Meios pacíficos de solucionar conflitos internacionais

Meios pacícos de solucionar conflitos internacionais

A ocorrência de conflitos internacionais traz a necessidade de se estabelecer instrumentos regulados pelo Direito Internacional para uma solução pacifica, a fim de que os países envolvidos não recorram a artimanhas ilegítimas para tal. [1]

Existem, diversos modos de disciplinar pacificamente às relações entre os envolvidos em controvérsias no cenário mundial, são estes os modos jurisdicionais, e os não jurisdicionais. [2]

Não há hierarquia entre eles e cabem as partes escolhê-los, segundo os seus critérios de avaliação e a situação de fato e de direito envolvida.

Dentre os modos não jurisdicionais de solução pacifica de conflitos encontram-se os Meios Diplomáticos e Políticos, nestes falta a norma jurídica cogente a ser aplicada. Portanto, cabe aplicar-lhes maneiras de satisfazer a lacuna existe, através da analogia e equidade. [3]

1.1 Meios diplomáticos

Pelos meios Diplomáticos resolvem-se os desacordos mediante negociação direta entre as partes ou intervenção de terceiros, sem o escopo de obrigar as partes ao seu parecer.

Dentro dos meios diplomáticos, encontramos as Negociações Diplomáticas, que nada mais são que acordos bilaterais ou multilaterais entre as partes em litígio, aonde é necessário que haja a equivalência entre as partes, e não ocorra a interferência de terceiros[4]. Utiliza-se para tal a comunicação diplomática que pode ser tácita ou expressa. Quando tácita, ela desenvolve-se de forma oral. Quando expressa, por meio de documentos acordados entre funcionários dos Estados partes, destinados para exercerem tal função.

Como exemplo contemporâneo de negociação diplomática feita com êxito indica-se o Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança.  Aonde os países chegaram a uma posição de consenso que deve desbloquear o processo de implementação das regras para a identificação de carregamentos contendo Organismos Vivos Geneticamente Modificados (OVMs), mais conhecidos como transgênicos. O acordo alcançado estabelece que seja adotada imediatamente a expressão “contém OVMs” para os casos onde já é possível realizar o rastreamento, a segregação e a identificação dos transgênicos e a expressão “pode conter OVMs” para os demais casos, que terão um prazo de seis anos para se adaptar às novas regras. Os dois regimes devem coexistir, portanto, até 2012, data prevista para que o contém seja adotado definitivamente. [5]

Outro meio Diplomático são os Bons Ofícios, neste existe um terceiro que de forma amigável, tende a fazer a aproximação entre as partes.

Isso ocorre, quando as partes em litígio não têm condições de negociarem devido a desentendimentos e desconfianças mútuas. O terceiro, vem a fim de criar um clima amigável. Porém, ele sequer toma conhecimento do fato em litígio. Ele sabe da ocorrência de uma desavença, mas não se envolve diretamente. As partes podem requisitar a um terceiro a sua atuação, ou o próprio pode se oferecer. Tanto as partes, quanto o terceiro, quando solicitado podem se opor a interferir. Deixando assim de ocorrer os Bons Ofícios.

O Brasil já prestou bons ofícios, assim como também já foi beneficiado pela prestação de bons ofícios de terceiros, diversas vezes. Em 1864, Brasil e Grã-Bretanha estavam de relações cortadas, devido o caso Christie, Portugal foi prestador de bons ofícios, o que fez com que os Estados que estavam se desentendendo, voltassem a ter relações amistosas.[6]

É importante ressaltar que os Bons ofícios não podem se confundir com a Mediação, que é outro meio Diplomático de solução pacifica de conflitos. Nela também há a presença de um terceiro, no entanto, na mediação, este além de conhecer a matéria de fato e de direito que motiva as controvérsias, propõe uma solução, que vem em forma de parecer. Apesar de que este parecer não tem efeito vinculante, ou seja, não obriga as partes a acatarem-no. [7]

Existe ainda, a Conciliação, aonde uma comissão integrada tanto por membros dos Estados litigantes, quanto por membros neutros, irão analisar o caso concreto e apresentar uma solução, que, no entanto, é facultativa de ser acatada. Ela se parece em muito com a mediação, a diferença se encontra, no fato de enquanto uma o parecer vem de apenas um terceiro, na outra existe uma comissão que irá fazer o juízo de valor.

Existe outro meio Diplomático, que vem mais como uma prevenção de litígios, já que não chega a ocorrer a desavença. È o Sistema de Consultas, onde as partes previamente combinam de se consultarem periodicamente, para tratarem de um assunto determinado. Normalmente esta combinação ocorre por tratados. Nos encontros periódicos, as partes irão levantar questões que ocorreram dentro do prazo determinado e as deixaram descontentes, e assim irão propor soluções para solucioná-las. [8]

1.2 Meios políticos

Os meios Políticos são aqueles exercidos quando existe litígio de certa gravidade, desconforto no cenário internacional que se encontra na eminência de uma guerra entre os Estados envolvidos.  Portanto, os órgãos políticos ou organizações tomam para si a solução do conflito. Eles podem agir mesmo à controvérsia de uma das partes, quando a outra manifesta interesse, ou mesmo à controvérsia de ambas as partes, quando o secretário geral da organização ou terceiro Estado integrante da organização se manifeste , trazendo a existência do conflito para debate entre os membros desta.

Cabe a Assembléia Geral e o Conselho de Segurança, das Nações Unidas intervirem como instâncias políticas de solução dos conflitos. Comumente o Conselho de Segurança é o mais utilizado, por estar mais disponível e mesmo por contar com meios eficazes de ação quando da eminência de uma guerra. Neste caso, ele precisa investigar, discutir e expedir recomendações para a solução do litígio. A solução em geral é provisória. Devido a não obediência a uma recomendação do Conselho de Segurança ou Assembléia Geral, não configurar ato ilícito, e o fato dos Estados serem soberanos, podendo agir conforme o seu entendimento, muitas vezes, de nada adianta a intervenção das instancias políticas[9].

Além dos órgãos da ONU, existem os Esquemas Regionais Especializados, que são organizações que tem alcance regional, A Organização dos Estados Americanos e a Liga dos Paises Árabes. Elas funcionam da mesma forma que os órgãos da ONU. As partes da mesma maneira, não são obrigadas a acatarem suas decisões, exceto se foram ambas as partes que requisitaram sua interferência, e mesmo assim se não atingir a soberania do Estado.

1.3. Meios jurisdicionais

Os meios jurisdicionais diferem dos antecedentes, pois neles há um compromisso de fato, ou seja, as decisões são obrigatórias, qualquer forma de resistir, intentando não seguir a sentença, configura um ilícito internacional, a busca da solução do conflito se faz conforme o direito vigente.

Pelos meios Jurisdicionais encontramos a Arbitragem e as cortes permanentes. Apesar de ambas buscarem uma solução firmada no direito, elas distinguem-se na estrutura e no processo.

A arbitragem tem como julgador um árbitro a ser escolhido pelas partes litigantes, diferentemente das cortes permanentes, que consta com um juiz profissional e permanente.

Na arbitragem, cabem as partes escolherem o árbitro, que normalmente é selecionado segundo as suas capacitações, na Corte Permanente de Arbitragem, que é na verdade é uma lista de pessoas qualificadas para atuarem como árbitros, a indicação é feita pelos Estados que mantêm a Corte. Cada Estado pode indicar até quatro nomes. As partes ainda devem descrever a matéria que ensejou o litígio, assim como, delimitar o direito a ser aplicado, determinando desde já os prazos e regras a serem seguidos.

Para que a arbitragem tenha eficácia, é preciso que antes de tudo, os paises em litígio celebrem um compromisso arbitral, que nada mais é que um contrato bilateral, aonde as partes se obrigam a cumprir todas as determinações necessárias para o bom andamento do processo, e acima de tudo, acatar a sentença proferida, que tem caráter definitivo.

Portanto, a garantia que as partes têm quando da ocorrência da arbitragem, é exatamente o pacto celebrado, antes do seu procedimento. Esse compromisso pode ser assumido, mesmo antes de se configurar um conflito. Neste caso, ao ser celebrado um tratado, as partes estipulam que na ocorrência de uma desavença, a solução virá por uma sentença arbitral, é a chamada cláusula arbitral. Existe ainda, o tratado geral de arbitragem, onde os Estados parte escolhem esta como a via de solução de conflitos, caso estes ocorram no futuro. O próprio tratado se regula, estabelecendo as suas regras e prazos. Devido à sentença arbitral ter caráter definitivo, ela é irrecorrível.

Existem somente duas hipóteses de se questionar a sua eficácia, quando ocorre obscuridade, omissão, contradição ou ambigüidade, pelo árbitro, a parte pode fazer um pedido de interpretação da sentença, a fim de obter esclarecimentos e se necessário uma reforma na sentença.            Outro caso, é quando o árbitro comete uma falta grave, agiu com dolo, prejudicando uma das partes em beneficio da outra. Quando isso ocorre, a solução é alegar nulidade a sentença arbitral, assim à parte exime-se de cumpri-la. [10]

A solução Judiciária tem alcance mundial, ela atinge Estados, empresas e entidades de direito público e até indivíduos particulares, e assim como a arbitragem, precisa ser requisitada pelas partes. O que faz com que a sentença tenha caráter definitivo e obrigatório, é exatamente esta sujeição das partes perante as cortes permanentes, o pacta sunt servanda. Sem este requisito, a sentença não tem validade, pois nenhum Estado soberano é obrigado a se obrigar a uma decisão contra a sua             vontade, devendo assim existir a sua pré-aceitação. Esta aceitação prévia pode ser por meio de tratados bilaterais, quando as partes entram em um acordo para se submeterem ao julgamento da corte, dirigindo-se assim em conjunto até ela, ou ainda, dentro deste caso, combinam que quando da ocorrência do litígio qualquer uma pode procurar pela corte. Outro caso de submissão à corte, ocorre quando a parte entra com a inicial, demonstrando assim o seu interesse. Se a parte contrária contestar o mérito, já configurou a sua aceitação.

A solução judiciária é exercida pelas cortes internacionais, permanentes. O grande marco da jurisdição internacional, é a Corte Internacional da Haia, que é atualmente o maior tribunal internacional, com alcance mundial. Integram o seu corpo quinze juízes, juristas que tem renome internacional, e são conhecidos pelo seu alto grau de conhecimento jurídico. Eles provem das mais diversas culturas, fazendo assim, que a Corte de Haia seja a grande Torre de Babel do mundo do jurídico. Isto ocorre, para que se tenha neutralidade na aplicação do direito. Por isso mesmo, não se pode ter mais de um juiz de cada nação. Os juizes são escolhidos, pelos membros da Assembléia Geral e o Conselho de Segurança da ONU. O mandato é de nove anos, podendo ser reelegíveis. A renovação se faz pelo terço a cada três anos.

O grande problema encontrado nos meios jurisdicionais de solução de conflitos está na carência de executoriedade, pois apesar da sentença ser legitima eficaz e até mesmo obrigatória, cabe a boa-fé das partes cumprirem-na. Pois mesmo, configurando um ilícito internacional o não cumprimento da sentença, cada Estado é soberano, e como tal tem a escolha em suas mãos, cabe somente a eles decidirem o que fazer, e não existe poder coercitivo que o obrigue a seguir o que ele não deseja.  Existe, no processo de solução judiciária, um meio de tornar a sentença executória em caráter excepcional, por meio da força, quando o conselho de Segurança da ONU, em tese usaria da sua força como meio coercitivo de fazer o Estado parte cumprir a sua obrigação, provinda do acórdão da corte. Dissemos em tese, pois isto de fato nunca ocorreu. [11]

Aqui se esgotam os meios pacíficos de solução de conflitos internacionais, resta-nos agora, entrar em outro meio de solução de conflitos, que na verdade não tem nada de meio e sim fim. A Guerra, nada mais traz do que um adicionar de motivos para se continuar conflitando.

 

Notas:
[1] SOARES, Guido Fernandes SILVA. Curso de Direito Internacional Público. VOL.I.São Paulo: Atlas, 2004, p 163.
[2] SILVA, Roberto Luiz. Direito Internacional Público. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p.404.
[3] REZEK, Francisco. Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 2005, p.339.
[4] SILVA, Roberto Luiz. Direito Internacional Público. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p.404.
[5]THUSWOHL, Maurício. CARREGAMENTO com transgênicos terá identificação definitiva em 2012. Disponível em: <http:// agenciacartamaior.uol.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=10301> Acesso em 29 Julho. 2006
[6] REZEK, Francisco. Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 2005, p 341.
[7] Ibidem, p. 340.
[8] SILVA, Roberto Luiz. Direito Internacional Público. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p.406.
[9] REZEK, Francisco. Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 2005, p.346.
[10] REZEK, Francisco. Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 2005, p.351.
[11] REZEK, Francisco. Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 2005, p.354 e s.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Renata Nassar Barreto

 

 


 

Equipe Âmbito Jurídico

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