Resumo: O presente estudo visa analisar o nexo técnico epidemiológico previdenciário- NTEP e seus efeitos sobre a ação indenizatória por acidente do trabalho. Preliminarmente, trata da problemática social que envolve o acidente do trabalho, da evolução legislativa de amparo ao funcionário acidentado, bem como das definições extraídas da Lei n.° 8.213/1991. Posteriormente, aprofunda-se a hipótese de caracterização do acidente do trabalho a partir das doenças ocupacionais, as quais poderão ser declaradas, voluntariamente, pelo empregador através da Comunicação de Acidente do Trabalho- CAT ou pelo perito do Instituto Nacional de Seguro Social- INSS através do NTEP. Nesse sentido, pontua o conceito do NTEP, assim como relata as garantias concedidas pela legislação ao trabalhador acidentado nas esferas previdenciária, trabalhista e civil. Esta última possui maior destaque, vez que desenvolve a temática da responsabilidade civil do empregador frente aos danos causados pelo acidente do trabalho ao funcionário.
Palavras chaves: Acidente do Trabalho. Empregado. Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário. Direito. Trabalho. Previdenciário. Cível. Responsabilidade.
Sumário: 1. Introdução; 2. Acidente do Trabalho; 2.1. Considerações Iniciais; 2.2. Evolução Legislativa; 2.3. Definição de Acidente do Trabalho; 3. Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário- NTEP; 3.1. Doenças Ocupacionais; 3.2. Comunicação de Acidente do Trabalho; 3.3. Definição do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário; 3.4. Garantias do Empregado com a Caracterização do Acidente do Trabalho; 4. Responsabilidade Civil do Empregador; 4.1. Abordagem Inicial; 4.2. Danos Morais, Materiais e Estéticos; 4.3. Responsabilização; 5. Considerações Finais; Referências Bibliográficas;
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho debate à problemática existente na relação jurídica trabalhista frente à tipificação do acidente do trabalho pelo empregador através do comunicado de acidente do trabalho e a criação do nexo técnico epidemiológico previdenciário.
Nesse sentido, objetiva abordar os aspectos que envolvem o nexo técnico epidemiológico previdenciário, na tipificação do acidente do trabalho e as suas consequências nas esferas previdenciárias, trabalhistas e principalmente na cível, no que tange a responsabilização do empregador.
Para tanto, o trabalho foi confeccionado a partir da pesquisa bibliográfica e eletrônica dos principais sites especializados.
A investigação inicia-se com algumas considerações sobre a ocorrência de acidentes do trabalho na sociedade moderna, abordando a sua problemática entre capital x trabalho. Aponta-se, nesse sentido, a evolução legislativa das normas que regem os infortúnios trabalhistas, chegando às suas definições modernas consagradas pela Lei n.° 8.213/1991.
Em um segundo momento, discute-se Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário – NTEP, iniciando-se a discussão nas doenças ocupacionais, as quais são equiparadas a acidente do trabalho, na Comunicação de Acidente do Trabalho- CAT e propriamente do NTEP, pontuando sua definição e importância na caracterização do acidente do trabalho e, consequentemente, sobre as garantias legislativas concedidas ao empregado acidentado no âmbito trabalhista e previdenciário.
Após, discute o reflexo da caracterização do acidente do trabalho a partir do NTEP na seara da responsabilidade civil do empregador. Dessa forma, reflete sobre os principais conceitos que envolvem o tema e critica a aplicação incondicional da responsabilização civil objetiva do empregador frente aos infortúnios trabalhistas.
Por conseguinte, nota-se que o trabalho possui importância jurídico-social, pois, além de sintetizar os principais tópicos do direito do trabalho, previdenciário, questiona a atuação dos magistrados nas ações indenizatórias trabalhistas por acidentes do trabalho.
2 ACIDENTE DO TRABALHO
2.1 Considerações Iniciais:
Os acidentes de trabalho comprometem de sobre maneira a produtividade econômica. São responsáveis por grande impacto no sistema de proteção social e interferem no nível de satisfação do trabalhador e no bem-estar da sociedade, além do que representam altos custos humanos e sociais, pouco conhecidos quer no âmbito empresarial ou no governamental.
Atenta-se que o acidente do trabalho reflete negativamente a todas as partes envolvidas. Ao trabalhador e sua família, os prejuízos são financeiros e emocionais. Já na empresa ocorrem prejuízos financeiros, pelo afastamento temporário do funcionário e pelo eventual custo em ação indenizatória pelos danos morais e materiais causados ao empregado. Em contrapartida, o governo, sofre com os altos gastos com saúde pública e com a Previdência Social.
Segundo Paulo Rogério Albuquerque de Oliveira (2010, p. 13/14) no ano de 2006, foram notificados através da Comunicação do Acidente do Trabalho- CAT, 503.890 acidentes do trabalho na população empregada, sendo que 2.717 foram fatais. Atenta-se que isso representa quatro acidentes por minuto e 10 óbitos por dia útil, situação absurda quando se trata de um país emergente.
Por certo, o perfil apresentado pelo Brasil é alarmante, principalmente com o aumento das doenças modernas, as quais são influenciadas pelo ambiente de trabalho e, portanto, caracterizadas como acidentes do trabalho. Salienta-se que tais enfermidades são, muitas vezes, ignoradas pelos empregadores, que se omitem na emissão da Comunicação do Acidente do Trabalho- CAT.
2.2 Evolução Legislativa:
Como relatado, os acidentes do trabalho são bastante comuns na sociedade moderna, considerando o contraponto lucro x bem-estar do empregado. Para tanto, ao longo dos anos, houve a necessidade da criação de normas especificas, a fim de proteger o trabalhador frente aos infortúnios trabalhistas.
O primeiro diploma legal a tratar do acidente do trabalho foi o Código Comercial (1850), que garantiu ao preposto lesionado três meses de salário.
Já a Lei n.° 3.724/1919 inovou trazendo a primeira lei geral sobre os acidentes do trabalho, a qual baseou sua atuação na responsabilidade civil do empregador pelos infortúnios decorrentes de dolo e culpa e, ainda, tratou dos casos fortuitos.
Logo após, a Constituição Federal de 1934 tratou da proteção ao acidente de trabalho, como prestação previdenciária, e determinou a contratação de seguro de natureza privada, a cargo da empresa.
O Decreto n.° 24.637/1934 esclareceu sobre o direito de pensão por morte aos herdeiros do acidentado. Da mesma forma, o Decreto-lei n.° 7.036/1944 estendeu as hipóteses de acidente do trabalho, abarcando as “concausas”, o período “in itinere” e os intervalos de trabalho e a proteção do trabalhador urbano.
Novamente, a Constituição Federal de 1946 pontuou a obrigatoriedade de o empregador manter o Seguro de Acidente do Trabalho- SAT, que até então não era monopolizado pela Previdência Social.
A Lei n.° 5.316/1967, buscando a evolução dos direitos do empregado acidentados, adotou a teoria do risco social, integrou o seguro de acidentes do trabalho na Previdência, abarcando as doenças profissionais e do trabalho, tornou a exploração do SAT monopólio Estatal, sendo excluídas as seguradoras privadas.
A Lei n.° 6.195/1974 beneficiou os empregados rurais com o SAT, passando esses a terem assegurados a proteção acidentária.
A Constituição Federal de 1988 apontou o acidente do trabalho como risco social, portanto passível de proteção previdenciária. O SAT permanece incumbência do empregador, mas isso não excluiu o direito do trabalhador a indenização por dolo ou culpa.
Por fim, a Lei n° 8.213/1991 consagrou as definições de acidente do trabalho, assim como os procedimentos previdenciários cabíveis. Atenta-se que tal regra, apesar de possuir cunho eminentemente previdenciário, intervém de sobre maneira no âmbito trabalhista, assegurando direitos aos obreiros, situação que será melhor abordada no decorrer no trabalho.
Como se verifica, o acidente do trabalho encontra-se nas pautas de discussão legislativa desde o ano de 1850, com o Código Comercial, o que anunciava, desde longa data, o conflito de interesses, especialmente, entre empregado e patrão.
2.3 Definição do Acidente de Trabalho:
Em síntese, considera-se como acidente do trabalho, não apenas o incidente que envolva o trabalhador no desempenho de suas atividades profissionais, mas todas aquelas situações/enfermidades desenvolvidas no labor.
De acordo com o art. 19 da Lei n.° 8.213/1991 o acidente de trabalho é infortúnio ocorrido no exercício do trabalho ou proveniente do labor que gera incapacidade ou a própria morte do empregado, como se verifica:
“Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.
§ 1º A empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador.
§ 2º Constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho.
§ 3º É dever da empresa prestar informações pormenorizadas sobre os riscos da operação a executar e do produto a manipular.
§ 4º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social fiscalizará e os sindicatos e entidades representativas de classe acompanharão o fiel cumprimento do disposto nos parágrafos anteriores, conforme dispuser o Regulamento.”
Da mesma forma, o art. 20 da Lei n.° 8.213/1991 equiparou a acidente do trabalho as doenças profissionais e do trabalho, como exposto:
“Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:
I – doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
II – doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.”
Já o art. 21 da Lei n.° 8.213/1991 enumerou diversas situações as quais, em função de sua relação mesmo que indireta com o trabalho foram tipificadas como acidentes laborais:
“Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para efeitos desta Lei:
I – o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação;
II – o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em conseqüência de:
a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho;
b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho;
c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho;
d) ato de pessoa privada do uso da razão;
e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;
III – a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade;
IV – o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:
a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;
b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito;
c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;
d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.
§ 1º Nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o empregado é considerado no exercício do trabalho.
§ 2º Não é considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho a lesão que, resultante de acidente de outra origem, se associe ou se superponha às conseqüências do anterior.”
Para tanto, pode-se dizer que são características do acidente de trabalho a exterioridade da causa do acidente (dizer que o infortúnio decorre de um evento causado por agente externo, ou seja, o mal que atinge o individuo não é congênito ou preexistente), a violência (considera-se como o fato que viola a integridade do individuo), a subtaneidade (o fato causador é abrupto, apesar de seus efeitos poderem surgir posteriormente), e a relação com a atividade laboral (impõe que a situação fatídica tenha ocorrido no desempenho de atividade laborativa). (CASTRO, 2011, p. 570/571).
Pelo exposto, todas essas as situações expostas são caracterizadas como acidente do trabalho, restando direitos e obrigações para as partes envolvidas (empregado, empregador e governo).
3 Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário – NTEP
3.1 Das Doenças Ocupacionais:
Antes de adentrar no Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário- NTEP importante aprofundar a analise das doenças ocupacionais, que, conforme relatado anteriormente, em função do art. 20 da Lei n.° 8.213/1991 serão consideradas acidente do trabalho.
Em síntese, as doenças ocupacionais são aquelas que surgiram em função da atividade laboral desempenhada pelo individuo, ocasionadas pela constante exposição a agentes físicos, químicos e biológicos, ou pela inadequada utilização dos recursos tecnológicos, tais como a informática.
Em regra, as doenças ocupacionais classificam-se em profissionais e do trabalho:
“Classifica-se como doença profissional aquela decorrente de situações comuns aos integrantes de determinada categoria de trabalhadores, relacionada como tal no Decreto n.° 3.048/99, Anexo II, ou, caso comprovado o nexo causal entre a doença e a lesão, aquela que seja reconhecida pela Previdência, independentemente de constar na relação. São também chamadas de idiopatias, tecnopatias, ou ergopatias. São comuns aos profissionais de certa atividade, como, por exemplo, a pneumoconiose, entre os mineiros.
Denomina-se doença do trabalho aquela adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, estando elencada no referido Anexo II do Decreto n.° 3.048/99, ou reconhecida pela Previdência. […] exemplo dos “Distúrbios do Sistema Osteomuscular Relacionados ao Trabaho”- DORT, dos quais as lesões por esforço repetitivo são o principal evento; são casos em que as condições inadequadas sob o prisma da ergonomia, desenvolvem os problemas típicos. A prevenção, no caso, deve ser baseada na limitação do tempo de exposição (duração da jornada e concessão de pausas regulares), na alteração do processo e organização do trabalho (evitando excessos de demanda) e na adequação de máquinas, mobília, equipamentos e ferramental do trabalho às características ergonômicas dos trabalhadores. […]” (CASTRO, 2011, p. 573).
Nota-se, que para a caracterização do acidente do trabalho a partir de uma doença ocupacional faz-se necessário à presença do nexo causal, qual seja o vinculo fático que liga a incapacidade ou morte do empregado à sua causa.
Nesse caso, poderá o empregador, voluntariamente, emitir a Comunicação de Acidente do Trabalho, pois vinculou a enfermidade incapacitante à atividade profissional desenvolvida junto à empresa. Contudo, tal situação apresenta-se como uma exceção, tendo em vista o conjunto de garantias concedidas ao empregado, que fogem aos interesses dos patrões.
No entanto, observou-se, ao longo dos tempos, que os empregados portadores de doenças ocupacionais, diante da omissão dos empregadores em emitir a CAT, assim como pela dificuldade do INSS em apontar a vinculação entre a enfermidade e da atividade laboral, foram lesados quanto a seus direitos. Ressalta-se que sem a caracterização do acidente do trabalho (doença ocupacional) o funcionário não terá garantido diversos direitos trabalhistas, cíveis e previdenciários.
Por isso, no ano de 2006, através da Lei n.° 11.430, houve a criação do Nexo Técnico Previdenciário, o qual concedeu ao perito do Instituto Nacional de Seguro Social a faculdade, de acordo com os elementos apresentados, de tipificar o acidente do trabalho, mesmo sem a apresentação da Comunicação de Acidente do Trabalho- CAT.
3.2 Comunicação de Acidente do Trabalho:
Em regra, ocorrido o acidente do trabalho ou verificada a doença ocupacional, o empregador esporadicamente deverá comunicar o fato a Previdência Social, nos termos do art. 22 da Lei n.° 8.213/1991:
“Art. 22. A empresa deverá comunicar o acidente do trabalho à Previdência Social até o 1º (primeiro) dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena de multa variável entre o limite mínimo e o limite máximo do salário-de-contribuição, sucessivamente aumentada nas reincidências, aplicada e cobrada pela Previdência Social.
§ 1º Da comunicação a que se refere este artigo receberão cópia fiel o acidentado ou seus dependentes, bem como o sindicato a que corresponda a sua categoria.
§ 2º Na falta de comunicação por parte da empresa, podem formalizá-la o próprio acidentado, seus dependentes, a entidade sindical competente, o médico que o assistiu ou qualquer autoridade pública, não prevalecendo nestes casos o prazo previsto neste artigo.
§ 3º A comunicação a que se refere o § 2º não exime a empresa de responsabilidade pela falta do cumprimento do disposto neste artigo.
§ 4º Os sindicatos e entidades representativas de classe poderão acompanhar a cobrança, pela Previdência Social, das multas previstas neste artigo.
§ 5o A multa de que trata este artigo não se aplica na hipótese do caput do art. 21-A”. (Incluído pela Lei nº 11.430, de 2006)
Nesse sentido, caso o comunicado de acidente do trabalho não seja formalizado pela empresa, essa será penalizada com multa variável entre o limite mínimo e o limite máximo do salário de contribuição, sucessivamente aumentada nas reincidências, sendo essa aplicada e exigida pela Previdência Social.
Conforme disposto no §2° do art. 22 da Lei n.° 8.213/1991, na falta de comunicação do acidente do trabalho pelo empregador, esse poderá ser formalizado pelo próprio acidentado, seus dependentes, entidade sindical competente, médico que assistiu ou qualquer autoridade pública.
Contudo, mesmo com a emissão do comunicado por aqueles sujeitos de direito, a empresa empregadora permanecerá obrigada ao pagamento da multa prevista no art. 22 da Lei n.° 8.213/1991.
Sobre o tema cumpre salientar as palavras de Gustavo Filipe Barbosa Garcia:
“Mesmo assim, essa comunicação subsidiária, pelas empresas acima arroladas (art. 22, §2° da Lei n.° 8.213/1991), não exime a empresa de responsabilidade pela falta de cumprimento do disposto no art. 22. Tanto é assim, que os sindicatos e as entidades representativas de classe poderão acompanhar a cobrança, pela Previdência Social, das multas previstas nesse dispositivo. Assim, desrespeitando a empresa o seu dever legal de emitir a CAT, não há uma imposição para que o próprio trabalhador acidentado o faça. Trata-se de mera faculdade dele, não se podendo sanciona-lo nem impor-lhe consequências adversas pelo seu não exercício.
Como se nota, em principio, cabe à empresa comunicar o acidente do trabalho à Previdência Social. Apenas na falta dessa comunicação pelo empregador é que podem formaliza-la o próprio acidentado, seus dependentes, a entidades sindical competente, o médico que o assistiu ou qualquer autoridade pública (§2° do art. 22).
Da mesma forma, o art. 169 da CLT também prevê que: “Será obrigatória a notificação das doenças profissionais e das produzidas em virtude de condições especial de trabalho, comprovadas ou objeto de suspeita, de conformidade com as instruções expedidas pelo Ministério do Trabalho”. Nesse sentido, observa-se a regulamentação prevista na NR da Portaria 3.214/1978, no item 7.4.8”. (GARCIA, 2011. p. 51/52)
Contudo, diante da falta de efetividade da imposição do art. 22 da Lei n.° 8.213/1991, seja pela esquiva do empregador, pela ignorância do empregado na busca de seus direitos ou pela omissão da Previdência Social em aplicar a respectiva multa, o legislador ciente da problemática social foi obrigado a mudar a sistemática de caracterização do acidente do trabalho, através da criação do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário- NTEP.
3.3 Definição do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário:
A Lei n.° 11.430/2006 inovou em criar o Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário- NTEP como alternativa a caracterização do acidente do trabalho.
Nota-se que com essa modificação legislativa, que inseriu novo artigo à Lei n.° 8.213/1991, possibilitou ao perito do Instituto Nacional de Seguro Social- INSS à vinculação do problema de saúde a atividade profissional do trabalhador, como se verifica:
“Art. 21-A. A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza acidentária da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade elencada na Classificação Internacional de Doenças – CID, em conformidade com o que dispuser o regulamento.
§ 1o A perícia médica do INSS deixará de aplicar o disposto neste artigo quando demonstrada a inexistência do nexo de que trata o caput deste artigo.
§ 2o A empresa poderá requerer a não aplicação do nexo técnico epidemiológico, de cuja decisão caberá recurso com efeito suspensivo, da empresa ou do segurado, ao Conselho de Recursos da Previdência Social.”
Infere-se que a expressão epidemiológica abarca o estudo interdisciplinar das situações que influenciam na perpetuação de enfermidades e na sua propagação na sociedade.
Por conseguinte, ao médico perito do INSS, para estabelecer o nexo técnico epidemiológico, deverá atentar para as características individuais do trabalhador (saúde + atividade profissional) com os dados coletivos laborais. Assim, presente a vinculação entre a doença ocupacional incapacitante, a atividade laboral e os dados coletivos poderá o servidor da Previdência Social tipificar o acidente do trabalho.
A fim de reformar o tema, cumpre transcrever as palavras de Fabio Zambitte Ibrahim:
“[…] Neste contesto, o NTEP permite o reconhecimento, de ofício, da incapacidade como derivada do trabalho, por meio de correlação entre a atividade econômica da empresa e da doença ocupacional- há correlação entre o CNAE e a tabela CID. Tal relação foi feita por meio de análises estatísticas, que expõe as doenças ocupacionais típicas entre determinadas atividades econômicas. Naturalmente, a correlação não será verdadeira em todas as situações, mas o mérito da Lei n.° 11.430/06, ao inserir o art. 21-A e impondo-o à empresa, que efetivamente assume o risco da atividade econômica” (IBRAHIM, 2011, p. 21).
Importante registrar que não haverá a utilização do nexo técnico epidemiológico previdenciário para a configuração do acidente do trabalho típico sentido “stricto”, ou seja, aquele fato ocorrido durante a atividade laboral que tenha ocasionado na morte ou incapacidade do empregado.
Infere-se que, de acordo com o art. 20-A, §2° da Lei n.° 8.213/1991 poderá a empresa requerer a não aplicação do nexo técnico epidemiológico, contudo, inexiste na legislação, a obrigatoriedade de previa notificação do empregador da conclusão do perito da Autarquia Previdência, a fim de permitir sua defesa ou justificação.
Tal situação, certamente, deixa a empresa em desvantagem, pois, após a concessão do beneficio previdenciário acidentário, passa a existir presunção jurídica (juris tantum) que confere ao funcionário diversas garantias.
Nesse ponto, importante ressaltar a Súmula n.° 42 do Tribunal Superior de Trabalho que confere ao nexo técnico epidemiológico previdenciário grande destaque na esfera trabalhista: “Presume-se a ocorrência de acidente de trabalho, mesmo sem a emissão da CAT- Comunicação de Acidente de Trabalho, quando houver nexo técnico epidemiológico conforme art. 21-A da Lei n.° 8.213/1991”.
Ainda sobre o tema, ressalta-se que a pericia médica da Autarquia Previdenciária, caso verifique indícios de culpa ou dolo por parte da empresa que contribuíram para a incapacidade ou óbito do segurado, terá que oficiar a Procuradoria Federal para, se for o caso, ingressar com ação regressiva contra os responsáveis, nos termos do arts. 120 e 121 da Lei n.° 8.213/1991, com forma ressarcir a Previdência Social com os gastos no pagamento dos benefícios.
Dessa forma, com a tipificação do acidente do trabalho, seja pela emissão do comunicado de acidente do trabalho ou a partir do Nexo Técnico Epidemiológico Trabalhista, passam propagar diversos efeitos no mundo jurídico.
3.4 Garantias do Empregado com a Caracterização do Acidente do Trabalho:
A legislação previdenciária, trabalhista e civil confere ao empregado acidentado diversas garantias, as quais, em função dos consequentes prejuízos ao patrão, problematizam a caracterização voluntaria do acidente do trabalho, como já exposto.
Entretanto, nesse tópico cabe a abordagem, sem a intenção de esgotar o tema, de alguns benefícios concedidos ao empregado acidentado, conferidos pela legislação pátria. Ressalta-se que a responsabilização civil do empregador será mais bem especificada em item individualizado, considerando a sua grande importância.
Inicialmente, enfocando a legislação previdenciária, o óbito ou incapacidade do empregado ocasionado pelo acidente do trabalho gerará a concessão de benefícios junto ao Instituto Nacional de Seguro Social- INSS, quais sejam auxílio-doença acidentário, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez acidentária, pensão por morte e reabilitação profissional.
Atenta-se que por existir vinculação da enfermidade ou óbito com o acidente do trabalho, a Previdência Social não exigirá carência mínima para o segurado usufruir dos referidos benefícios (art. 26 da Lei n.° 8.213/1991). Ou seja, não será obrigatório um tempo mínimo de contribuições.
Infere-se que o auxílio-doença acidentário será devido ao segurado que estiver incapacitado temporariamente para o desempenho de sua atividade laboral por prazo superior a 15 dias (arts. 59 e 60 da Lei n.° 8.213/1991).
Entretanto, caso o abalo a saúde do trabalhador seja total e permanente, poderá ser-lhe concedido aposentadoria por invalidez (art. 42 da Lei n.° 8.213/1991), sendo, para tanto, proibido a concomitância do beneficio com a remuneração em qualquer atividade laboral.
Já o segurado que, em gozo de auxílio-doença, não tiver condições de retornar a sua atividade laboral, sendo sua incapacidade parcial e permanente, poderá ser incluso em programa de reabilitação profissional, a fim de facilitar a sua reinserção no mercado de trabalho (art. 89 da Lei n.° 8.213/1991) em ramo profissional adequado as suas limitações.
Salienta-se que o trabalhador, em função do acidente do trabalho, que apresentar lesões que resultem na redução de sua capacidade laborativa habitual, poderá perceber mensalmente, até a sua aposentadoria, auxílio-acidente (art. 86 da Lei n.° 8.213/1991). Nesse caso, o trabalhador poderá receber concomitantemente o beneficio previdenciário e os rendimentos de sua labor.
E, por fim, será concedida a pensão por morte, em conformidade com o art. 74 da Lei n.° 8.213/1991, quando ocorrer o óbito do segurado em virtude do acidente de trabalho, momento em que o beneficio será concedido aos dependentes habilitados.
Na esfera trabalhista, um dos principais efeitos da tipificação do acidente do trabalho é a estabilidade provisória prevista no art. 118 da Lei n.° 8.213/1991, como se verifica:
“Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente”.
Entretanto, o referido dispositivo legal deve ser interpretado em conformidade com a Súmula n.° 378 do Tribunal Superior do Trabalho:
“378 – Estabilidade provisória. Acidente do trabalho. art. 118 da Lei nº 8213/1991. Constitucionalidade. Pressupostos. (Conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 105 e 230 da SDI-1 – Res. 129/2005, DJ 20.04.2005)
I – É constitucional o artigo 118 da Lei nº 8.213/1991 que assegura o direito à estabilidade provisória por período de 12 meses após a cessação do auxílio-doença ao empregado acidentado. (ex-OJ nº 105 – Inserida em 01.10.1997)
II – São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superior a 15 dias e a conseqüente percepção do auxílio doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego.” (Primeira parte – ex-OJ nº 230 – Inserida em 20.06.2001)
Alerta-se que o acidente do trabalho somente gerará a estabilidade prevista no art. 118 da Lei n.° 8.213/1991 quando a incapacidade determinar o afastamento do funcionário pelo prazo superior a 15 dias.
Infere-se que durante o período de afastamento o empregador permanece obrigado a realizar os depósitos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, computo do tempo de afastamento para fins de indenização e estabilidade, assim como para aquisição de férias, desde que inferior a 6 meses.
“Para tanto, cumpre transcrever os ensinamentos de Mauricio Godinho Delgado:[…]
As regras especiais que distinguem o presente caso de suspensão contratual são:
a) Computa-se o período de afastamento em face de acidente do trabalho (ou doença ocupacional), para fins de indenização e estabilidade celetista (se aplicáveis as figuras) – parágrafo único do art. 4° da CLT. Note-se, de todo mundo, que esta ressalva praticamente não mais subsiste, no plano da realidade, já que a Carta de 1988 inviabilizou novas aquisições de indenizações e estabilidade celetistas no cenário do país (art. 7°, I, e art. 10, ADCT, CF/88, que revoga, tacitamente, os arts. 477 caput, e 492, da CLT).
b) Computa-se o período de afastamento para fins de depósitos de FGTS (art. 28, Decreto n,° 99.684/90 – Regulamento do FGTS […]). Os depósitos do FGTS, portanto, devem ser efetuados diretamente pelo empregador na respectiva conta vinculada obreira.
c) Computa-se período de afastamento previdenciário por acidente do trabalho ou por enfermidade – desde que inferior a 6 meses – para fins de período aquisitivo de férias do empregado ( art. 131, III, CLT). Aqui a lei não distingue a causa do afastamento previdenciário: qualquer doença (mesmo não profissional) enseja a exceção legal, favorecendo o obreiro com a contagem do tempo para fins de férias. […]” (DELGADO, 2007. P. 1073/1074)
Como relatado, o acidente de trabalho, caracterizado pelo NTEP ou pela CAT, gera diversas garantias ao empregado, que são desvantajosas ao empresário. Por isso é fácil entender o conflito de interesses existente sobre essa temática, ainda mais, após o enfoque da responsabilidade civil, próximo tópico a ser abordado.
4 Responsabilidade Civil do Empregador
4.1 Abordagem Inicial:
O infortúnio trabalhista, aqui considerada sob a sua definição mais ampla, incluindo as doenças ocupacionais, poderá acarretar prejuízos morais e materiais ao empregado, passiveis de indenização pelo empregador, quando comprovada violação ao direito da personalidade. Infere-se que a ação indenizatória, regida pelas normas de direito civil, poderá ser proposta, sem prejuízo dos benefícios acidentários concedidos pelo INSS.
Tal entendimento encontra-se sedimentado na Constituição Federal, art. 7°, XXVIII:
“Art. 7°- São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: […]
XXVIII- seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este esteja obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa; […]”
4.2 Danos Morais, Materiais e Estéticos:
Então, dano significa o prejuízo causado ao individuo que venha a acarretar-lhe lesão à bem jurídico tutelado, podendo ser de natureza moral e material.
Por sua vez, o dano moral constitui-se na lesão em direitos extrapatrimoniais, tais como a honra, a dignidade, a imagem e a intimidade, que ocasione dor e sofrimento ao indivíduo. Da mesma forma, o dano estético caracteriza-se na lesão a imagem fisicamente materializada. Por exemplo, uma grande cicatriz causada pelo acidente do trabalho.
Em contrapartida, o dano material é aquele em que houve a violação de direitos patrimoniais. Nesse ponto, analisa-se sobre dois aspectos, o que efetivamente se perdeu (dano emergente) e o que deixou de ganhar com a perda inicial (lucros cessantes).
O doutrinador Maurício Godinho Delgado integra, com propriedade, a temática do acidente do trabalho com os seus possíveis danos, como se verifica:
“As distintas lesões acidentárias podem se traduzir em deteriorações físico-mentais do individuo em decorrência do ambiente laborativo ou da forma de postura durante o cumprimento da prestação de serviços (doenças profissionais, especificadamente). Podem ainda tais lesões resultar de acidente do trabalho, que se traduz em fato ou ato unitário, regra geral, ou pelo menos concentrado no tempo, que produz significativa agressão à higidez físico-mental do trabalhador.
As lesões acidentárias podem causar perdas patrimoniais significativas ao trabalhador. Em primeiro lugar, o tocante aos próprios gastos implementados para sua recuperação (além daqueles previdenciariamente acobertados, se for o caso). E, segundo lugar, podem produzir restrição relevante ou, até mesmo, inviabilização da atividade laborativa do empregado, conforme gravidade da lesão sofrida. […]
As lesões acidentárias também podem causar dano moral ao trabalhador. Este, como visto, consiste em toda dor física ou psicológica injustamente provocada em uma pessoa humana. Neste quadro a doença ocupacional, a doença profissional e o acidente do trabalho podem, segundo a sua gravidade, provocar substanciais dores físicas e psicológicas no individuo, com intensidade imediata ou até mesmo permanente, ensejando a possibilidade jurídica de reparação.[…]
As lesões acidentárias também podem causar dano estético à pessoa humana atingida. A indenização caberá, segundo Sebastião Geraldo de Oliveira,no caso de a lesão comprometer “a harmonia física da vitima”. Esclarece o autor que não se está diante, rigorosamente, “de um terceiro gênero de danos, mas de uma especificidade destacada do dano moral”. […] (DELGADO, 2007, p. 616/618).
Apesar da discussão sobre o dano estético compor o dano moral, o Supremo Tribunal de Justiça, através da Súmula n.° 387 pacificou o assunto dizendo que “É lícita à cumulação das indenizações de dano estético e moral”.
Para tanto, conhecidos os tipos de danos amparados pelo direito civil, assim como a sua relação com o acidente do trabalho, passa-se a debater a responsabilização do empregador propriamente dita.
4.3 Responsabilização:
Ocorrido o acidente do trabalho ou doença ocupacional, caracterizada pela CAT ou pelo NTEP, que causou significativo dano ao funcionário, poderá existir o dever de indenização pelo empregador.
Inicia-se a abordagem do tema citando os arts. 186 e 927 do Código Civil:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
Desses dispositivos legais, conclui-se que a responsabilização civil, em regra, exige a presença da ação ou omissão do agente (dolosa ou culposa), o dano (moral, material e/ou estético) e o nexo causal existente entre ambos (arts. 186 e 927 “caput” do Código Civil). Nesse caso, diz-se a aplicação da responsabilidade civil subjetiva, ou seja, haverá a necessidade de comprovação do dolo ou culpa do agente causador do prejuízo.
Contudo, a legislação, no art. 927, parágrafo único do Código Civil, excepcionou a regra supra para os casos em que atividade seja de risco, dizendo que haverá o dever de indenizar mesmo que o agente não tenha agido com dolo ou culpa. Nessa hipótese se estará frente à responsabilidade civil objetiva, ou seja, independentemente da comprovação do dolo ou culpa do agente que causou o dano, haverá o dever de indenizar.
No que tange a responsabilidade objetiva, assevera-se que haverá situações em que inexistirá o dever de indenizar, quais sejam a culpa exclusiva da vitima, o fato de terceiro, o caso fortuito e a força maior (VENOSA, 2004, p. 46).
No âmbito do direito do trabalho, mais precisamente nos acidentes do trabalho, em função do risco natural do empreendimento aplica-se a responsabilidade objetiva, conforme entendimento que se consolida na doutrina:
“Com os avanços produzidos pela Carta Magna, a reflexão jurídica tem manifestado esforços dirigidos a certa objetivação da responsabilidade empresarial por danos acidentários. Tal tendência à objetivação, evidentemente, não ocorre no campo dos danos morais e à imagem que não tenham relação com a infortunística do trabalho. De fato, essencialmente na seara da infortunística é que as atividades laborativas e o próprio ambiente de trabalho tendem a criar para o obreiro, regra geral, risco de lesões mais acentuado do que o percebido na generalidade de situações normalmente vivenciadas pelo individuo na sociedade.” (DELGADO, 2007, p. 621).
“A teoria do risco surgiu durante a crise do modelo de estado liberal em que a liberdade e a autonomia eram enfocados primordialmente sob um aspecto formal. Os próprios acidentes de trabalhos demonstraram que a liberdade e a autonomia não podem ser efetivamente exercidas apenas a partir de garantias formais. A razão de se condenar o empregador era o reconhecimento de um desnível material entre os envolvidos. O alargamento dos pressupostos visou sobretudo a resguardar a dignidade dos trabalhadores sob um ponto de vista substancial.
A adoção da teoria do risco, portanto, mostra-se como forma de possibilitar a distribuição equânime dos ônus sociais. A teoria do risco apresenta variantes conforme critérios orientadores da eqüidade, assim se fala em risco proveito, em risco criado, em risco da empresa, em risco profissional, etc. qualquer que sejam esses critérios de atribuição de riscos, todos eles exigem a assunção voluntária da atividade que potencialmente pode gerar o risco e os danos dela decorrentes. Como Josserand já afirmava, não se trata de atribuir a alguém a responsabilidade por todos os riscos da humanidade, mas somente o risco que a pessoa criou, ou do qual ela retira benefícios, bem como os inerentes ao empreendimento ou ao exercício da profissão.” (Apelação Cível Nº 70022253728, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 24/06/2009).
Pelo exposto, chega-se ao ponto de destaque no presente trabalho. Nota-se que os empregadores terão o dever de indenizar seus funcionários acidentados no trabalho ou que contraíram doenças ocupacionais independentemente de concorrem com dolo ou culpa.
Sobre esse aspecto ressalta-se a importância do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário- NTEP, inovação trazida pela Lei n.° 11.430/2006, que permitiu ao perito da Previdência Social, de acordo com o tipo de enfermidade, atividade laboral e dados coletivos, concluir pelo acidente do trabalho.
Tal situação ganhou relevância na esfera trabalhista quando o Tribunal Superior do Trabalho, através da Súmula n.° 42 que entendeu que o NTEP faz presunção relativa do acidente do trabalho. Situação que determina, em regra, ao empregador o dever de indenizar o trabalhador, sem a perquirição de culpa ou dolo, pelos danos, quais sejam morais, materiais e estéticos.
A dimensão utilizada pela legislação e pelo entendimento dos Tribunais Superiores mostra-se adequada frente à hiposuficiência do empregado acidentado, entretanto essas medidas devem ser analisadas com cautela pelo Magistrado, pois, caso contrário, se poderá estar cometendo injustiças, que poderão determinar a extinção financeira de uma empresa.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O direito do trabalho, por sua própria natureza jurídica, sempre está envolvido em grandes discussões, vez que organiza a relação capital x trabalho.
No que tange aos acidentes do trabalho, tal situação não foge a regra, sendo esse um dos pontos mais discutidos pelos operadores do direito nas esferas do Poder Judiciário.
A Lei n.° 8.213/1991 inovou em diversos aspectos sobre a temática dos acidentes do trabalho, momento em que os definiu e equiparou diversas situações, que a principio não teriam vinculação com a atividade laboral como causa principal.
Ressalta-se que essa norma, após alteração da Lei n.° 11.430/2006, criou o Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário- NTEP, como uma das formas de caracterização do acidente do trabalho. Ou seja, o perito do INSS poderá caracterizar o acidente do trabalho a partir da enfermidade apresentada pelo empregado, assim como pela sua vinculação com sua atividade profissional e com os dados médicos da coletividade. Para tanto, verifica-se que o NTEP ganha importância frente às doenças ocupacionais, ou melhor, aquelas contraídas em função do desempenho da atividade laboral.
A partir dessa abordagem, a Súmula n.° 42 do Tribunal Superior do Trabalho entendeu que o NTEP faz presunção relativa do acidente do trabalho. Situação que destaca a importância do NTEP, considerando os diversos benefícios legais concedidos ao empregado acidentado, tais como manutenção dos depósitos na conta do FGTS durante o período de afastamento em auxílio doença e o direito a reparação pelos danos causados pelo acidente ou doença ocupacional.
Sobre essa última garantia encontra-se a maior polemica, pois a regra geral de responsabilização civil é a necessidade de perquirição de culpa ou dolo na atividade que gerou o dano (responsabilidade subjetiva), tendo como exceção as atividades de risco em que inexistirá a obrigação de comprovar a motivação culposa ou dolosa (responsabilidade objetiva).
Pois bem, no âmbito do acidente do trabalho (ou doença ocupacional), consolidou-se entendimento que permite a aplicação da responsabilidade objetiva, considerando a existência do risco profissional assumido pelo empresário no momento da contratação dos funcionários.
Observa-se que como forma de defesa o empregador poderá alegar, apenas, a culpa exclusiva da vitima, o fato de terceiro, o caso fortuito ou a força maior. Alerta-se que inexistirá a busca da existência da culpa ou dolo do empresário.
Por certo, tal amparo legislativo e jurisprudencial é bastante válido, tendo em vista a situação de desvantagem do empregado acidentado, entretanto esse entendimento deve ser aplicado com cautela, sob pena de inviabilizar o exercício da atividade empresarial de determinados seguimentos.
Advogada, Especialista em Direito Tributário UNISUL/LFG, Especializanda em Direito e Processo do Trabalho UNIDERP/LFG.
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