Resumo: Atualmente, muito embora haja expresso na Constituição Federal a separação entre os Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciario), sua harmonia e independência, o que se tem visto em algumas situações é a omissão do legislativo em parte de suas funções (criar, legislar normas), e uma invasão do Judiciário em alguns momentos nesta função, notadamente quando profere decisões que criam normais gerais abstratas, consistindo em uma configuração material do Direito. Não obstante a isto, em determinadas situações devido à omissões do próprio legislador, o Judiciário se vê demandado a decidir, a falar o Direito, e para realização deste, se vê na necessidade de decidir às vezes positivando este Direito, contrariando aquilo que prega a CF, a qual coloca o Poder Judiciário como guardião das leis, protetor da CF, e não como instituidor de leis. Esta intervenção do Poder Judiciário sob as competências do Legislativo pode ser vista em vários ramos do Direito, e na esfera tributária não é diferente, principalmente quando se pretende o Judiciário utilizar de regras principiológicas, como os princípios da igualdade e capacidade contributiva, para interferir nas limitações ao poder de tributar. Assim sendo, a manutenção da autonomia, harmonia e liberdade entre os Poderes da República é imprescindível para a ordem e a segurança jurídica em tempos de vivencia em um Estado Democrático de Direito, e para tanto o Poder Judiciário deve fazer prevalecer o direito, deve dizer o direito, porém, respeitando as limitações, funções, e competências constitucionais de cada um dos Poderes.
Palavras-chave: Ativismo. Direito. Poder Judiciário. Poder Legislativo. Tributário.
Abstract: Currently, although there is expressed in the Constitution the separation of powers (legislative, executive and judiciary), its harmony and independence, which has been seen in some situations is the omission of part of their legislative functions (create, legislate standards), and an invasion of the judiciary at times in this role, especially when it makes decisions that create normal general abstract, consisting of a hardware configuration of Law. Despite this, in certain situations due to the omission of the legislature itself, the judiciary is seen defendant to decide to speak the law, and to accomplish this, we see the need to decide sometimes positivando this law, contrary to what he preaches CF, which puts the judiciary as guardian of the laws, shield CF, as settlor and not of laws. This intervention of the Judiciary under the powers of the legislature can be seen in various branches of law, and the tax sphere is no different, especially when you want to use the judiciary rules principiológicas, the principles of equality and ability to pay, to interfere in limitations on the power to tax. Thus, the maintenance of autonomy, freedom and harmony between the branches of government is essential to the order and legal certainty in times of experiences in a democratic state, and both the judiciary must enforce the law should say right, however, respecting the limitations, duties, and powers of each of the constitutional powers.
Keywords: Activism. Right. Judiciary. Legislature. Tax.
Sumário: Introdução. 1. O Ativismo Judicial e sua caracterização. 2. A separação dos poderes frente ao ativismo judicial. 3. Os reflexos do ativismo em matéria tributária. Considerações Finais.
INTRODUÇÃO
Atualmente a função típica do Poder Legislativo é a configuração democrática do Direito mediante a confecção de normas gerais e abstratas. O Poder Legislativo para exercer sua função típica utiliza o procedimento democrático, respeitando o principio da legalidade, propiciando à configuração democrática do Direito no momento em que esta função é exercida por meio de deliberações dos representantes eleitos pelo povo, de acordo com os procedimentos previamente determinados.
Noutro giro, muito embora a função típica do Poder Judiciário seja a de aplicar e definir o Direito em caso que se configure conflitos intersubjetivos ou confrontos entre as normas infraconstitucionais e a Constituição Federal, certo é que a atuação do judiciário não será uniforme, restando algumas vezes mais ampla, outras devendo ser mais restrita.
É nesta atuação do judiciário, que muitas vezes se tenta justificar por meio de um comportamento afirmativo que se encontra algumas ingerências sob funções tipicamente do legislativo, o que, tem-se caracterizado como um ativismo judicial. Isto tem ocorrido com certa freqüência em praticamente todos os ramos do direito, e muitas das vezes este “fenômeno” (ativismo) é visto também no direito tributário, principalmente nas grandes discussões que chegam ao Supremo Tribunal Federal, como se verá mais adiante.
No cenário atual em que os Poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário) possuem seus limites e funções devidamente definidos, o papel de cada um e eventual interferência de algum em funções típicas de qualquer outro poderá provocar distorções no sistema pautado num Estado Democrático de Direito.
Neste sentido, atualmente a atuação do Poder Judiciário em certas situações tem representado uma nítida invasão de competência do Poder Legislativo, notadamente nos casos em que este se omitiu em sua função de legislar. O Poder legislativo poderá agir, como omitir, podendo ter sua atuação uma variação entre a configuração material das normas segundo a Constituição Federal, até à uma possível omissão no exercício dessa tarefa. Logo, pode-se dizer que quanto maior o grau de exercício da função legisladora na configuração das normas, menor será a possibilidade de atuação do judiciário quanto à configuração normativa, interferindo menos do âmbito funcional do legislativo.
Mas certo é que, diante das manifestações recentes dos tribunais pátrios, muito embora o monopólio de redação das leis permanecem, e são, por determinação constitucional do Congresso Nacional, o que se vê nos dias de hoje é um Poder judiciário agindo cada vez mais com liberdade, no sentido de fazer uma leitura dos enunciados normativos de forma a superar os limites neles impostos, e invadir funções tipicamente do legislador, sob o argumento de que o cidadão que procurou o judiciário não poderá permanecer impossibilitado de exercer um direito, não por vedação legal, mais simplesmente porque o legislador, aquele eleito pelo voto direto do povo, não exerceu sua competência.
Contudo, o Poder Judiciário não pode simplesmente agir da forma que julgar melhor ou mais eficaz para que alcance um determinado direito, ou para que se chegue à uma solução da lide, muitas vezes agindo como legislador positivo, invadindo competência de outro Poder da República, para isto tem-se devidamente expresso no texto constitucional ferramentas que lhe permite utilizar para que possa sanar eventual omissão de lei, como são os casos em que o Supremo Tribunal Federal é provocado mediante mandado de injunção ou ação direta de inconstitucionalidade por omissão.
1. O ATIVISMO JUDICIAL E SUA CARACTERIZAÇÃO
O ativismo judicial em simples descrição pode ser entendido como o exercício da função jurisdicional utilizada para solucionar problemas que inicialmente teriam natureza política, vez que, institucionalmente incumbe ao Pode Judiciário solucionar litígios de natureza subjetiva (conflitos de interesses) e controvérsias jurídicas de natureza objetiva (conflitos normativos), que acaba por ultrapassar seus limites e alcançar as funções legislativas.
Em outras palavras, o ativismo se caracteriza por uma atuação judicial no intuito de resolver problemas que às vezes não contam com adequada solução legislativa, ou seja, o julgador ultrapassa seus limites, e ao invocar a função constitucional da jurisdição age com poder criativo, mesmo que não haja previsão legal que o autorize na respectiva atuação.
Note, assim, que o Poder Legislativo possui como função típica dentro de um Estado Democrático de direito a produção normativa, a confecção de normas gerais e abstratas, e para configurar uma situação de ativismo, basta que o Poder Judiciário no exercício da atividade judicial invada competências do legislador, desrespeitando, e descaracterizando a função típica do Poder Legislativo. E esta função, por sua vez, pode ser identificada pelo procedimento, pelo objeto e pelo instrumento.[1]
Assim, quanto ao procedimento por meio do qual o Poder Legislativo desempenha sua função típica é o procedimento democrático, realizado sob a ótica dos princípios democrático e da legalidade. O exercício da atividade legislativa, com discussão e deliberações por parte dos representantes eleitos pelo povo, conforme procedimentos e processos delineados previamente e aprovados, remete à uma configuração democrática do Direito, e, a partir do momento em que a instituição da norma não passa por discussões, aprovações e deliberações a serem realizadas por representantes eleitos pelo povo, mas sim, por representantes do Poder Judiciário, está se diante de uma forma de ativismo judicial.
Na mesma linha, quanto ao objeto, a atuação do Poder Legislativo se dá em relação aos princípios e regras, que, com base em sua liberdade de configuração e de fixação de premissas, concretiza democraticamente estes princípios e regras. E, configura-se, portanto, o ativismo quanto ao objeto, quando o Poder Judiciário é quem configura materialmente o Direito.[2]
E, com relação ao instrumento, pode-se dizer que é por meio deste que o Poder Legislativo exerce sua função típica de fixar a norma geral e abstrata. Neste sentido, ocorrerá ativismo judicial quanto ao instrumento quando a função típica de editar normas gerais e abstratas for exercida pelo Poder Judiciário, e não pelo Poder Legislativo.
Assim sendo, haverá ativismo judicial sempre que o Poder Legislativo não prescrever democraticamente (procedimento) os princípios e as regras constitucionalmente previstos (objeto) mediante a instituição de normas gerais e abstratas (instrumento), as quais passam a ser feitas pelo Poder Judiciario.
Portanto, pode-se dizer que Poder Judiciário ativista é aquele que exerce função típica de configuração material do Direito por meio de decisões judiciais que criam normas gerais e abstratas.
Outrossim, muitas vezes, para se legitimar uma atuação ativista por parte do judiciário, o que se argumenta é que sua legitimação encontra amparo no principio da inafastabilidade do controle jurisdicional decorrente do disposto no art. 5º, XXXV da Constituição Federal (CF), uma vez que a missão democrática e constitucional do Poder Judiciário é atuar de modo a evitar lesão ou ameaça a direitos, tenha o legislador infraconstitucional dotado, ou não, o juiz para concretizar o respectivo ditame constitucional. Neste sentido, o próprio Supremo Tribunal Federal, por manifestação do Ministro Celso de Mello, quando da cerimônia de posse do então Presidente do Supremo, Ministro Gilmar Mendes, em abril de 2008, assim explanou:
“Nem se censure eventual ativismo judicial exercido por esta Suprema Corte, especialmente porque, dentre as inúmeras causas que justificam esse comportamento afirmativo do Poder Judiciario, de que resulta uma positiva criação jurisprudencial do direito, inclui-se a necessidade de fazer prevalecer a primazia da Constituição da República, muitas vezes transgredida e desrespeitada por pura, simples e conveniente omissão dos poderes públicos. Na realidade, o Supremo Tribunal Federal, ao suprir as omissões por inconstitucionais dos órgãos estatais e ao adotar medidas que objetivam restaurar a Constituição violada pela inércia dos poderes do Estado, nada mais faz senão cumprir a sua missão constitucional e demonstrar, com esse gesto, o respeito incondicional que tem pela autoridade da Lei Fundamental da República. Praticas de ativismo judicial, Senhor Presidente, embora moderadamente desempenhadas por esta Corte em momentos excepcionais, tornam-se uma necessidade institucional, quando os órgãos do Poder Publico se omitem ou retardam, excessivamente, o cumprimento de obrigações a que estão sujeitos por expressa determinação do próprio estatuto constitucional, ainda mais se se tiver presente que o Poder Judiciário, tratando-se de comportamentos estatais ofensivos à Constituição, não pode se reduzir a uma posição de pura passividade.”[3]
Não obstante, a liberdade do Poder Judiciário para criar um direito há de ser uma liberdade responsável e autocontrolada, uma vez que não lhe é concebido função de introduzir na lei o que deseja extrair dela e tampouco aproveitar-se da abertura semântica dos textos para neles inserir conteúdos, que muitas vezes são incompatíveis com esses normativos, além de estar ferindo o principio da separação dos Poderes, fere, a própria Constituição Federal, a qual designou mecanismos e regras para que as normas sejam instituídas, e determinou expressamente as funções típicas de cada Poder.
2. A SEPARAÇÃO DOS PODERES FRENTE AO ATIVISMO JUDICIAL
A Constituição Federal Brasileira prevê expressamente a separação dos Poderes da União, devendo os mesmos serem independentes, harmônicos e conviverem em equilíbrio, o que, permite que a sociedade brasileira desfrute de um cenário de Estado Democrático de Direito, pautado na certeza e segurança do Direito. Neste sentido a Constituição Federal dispõe que:
“Art. 2º. São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.”
Porém, como já descrito anteriormente, o Poder Judiciario tem se transformado em constituinte derivado, em legislador positivo, invadindo competências do Poder Legislativo, proporcionando uma situação de ruptura do equilíbrio, harmonia e independência prescritos no Texto Constitucional.
No caso das intervenções feitas pelo Supremo Tribunal Federal, a Constituição em seu art. 102, caput, tornou esta Suprema Corte em legislador negativo, notadamente ao torná-la “guardiã” da Constituição. [4]
E, no artigo 103, parágrafo 2º, reforçou ainda mais o status de guardião, ao ponto de estabelecer que, ao declarar a inconstitucionalidade por omissão do Poder Legislativo, o Supremo Tribunal não poderá editar norma, devendo, apenas, comunicar ao Legislativo que a sua omissão é inconstitucional, para adoção das providências necessárias, porém, não impondo prazo para supri-la (salvo se órgão administrativo), e nem sanção se não o fizer. [5]
Note que, o regramento está muito bem delineado no texto constitucional, não cabendo a outro Poder da República exercer função típica que não a sua. O ativismo que se tem visto atualmente afronta veementemente os dispositivos constitucionais.
Não obstante a isto, ao tratar dos Poderes, o constituinte reservou o titulo IV da Carta Magna, definindo um a um suas funções essenciais, e prescreveu no art. 49, inciso XI, que compete exclusivamente ao Congresso Nacional zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes.
Em outras palavras, o Poder Legislativo deve fazer valer suas competências, e deve zelar por elas, não permitindo que outro Poder o infrinja. Neste contexto em que cada vez mais o Poder Judiciário se põe como ativista, quebrando as regras constitucionais, em uma situação extrema, caso estas invasões do Poder Judiciario prejudique a segurança jurídica e conseqüentemente o Estado Democrático de Direito, poderá o Poder Legislativo, com base no art. 142 da CF, até mesmo solicitar interferência das Forças Armadas para que seja restabelecida a lei e a ordem. Se não veja:
“Art. 142. As forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da Republica, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.” (grifo nosso)
Assim, caso o ativismo judicial chegue a contribuir para um descompasso entre os Poderes, quebrando sua independência e sua harmonia, podendo chegar ao ponto que colocar em risco a própria segurança jurídica dos cidadãos, da Republica Federativa do Brasil, e do próprio Estado Democrático de Direito, poderá o Poder Legislativo, por permissão Constitucional, até mesmo solicitar ajuda às Forças Armadas para que suas competências sejam respeitadas. Por conseguinte, é possível notar nesta passagem do texto constitucional o quão importante é a independência entre os Poderes, levando o constituinte até prever intervenção das Forças Armadas para manutenção das competências.
3. OS REFLEXOS DO ATIVISMO EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA
Neste diapasão, ao ativismo judicial tem estado presente nos mais variados ramos do direito, e não é diferente no que concerne ao direito tributário.
No que se refere à instituição de tributos, por exemplo, claro é que o Poder Judiciário não pode suprir eventual omissão do Poder Legislativo por meio de lei, pelo simples fato de que somente a lei poderá instituir ou aumentar tributo.
Esta postura diante dos mandamentos constitucionais não seria possível nem para instituição de tributo por meio de decisão judicial, e nem por meio de uma atuação positiva destinada a salvar tributo que deveria ter sido instituído por meio de lei com todos os seus elementos, porém, não o foi. O poder de tributar somente poderá ser exercido, se, e somente se estiver diante de regramento de competência que atribua este poder.
Uma vez delimitado o poder de tributar no âmbito constitucional, cumpre aclarar que os princípios constitucionais que o regem, entretanto, devem ser utilizados para conformar o exercício da competência, não para alargá-la ou para sanar vicio presente no seu exercício. Um exemplo claro são as hipóteses em que o Poder Judiciario utiliza de tais princípios constitucionais para alargar o poder de tributar devidamente concedido por regras.
O principio da igualdade, por exemplo, é estabelecido como limitação ao poder de tributar com eficácia de cunho negativa. Assim, o Poder Judiciario não pode usá-lo como meio para declarar a constitucionalidade de leis que tributem fatos não previstos em regras de competência, ou para declarar a legalidade de atos administrativos que tributem fatos não previstos em lei. Isto porque da forma como foi instituído, tal principio visa limitar o poder de tributar, e não dar condições para criar tributação.
Na mesma linha ocorre com o principio da capacidade contributiva, que é previsto na Constituição Federal como forma de graduar os tributos, não como razão para instituí-los. Logo, o Poder Judiciario não pode fazer valer deste principio para manter autuação fiscal que constitua creditos tributários relativamente a fatos que não foram previstos em lei, objetos de planejamento tributário, sob o simples argumento de que eles representam a mesma capacidade contributiva daqueles previstos em leis.
Por seu turno, o Supremo Tribunal Federal ao tratar questões tributarias em que lhe era posto situação na qual se via compelido a se manifestar como legislador positivo, por varias vezes decidiu pela não possibilidade de atuar como tal. Senão veja, dentre outras tantas decisões[6]:
“Ementa: I – Recurso Extraordinário (…); II – Isonomia: alegada ofensa por lei que concede isenção a certa categoria de operações de cambio, mas não a outra, substancialmente assimilável aquelas contempladas (DL 2.434/88, art. 6º): hipótese em que, o acolhimento da inconstitucionalidade argüida, poderia decorrer a nulidade da norma concessiva da isenção, mas não a extensão jurisdiconal dela aos fatos arbitrariamente excluídos do beneficio, dados que o controle da constitucionalidade das leis não confere ao Judiciário funções de legislação positiva.”[7]
“Ementa: Recurso Extraordinário: Isenção do Imposto sobre Operações Financeiras nas Importações. (…). 1. A isenção fiscal decorre do implemento da política fiscal e econômica, pelo Estado, tendo em vista o interesse social. É ato discricionário que escapa ao controle do Poder Judiciario e envolve o juízo de conveniência e oportunidade do Poder Executivo. (…) 2. Não pode esta Corte alterar o sentido inequívoco da norma, por via de declaração de inconstitucionalidade de parte do dispositivo da lei. A Corte Constitucional só pode atuar como legislador negativo, não porém, como legislador positivo.”[8]
No entanto, o STF tem se afastado desta orientação, e atuando cada vez mais como legislador positivo. Um exemplo clássico desta nova posição pôde ser visto no voto do Min. Gilmar Mendes no RE 405.579, em sessão de 17.10.2007, cuja relatoria foi do Min. Joaquim Barbosa, para o qual a solução da controversa pautada em referido recurso passava pela manutenção do beneficio fiscal sem, contudo, excluir os demais contribuintes que não estavam abrangidos pela norma (exclusão o beneficio incompatível com o principio da igualdade). Em outras palavras, a ampliação do beneficio atende mais os direitos e as garantias fundamentais do que a extinção do beneficio para os contribuintes beneficiados expressamente pela norma. Assim, os poderes Executivo e Legislativo teriam, então, como alternativa, aplicar uma alíquota menor ou maior para todos os contribuintes, para contrabalancear os efeitos arrecadatórios, mas não poderiam em momento algum discriminar um determinado contribuinte.
Outro exemplo em matéria tributaria diz respeito ao direito ao credito de IPI nas operações sujeitas à alíquota zero. A eliminação do direito a credito de IPI nas operações isentas, além de não encontrar respaldo na Constituição, fere claramente o artigo 175 do CTN. Esta norma foi reescrita pelo STF, ao acrescentar que, além da exclusão do credito tributário (no caso, aquele a que se refere o artigo 139 do CTN), a isenção também impede o nascimento da obrigação tributaria. O CTN é claro ao dispor que nas isenções, nasce a obrigação tributaria, sendo, entretanto, eliminada pela norma isencional, a possibilidade de constituição do credito tributário, tal como ocorre na anistia.
Outra situação de interferência do judiciário no campo tributário, invadindo texto legal é o caso das decisões dos tribunais no sentido de que há incidência do IPI, mesmo em situação de furto ou roubo. Ora, o art. 46 do CTN traz que o importo sobre produtos industrializados é de competência da União, e seu fato gerador é dentre outros a saída do estabelecimento. Neste sentido o art. 47 do mesmo diploma legal aduz que a base de calculo do imposto nas hipóteses de saída do estabelecimento é o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria. Assim, note que no caso de furto ou roubo, não há valor de operação! Como pode o Poder Judiciario determinar a incidência do IPI cuja alíquota tem como base de calculo algo que não existe, isto é, a operação?!
Veja-se que, o ativismo judicial está presente também fortemente nas matérias tributarias, e, tal como em outros seguimentos do direito, certamente já traz transtornos à segurança jurídica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do até aqui exposto, em um Estado Democrático de direito, em que se preza pela segurança jurídica dos cidadãos, e pela manutenção do Texto Constitucional, permitir que o Poder Judiciario continue invadindo as funções típicas do Poder Legislativo, significa quebrar a independência e harmonia entre os poderes da República Federativa do Brasil, causando distorções que podem colocar o país em cenário de insegurança, como por exemplo as situações de ativismo em matéria tributaria, acima elucidadas.
Logo, o Poder legislativo deve exercer suas funções típicas atuando por meio de lei somente até os limites de competência que lhe é permitido pelas regras constitucionais de competência, e de outro lado o Poder Judiciário não poderá intervir para corrigir eventuais desvios ou extrapolação de tais competências, salvo nas hipóteses previstas na Constituição Federal.
Mestrando em Direito pela Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP, Gerente Corporativo Tributário em empresa de grande porte; Graduado em DIREITO pela UNESP – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2007); Pós-graduado em Direito Tributário pela Uniderp – Anhanguera; Membro do Comitê Tributário da ABAT – Associação Brasileira de Advocacia Tributária; Membro da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra – ADESG, com habilitação em Ciências Políticas e Estratégia
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