformar com o lançamento, iniciando, portanto, o processo administrativo fiscal, o crédito tributário só estará definitivamente constituído após o decurso do prazo legal, a contar da notificação ao sujeito passivo dando ciência da decisão definitiva” (CTN, art. 201). [8]
Em oposição ao instituto da decadência, o curso do prazo prescricional pode suspenso ou interrompido em razão da prática de determinados atos. Na hipótese de superveniência de causa suspensiva, o prazo prescricional restará paralisado enquanto durar a respectiva causa e, uma vez cessada esta, o prazo volta a fluir, descontando-se o tempo decorrido anteriormente. Em caso de ocorrência de uma das hipóteses interruptivas da prescrição, o prazo quinquenal é integralmente devolvido à pessoa eventualmente prejudicada com a sua consumação, desprezando-se o período já decorrido.
As situações que interrompem o prazo prescricional em direito tributário encontram-se estritamente definidas no artigo 174, parágrafo único do CTN[9], as quais indicam “hipóteses em que o interessado age na busca da satisfação do seu direito, demonstrando não estar em situação de inércia”.[10]
Nos termos artigo 174, parágrafo único, inciso I do CTN, com redação dada pela Lei Complementar nº 118/2004, o curso do prazo prescricional é interrompido quando proferido o despacho do juiz que ordenar a citação da parte executada nos autos do feito executivo.
O referido dispositivo, além de se encontrar em estrita consonância com o artigo 8°, § 2°, da Lei de Execução Fiscal, evita a ocorrência de efeitos deletérios à Administração Tributária, que ajuizando de maneira efetiva a ação de execução fiscal, não localiza o executado em razão do seu ocultamento proposital ou é surpreendida com a demora na citação da parte ré, em razão de motivos inerentes aos mecanismos da Justiça.
Desta feita, o despacho do juiz que ordena a citação do executado é considerado o marco inicial da interrupção do prazo prescricional, sendo que a sua contagem ficará impedida enquanto não verificado o requisito necessário para o seu curso, qual seja, a inércia da parte credora, conforme bem ensina Leandro Paulsen:
“Assim, se efetuada a citação, o credor nada mais solicitar e a execução não tiver curso em razão da sua omissão, o prazo terá recomeçado. Entretanto, se, efetuada a citação, for promovido o prosseguimento da execução pelo credor, com a penhora de bens, realização de leilão etc, durante tal período não há que se falar em curso do prazo prescricional. Só terá ensejo o reinício da contagem quando quedar inerte o exequente”.[11]
No mesmo sentido, eis a lição de Mauro Luis Rocha Lopes:
“Ao determinar a formação da relação processual, o ato do julgador interrompe o curso da prescrição porque atesta implicitamente que a Fazenda Pública exerceu efetivamente o direito de exigir o seu crédito. Por essa razão, a partir do momento em que determinada a citação do executado, a prescrição fica praticamente superada, somente voltando a correr em casos excepcionais” (v. artigo 40 e prescrição intercorrente).[12]
Se, no entanto, após a interrupção do prazo prescricional em razão do despacho do juiz que ordenar a citação da parte executada, a Fazenda Pública quedar-se inerte na promoção dos atos necessários à cobrança forçada do crédito tributário por mais de cinco anos, em razão da não localização do executado ou de bens penhoráveis, nos termos do artigo 40, §4º, da Lei de Execução Fiscal, ou do baixo valor do débito executado, conforme dispõe o artigo 20, da Lei nº 10.522/02, surgirá o fenômeno da prescrição intercorrente.
O reconhecimento da prescrição intercorrente nas ações de execução exige a efetiva caracterização da inércia da parte exequente, como registra Arruda Alvim com precisão: “Não se deve admitir a ocorrência de prescrição se não houver inércia do credor; e, mais minudentemente, não deve ser havida como configurada prescrição intercorrente se não há inércia do autor ou do credor, em processo de conhecimento ou em execução.”[13]
Desta feita, se durante a cobrança judicial do crédito tributário a Fazenda Pública não localizar bens do devedor passíveis de constrição, o feito deverá ser suspenso e, posteriormente, arquivado provisoriamente, momento em que o credor deverá valer-se das diligências necessárias à localização de bens que satisfaçam a dívida em cobro, sob pena de ser retomada a contagem do prazo prescricional de cinco anos.
Diante da repercussão acerca da prescrição intercorrente nos feitos executivos, o Superior Tribunal de Justiça aprovou a Súmula 314, determinando que, “em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual inicia-se o prazo da prescrição quinquenal intercorrente”.
Percebe-se, assim, que só há que se falar na decretação da prescrição ou da prescrição intercorrente, em âmbito tributário, quando restar efetivamente caracterizada a inércia da parte credora na busca de meios efetivos à cobrança do débito.
3. Prazo prescricional para redirecionamento da execução fiscal aos responsáveis tributários por transferência.
É imperioso esclarecer, de início, que o presente estudo não busca analisar a situação em que os responsáveis legais pelo crédito tributário encontram-se devidamente relacionados na Certidão de Dívida Ativa – CDA, quando do ajuizamento da ação de execução fiscal. Em tal hipótese, a análise da prescrição resta afastada de plano, porquanto os responsáveis integram o polo passivo do feito executivo desde o seu início, consoante bem defende Maria Rita Ferragut:
“O redirecionamento da execução fiscal em face do administrador não se submete ao prazo prescricional, se seu nome estiver indicado na CDA. Nessa situação, o direito de ação foi exercido de forma plena, já que a faculdade de acessar a jurisdição exaure-se na distribuição da execução fiscal.”[14]
No entanto, caso a Fazenda Pública não efetive os atos executivos em relação aos responsáveis tributários indicados na CDA que instruiu a petição inicial da execução fiscal, promovendo a citação de todos os executado e realizando diligências para localização de bens penhoráveis, surgirá a possibilidade de decretação da prescrição quinquenal intercorrente em razão da sua inércia.
Será analisada, portanto, a hipótese em que a Fazenda Pública verifica, no curso da execução fiscal, um das hipóteses legais que autorize a responsabilização por transferência de terceira pessoa pelo crédito tributário – como a dissolução irregular da empresa executada ou a sucessão empresarial – e requeira a inclusão dos responsáveis no polo passivo do feito executivo.
Assim, não restando configurada a responsabilidade tributária em momento anterior ao ajuizamento da competente ação de execução fiscal, a Fazenda Pública deve requerer o redirecionamento do feito executivo aos respectivos responsáveis legais, ainda que estes não tenham participado do processo administrativo de constituição do crédito fiscal. Tal providência processual encontra fundamento nos ditames do artigo 568, incisos I e V, do Código de Processo Civil, que, ao diferenciar as figuras do devedor e do responsável tributário, possibilita a inclusão no polo passivo da execução fiscal de terceira pessoa considerada como responsável pelo crédito tributário.
Para tanto, a Fazenda Pública deve se desincumbir do seu ônus probatório, demonstrando que o ato ou fato jurídico ensejador da consequente alteração do polo passivo da execução fiscal se configurou tão somente naquele momento processual, uma vez que “os fatos constitutivos, impeditivos, modificativos ou extintivos que as partes têm o ônus de afirmar nos momentos adequados não são somente aqueles que tenham tais eficácias perante o direito material, mas também processual”[15].
Neste sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça delineado no julgado abaixo transcrito:
“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. DISSOLUÇÃO IRREGULAR. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE. ÔNUS DA PROVA. DISTINÇÕES.
1. Na imputação de responsabilidade do sócio pelas dívidas tributárias da sociedade, cumpre distinguir a relação de direito material da relação processual. As hipóteses de responsabilidade do sócio são disciplinadas pelo direito material, sendo firme a jurisprudência do STJ no sentido de que, sob esse aspecto, a dissolução irregular da sociedade acarreta essa responsabilidade, nos termos do art. 134, VII e 135 do CTN (v.g.: EResp 174.532, 1ª Seção, Min. José Delgado, DJ de 18.06.01; EResp 852.437, 1ª Seção, Min. Castro Meira, DJ de 03.11.08; EResp 716.412, 1ª Seção, Min. Herman Benjamin, DJ de 22.09.08).
2. Sob o aspecto processual, mesmo não constando o nome do responsável tributário na certidão de dívida ativa, é possível, mesmo assim, sua indicação como legitimado passivo na execução (CPC, art. 568, V), cabendo à Fazenda exeqüente, ao promover a ação ou ao requerer o seu redirecionamento, indicar a causa do pedido, que há de ser uma das hipóteses da responsabilidade subsidiária previstas no direito material. A prova definitiva dos fatos que configuram essa responsabilidade será promovida no âmbito dos embargos à execução (REsp 900.371, 1ª Turma, DJ 02.06.08; REsp 977.082, 2ª Turma, DJ de 30.05.08), observados os critérios próprios de distribuição do ônus probatório (EREsp 702.232, Min. Castro Meira, DJ de 26.09.05).
3. No que se refere especificamente à prova da dissolução irregular de sociedade, a jurisprudência da Seção é no sentido de que "a não-localização da empresa no endereço fornecido como domicílio fiscal gera presunção iuris tantum de dissolução irregular (EREsp 716.412/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 22.09.08; EREsp 852.437, 1ª Seção, Min. Castro Meira, DJ de 03.11.08).
4. No caso, o acórdão recorrido atestou que a empresa não funciona no endereço indicado, estando com suas atividades paralisadas há mais de dois anos, período em que não registrou qualquer faturamento.
5. Recurso especial improvido.” (REsp 1096444/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/03/2009, DJe 30/03/2009)
Seguindo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca da inclusão dos responsáveis tributários no feito executivo, defende Leandro Paulsen:
“Não constando do título o nome dos sócios contra os quais é pretendido o redirecionamento, faz-se indispensável que o Exeqüente demonstre os fundamentos, de fato e de direito, para a execução pessoal do sócio, na medida em que este não estará sendo demandado com suporte exclusivo no título. Assim, nesse caso, em se tratando de redirecionamento com suporte na responsabilidade de que trata o art. 135, III do CTN, o Juiz deve exigir do Exequente que demonstre que o sócio exerceu a gerência na época da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, e que a obrigação decorre de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.”[16]
Não padecendo dúvida quanto a possibilidade de redirecionamento da execução fiscal a terceira pessoa solidária, subsidária ou pessoalmente responsável pelo crédito tributário, impende analisar o marco inicial do prazo que dispõe a Fazenda Pública para efetivar tal cobrança.
Em uma análise superficial, pode-se concluir que o prazo quinquenal para cobrança do crédito tributário do contribuinte e do responsável tem o mesmo marco exordial. No entanto, em se tratando de situação em o crédito tributário não foi constituído em relação ao responsável, a definição do termo a quo deve ser analisada pela interpretação sistemática do artigo 174, caput e parágrafo único do CTN.
Neste contexto, consoante delineado linhas acima, a prescrição restará consumada caso decorra mais de cinco anos entre a constituição definitiva do crédito tributário e o despacho do juiz que ordenar nos autos da ação de execução fiscal a citação da parte executada. Caso tal iter procedimental seja efetivado antes do decurso do prazo quinquenal, o despacho do juiz que autorizar a citação do executado terá o condão de interromper o prazo prescricional.
Por outro lado, o prazo prescricional para ajuizamento da competente ação de execução fiscal refere-se ao tempo que é efetivamente colocado à disposição do credor para viabilizar a cobrança forçada da dívida fiscal, o que inclui todos os atos processuais necessários ao seu adimplemento.
Assim, se a hipótese legal que autoriza a responsabilização de terceira pessoa pelo crédito tributário, que não o contribuinte, surgiu apenas durante o curso do feito executivo, o prazo prescricional de que dispõe a Fazenda Pública para incluir os responsáveis tributários no polo passivo do feito tem início a partir dessa constatação, pois, até então o prazo prescricional encontrava-se interrompido desde o despacho do juiz que determinou a citação do executado.
Sobre o tema, leciona Sara de França Lacerda:
“Isto porque, apenas no momento em que se verificar a possibilidade de inclusão do sócio no polo passivo da demanda é que se pode exigir alguma ação positiva da exequente nesse sentido. Não se pode querer que alguém pratique ato processual sem que o implemento das condições que o permitam tenham ocorrido.”[17]
Tal entendimento encontra seu fundamento no princípio da actio natia, preconizado no artigo 189 do Código Civil, e regente da contagem do prazo prescricional no direito brasileiro. Em conformidade com os ditames do mencionado princípio, apenas com a violação de determinado direito e o surgimento da respectiva pretensão é que se considera iniciado o transcurso do prazo prescricional em desfavor do titular da pretensão.
Impende aqui transcrever os ensinamentos de Maria Helena Diniz sobre o termo inicial de contagem do prazo de prescrição:
“A violação do direito subjetivo cria para o seu titular a pretensão, ou seja, o poder de fazer valer em juízo, por meio de uma ação (sentido material), a pretensão (positiva ou negativa) devida, o cumprimento da norma legal ou contratual infringida ou a reparação do mal causado, dentro de um prazo legal (arts. 205 e 206 do CC). O titular da pretensão jurídica terá prazo para propor a ação, que se inicia (dies a quo) no momento em que se der a violação do seu direito subjetivo. Se o titular deixar escoar tal lapso temporal, sua inércia dará origem a uma sanção adveniente, que é a prescrição.”[18]
A jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça segue o entendimento ora exposto, reconhecendo o princípio da actio nata como informador lapso temporal prescritivo, como bem registra o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho:
“De início, vale lembrar que o instituto da prescrição é regido pelo princípio da actio nata, ou seja, o curso do prazo prescricional tem início com a efetiva lesão ou ameaça do direito tutelado, momento em que nasce a pretensão a ser deduzida em juízo.”[19]
Destarte, na hipótese de responsabilidade dos administradores pela dissolução irregular da sociedade executada, a contagem do prazo prescricional para efetivação do redirecionamento da execução fiscal tem seu início quando caracterizada, nos autos do feito executivo, a desconstituição, de modo irregular, da parte executada, como por exemplo por meio da não localização pelo Oficial de Justiça da empresa para citação nos endereços constantes das bases de dados dos órgãos oficiais.
Considerar o marco inicial para redirecionamento do feito a partir da citação da empresa executada somente se justificaria caso se pudesse responsabilizar o administrador pelo mero inadimplemento da obrigação tributária, pois, neste caso, o fundamento fático-jurídico para viabilizar a pretensão executória em face dos co-responsáveis já restaria presente desde o ajuizamento do feito executivo.
Acontece, no entanto, que a jurisprudência pátria é firme no entendimento de que a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, hipótese de responsabilização do sócio, com fundamento no artigo 135, III do CTN, conforme se depreende do julgado abaixo transcrito:
“TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO AO SÓCIO-GERENTE. FALTA DE PAGAMENTO. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. REsp 1.101.728/SP. SISTEMÁTICA DO ART. 543-C. RECURSOS REPETITIVOS. COMPROVAÇÃO DA DISSOLUÇÃO IRREGULAR. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA.SÚMULA 7/STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO NÃO PROVIDO.1. A Primeira Seção deste Tribunal, no julgamento do REsp 1.101.728/SP, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 23/3/09, sob a sistemática do art. 543-C do CPC, decidiu que "a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, nem em tese, circunstância que acarreta a responsabilidade subsidiária do sócio, prevista no art. 135 do CTN" 2. A matéria atinente à comprovação da dissolução irregular da sociedade demanda, na hipótese, a reapreciação de aspectos fático-probatórios da lide, o que é inviável em sede de recurso especial, atraindo a aplicação da Súmula 7/STJ: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial". 3. Agravo regimental não provido.” (AgRg no Ag 1356565/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/05/2011, DJe 26/05/2011)
Definir, portanto, que a prescrição para inclusão dos administradores no polo passivo da execução fiscal se inicia em momento anterior à constatação da dissolução irregular da empresa executada, ou seja, antes mesmo de haver nascido a pretensão ao redirecionamento, atenta de maneira cristalina ao princípio da actio nata.
Impende, aqui, registrar que nas hipóteses previstas no artigo 135 CTN, caso a sociedade se beneficie dos atos praticados com excesso de poder, infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto, tanto os diretores, gerentes ou representantes da pessoa jurídica de direito privado quanto a pessoa jurídica responderão solidariamente pelo crédito tributário, em razão da aplicação do artigo 125, III do CTN.
O mencionado artigo 125, III do CTN prevê expressamente que, em decorrência dos efeitos da solidariedade, a interrupção da prescrição a favor ou contra um dos obrigados favorece ou prejudica os demais. Destarte, a prescrição quinquenal, quando interrompida em desfavor da pessoa jurídica executada, por meio do despacho do juiz que determinar a sua citação, também será interrompida em relação os sócios ou administradores com poderes de gerência, responsáveis de maneira solidária pelo débito fiscal em razão dos atos que praticarem.
Da mesma forma, nas hipóteses de responsabilidade por sucessão empresarial dispostas no artigo 132 do CTN – fusão, transformação ou incorporação de pessoas jurídicas, não há como se reputar como termo a quo para cobrança do crédito tributário do responsável legalmente designado, o despacho do que ordenar a citação da empresa originariamente indicada no polo passivo da ação de execução fiscal.
Isto porque, caso a operação de sucessão ocorra após o ajuizamento do feito executivo contra o contribuinte, a Fazenda Pública deverá dispor integralmente do prazo de cinco para realizar a cobrança do responsável tributário, devendo tal prazo ter início quando do conhecimento da reorganização societária.
Nesse sentido, leciona com propriedade Juliana Furtado Costa Araújo:
“Não é este, porém, o entendimento que deve prevalecer. Isto porque o prazo quinquenal a que se refere o artigo 174 do CTN diz respeito ao tempo que é colocado à disposição do sujeito ativo para viabilizar a cobrança de seu crédito, o que inclui todos os atos processuais necessários ao seu adimplemento, anteriores e posteriores ao ajuizamento, por exemplo, a inscrição em dívida ativa, a citação do executado, a penhora e leilão de bens etc.”[20]
Caso o Fisco seja formalmente comunicado da sucessão empresarial por ato da empresa executada ou dos responsáveis legais, o prazo prescricional, interrompido pelo despacho que determinou a citação do contribuinte, deverá retomar a sua contagem no momento em que a Fazenda Pública tomou conhecimento do ato sucessório. Por outro lado, caso a sucessão se dê sem qualquer comunicação aos órgãos oficiais, a recontagem do prazo prescricional só poderá ter início quando a parte exequente tiver o efetivo conhecimento do ato de sucessão empresarial, devendo esta se desincumbir do ônus da prova nos autos do feito executivo, carreando documentos que comprovem a sucessão.
A Fazenda Pública, portanto, só poderá se insurgir contra o sucessor empresarial quando tiver efetivo conhecimento do ato sucessório que enseje, por força de expressa disposição legal, responsabilização de terceira pessoa pelo crédito tributário, motivo pelo qual, em razão do princípio da segurança jurídica, o prazo prescricional deve ter início apenas nesta data.
Percebe-se, assim, que apenas após a ocorrência de ato ou fato jurídico que implique responsabilidade tributária de pessoa diversa do contribuinte, é que se inicia a fluência do prazo prescricional para que a Fazenda Pública exerça o seu direito de redirecionar o feito executivo. Antes disso, não há que se falar em perda da pretensão em razão da desídia do Fisco, uma vez que tal prazo sequer teve seu início diante da inexistência de autorização legal que justifique a inclusão de terceira pessoa no polo passivo da execução fiscal.
Cumpre, aqui, salientar, que o Superior Tribunal de Justiça tem posicionamento majoritário diverso do delineado no presente estudo, defendendo que o prazo prescricional para redirecionamento da ação de execução fiscal contra os sócios administradores tem início com o despacho que determina a citação da pessoa jurídica. [21]
A despeito disso, verificamos decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça na mesma linha ora defendida, as quais demonstram uma possível revisão do entendimento firmado pela mencionada Corte no que tange ao termo a quo para redirecionamento do feito executivo aos responsáveis legais pelo crédito tributário. Vejamos:
“TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. SÓCIO-GERENTE. PRESCRIÇÃO. TEORIA DA "ACTIO NATA". RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS. MATÉRIA QUE EXIGE DILAÇÃO PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 393/STJ. 1. O termo inicial da prescrição é o momento da ocorrência da lesão ao direito, consagrado no princípio universal da actio nata. 2. In casu, não ocorreu a prescrição, porquanto o redirecionamento só se tornou possível a partir da dissolução irregular da empresa executada. 3. A responsabilidade subsidiária dos sócios, em regra, não pode ser discutida em exceção de pré-executividade, por demandar dilação probatória, conforme decidido no Recurso Especial "repetitivo" 1.104.900/ES, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Seção, julgado em 25.3.2009, DJe 1°.4.2009, nos termos do art. 543-C, do CPC. 4. Incidência da Súmula 393/STJ: "A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória". Agravo regimental provido.”(AgRg no REsp 1196377/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/10/2010, DJe 27/10/2010)
“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. CITAÇÃO DA EMPRESA E DO SÓCIO-GERENTE. PRAZO SUPERIOR A CINCO ANOS. PRESCRIÇÃO. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA. 1. O Tribunal de origem reconheceu, in casu, que a Fazenda Pública sempre promoveu regularmente o andamento do feito e que somente após seis anos da citação da empresa se consolidou a pretensão do redirecionamento, daí reiniciando o prazo prescricional. 2. A prescrição é medida que pune a negligência ou inércia do titular de pretensão não exercida, quando o poderia ser. 3. A citação do sócio-gerente foi realizada após o transcurso de prazo superior a cinco anos, contados da citação da empresa. Não houve prescrição, contudo, porque se trata de responsabilidade subsidiária, de modo que o redirecionamento só se tornou possível a partir do momento em que o juízo de origem se convenceu da inexistência de patrimônio da pessoa jurídica. Aplicação do princípio da actio nata. 4. Agravo Regimental provido.” (AgRg no REsp 1062571/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/11/2008, DJe 24/03/2009)
O novo entendimento do Superior Tribunal de Justiça exposto nos julgados colacionados acima merecem prosperar, uma vez que não se pode falar em contagem do prazo prescricional quando o ato ou fato jurídico autorizador do redirecionamento do feito sequer ocorreu. Não se pode alegar a inércia da parte credora a partir da citação do executado originariamente indicado na CDA se a circunstância material para cobrança do crédito tributário de terceira pessoa ainda não se configurou.
Percebe-se, assim, que o termo a quo do lapso prescricional para redirecionamento da execução fiscal deve seguir os ditames do princípio da actio nata, não havendo fundamento para qualquer argumento que implique na contagem do prazo quinquenal de prescrição em momento anterior à efetiva caracterização de ato ou fato jurídico que viabilize o redirecionamento do feito executivo aos responsáveis devidamente designados em lei.
Apenas com o surgimento de uma das circunstâncias materiais que autorizem a inclusão de terceira pessoa no polo passivo da execução fiscal é que a desídia da Fazenda Pública poderá implicar na consequente perda do seu direito de exigir judicialmente o crédito tributário.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo do desenvolvimento do presente artigo, restou evidenciado que nas hipóteses de responsabilidade tributária por transferência a obrigação tributária emerge, de início, em face do contribuinte, no entanto, em razão do advento de determinado ato ou fato jurídico, o responsável tributário definido na legislação de regência é incluído no polo passivo da obrigação tributária.
Por outro lado, buscou-se demonstrar que o estabelecimento do marco inicial do prazo de prescrição quinquenal para redirecionamento da execução fiscal depende da interpretação sistemática do artigo 174, caput e parágrafo único do Código Tributário Nacional.
Destarte, se quando do ajuizamento do feito executivo não estiverem presentes os fundamentos legais para cobrança da dívida fiscal de terceira pessoa legalmente responsável pelo crédito tributário, a Fazenda Pública não poderá indicá-la como sujeito passivo na Certidão de Dívida Ativa que instrui a petição inicial da ação de execução fiscal. Porém, se no curso da ação de cobrança do débito fiscal restar configurada uma das hipóteses legais que autorizam a responsabilização de terceira pessoa pelo crédito tributário, a partir de então, a Fazenda Pública deverá dispor integralmente do prazo prescricional para efetivar o redirecionamento do feito aos responsáveis.
Isto porque, em obediência aos ditames do artigo 174, do CTN, o prazo prescricional cinco anos, é interrompido pelo despacho do juiz que determinar a citação do executado inicialmente indicado na peça exordial do feito executivo. E, portanto, somente pode ter o seu cômputo reiniciado quando restarem presentes e devidamente comprovadas as circunstâncias fático-jurídicas que permitem a inclusão de uma terceira pessoa no polo passivo do feito executivo. A partir deste momento é que poderá ser decretada a desídia da exequente em razão da sua inércia na cobrança do crédito tributário e consequente perda do seu direito de cobrar o débito em juízo.
A despeito de a tese defendida no presente artigo encontrar-se em dissonância da posição majoritária do Superior Tribunal de Justiça, há julgados recentes do mencionado tribunal que indicam uma possível alteração de entendimento, que, aplicando a teoria da actio nata e levando em consideração a boa-fé da parte exequente, determina como termo a quo do prazo prescricional para redirecionamento da execução fiscal o momento que restar cabalmente configurada a hipótese de responsabilidade tributária.
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Notas:
Procuradora da Fazenda Nacional, Diretora do Centro de Altos Estudos da PGFN no DF, Pós-graduada em Direito Tributário
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