Nota fiscal de serviços e boleto bancário

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Trata-se de estudo e análise sobre a utilização dos boletos bancários em substituição às notas fiscais de serviços, fato que vêm sendo questionado cada vez mais no âmbito da administração fiscal municipal. Discute-se no presente trabalho os principais conceitos jurídicos envolvidos, a prática e o procedimento fiscal correlatos.

1. INTRODUÇÃO.

O presente estudo tem por escopo discutir a questão atinente à substituição da nota fiscal de serviços por boletos bancários, polêmica que vem sendo posta constantemente no âmbito da administração tributária municipal.

A análise do tema torna-se importante a partir do momento em que cada vez mais se observa a utilização do boleto bancário como forma de pagamento das obrigações jurídicas.

Nos parágrafos posteriores o assunto será examinado juridicamente, discutindo os aspectos práticos quanto à utilização das notas fiscais de serviços e dos boletos bancários, os conceitos relacionados ao tema e a legislação tributária aplicável à espécie, tendo por base o Município de Niterói.

2. ASPECTOS PRÁTICOS.

Atualmente, com a difusão da Internet como meio de comunicação acompanhada do desenvolvimento das operações bancárias, foram criados mecanismos e formas de agilizar e de facilitar as operações entre fornecedores e clientes, objetivando atender às expectativas do contratante e do contratado.

Desse modo, os prestadores de serviços passaram a firmar contratos com as instituições bancárias, de forma a permitir que seus clientes (consumidores) tenham comodidade e facilidade no recolhimento do preço do serviço contratado, podendo fazê-lo em local de fácil acesso ou próximo de sua residência ou trabalho, enfim, diminuindo tempo e custo.

Com efeito, na prática das atividades civis e mercantis a aplicação de novas tecnologias e de novos meios eletrônicos facilitam a contratação de operações, o pagamento de obrigações, a circulação do crédito, a relação custo-benefício tanto das empresas (sociedades empresariais) quanto dos clientes (pessoas físicas ou jurídicas).

Assim, exemplificando-se, um determinado fornecedor de serviços, como é o caso das academias de ginástica, que possuem como clientes pessoas físicas de diversas localidades e com bastante rotatividade, pode contratar junto à instituição bancária a utilização de boletos bancários como forma de pagamento, objetivando o recebimento de seus créditos, vale dizer, dos preços dos serviços cobrados dos seus clientes.

Por seu turno, os alunos (clientes da academia) poderão imprimir o boleto bancário de sua própria residência, através da utilização da Internet, recolhendo a obrigação contratada (mensalidade) na agência bancária mais próxima de sua casa.

Contudo, o boleto bancário não significa que a prestadora dos serviços estará desobrigada de emitir a nota fiscal correspondente aos serviços efetivamente prestados. A empresa continuará obrigada, por força de lei, a emitir para cada cliente a respectiva nota fiscal de serviços, com todos os dados e requisitos previstos na lei tributária.

3. DA NOTA FISCAL DE SERVIÇOS.

A nota fiscal de serviços é documento fiscal de emissão obrigatória para o contribuinte prestador de serviços, inclusive para pessoas isentas ou imunes, e comprobatória da operação realizada. A sua emissão constitui-se em obrigação acessória tendo como conteúdo uma obrigação de fazer (positiva), no interesse do fisco, como órgão arrecadador ou fiscalizador dos tributos. O Código Tributário Nacional dispõe no seu art. 113, § 2º, in verbis:

“Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

……………………

§ 2º. A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.”

Relativamente ao Município de Niterói a obrigação da emissão de nota fiscal para cada serviço prestado, com a discriminação dos dados dos clientes-usuários (nome, CPF ou CGC, endereço) está estabelecida no arts. 47 e 56, inciso I, do Decreto nº 4.652/85, alterado pelo Decreto nº 8.464/01, verbis:

“Art. 47  –  Os prestadores de serviços  –  ainda que isentos ou imunes, inclusive consórcios, cooperativas e condomínios  –  que prestem serviços a terceiros, deverão possuir e emitir obrigatoriamente Notas Fiscais de Serviços e outras, conforme modelos aprovados e relacionados a seguir e publicados ao final desse Decreto:

……………..”

 “Art. 56  –  O estabelecimento prestador de serviços emitirá Nota Fiscal de Serviços, Modelo 1 ou 2, conforme descrita no artigo 47:

I. Sempre que executar serviços;”

A nota fiscal de serviços de natureza comum é autorizada mediante a apresentação de uma série de documentos ao Fisco Municipal, mais precisamente no Plantão Fiscal da respectiva Secretaria Municipal de Fazenda.

No que tange ao Município de Niterói o art. 53 do Decreto nº 4.652/85, alterado pelos Decretos nº 8.464/01 e nº 9.549/05, prescreve o procedimento fiscal para a autorização do documento fiscal, a saber:

“Art. 53  –  Os estabelecimentos gráficos somente poderão confeccionar os documentos fiscais, enumerados no artigo 47, mediante prévia autorização da Secretaria Municipal de Fazenda.

……………………..

§4º A Autorização do Município de Niterói para Impressão de Documentos Fiscais será emitida exclusivamente pela Secretaria Municipal de Fazenda, mediante solicitação do contribuinte ao Plantão Fiscal e apresentação do Cartão de Alvará de Localização”.

§5º  –  Na primeira solicitação pelo Sistema Computadorizado de AIDF, o Contribuinte deverá apresentar a última autorização de AIDF obtida, para que a mesma seja cadastrada no sistema.

§6º  –    O requerente receberá a Autorização do Município de Niterói para Impressão de Documentos Fiscais em duas vias:

1.      a primeira via será destinada ao estabelecimento prestador do serviço;

2.      a segunda via será destinada ao estabelecimento gráfico, devendo ficar à disposição da Fiscalização, devidamente assinada pelo responsável pela empresa que contratou a prestação do serviço.

……………..”

Desse modo, no momento da apresentação pelo contribuinte da AIDF (Autorização Para a Impressão de Documentos Fiscais) o fiscal de tributos plantonista possui como uma das suas atribuições a verificação da numeração correta das notas fiscais a serem autorizadas e confeccionadas pelas gráficas cadastradas no Município de Niterói, seguindo a ordem seqüencial própria.

A numeração das notas fiscais de serviços em ordem seqüencial bem como sua correta escrituração nos livros fiscais por parte do contribuinte são fundamentais para a Fazenda Municipal manter o controle fiscal das operações praticadas no Município.

Assim, ao solicitar a documentação fiscal da empresa o fiscal de tributos além de apurar o montante do ISS devido também verifica a correta emissão das notas fiscais de serviços quantos aos requisitos legais e regulamentares, inclusive atentando-se à exata seqüência numérica das mesmas, em conformidade com as AIDF’S autorizadas, e a conseqüente escrituração com exatidão no Livro de Registro de Apuração do ISS.

Destaca-se a questão da ordem seqüencial das notas fiscais de serviços por ser de fundamental importância para o tema que será tratado adiante, ao se discutir a utilização dos boletos bancários (item 5).

4. DO REGIME ESPECIAL.

O regime especial de emissão de nota fiscal de serviços foi instituído pela lei objetivando facilitar o preenchimento e a emissão das notas fiscais pelo contribuinte, quando tivesse grande volume de serviços prestados, com muitos clientes e usuários, utilizando-se de processamento e preenchimento eletrônico, que acelera a emissão da nota e diminui o volume de papel, com gravação em disquete, programa ou fita magnética.

Trata-se de modalidade de autorização de nota fiscal de serviços em que o Município permite a utilização de documento fiscal substitutivo do normalmente autorizado nos plantões fiscais, sob a condição de atenderem os requisitos legais e de maneira excepcional.

Assim, como exceção à regra, a utilização do regime especial de documento fiscal deve ser analisada sem perder de vista o seu caráter excepcional. Por conseguinte, a emissão do documento fiscal substitutivo só poderá ser autorizada através de processo específico, em que se examinará se estão presentes os requisitos e as condições impostas pela lei municipal.

A título exemplificativo, no Município de Niterói, o Fisco admite aos estabelecimentos de ensino a emissão de carnês de pagamento em substituição às notas fiscais de serviços, nos termos do art. 47, VIII e § 2º, inciso III do Decreto nº 4.652/85, alterado pelo Decreto nº 8.464/01, ipsis litteris:

“Art. 47  –  Os prestadores de serviços  –  ainda que isentos ou imunes, inclusive consórcios, cooperativas e condomínios  –  que prestem serviços a terceiros, deverão possuir e emitir obrigatoriamente Notas Fiscais de Serviços e outras, conforme modelos aprovados e relacionados a seguir e publicados ao final desse Decreto:

……………..

VIII – Nota Fiscal em Regime Especial

(Só poderá ser autorizada a sua impressão, se colocado o número do processo que deferiu o seu uso)

……………..

§2º  –  Excetuam-se do disposto no caput deste artigo:

……………..

III – Os estabelecimentos de ensino, desde que, em substituição à nota-fiscal de serviços, emitam carnês de pagamentos para todas as mensalidades escolares, observando as informações necessárias exigidas por este Regulamento;”

Dessa forma, os estabelecimentos de ensino podem emitir carnês de pagamento em substituição às notas fiscais de serviços, todavia sob a condição de atender às informações necessárias dispostas no Regulamento (Decreto nº 4.652/85).

Os referidos carnês de pagamento são documentos equivalentes e com as mesmas indicações da nota fiscal de serviços (art. 47, inciso III do Decreto nº 4.652/85), inclusive com numeração fornecida pelo Fisco e com o controle do mesmo através das AIDF’S.

Resulta do exposto que deverão constar nos carnês de pagamento das mensalidades os seguintes itens:

I – denominação “carnê de pagamento de prestações escolares”;

II – nº de ordem e nº de via;

III – a natureza da operação: serviços de ensino, instrução, etc.;

IV – data da emissão;

V – o nome, o endereço e o nº de inscrição municipal e no CGC/CNPJ do estabelecimento emitente;

VI – o nome e o nº de matrícula do aluno;

VII – a discriminação das unidades e quantidades;

VIII – a discriminação dos serviços prestados (pré-escolar, de 1ª a 4ª séries, de 5ª a 8ª séries, de 2º grau, etc);

IX – os valores;

X – a expressão: “o ISS foi calculado pela alíquota de……% de acordo com a Lei nº 480/83).

Nota-se, portanto, que o regime especial, entendido como situação excepcional, não autoriza a emissão de documento fiscal que não contenha os requisitos legais, que não disponha no seu bojo dos dados necessários à comprovação da efetiva prestação dos serviços e que não permita o controle das operações pelo Fisco Municipal.

5. DO BOLETO BANCÁRIO.

O ‘Boleto Bancário’ é título de crédito, sua função primordial é a de permitir a circulação do crédito nele contido. Possui os elementos inerentes aos títulos de crédito em geral (letra de câmbio, nota promissória, duplicata, cheque, conhecimento de depósito, warrant, etc): literalidade, cartularidade e autonomia.

Neste ponto, peço vênia, para destacar ótimas linhas traçadas pelo Desembargador Jessé Torres no seu voto no julgamento da Apelação Cível nº 2004.001.07799, em 05/05/2004, da 2ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ad litteris et verbis:

“O direito empresarial é dinâmico, notadamente quando faz uso dos títulos de crédito, cujo escopo é a rápida circulação do capital, a permitir que deles melhor se disponha a serviço da produção de riqueza. Segue-se ser praxe do mercado bancário a notificação por boletos, que integram os chamados usos convencionais, decorrentes da prática espontânea e constante dos empresários em suas relações comerciais…”

Ademais, o ‘Boleto Bancário’ objetiva fazer com que aquele determinado crédito contido no documento possa ser transmitido dentro da cadeia de circulação do título, existe para facilitar as operações comerciais entre cliente-Banco-empresa. Valem, ainda, como documento suficiente para ensejar o procedimento monitório.

Por isso, a verificação no referido título da existência de termos como: ‘cedente’, ‘aceite’, ‘código cedente’, ‘sacado’, ‘sacador’, avalista’, etc, atinentes aos títulos de crédito.

Entende-se que a utilização dos ‘Boletos Bancários’ é decorrência da modernização das operações comerciais (bancárias, de venda e de serviços), trazendo muitos benefícios e facilidades, não se negando os efeitos práticos de tais documentos.

No campo da fiscalização, quando se insere na corrente acima o elemento ‘Fisco’, deve-se ter em foco que este tem posição central na relação jurídico-tributária, no que se refere ao tributo incidente nas operações, por isso mesmo determinando as regras pelas quais serão documentadas as operações para efeitos fiscais.

Nada impede a utilização dos ‘Boletos’ como documento necessário à circulação do crédito decorrente da relação mercantil ou da relação civil, mas não como documento fiscal, comprobatório da relação tributária (prestação dos serviços – fato gerador do ISS), aqueles servirão apenas para facilitar o pagamento das obrigações.

Apenas para concluir o raciocínio acima, comparam-se os elementos contidos normalmente em uma nota fiscal de serviços com os dos ‘Boletos Bancários’  utilizados comumente:

– Nº de ordem e nº de via (ausentes no BB);

– Natureza da operação (descrita de forma sucinta no BB);

– Data da emissão (não há, apenas a do vencimento);

– Data-limite para a emissão (inexistente no BB);

– Endereço e nº da inscrição municipal do emitente (inexistentes no BB);

– Declaração de que os serviços foram prestados (inexistente no BB);

– Valor do ISS incidente na operação (inexistente no BB, frisa-se que o imposto sobre serviços incide em cada operação, embora seu recolhimento seja mensal);

– Alíquota aplicável e nº da Lei Municipal (inexistentes no BB).

CONCLUSÃO.

Finalmente há de se registrar que a admissão do uso de boletos bancários em substituição às notas fiscais de serviços geraria efeitos práticos nocivos em termos tributários e acarretaria um precedente perigoso no âmbito da administração fiscal.

 

Com efeito, além de não haver previsão legal para tanto, caso se permitisse a substituição supramencionada o Fisco Municipal perderia o controle da comprovação das operações (prestações de serviços) realizadas pelo contribuinte, das notas fiscais autorizadas e do subseqüente imposto devido nas operações.

Explica-se: atualmente, exempli gratia, nos serviços de ensino, o aluno pode obter o boleto bancário até mesmo pela Internet, com a impressão do documento em casa, sem qualquer interferência do estabelecimento de ensino. Assim, ao ser solicitada a documentação fiscal, a prestadora de serviços não apresentará todos os boletos por falta de condições práticas para tanto. À semelhança: é como se admitir que o próprio contratante (aluno, cliente) emitisse a nota fiscal de serviços em lugar do prestador. Situação absurda.

Ademais, o aluno, quando precisar de comprovante dos serviços prestados, até mesmo para fins de contabilidade pessoal ou deduções no IRPF, deverá ter documento fiscal idôneo, previsto na lei e que realmente comprove a prestação dos serviços educacionais e, nesse caso, a legislação municipal admite apenas a emissão de nota fiscal de serviços ou de carnê de pagamento de prestações escolares, não possuindo o boleto bancário este intuito.

Isto posto, com a falta da emissão das notas fiscais de serviços e o uso tão somente de boletos bancários, ficaria difícil até mesmo para a empresa prestadora dos serviços relacionar todos os boletos emitidos, que dependeria de informações das instituições bancárias, atrelando o Fisco Municipal a terceiro não vinculado ao fato gerador.

O Município deixaria de arrecadar o ISSQN incidente nas operações por falta de controle dos fatos geradores ocorridos e conseqüentemente geraria arbitramentos e litígios tributários que poderiam ser evitados com o controle e emissão das notas fiscais de serviços juntamente com os boletos bancários: as primeiras como documentos fiscais obrigatórios e que registram os fatos geradores ocorridos e os segundos como título de crédito e que facilitam e possibilitam a  circulação do crédito.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Francisco da Cunha Ferreira

 

Fiscal de Tributos do Município de Niterói e Bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense.

 


 

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Equipe Âmbito Jurídico

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