Resumo: Bem jurídico ambiental, a água desempenha papel fundamental para a manutenção de vida no planeta. Portanto, a qualidade da porção hídrica servível as do ecossistema constitui condição sine qua non para que seja resguardado, materialmente, o direito fundamental constitucional a saúde humana. Assim, torna-se imperativo o cumprimento das exigências contidas na lei de saneamento básico para evitar a mortalidade humana provocada pela poluição hídrica.
Palavras-chave: Água. Saúde. Legislação.
Sumário: 1. Introdução. 2. Água: conceito, aspectos históricos e jurídicos. 3. Lei do saneamento básico e saúde humana. 4. Água e saúde humana. 5. Considerações finais. Referências.
1 INTRODUÇÃO
A água, além de atender às necessidade biológicas da humanidade, constitui um bem essencial para a satisfação das necessidades sociais e econômicas das civilizações, cuja qualidade e potabilidade são fatores determinantes para a saúde humana.
Ao longo dos anos, a água foi considerada um recurso ilimitado, inesgotável, apto a saciar as variadas necessidades sociais não havendo maiores preocupações da sociedade e do Estado na preservação deste recurso natural da maior relevância.
Foi este tipo de pensamento que levou as grandes massas de água à situação corrente de poluição, escassez quanti-qualitativa, conflitos pelo seu uso, além de formação e expansão de doenças de veiculação hídrica, implicando prejudicialidade à saúde humana.
Objetiva-se estabelecer a relação entre a preservação da qualidade da água e a promoção da saúde humana, demonstrando-se que a degradação hídrica interfere diretamente na saúde humana elevando a ocorrência de doenças e de letalidade.
Esta pesquisa é do tipo exploratória quanto ao seu objetivo e bibliográfica quanto aos seus procedimentos técnicos.
De acordo com Gil (2002), a pesquisa exploratória tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito. Ainda para o mesmo autor a pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos.
2 ÁGUA: CONCEITO, ASPECTOS HISTÓRICOS E JURÍDICOS
O cenário de escassez e degradação em que se encontra a água doce, nas últimas décadas, suscitou a preocupação de órgãos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU), órgãos nacionais, como o Ministério da Saúde (MS) com a proteção e preservação dos recursos hídricos.
Em 22 de março de 1992 a ONU instituiu o Dia Mundial da Água, publicando o documento intitulado “Declaração Universal dos Direitos da Água” que preconiza:
“1. A água faz parte do patrimônio do planeta. Cada continente, cada povo, cada nação, cada região, cada cidade, cada cidadão é plenamente responsável aos olhos de todos. 2. A água é a seiva de nosso planeta. Ela é condição essencial de vida de todo vegetal, animal ou ser humano. Sem ela, não poderíamos conceber como são a atmosfera, o clima, a vegetação, a cultura ou a agricultura. 3. Os recursos naturais de transformação da água em água potável são lentos, frágeis e muito limitados. Assim sendo, a água deve ser manipulada com racionalidade, precaução e parcimônia. 4. O equilíbrio e o futuro de nosso planeta dependem da preservação da água e de seus ciclos. Estes devem permanecer intactos e funcionando normalmente para garantir a continuidade da vida sobre a Terra. Esse equilíbrio depende em particular da preservação dos mares e oceanos, por onde os ciclos começam. 5. A água não é somente herança de nossos predecessores; ela é, sobretudo, um empréstimo aos nossos sucessores. Sua proteção constitui uma necessidade vital, assim como a obrigação moral do homem para com as gerações presentes e futuras. 6. A água não é uma doação gratuita da natureza; ela tem um valor econômico: precisa-se saber que ela é, algumas vezes, rara e dispendiosa e que pode muito bem escassear em qualquer região do mundo. 7. A água não deve ser desperdiçada nem poluída, nem envenenada. De maneira geral, sua utilização deve ser feita com consciência e discernimento para que não se chegue a uma situação de esgotamento ou de deterioração da qualidade das reservas atualmente disponíveis. 8. A utilização da água implica respeito à lei. Sua proteção constitui uma obrigação jurídica para todo homem ou grupo social que a utiliza. Essa questão não deve ser ignorada nem pelo homem nem pelo Estado. 9. A gestão da água impõe um equilíbrio entre os imperativos de sua proteção e as necessidades de ordem econômica, sanitária e social. 10. O planejamento da gestão da água deve levar em conta a solidariedade e o consenso em razão de sua distribuição desigual sobre a Terra.”
A Portaria 518, art. 4º, I, do MS define água potável como a “água para consumo humano cujos parâmetros microbiológicos, físicos, químicos e radioativos atendam ao padrão de potabilidade e que não ofereça riscos à saúde”.
Em virtude de uma mudança de paradigma em que a água não mais é considerada um recurso abundante e ilimitado, a Lei nº 9.433/97, estabelece alguns fundamentos: a água é um bem de domínio público, indicando a publicização deste recurso e afastando a possibilidade do domínio privado do mesmo; a água é um recurso natural limitado dotado de valor econômico, apontando para a necessidade de preservação e racionalização no uso da água; a gestão hídrica deve proporcionar o uso múltiplo da água, a fim de incentivar uma maior variabilidade no número de consumidores e de formas de exploração, dentre outros.
No que concerne à distribuição da água na terra, tem-se que somente 2,5% da água é doce, porém 68,7% deste total encontram-se em locais de difícil acesso e extração e os 30, 3% restantes localizam-se no subsolo, rios, pântanos. Assim, apenas 0,002% do total da água doce pode ser utilizada para consumo humano e animal. E deste total 97% estão armazenados em fontes subterrâneas (RIBEIRO, 2008, p. 26).
As águas doces superficiais situadas em lagos, rios e barragens, possíveis ao consumo humano, vêm sofrendo os efeitos da degradação ambiental, todavia, a água faz parte do meio ambiente e, assim, requer sua conservação e bom uso para garantir da vida no planeta.
Entretanto, as diversas atividades hídricas, tais como agricultura, pelo uso de agrotóxicos; a irrigação; a indústria pelo despejo do rejeito industrial com elevada carga de poluentes químicos; o lixo e o esgoto doméstico, bem como o hospitalar; as atividades de lazer; a irregularidade das construções urbanas; a falta de políticas públicas, tais como de saneamento básico contribuem de forma decisiva para a poluição da água doce potável e, por conseqüência, influenciam na veiculação de variadas doenças hídricas.
Nos países em desenvolvimento são poucas as cidades que contam com estações de tratamento para os esgotos domésticos, agrícolas e industriais, incluindo os agrotóxicos (PORTAL SÃO FRANCISCO, 2008).
Ressalte-se que nesta pesquisa será enfatizada a falta do saneamento básico como fator fundamental na perturbação da saúde humana.
3 LEI DO SANEAMENTO BÁSICO E SAÚDE HUMANA
O saneamento básico é um dos principais indicadores da qualidade de vida e do desenvolvimento econômico e social de uma cidade.
Segundo a OMS, saneamento básico é “o gerenciamento ou controle dos fatores físicos que podem exercer efeitos nocivos ao homem, prejudicando seu bem-estar físico, mental e social” (PHILIPPI Jr, 2004).
Outra definição é a trazida pela Lei Ordinária n.º 11.445 de 05 de janeiro de 2007, cognominada Lei do Saneamento Básico, que estabelece as diretrizes básicas nacionais para o saneamento e o define como o “conjunto de serviços, infra-estruturas e instalações operacionais de: abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza urbana, manejo de resíduos sólidos e drenagem e manejo das águas pluviais”.
O saneamento básico está intimamente relacionado às condições de saúde da população e mais do que simplesmente garantir acesso aos serviços, instalações ou estruturas que citam a lei, envolvem, também, medidas de educação da população em geral e conservação ambiental (FARIA, 2008).
Assim, dispõe a Constituição Federal (CF) de 1988 “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
No tocante ao histórico do saneamento básico, a preocupação com o saneamento básico é algo que vem desde a antiguidade quando do surgimento e expansão das primeiras cidades. O primeiro aqueduto de que se tem notícia foi construído em 691 a.C., na Assíria. Entretanto, por muito tempo, os conhecimentos que eram adquiridos por uma civilização acabavam morrendo com ela e, por isso, a cada nova civilização os conhecimentos tinham de ser redescobertos (FARIA, 2008).
De acordo com o site da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), em artigo publicado sobre a História do Esgotamento Sanitário, as décadas de 1830 e 1840 podem ser destacadas como as mais importantes na história científica da engenharia Sanitária, vez que a epidemia de cólera de 1831/32 despertou a preocupação com o saneamento das cidades inglesas, pois ficou evidenciado que a doença era mais intensa em áreas urbanas carentes de saneamento efetivo poluídas por excrementos e lixo, além de mostrar que as doenças não se limitavam às classes mais baixas.
Segundo o conceito de Promoção de Saúde proposto pela OMS desde a Conferência de Ottawa, Japão, em 1986, um dos fatores mais importantes da saúde são as condições ambientais. O que abrange o lugar, ou meio em que se vive que, quando insalubre pode ocasionar e transmitir várias doenças e, também, as condições do meio ambiente em que a pessoa está inserida, pois a qualidade do ar, da água e do solo também são fatores determinantes para saúde das pessoas. Basta citar como exemplo as doenças respiratórias causadas pela poluição das grandes cidades (FARIA, 2008).
Atualmente o benefício mais difundido do saneamento básico tem a ver com sua característica de prevenção. Estudos comprovam que para, aproximadamente, cada 1 real investido em saneamento básico têm-se uma economia de 4 reais com assistência médica. É que com o acesso a água potável e condições mínimas de higiene, inúmeras doenças podem ser evitadas, dispensando o tratamento e todos os custos advindos dele (FARIA, 2008).
Este défict no Brasil e no mundo inspirou a ONU a instituir o ano de 2008 como o Ano Internacional do Saneamento Básico, frente aos desafios históricos que ainda se apresentam. O investimento em ações na área é menos oneroso do que tratar doenças provocadas pela ausência de esgotos e de água tratada (PALÁCIO et al, 2008).
Corrobora com este entendimento Novaes apud Palácio et al (2008) que afirma “Investir em saneamento é mais barato do que tratar doença. No entanto, no Brasil, prevalece a política de medicalizar, de forma paliativa, problemas estruturais graves”, levando-se em consideração que as obras de saneamento básico não dão tanta visibilidade à gestão, além do que a sociedade não incorpora a relação entre saneamento e doenças. Ou seja, medidas estruturantes de promoção à saúde, como o saneamento, são desvinculadas de doenças e tratamento.
A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) 2000, feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com a Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano da Presidência da República (SEDU/PR), com a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) e com a Caixa Econômica Federal, revela que 97,9% dos municípios brasileiros têm serviço de abastecimento de água; 78,6% têm serviço de drenagem urbana; 99,4% têm coleta de lixo, todavia o serviço de esgotamento sanitário ainda é o que apresenta a menor taxa, sendo oferecido em 52,2% dos municípios brasileiros (IBGE, 2002).
No cenário internacional, dados preliminares do segundo relatório da ONU sobre o recursos hídricos no mundo apontam que aproximadamente 2,4 bilhões de pessoas não têm condições básicas de saneamento, o que multiplica o número de mortes por diarréia e malária. Estes dados alertam que a precariedade do saneamento reflete na situação da saúde global. Segundo a United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO), enfermidades relacionadas à diarréia e à malária foram, em 2002, a causa da morte de mais de 3 milhões de pessoas, sendo que 90% eram crianças com menos de cinco anos. “Aproximadamente 1,6 milhão de vidas poderiam ser salvas anualmente com o fornecimento de água potável, saneamento básico e higiene”, destaca a UNESCO (PNUD, 2006).
4 ÁGUA E SAÚDE HUMANA
A saúde deve ser vista como um recurso para a vida e não como objetivo de viver (PHILIPPI Jr, MALHEIROS, 2004), levando-se em consideração que a saúde abarca o bem-estar físico, mental e social, além da ausência de doenças.
Assim, conforme os autores acima mencionados, a OMS define a saúde pública como “a ciência e a arte de promover, proteger e recuperar a saúde, por meio de medidas de alcance coletivo e de motivação da população” Esta definição considera como objetivo da saúde a melhoria da qualidade de vida da população, tendo em vista aspectos como cidadania, educação ambiental, fatores socioculturais, ambientais e econômicos.
A CF/88 reconhece a saúde como um direito fundamental social e assim estabelece “Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” [grifos nossos].
Compreendem ações de saúde pública, a medicina preventiva e social e as atividades de saneamento do meio, para conservar e melhorar a qualidade de vida do homem doente, mas também do homem são e investigar as causas das doenças no meio ambiente que o cercam (PHILIPPI Jr., 1998 apud PHILIPPI Jr., 2004).
Conforme o Relatório de Gestão dos Problemas da Poluição no Brasil, um dos problemas de poluição mais alarmante é o agravo à saúde em decorrência da falta do abastecimento de água potável e da falta de esgotamento sanitário (JORNAL DA CIÊNCIA, 2002).
Assim, apesar de ser uma substância vital para a saúde humana, a água, contaminada e de baixa qualidade, também debilita as pessoas, produz doenças por vários mecanismos e aumenta a mortalidade (TUNDISI; TUNDISI, 2008, p. 535).
A melhor qualidade da água e das condições de saneamento ajudaria a reduzir os percentuais de transmissão da malária e da esquistossomose (JORNAL DA CIÊNCIA, 2002).
De todos os males ambientais, a contaminação das águas é o que apresenta conseqüências mais devastadoras. Um terço da humanidade vive em estado contínuo de doença ou debilidade como resultado da impureza das águas, o outro terço está ameaçado pelo lançamento de substâncias químicas na água, cujos efeitos a longo prazo são desconhecidos (PORTAL SÃO FRANCISCO, 2008).
O problema da falta ou deficiência no sistema de saneamento básico, no que envolve acesso a água potável e esgotamento sanitário, reflete a existência e/ou proliferação de doenças associadas com a água, que, pela poluição, fica contaminada.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Verificou-se que a água representa este paradoxo em que provê a vida, todavia, estando contaminada e de má qualidade causa debilidade e morte.
Assim, urge-se como necessária a adoção de políticas públicas de saneamento básico e educação ambiental e de saúde por parte do Estado e das Comunidades Internacionais para salvaguardar o direito à saúde consagrado nos artigos 6º e 225 da CF/88 e nos documentos da ONU e da OMS.
Aliado a esta ação estatal e internacional, faz-se imprescindível uma conscientização da população no sentido de colaborar para promoção da sua própria saúde através do cumprimento dos requisitos exigidos pela Administração Pública.
Doutor em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB. Graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. Professor Adjunto II da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG, no Curso de Bacharelado em Direito do Centro de Ciências Jurídicas e Sociais. Professor e Orientador do Mestrado e Doutorado em Recursos Naturais da UFCG/PPGRN e de Especialização em Direito do CCJS/UFCG. Autor dos livros: Direito Constitucional: uma abordagem histórico-crítica; Direito Ambiental: em busca da sustentabilidade. Introdução ao Direito Ambiental. Introdução ao Estudo do Direito. História Ambiental e Direito Ambiental: diálogos possíveis. Direito Ambiental e dos Recursos Naturais: biodiversidade, petróleo e águas (no prelo). Capítulo do livro – Trabalhador Rural, intitulado: O Trabalhador Rural na Região Nordeste. Capítulo do livro – Água Doce: Direito Fundamental da Pessoa Humana. Experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Constitucional, Direito Ambiental, Direito Econômico, Direito de Águas.
Mestranda em Recursos Naturais pela UFCG/CTRN/PPGRN; Estágio Docência em Legislação Ambiental pela UFCG/CTRN; Bacharel em Direito pela UFCG/CCJS; Bolsista CAPES/UFCG
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