Resumo: O presente trabalho possui o intuito de analisar os meios disponíveis às autoridades públicas e mesmo aos particulares para a persecução criminal. Para tanto, o presente artigo foi dividido em duas partes, sendo que a primeira possui o intuito de estabelecer a definição, características e procedimentos do inquérito policial e, numa segunda parte, analisou-se o especificamente o instituto da interceptação telefônica.
Palavras-chave: Investigação criminal. Inquérito policial. Interceptação telefônica.
Abstract: This work aims to analyze the means available to public authorities and even to individuals for criminal prosecution. Therefore, this article is divided into two parts, the first of which has the aim of establishing the definition, characteristics and procedures of the police investigation and, in a second part, we analyzed the specific interception of the institute.
Keywords: Criminal investigation. Police investigation. Interception.
1 INTRODUÇÃO
A persecução penal é dever do Estado. Praticada a infração penal, cumpre a ele, o Estado, a apuração e o esclarecimento dos fatos e de todas as suas circunstâncias.
Para tanto, a lei defere a determinados órgãos, responsáveis pela segurança pública, a competência para a investigação da existência dos crimes comuns, em geral, e da respectiva autoria, conferindo meios para tal investigação.
2 Investigação criminal
A fase de investigação, em regra promovida pela polícia judiciária, tem natureza administrativa, sendo realizada anteriormente à provocação da jurisdição penal. Trata-se de procedimento voltado ao esclarecimento do caso penal, destinado à formação do convencimento do responsável pela acusação. O magistrado, nesta fase, deve permanecer absolutamente alheio à qualidade da prova em curso, somente intervindo para tutelar violações ou ameaça de lesões a direitos e garantias individuais das partes, ou para resguardar a efetividade da função jurisdicional.
A formação do convencimento do encarregado da acusação pode decorrer também de atividades desenvolvidas em procedimentos administrativos conduzidos por outras autoridades administrativas e até mesmo por atuação de particulares, estes através de encaminhamento de documentação ou informações suficientes à formação do convencimento do órgão acusador.
Como regra, a iniciativa da ação penal a cargo do Estado, nos crimes comuns, é atribuída a órgãos estatais, sendo o principal condutor a Polícia Judiciária, cabendo a esta o esclarecimento das infrações penais.
O inquérito policial, atividade específica da polícia denominada judiciária tem por objetivo a apuração das infrações penais e de sua autoria.
Tratando-se de ação penal pública, a processualização da persecução penal é monopolizada, o inquérito policial deve ser instaurado de ofício pela autoridade policial, a partir do conhecimento da existências do cometimento do fato delituoso. A notícia do crime pode ser oferecida por qualquer pessoa do povo e a partir do conhecimento pessoal do fato pela autoridade policial. Ressalte-se que a Constituição Federal veda o anonimato, impossibilitando a notícia do crime anônima ou apócrifa, salvo quando o documento em questão tiver sido produzido pelo acusado ou constituir o próprio corpo de delito.
Tratando-se de ação pública condicionada à manifestação do interessado, ou, ainda, requisição do Ministro da Justiça, o inquérito policial somente poderá ser instaurado a partir de requerimento ou requisição do respectivo interessado, nos termos do § 4º do artigo 5º do Código de Processo Penal.
Caso o requerimento do ofendido ou de seu representante não apresentar conjunto indiciário mínimo à abertura das investigações, ou quando o fato não ostentar contornos de criminalidade, a autoridade policial poderá recusar a instauração do inquérito.
As provas obtidas são destinadas ao convencimento do órgão judiciário.
2.1 Meio de prova e meio de obtenção de prova
Os meios de prova referem-se a uma atividade endoprocessual que se desenvolve perante o juiz com a participação das partes.
Os meios para a obtenção de prova são os meios de investigação, que são certos procedimentos regulados pela lei, em regra extraprocessuais, com o objetivo de conseguir provas materiais, que podem ser realizados por outros indivíduos, que não o juiz.
A interceptação telefônica, objeto do presente trabalho, classifica-se como meio para obtenção de prova.
3 Interceptação telefônica – Lei nº 9.296/96
Nos termos do inciso XII, parte final, do art. 5° da Constituição Federal, “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.
A Lei nº 9.296/96 regulamentou o citado inciso estabelecendo critérios e limites para a interceptação telefônica no Brasil.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus nº 73.351-SP, de 10 de maio de 1996, que o preceito constitucional não seria auto-aplicável, sendo qualquer interceptação telefônica válida somente após a edição da Lei nº 9.296/96.
Salienta-se que, antes da Constituição Federal de 1988, existia uma grande polêmica sobre a possibilidade da interceptação telefônica, haja vista que a Constituição de 1969 declarava ser inviolável tanto o sigilo da correspondência quanto o sigilo das comunicações telegráficas, abstendo-se de tocar no assunto das comunicações telefônicas. Vigorava o inciso II do artigo 57 da Lei nº 4.117/62, que estabelecia como não sendo violação de comunicação o conhecimento dado ao juiz competente, mediante requisição ou intimação deste, sendo que o Supremo Tribunal Federal entendeu que este inciso não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, por ser o inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal norma de eficácia limitada.
Na interceptação telefônica o contraditório é diferido, correndo a mesma em autos apartados, sendo que a parte somente toma ciência após o ato.
Tem natureza jurídica de medida cautelar preparatória quando decretada na fase de investigação e de medida cautelar incidental quando decretada na fase processual.
Necessário se destacar que, nos termos do artigo 1º da Lei nº 9.296/96, os casos de interceptação telefônica também se aplicam aos casos de interceptação do fluxo de comunicações em sistema de informática e telemática.
3.1 Escuta telefônica, escuta ambiental, interceptação ambiental, gravações clandestinas e interceptação telefônica em sentido estrito
A escuta telefônica ocorre quando um terceiro capta a conversa com o consentimento de apenas um dos interlocutores. Esta espécie não abarca a gravação de comunicação telefônica feita por um dos interlocutores, uma vez que essa conduta não é considerada como interceptação telefônica e sim uma gravação clandestina de conversa telefônica própria.
A escuta ambiental é a interceptação de conversa entre presentes, realizada por terceiros, feita com o conhecimento de alguns, ou pelo menos de um dos interlocutores. Por sua vez, a interceptação ambiental é a captação de conversa entre presentes feita por terceiro dentro do ambiente em que se situam os interlocutores, mas sem o conhecimento destes.
A interceptação telefônica em sentido estrito deve ser entendida como a captação de uma comunicação feita por um terceiro, sem o conhecimento dos interlocutores.
Segundo o Supremo Tribunal Federal somente a interceptação telefônica e a escuta telefônica é que necessitam de autorização judicial.
A gravação de conversa informal entre o criminoso e os policiais é prova ilegal, pois é modalidade de interrogatório sub-reptício, ou seja, ilegal. A gravação ambiental, feita pela polícia, no caso de crime organizado, é válida.
Salienta-se, ainda, que a gravação de conversa reservada de cliente e advogado é ilícita. Caso o advogado for o próprio investigado ou acusado, aí sim poderá sofrer interceptação telefônica, pois aí não é caso de sigilo profissional.
Importante destacar, ainda, que a quebra do sigilo dos dados telefônicos é válida e não se submete à Lei nº 9.296/96, pois é solicitação feita à empresa telefônica para que esta forneça as ligações efetuadas e recebidas. Além disso, é lícita a identificação dos últimos números gravados no celular, não se trata de quebra de sigilo.
3.2 Requisitos para a interceptação
a. Ordem judicial: é necessário o acionamento do Poder Judiciário, seja por parte do Ministério Público ou por parte da autoridade policial. Nos termos do artigo 3º da Lei nº 9.296/96, poderá também ser decretada de ofício pelo juiz.
Anote-se que essa autorização judicial poderá ser dispensada nos casos constitucionalmente previstos, ou seja: estado de defesa (artigo 136, § 1º) e estado de sítio (artigo 139, III).
O juiz que determinar a quebra do sigilo telefônico será também o competente para julgar a ação principal. Caso houver declinação da competência, a interceptação autorizada pelo juiz anterior é válida.
Observa-se que Comissão Parlamentar de Inquérito não tem poderes para decretar interceptação telefônica, é caso de reserva jurisdicional em que somente o Poder Judiciário tem tais poderes.
Se for negada a interceptação na fase processual, a medida cabível é o mandado de segurança, impetrado pelo Ministério Público. É uma das hipóteses de mandado de segurança cabível contra ato de juiz penal.
Contra a decisão que decreta cabe habeas corpus.
b. Para fins de investigação criminal ou instrução processual penal: o pedido de interceptação só poderá ser deferido pelo juiz se for para servir de base em uma investigação criminal ou em um processo penal, podendo ser iniciada inclusive antes da instauração do Inquérito Policial.
Deverá haver indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal: pelo disposto no inciso I do artigo 2º da Lei nº 9.296/96, não se exige prova plena para que seja deferido o pedido da interceptação. Faz-se necessário que haja o suficiente juízo de probabilidade, isto é, fumus boni iuris, tendo em vista o princípio do in dubio pro societate.
c. Crime punido com reclusão. Observa-se que o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça admitem a interceptação telefônica no caso de crimes punidos com detenção, desde que seja conexo com crime punido com reclusão para o qual foi solicitada a interceptação.
d. Único meio de produzir a prova: como se trata de medida excepcional, a quebra do sigilo telefônico só pode ser deferida quando a prova não puder ser obtida por outros meios, cabendo ao juiz, no caso concreto, decidir se existem ou não alternativas menos lesivas ao indivíduo.
A interceptação que não atender aos requisitos legais deve ser excluída do processo e anulará todo o processo se for a única prova da materialidade e autoria.
3.3 Prazo
O prazo para a execução da interceptação é de no máximo quinze dias, podendo ser prorrogado se, novamente, comprovado a indispensabilidade do meio de prova. A lei não limita o número de prorrogações possíveis e o Supremo Tribunal Federal entende poder ocorrer quantas prorrogações forem necessárias.
4 CONCLUSÃO
À guisa de conclusão, entende-se que devido ao aumento da complexidade das relações e conflitos sociais discute-se até onde o Estado pode adentrar com sua atividade investigatória para a aplicação da norma penal. Atualmente existe uma forte inclinação a restringir direitos e garantias fundamentais, posto que são vistos como obstáculos ao efetivo combate da criminalidade.
A segurança pública é um bem protegido pela Constituição Federal e constitui um direito fundamental da pessoa, sendo um bem digno de proteção diante de um conflito com outros bens ou direitos constitucionalmente protegidos, tendo a Lei nº 9.296/96 regulamentado os mecanismos para proteção de tal bem.
Diante do caso concreto, onde a produção da prova viola o direito fundamental de uma terceira pessoa, caberá ao Poder Judiciário, por estar diante de uma colisão real de direitos proceder à ponderação de interesses, verificando qual dos bens tutelados possui maior relevância.
Salienta-se que a interceptação das comunicações telefônicas tornou-se um dos mais eficazes meios probatórios, principalmente para os crimes que não deixam vestígios materiais.
“o processo penal brasileiro vem sofrendo diversas alterações legislativas e seguindo passo a passo a uma evolução que beneficia todo o sistema penal e processual penal, sendo uma dessas evoluções a utilização de videoconferência, que como exposto, traz diversos benefícios à eficiência, economia e celeridade do sistema judiciário penal.”
Procurador Federal na Procuradoria Secional Federal em Uberlândia/MG; Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia/MG; Pós graduando em Direito Previdenciário pelo Instituto Renato Saraiva e em Direito Público pela Universidade Federal de Uberlândia/MG
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